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Humanos, macacos, tubarões, pombos, pintinhos e até bactérias se curvam, de maneira consciente ou inconsciente, para Ela. O próprio universo e tudo o que o forma também. Isso implica que aquilo que chamamos de matemática não está apenas impressa em nosso sistema nervoso. Bactérias não possuem sistema nervoso, átomos de carbono não possuem sistemas nervosos; Ela está presente em tudo o que existe em um nível químico, molecular, atômico. E tudo o que existe deve mesmo se curvar a Ela.
A existência é um grande jogo, e estamos aos poucos descobrindo suas regras, infelizmente essas regras não estão nem um pouco a nosso favor. Já vimos que uma vez vivos, somos obrigados a jogar o jogo, mas não importa o quão bem joguemos não vamos nunca ganhar, nem empatar; talvez Schopenhauer não estivesse sendo pessimista quando afirmou que não podemos fugir de nosso caráter mesmo que o condenemos, talvez ele apenas estivesse afirmando o óbvio.
A versão moderna, pobre, popular e sem graça de Schopenhauer, o Dr. House, MD, segue a mesma lógica, de forma moderna, pobre, popular e sem graça, quando afirma que as pessoas não mudam e que todo mundo mente.
Como vimos estamos imersos em um sistema onde não importa o que fizermos não temos como vencer, no fim todos morremos e o nosso maior gênio imortalizado terá o mesmo destino do maior Tiranossauro Rex imortalizado do passado. Eventualmente todos viraremos pó e até isso acontecer podemos nos contentar em sermos marionetes de algo muito maior do que nós mesmos. Essa idéia lhe causa desconforto? Nós podemos explicar porquê.
Um dos programas que seu cérebro roda constantemente é conhecido no mercado de softwares pelo nome de Superioridade Ilusória. Resumidamente a superioridade ilusória nos faz termos certeza de que cada um de nós, o famoso EU, está acima da média em relação a todos os outros, o famoso “todos que não forem eu”. Pessoas com o Q.I. abaixo da média tendem a superestimar o próprio Q.I. Pessoas que conviveram juntas tendem a se lembrar como sendo mais justas, honestas, divertidas e inteligentes em comparação com a memória das pessoas com quem conviveram. É isso que faz com que 87% das pessoas que conseguem MBA qualificarem sua performance como acima da média, que faz pessoas se julgarem mais populares do que realmente são ou que são mais saudáveis do que são. Isso explica porque consideramos um sistema que não esteja a nosso favor como injusto, isso explica porque a maioria das pessoas que lê este texto acha que ele pode se referir aos outros mas nunca a si mesmas, já que elas podem mudar e não são marionetes de ninguém. Afinal, por pior que seja o mundo, você com certeza é diferente.
Vejamos se de fato é.
Nós vivemos em grupos, somos animais sociais. Isso implica que todo dia o seu interesse indiviual se choca com o interesse de outro alguém ou outros alguéns. Quem toma banho primeiro em casa? Você não está com tanta fome assim, devia comer a última fatia de presunto da geladeira? Eu não entrei na vaquinha do pão de queijo do escritório, mas ninguém vai achar ruim eu pegar um. Está de noite, estou cansado/cansada, as bilheterias do metrô já fecharam e descobri que não tenho um bilhete, ninguém está olhando, o lugar parece deserto, pulo ou não a catraca? O amor da minha vida está viajando, eu amo a pessoa, mas aquela outra está me dando um mole danado, se eu for pra cama com ela só por uma noite, que mal tem? Eu preciso muito de um aumento, acho que meu trabalho é bem feito e necessário, mas e se eu falar que se não receber o aumento vou pedir demissão e não receber o aumento, continuo trabalhando com cara de idiota ou troco o certo pelo duvidoso? Trabalhou o dia todo, não aguenta ficar de pé e logo que senta no assento reservado para idosos entra no transporte uma senhora descansada e fica de pé perto de você, você oferece o lugar para ela, correndo o risco de ter que continuar a viagem de pé? Você encontra na praça de alimentação do shoppingo uma carteira cheia de dinheiro, embolsa a grana ou procura o dono?
Conflitos de interesse. Parece que você está sempre disputando contra algo ou alguém. Se houvessem regras, você pensa, a vida seria mesmo um jogo. Um jogo do qual não podemos escapar. Já ouviu a expressão que a vida seria mais fácil se viesse com um manual de instruções? Bem, nós vamos te dar o manual e você diz se a vida de fato se tornou mais fácil.
Regras do Jogo
“Uma coisa eu aprendi nos últimos sete anos: em todo jogo e trapaça existe sempre um oponente e uma vítima. O truque é saber quando você é o segundo para então se tornar o primeiro.”
– Jake Green – Revolver
Primeira regra do jogo: Maximizar, prioritariamente, o ganho individual.
Existe alguma dúvida a respeito disso? Se sim, vamos ser ainda mais claros. Existe um termo técnico, “Função de Utilidade”, que descreve aquilo que todo mundo quer da vida em qualquer momento da vida. Jogadores sempre vão buscar certos resultados em detrimento de outros, e esses resultados buscados visam sempre a Utilidade. Essa utilidade é aquilo que a sua alma quer com toda a força do universo, aquilo que quanto mais você tiver, melhor. Pense na utilidade como sendo pontos que você quer acumular. Se você joga pôquer valendo palitos de fósforos, então a utilidade é a quantidade de palitos que você junta. Se você acha dinheiro importante, a sua utilidade é o dinheiro, se acha saúde importante ela é a saude, se sexo é o que te faz suar frio e você abre mão de tudo por uma boa trepada, então sexo é a sua utilidade. A utilidade que você atribui a um certo resultado é que determina sua estratégia no jogo, e assim, agir racionalmente, significa fazer de tudo para que você consiga maximizar essa utilidade. Dai surgem os conflitos – as partidas do jogo – já que cada jogador deseja maximizar, prioritariamente, o ganho individual.
