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Sar Naquista
“Suprimam os números e vocês vão suprimir as artes, as ciências e, consequentemente, a inteligência. Restabeleçam-nos, e com eles reaparecem suas duas filhas celestes, a harmonia e a beleza; o grito torna-se canto, o ruído passa a ter ritmo, o salto torna-se dança, a força passa a se chamar “dinâmica”, e os rabiscos de tornam imagens”
– Joseph de Maistre, Des Soirées de Saint-Petersbourg
Desde a aurora da humanidade, utilizamos a matemática para compreender e transforma o mundo. De fato, o desenvolvimento do domínio matemático é análogo ao desenvolvimento da civilização e desde os tempos antigos os grandes pensadores a tiveram em elevada consideração.
Mas há ainda nos números uma faceta que passa despercebida em todas as escolas e instituições de ensino de hoje, estamos falando de seu caráter sagrado. Os números não são apenas símbolos poderosos , são realidades inegáveis (ninguém nega senão por loucura que a raiz quadrada de 25 seja 5). Realidades que por serem perenes podem ser consideradas mais reais do que qualquer forma material que agora é e depois