Isso não significa que cada jogador, ou, trocando em miudos, você, não seja solidário ou que seja um egoísta unha de fome, essa necessidade é algo muito mais profundo do que o mero civismo ou “bondade”, mas não se preocupe, nem as mais civilizadas sociedades conseguiram resolver esse dilema. Pense, por que consideramos o altruismo uma virtude humana e não uma característica humana? Se todos se comportassem de forma altruísta, buscando o bem do grupo acima do próprio, não haveria o jogo. E o jogo não tem nada a ver com moralidade, com “bem ou mal”, ou com “certo e errado”, tem a ver apenas com Ela, apenas com matemática.
Segunda regra do jogo: você deve descobrir se está jogando em time ou sozinho.
Na época em que o Carandirú estava na ativa, a AIDS era uma praga impossível de ser combatida, uma número enorme de presos tinha a doença e um número maior ainda a adquiria. De repente, como se por mágica, o número de contaminados diminuiu, ninguém sabia o porquê, até perceberem que outra praga que estava surgindo era a responsável. Antes, na prisão, grande parte do consumo de drogas era via intravenosa com o uso de seringas. Quando o crack chegou na prisão as pessoas o trocaram pela cocaína sem pensar, ele virou a droga favorita de todos, se tornando uma epidemia como a AIDS, só que a AIDS começou a se conter, isso porque o crack era fumado e não injetado, assim grande parte do contágio deixou de existir, as pessoas se drogavam fumando e não se picando. O crack acabou ajudando a diminuir o contágio de uma doença que mata e não tem cura; já o crack pode matar, mas não é contagioso como a AIDS. Neste caso podemos dizer que um dos males ajudou a sanar o outro. Podemos dizer que neste caso o vício em crack foi algo bom?
Quando lidamos com a segunda regra do jogo, geralmente entramos em dilemas deste tipo. Temos que saber o que precisa acontecer para que uma colaboração com alguém seja vantajosa ou não, quando vale a pena jogarmos sozinhos.
Terceira regra do jogo: Enquanto você conseguir respirar, não pode parar de jogar. Você entrou em campo no momento em que seu pai inundou o útero da sua mãe, você só sai dela quando seu coração parar de bater. Durante cada segundo seu, desperto ou não, a partida está acontecendo e seus oponentes são todas as outras pessoas e seres vivos no mundo, todos tem consciência das regras e todos querem ganhar. Não se iluda nem por um instante que isso não é verdadeiro. Isso nos torna prisioneiros do jogo e devemos agir como tal.
Quarta Regra do jogo: Você não precisa decorar ou entender as regras, elas já foram programadas em seu sistema nervoso através da química do seu corpo, mesmo não querendo, você vai seguir essas regras, cada escolha que tomar vai, conscientemente ou não, respeitar essas regras, não há como fugir disso, nem que você queira (em caso de dúvidas vá trabalhar sem nenhuma roupa no corpo).
Quinta regra do jogo: Todo o resto é ilusão.
O Jogo
Agora você já sabe que recebeu uma programação para maximizar o seu ganho individual. Essa programação é a primeira e mais forte diretriz do seu sistema, é ela que controla você com mais força. Você também já viu que o seu ganho pode ser traduzido como “utilidade”. Um bebê recém nascido vai fazer de tudo para conseguir um peito na boca, um homem crescido também, neste jogo o bebê se sai melhor porque tem a vantagem de exercer um controle emocional sobre a mãe, enquanto os homens adultos tem que conquistar (ou pagar pelo) o desejo da dona do peito. Quando você tem fome quer comer, quando quer perder peso mesmo que tenha fome evita a comida, já que sua utilidade é a balança a seu favor. Vamos deixar de teorias e partir para a prática.
Você entrou em um ônibus lotado de noite, ele está passando pela avenida das universidades, se enchendo a cada ponto. Você percebe que está se aproximando de seu destino e tem que atravessar a catraca ou… por que não simplesmente esperar a porta se abrir no seu ponto e descer sem pagar? Tem tanta gente no ponto de ônibus e entrando e saindo que ninguém vai notar.
Você sai no fim do ano para um restaurante com o pessoal da empresa para uma confraternização, todos as 50 pessoas, incluindo você decidem dividir a conta pelo grupo. Você está com pouca grana no bolso, mas sabe que vai pagar 2% da conta (o 100% total, dividido por 50 pessoas). Por que não pedir um prato mais chique e exótico e umas bebidas a mais, sem falar na sobremesa, já que todos vão pagar?
Você tem duas crianças com sede em casa, elas pedem por suco. Você prepara uma jarra de suco e coloca gelo dentro para deixar ainda mais gostoso. Quando serve a bebida uma das crianças repara que o copo do irmão “tem mais suco”, o irmão repara que o copo da irmã “tem mais pedras de gelo”, e a briga começa. Isso sempre acontece e você sabe que jogar crianças pela janela quando perde a calma é errado. O que você pode fazer para resolver isso de forma que não condene as crianças a uma futura vida de visitas a psicólogos?
Por que as quadras esportivas de prédios e condomínios, que quase nunca são usadas pelos moradores, são muito mais bem cuidadas do que as públicas, que são usadas por centenas de pessoas?
Por que seus políticos mentem para você e você continua votando neles?
Apesar de tudo isso ser um único Jogo, não existe uma única forma de jogá-lo. A forma escolhida determina como a partida será disputada e cada partida se torna uma miniatura do Jogo Completo. Como em um holograma que quando partido se torna, cada parte, um novo holograma inteiro. Neste aspecto os novos “jogos menores” podem se tornar um jogo de soma zero – quando a vitória de um nogador implica, necessariamente, na derrota do outro, como um jogo de poker, por exemplo – ou um jogo de colaboração – onde talvez o indivíduo não ganhe tanto, mas ganha mais do que se tentasse ganhar tudo, conseguiu entender?
Então imagine que você vive em uma pequena cidade, e descobre nos arredores um trigal. Lá nasce um trigo muito bom e logo você começa a ir lá para colher um pouco para fazer bolos, tortas, kibe cru etc. O trigo não é de ninguém, ninguém plantou e está lá, crescendo, tomando sol e chuva. Só que você não foi a única pessoa que notou o trigo, e logo todo mundo da cidade começa a colher um pouco. Com o tempo, pegar de pouco em pouco cansa, você percebe que se encher uma pick-up com o trigo, vai ter materia prima para o mês todo, sem ter que ficar voltando todo dia. As outras pessoas percebem isso e logo surge uma pequena consecionária de pick-ups e pequenos caminhões. E todos compram os veículos, e colhem o trigo, até alguém se tocar uma maneira melhor de colher mais trigo mais rápido. Bom, chegamos no ponto em que temos que considerar qual o tamanho dessa plantação? Dá para todos colherem dela por quanto tempo? Essas questões surgem porque temos a perspicácia de notar que cedo ou tarde o trigo acaba, muita gente pegando muito trigo, é como a noção química que as bactérias tem de que se infestarem você, perdem sua fonte de comida. Você pára então e começa a dedicar uma semana por mês a ir cuidar da plantação? Lembre-se que não é de ninguém, por isso você não vai receber nenhuma compensação por seu tempo, e além disso todos estão se servindo e ninguém pára para cuidar dela, afinal como é de todo mundo, a responsabilidade não é de ninguém, por que você pararia para ir arar o campo, plantar trigo de novo e cuidar do que nascer, espantando os animais, cobrindo quando gear, etc… por que você vai arcar com os custos e consequências sozinho de algo que todos usam?
Entendeu porque as quadras e praças públicas são mais mal cuidadas do que as quadras e quintais particulares? Isso acontece porque todos querem maximizar seu ganho, o que é o oposto de perder o ganho ou arcar com um ganho negativo, também conhecido como despesa. No interesse individual contra o interesse coletivo o individual prevalece, se acha isso besteira responda rápido qual foi a última vez que saiu com uma vassoura debaixo do braço para varrer a rua em que vive e desentupir os bueiros. Não precisa dar desculpas do porquê não faz isso, só uma data da última vez que fez.
Sacou porque fazendas tem cercas? (sério… você não achava mesmo que aquelas cerquinhas de arame farpado eram pros ladrões não entrarem né?)
Isso acontece porque se deixarmos o mundo à Deusa dará, nós o consumiremos e o mastigaremos com ainda mais vontade do que já o consumimos e o mastigamos hoje, neste aspecto as bactérias sem cérebro se saem melhor do que nós. A privatização, o pesadelo dos Hippies e o arqui-inimigo do MST é simplesmente uma forma de evitar que os indivíduos colham apenas os benefícios de algo, mas que também arquem com a despesa da preservação.
Isso funciona porque ao se delimitar/privatizar algo, existe uma forma de inserir um castigo, seja uma multa, uma proibição ou uma perda para aqueles que estão usufruindo este algo, e isso se choca de frente com nossa primeira diretriz.
Lembra-se dos racionamentos de energia no começo dos anos 2000? Todo mundo achava que só por pagar uma conta de luz, podia gastar quanta energia quisesse, claro que ninguém perguntou nada para a velha Mãe Natureza que é a responsável pela matéria prima da energia. O governo percebendo a merda que ia dar criou sobretaxas e cortes do fornecimento energia individuais para se criar uma consciência de que não é porque está ali que qualquer um faz o que quer – foi o equivalente energético de cercar o pasto. Vendo que poderia ser mordido onde mais dói, o povo começou a racionar energia, levado pela matemática que cada indivíduo da sociedade realizou que afirmava que eles poderiam deixar de perder seu dinheiro sem ter que levar uma vida especialmente miserável – foi criada, entre o povo e o governo, uma estratégia de equilíbrio para se levar o jogo.
Essas situações onde todo mundo usa e ninguém cuida é conhecida como tragédia dos comuns. E ela pode ser ilustrada de forma mais clara pela seguinte situação:
Fim de ano. Você e os colegas do escritório vão confraternizar em um “barzinho super legal aqui perto, fica do lado do metro pra quem precisar ir para casa mais cedo e não tem carro, é muito aconchegate e tem umas comidinhas super legais com um precinho em conta”. Todos decidem dividir a conta final e se sentam em uma mesona comprida como uma solitária que vive nas tripas de alguém que sofre de infestação de solitária. Logo de cara todos pedem um choppinho ou um refrigerante e começam o olhar o cardápio. Como dissemos, a grana anda curta e você pensa em ficar no básico, mas então percebe que na ponta da mesa já tem dois copos de caipirinha e, ao invés de fritas, começam a chegar pratos de carpáccio e filé. O pessoal que tinha combinado de pedir uma pizza para rachar já está começando a pedir fritas e sanduiches individuais. O filme pára, sua cabeça se divide em duas:
Cabeça A – Nossa, o povo tá exagerando, mas eu estou meio apertado e não tem porque pedir coisa muita cara, vou ficar nos meus três chopinhos e pedir uma porção barata de fritas.
Cabeça B – Caramba… se vou dividir a conta em 50, e pagar só 2%, posso pedir uma comida boa e me acabar de beber que no fim ainda saio no lucro, com certeza vou pagar menos do que se pedisse isso tudo sozinho. GARÇOM! QUANTO SAI ESSA PORÇÃO DE FILÉ? ME TRAZ UMA ERDINGER!”
O que você faria nesta situação? Ouviria qual cabeça? (não, não estamos falando do seu pênis)
Ajudaria se você soubesse que acabou de cair na situação de tragédia dos comuns?
Qualquer que seja a escolha que fizer, se conter ou sair pro abraço, você e todo mundo já perdeu. Perdão, quase todo mundo já perdeu. Mesmo que a conta seja dividida por 50 pessoas o custo individual será mais alto do que se você tivesse se contido. Se suas fritas e seus três chopps totalizassem R$31,00 reais – com os 10% já inclusos – pode ter certeza que a sua parcela da conta ultrapassará os R$40,00. Quem já passou por essa situação sabe. E quanto menos você consumir, maior será a sua perda. Imagine que beba apenas um chopp de 4 reais, ao invés de pagar os R$40,00 e tantos reais, terá que pagar 40 e tanto – 4/50. 4/50 = 0,08. Sua conta seria 8 centavos mais barata, teria pago ainda R$40,00 e tantos reais menos 8 centavos.
Quando todos começam o cada um por si, o raciocínio aponta que quanto menos você consumir maior será seu prejuízo, e isso cria uma bola de neve, pois todos percebem isso e tiram o proveito. Vira uma tragédia, para todos os comuns que estão lá. Perdão, quase todos os comuns que estão lá. Não que isso possa quebrar alguém, mas isso sempre explica no dia seguinte as pessoas que começam a falar com ódio na voz, que nunca mais participa de uma coisa assim porque teve que pagar R$70,00 reais e nem consumiu tanta coisa.
Veja agora o que acontece quando percebemos que este é um jogo onde jogamos com outras pessoas e não sozinhos.
Imagine que ao invés de sair com 50 pessoas você sai apenas com mais dois amigos, e os três decidem rachar a conta. Pára o filme, sua cabeça se divide:
Cabeça A – Nossa, já que vou dividir a conta em 3, ao invés do meu chopinho posso pedir essa vitela ao molho de diamantes e uma garrafa de champagne Krug já que no fim os outros dois vão arcar com o custo, vai ser uma pechincha para mim.
Cabeça B – Vamos um na onda do outro, tomo os meus três choppinhos, se rolar uma porção beleza, e no final gasto o que vim pra gastar, um pouco mais ou um pouco menos.
Qual cabeça você ouviria desta vez? Geralmente os que ouvem a Cabeça A só saem uma única vez com os amigos, já que depois do encontro deixam de ter amigos.
No que a situação da confraternização muda em relação à Happy Hour no boteco? Em nada. O que muda é nossa percepção de que tipo de jogo estamos jogando naquele momento. Se na situação da festa de confraternização simplesmente dividíssemos o grupo em mesas separadas, contendo até 6 pessoas, o prejuízo geral seria menor. Quando retificamos acima que quase todo mundo perde nesta situação, nos referíamos a uma curiosidade que acontece em casos de tragédias dos comuns. Na natureza uma manada de búfalos é tão rápida quando os búfalos mais lentos, isso porque ao se manterem a manada, os búfalos tem respeitar o limite dos menos rápidos para não se dividirem. Na tragédia dos comuns a coisa é similiar, o prejuizo geral é puxado pelos gastos dos maiores sem noção. Em uma mesa de X pessoas, o gasto geral tende a ser a média – em outras palavras se todos pedem uma porção de fritas no final cada um pagará por uma porção. Agora se em uma mesa de X pessoas todas pedem fritas e uma pede uma porção de vitela com molho de hortelã, essa pessoa terá o custo da vitela diluido no custo das fritas, ou seja todos pegam mais, menos aquele que pediu a vitela, esse paga menos. Para entender isso vamos dar nome aos bois:
Batata-Frita: R$12 reais;
Vitela com molho de hortelã: R$56 reais;
7 pessoas com noção na mesa;
1 pessoa sem noção na mesa;
Todos resolvem pedir algo e calculam que uma porção de fritas alimentam 3 pessoas, 3 porções resolveriam. Custo R$36,00 dividido por 8 = R$4,50 reais por pessoa. Mas a sem noção pensa “ahhh vamos dividir mesmo” e corrige o pedido para 2 fritas e uma porção de vitela. Se pedisse sozinha pagaria R$56 reais, como vai dividir são 56 + 24 (duas fritas) dividido por 8 pessoas = R$8,00.
O que para o fã de vitela pareceu uma grande jogada, pagou R$8 reais ao invés R$56, fez com que todos tivessem um aumento de mais de 120% em sua despesa. Por um lado uma pessoa tem um custo menor e por outro várias tem um acréscimo. A Tragédia vem quando as várias tentam compensar esse acréscimo consumindo mais, para “gastar menos” no geral, e acabam criando um sistema que é prejudicial para os que gastam demais e muito mais prejudicial para os que gastam apenas o que precisam. A pessoa que consumiu apenas meia porção de fritas (já que uma porção servem 2 pessoas) acaba pagando a vitela que não comeu. Da mesma forma que a pessoa que paga a passagem de ônibus acaba pagando por todos os que desceram sem o motorista ou o cobrador verem, e pagam caro, cada vez que o número de inadimplentes em um sistema cresce aqueles que tem as contas em dia arcam com a despesa. Agora imagine que não estamos falando de um ônibus que você pegou, mas de uma sociedade da qual você faz parte. Já parou para pensar porque você paga tantos impostos e porque tudo tem tantos impostos embutidos? Seu dia a dia é uma tragédia dos comuns que você não pode controlar.
Já que cada pessoa que nasce não traz consigo uma soma de dinheiro para gastar durante a vida, ela deve usar parte do dinheiro que já circula por ai. O problema é que dinheiro não nasce em árvores. Por isso quanto mais gente existe no mundo, menos vale o dinheiro. Quanto menos vale o dinheiro maiores são as dívidas. Quanto mais se deve, mais todos tem que pagar para se tentar manter o equilíbrio da balança. Quanto mais se paga, menos dinheiro você tem na carteira, etc. Como resolver isso? Pense na solução de dividir o grupo de confraternização em mesas menores, qual a resposta?
Agora, como dissemos, essas regras estão implantadas em nós, sempre vamos querer mais do que nós achamos que nos faz feliz e isso não é necessariamente aquilo que precisamos para viver bem.
As duas crianças que discutem por causa do suco não querem saber se o copo tem mais suco do que vão conseguir beber ou se as duas bebedias estão na mesma temperatura. Eles querem mais. Mais suco, mais gelo, e elas sentem que estão sendo prejudicadas se não tiverem mais de ambas as coisas. Elas não páram para pensar, mas se pararem só terão certeza de que estão certas e de fato foram lesionadas, dai partem para o contra ataque: chantagem emocional, ameaças, etc.
Agora o que aconteceria se ao invés de servir as duas crianças você fizesse com que elas se servissem, mas colocasse uma regra adicional: uma pode encher os dois copos como quiser… mas a outra é que escolhe primeiro de qual copo vai beber. Neste momento a segunda regra do jogo entra com força e as crianças percebem que para ganhar mais, tem que ser o mais precisas possível em compartilhar corretamente o suco. Em situações como essa a pessoa percebe que se tentar levar vantagem ela se coloca em uma situação delicada de poder ver a sua vantagem ser servida para outra pessoa. Ai entra a importância de você saber se está jogando com alguém ou contra alguém e as aparências podem enganar.
Vamos Para a Cadeia!
Vejamos um exemplo completamente fictício que dificilmente aconteceria na vida real. 2 pessoas roubam um banco. Levam meio milhão de pratas. Elas escondem o dinheiro para esperar o “calor abaixar” e seguem com a vida. Infelizmente, graças a sua vida pregressa e a seus vizinhos desconfiados, a polícia os prende uma tarde e os leva a interrogatório, em salas separadas. Vamos chamá-los de Sr. A e Sr B. Para deixar a coisa mais interessante se coloque no lugar de um deles, pode escolher à vontade.
A polícia não tem provas para condenar vocês, apenas suspeitas, mas se um de vocês confessar o crime eles podem prender ambos. Claro que você sabe que tem meio milhão de pratas escondidos por ai, e que a polícia não tem provas contra você e tudo o que você precisa fazer é ficar de bico calado. Mas ai as coisas ficam interessantes. Como todo bom ladrão de bancos, você tem armas ilegais em casa, assim como seu parceiro e o jogo muda um pouco. Eles podem te prender por 6 meses por porte ilegal de armas. E a coisa fode de vez quando a polícia resolve apelar: eles dizem que as pessoas que assaltaram o banco vão pegar 10 anos de cadeia, e que como eles suspeitam de você te dão uma chance; se você abrir o bico e dedurar seu cúmplice eles te liberam e só ele cumpre a pena, agora se você ficar calodo pega 6 meses de prisão e como bônus se os dois assumirem o crime ambos cumprem apenas 5 anos de pena.
Agora sua cabeça funciona assim: se ambos ficarem quietos cumprem 6 meses. Se ambos acusarem o cúmplice ambos servem 5 anos, mas se você acusar o cúmplice sai livre e ele cumpre 10 anos. Imagine isso, você com meio milhão de pratas para torrar, seu cúmplice preso por 10 anos. Neste tempo você muda de nome e foge do país. Claro que ele pode estar pensando a mesma coisa. Você confia nele, tanto quando você ACHA que ele confia em você?
Este cenário tem o nome de “dilema do prisioneiro” e pode não parecer, mas é um modelo matemático muito interessante. Ele foi formulado originalmente por Merrill Flood e Melvin Dresher enquanto trabalhavam na RAND em 1950 e mais tarde aperfeiçoado por Albert W. Tucker, que fez a sua formalização com o tema da pena de prisão e deu ao problema geral esse nome específico. A questão que o dilema propõe é: o que vai acontecer? Como o prisioneiro vai reagir?
Curiosamente este dilema pode resultar em dois vencedores. Se ambos calarem a boca e cumprirem apenas 6 meses de pena. Entretanto, os jogadores confrontam-se com alguns problemas: Confiam no cúmplice e permanecem negando o crime, mesmo correndo o risco de serem colocados numa situação ainda pior, ou confessam e esperam ser libertados, apesar de que, se ele fizer o mesmo, ambos ficarão numa situação pior do que se permanecessem calados?
Como vimos o objetivo de cada um é a utilidade, que no caso é cumprir zero tempo de prisão e ainda ficar com o máximo do dinheiro escondido que conseguir. O problema é que se ambos seguirem esse instinto caímos em uma tragédia dos comuns, onde ambos simpelsmente perdem. Agora suponha que os policiais deixem os dois conversarem antes de se decidirem pelo que fazer. Por mais que jurem que ficarão quietos, existe mesmo a chance de confiar? Quanto mais sincero cada um parecer de que prefere o silêncio e quanto mais convencido o parceiro ficar, maior é a chance de um deles levar a melhor. Ou seja o teatro e o blefe são importantes, mas não garantias de sucesso, mas são uma grande vantagem.
Não é de se admirar que o blefe tenha se tornado uma característica clara nos seres vivos. Parecer mais forte do que é, mais perigoso do que é, maior do que é, mais rico do que é… qualquer coisa que aumente a chance de você atingir sua utilidade. Veja qualquer jogo de futebol e logo vai ver dois jogadores indo um em direção ao outro e tendo como resultado um rolando na grama segurando a perna como se ela fosse se soltar para, dois minutos depois de cobrada a falta estar saltitando como uma gazela pelo campo. O dilema dos prisioneiros nos mostra porque casais que sempre viveram bem se tornam tão mesquinhos e cruéis um com o outro depois de se separarem – já que pelo menos um se sente prejudicado, tenta arrastar o outro para baixo junto, mesmo que com isso se prejudique mais.
Não existe uma resposta correta para o dilema do prisioneiro, confiar, ser esperto… ele apenas nos oferece uma ferramenta para podermos pesar nossas decisões, nos oferecem uma forma de usarmos a razão da melhor maneira possível. Curiosamente um experimento baseado no dilema mostrou que cerca de 40% de participantes cooperaram (ficam em silêncio), o que nos mostra que em 60% das vezes alguém vai jogar merda no ventilador, e se isso vai acontecer em mais da metade das vezes você vai fazer o papel de bobo e levar merda na cara sem reagir, ou já começa chutanto o balde e danem-se as consequências?
É esse pensamento que faz com que a cada dia mais e mais jogadores no mundo afundem um pouco mais. As emoções são mais fortes do que a razão, mesmo que você já tenha pesado os prós e contras. Isso acontece porque as regras do jogo estão gravadas quimicamente no nosso sistema nervoso.
Quer ver um exemplo mais claro? Você está em uma sala, entra uma pessoa visivelmente enferma, mancando, dizendo que foi picada por uma cobra, que precisa tomar o antídoto que está na sala do lado. Você sai correndo para a sala do lado e vê dois frascos na mesa, quando vai pegar um a pessoa grita do outro cômodo, só cuidado pra não me trazer o veneno. Os dois frascos são iguais, idênticos, e alguém se esqueceu de etiquetá-los. O que você faz? A pessoa com certeza só tem mais uma hora de vida. Não vai chegar ninguém lá. Você:
a) Escolhe um dos frascos ao acaso – afinal 50% de chance de sobreviver é melhor que a morte certa – e leva para aplicar a injeção e torce para que a pessoa se salve;
ou
b) Escolhe um dos frascos ao acaso e aplica uma dose em você – afinal você não quer matar a pessoa com a escolha errada e se você sobreviver vai ter 100% de certeza de que a vítima da picada sobreviverá;
Independente da sua índole, a resposta natural da grande maioria das pessoas que se consideram sãs seria a alternativa A. Afinal podemos reduzir o problema a: duas vidas, na opção A você garante a sobrevivência de pelo menos uma, na opção B você coloca as duas em risco, uma que já estava condenada e outra saudável e pior, a vida saudável é a sua. Logo…
Em 1988 Cazuza lançou seu terceiro album, intitulado Ideologia, na faixa título, que foi eleita a música do ano na época, ele cantava que “Meus heróis morreram de overdose”. Eu não sei se isso aconteceu com todos os heróis, mas eles parecem de fato estar em falta no mercado hoje em dia. Heróis que nos inspirem a ser pessoas melhores do que somos, a realizar atos grandiosos. Graças aos céus eles estão em falta, caso contrário nos inspirariam a fazer coisas pouco saudáveis também. Pegue o exemplo de Indiana Jones. Em sua terceira aventura se vê com o pai baleado no chão, tendo que atravessar uma série de armadilhas para recuperar o santo Graal, a única coisa que salvaria a vida de seu pai. Infelizmente ele tinha nazistas junto com ele, e os nazistas queriam matar ele (menos a nazista gostosa que queria comer ele). Ele finalmente chega a uma sala onde tem que escolher um dentre muitos e muitos cálices, encher de água e levar para o pai. Um dos nazistas escolheu o cálice errado e morre de uma forma que só os nazistas sabem morrer. Indy estava em maus lençois. Se levasse o cálice errado o pai morria, e eram muitos. Ele então pensa, escolhe oque lhe parece mais lógico, enche de água e então… ELE BEBE DO CÁLICE. Voltando para nosso teste é exatamente a escolha A, a que nos parece bizarra. Claro que nosso herói poderia ter sido ainda mais lógico do que na escolha das cálices e levado para o pai, já que se ele errasse o pai morreria de qualquer forma só que sozinho, sofrendo e esperando o filho que jamais voltaria para seu lado. Por outro lado imaginemos que Indy levasse o cálice errado e o pai morresse. Que raio de vida ele levaria depois disso? “Desculpa pai, não foi dessa vez. Agora vou caçar uns russos na Amazônia pós Segunda Guerra, tchau”? A maioria das pessoas se perturbaria de ter tido uma chance de salvar um ente querido e falhado. Seria como pensar: eu tive a solução nas mãos e a deixei escapar! Sou incompetente, se tivesse estudado mais saberia como se parece um cálice sagrado de Jesus!”, dificilmente paramos para pensar que devido às possibilidades, combinações e probabilidades, se não fosse pelo roteirista do filme, o pai de Indy não tinha esperanças, logo seria natural ele morrer. Mas a esperança de fazer a diferença é outro dos fantasmas que nos assombra.
No caso de Inidiana Jones muitos de nós podemos compreender sua ação, caso fosse algum ente querido nosso, muitas pessoas se colocariam em risco para salvar a quem amam, seja um filho, um pai, uma mãe, etc.
De que valem milhões de anos de evolução do cérebro humano se ele ainda é incapaz de tomar as decisões lógicas?
Claro que por lógicas não queremos dizer as corretas, lembre-se, não existem respostas corretas. Você recebeu um convite para um churrasco, ou festa. E te avisam que cada um leva um engradado de cerveja. Você vai no mercado e calha de estar passando por um mês financeiramente apertado. Vê que a cerveja que gosta está saindo por R$2,50 a lata, e tem que levar 24 delas. Ao lado uma marca aguada anuncia que cada lata custa R$ 0,99. No meio descobre uma marca popular, que não é ruim, custando R$1,30. Suponha que você escolha a cerveja de R$1,30, afinal pode não estar com grana sobrando, mas não é nenhum muquirana. Quando chega no churrasco, ou festa, percebe duas coisas: pessoas compraram engradados da sua cerveja favorita! pessoas compraram engradados da cerveja vagabunda! Se você já se viu em uma situação dessas, pense com sinceridade: se restringiu somente à marca que levou? Ou houve o momento do: eu fiz minha parte, até vou beber da que eu trouxe, mas essa é a minha favorita! Caso não tenha feito isso ou nunca tenha participado de um evento desses eu afirmo: a cerveja boa e a intermediária SEMPRE terminam primeiro, ficando só a porcaria aguada para o final. Ninguém faz isso para prejudicar ninguém, nem para provar superioridade estratégica, mas é algo que acontece. A regra geral é que a maioria irá tentar maximizar o seu ganho individual, e isso acontece ao custo de todos.
Mas, se todos obedecemos à diretriz da maximização individual, por que o mundo não é um filme do Mad Max, onde quem tem mais armas fala mais alto? Isso acontece por causa da segunda regra, que até agora vimos apenas de relance mas que será estudada agora com um pouco mais de atenção.
Quando os macacos decidiram que a vida estava chata e resolveram descer das árvores para inventar os canais pornôs de tv a cabo e a internet, eles perceberam uma coisa. Por mais que às vezes tivessem vontade de simplesmente metar a mão em uma macaca e levar ela contra a vontade para uma caverna, já que a pornografia digital estava programada para acontecer apenas em alguns milhões de anos, eles não faziam isso. Da mesma forma que maximizar o ganho pessoal não é algo ligado ao egoísmo e a um carater aproveitador, preservar e ajudar ao próximo também não se trata de bondade ou um bom carater. Como já dissemos antes: o altruísmo é uma virtude, não uma característica do ser humano. Nós todos estamos jogando, acontece que às vezes o jogo não é de soma zero, pode ocorrer de caso ajudemos alguém a ganhar, nós ganhemos também. A cada vez que você vota em um político, está fazendo isso para ajudar ele a manter a família e a pagar a faculdade dos filhos, ou faz isso para ganhar, ou deixar de perder, algo?
Políticos são poderosos. A utilidade deles é o poder, quanto mais poder melhor. O problema é que o poder político não vem de uma caixinha, ele tem que ser acumulado, um voto de cada vez. E para receber votos ele tem que convencer você de que ele é melhor do que os outros. Como vivemos em uma democracia, você é obrigado por lei a votar. Assim um político nem precisa te convencer que votar é bom, ele só precisa queimar a concorrência. E como ele faz isso?
Bem, seres humanos em geral tem manias engraçadas. Cumprimentamos estranhos com sorrisos. Damos gorjetas a garçons que nunca mais veremos. Doamos sangue. Adotamos filhos que não são nossos. Todas essas ações que parecem irracionais nos mostram que nosso cérebro, mesmo que de forma insconciente, tenta captar sinais de pessoas que sejam confiáveis como parceiras no jogo. Temos que estar prontos para partidas em que tentar um ganho individual pode prejudicar o ganho. Suponha que esteja com o tesão à flor da pele, os olhos ficando brancos, você não consegue digitar sem afundar as teclas no teclado. Decide ir para um bar, e leva alguns amigos ou amigas junto. Chegando no campo de caça todos percebem um exemplar ecepcional em beleza, porte, que exala tesão e está desacompanhado. Apesar da melhor estratégia individual seja se criar uma competição pela atenção da pessoa desejada, isso poderia consumir muita energia, muito tempo e no final apenas um do grupo sairia vencendo, o grupo como todo perderia e esse/a amigo/a fura-olho provavelmente não seria chamado/a tão cedo para sair de novo. A melhor técnica é esquadrinhar o local por alvos secundários e terceários e dividir a energia de todos. E, seguindo este exemplo, qual a melhor maneira de se impressionar sua futura vítima? Tentamos ao máximo parecer confiáveis, simpáticos e compreensivos. Tentamos nos mostrar não exatamente como somos, mas como achamos que a pessoa gostaria que fôssemos.
Com isso em mente como podemos criticar o político que tenta se mostrar não como é, mas como ele acha que você gostaria que ele fosse? Você vai ser obrigado a votar mesmo, e com certeza vai votar naquele cara que tiver a maior chance de aumentar o seu ganho individual ou minimizar as suas perdas individuais.
Para tentar entender exatamente como funciona esse mecanismo de sociabilização pesquisadores tentaram se aprofundar na programação de nosso cérebro, mas um deles se sobressaiu. No início da década de 1980 Robert Axelrod resolveu investigar o jogo com a melhor ferramenta de todas, propondo um jogo. Ele partiu do princípio do dilema do prisioneiro e pediu para que pessoas desenvolvessem programas que pudessem trair ou cooperar com o adversário em troca de pontos, exatamente como aconteceria no dilema. Os vários programas seriam confrontados aos pares, e cada um deles escolheria trair (dedurar) ou cooperar (calar )em cada encontro. Só que diferente da vida real, onde caso você levasse pra cama a mulher que seu amigo estava cortejando ou se você pedisse vitela depois que seus amigos pedissem batata-frita não teria outra chance de repetir o experimento, cada par de programas confrontaria seu rival 200 vezes seguidas. Cada vencedor seria então colocado para disputar entre si e no final teríamos o melhor de todos. Lembre-se que num dilema do prisioneiro, o melhor para cada jogador é trair enquanto o oponente coopera (a tentação de trair tem que ser grande). O pior para cada jogador é quando ele coopera enquanto o outro trai. Finalmente, a recompensa pela cooperação mútua tem que ser maior que a punição pela traição mútua.
Axelrod atribuiu pontos a cada uma dessas situações e venceria o programa que acumulasse mais pontos depois de enfrentar cada adversário duzentas vezes seguidas. Todos os tipos de estratégia poderiam ser representados: por exemplo, um programa adotando uma estratégia “generosa” que sempre perdoasse as traições do outro. Uma estratégia “cínica”, que perdoasse traições até um certo confronto (até a centésima partida, digamos), dando a impressão de ser boazinha, e, depois, traísse sistematicamente até o fim. Uma que sempre traisse. Uma que traisse e perdoasse alternadamente. Enfim, as possibilidades eram infinitas.
O programa vencedor, que derrotou todos os outros, acabou sendo batizado de “toma lá, dá cá” (TLDC). Muitos dos programas inscritos eram complexos, TLDC não. Ele consistia de apenas quatro linhas de comando. E sua estratégia era simples, matematicamente bela: sempre que começava, cooperava e a partir dai mimetizava a ação do oponente, traindo se fosse traída, cooperando se recebece cooperação. O programa mostrou que na grande disputa onde existe a possibilidade de cooperação o que vale a penas é ser legal (nunca trair primeiro) mas não burra (se for traído retribua), saber perdoar (se após ser traído – e ter retribuido – você receber cooperação, não guardar mágoas e cooperar) e ser transparente (deixar claro sua estratégia) é o melhor jogo.
Pais adotam essa estratégia na educação dos filhos – faça isso e apanhe, não faça e todos ficam feliz, errou uma vez não vai pagar pelo resto da vida. Soldados adotam essa estratégia, nas tricheiras na primeira guerra mundial: unidades inimigas, frente a frente por meses a fio, evitavam dar o primeiro tiro. Morcegos vampiro adotam essa estratégia, é comum alguns morcegos que conseguiram mais do que necessitavam, regurgitarem o excesso de sangue para algum colega que não conseguiu nada. O colega, dias depois, retribui o favor. Eles se reconhecem na multidão de morcegos. Políticos adotam essa estratégia, ninguém faz acordo com um político sem chance de se reeleger pois não haveria chance para a retribuição no futuro.
Mas isso não funcionaria se a terceira regra do jogo não existisse. Enquanto você estiver vivo estará jogando. Esse tipo de retribuição só faz sentido tem como perspectiva a própria retribuição, caso contrário você poderia entrar em um banco, matar todo mundo, pegar todo o dinheiro e ir trabalhar no dia seguinte sem problemas, não faz isso não por que matar e roubar sejam errado, pessoas se matam e se roubam o tempo todo, criam inclusive filosofias para justificar isso, a guerra do golfo e a emergência do mercado da China são os maiores e mais recentes exemplos disso. Não o fazemos porque sabemos que haverá uma retribuição. Aquele macaco não arrasta a macaca para o meio do mato para abusar dela porque sabe que ela tem irmãos e que outros macacos vão querer tirar o abuso a limpo.
O toma lá, dá cá só funciona enquanto houver um futuro para os jogadores, se não houver a traição se torna não apenas tentadora, mas racional. Lembre-se de cada “lembrança” que você já pegou de hoteis, bares e clubes porque sabia que não ficaria tempo o suficiente lá para sofrer as consequências. Lembra-se das bactérias do nosso corpo? Quando elas se tornam sensíveis ao fato de que o futuro está menor, e começam a trair o hospedeiro, surgem as infecções, o cara ia morrer mesmo, então elas aproveitam. Mas como o jogo dura enquanto houver jogadores, ou seja, enquanto houver vida, a cooperação prossegue. E isso não é nem de forma consciente. Os morcegos vampiro não fizeram um debate para decidir a melhor forma de agir, nem as bactérias. Quando uma criança faz birra, ela não está usando uma das centenas de estratégias que desenvolveu e estudou, da mesma forma que uma mãe que perdoa não está seguindo um manual de boas maneiras. Essa é a premissa da quarta regra. Você não precisa perceber as regras para usá-las, na verdade quanto menos consciência tiver delas, melhor jogador você será.
Existe algo sobre você que você desconhece completamente. Algo que você não apenas não conhece mas que você nega que sequer existe até ser tarde demais para tomar qualquer atitude a respeito. É a única razão pela qual você acorda de manhã, a única razão que te faz aturar seu chefe escroto e seu emprego de merda. Tudo isso porque você quer que as pessoas saibam como você é bom, atrativo, generoso, divertido, maluco e esperto. Todos nós somos adictos, viciados em aprovação alheia. Somos todos macacos embrulhados em ternos e vestidos, implorando pela aprovação de outros como nós. Você consegue agora responder por que?
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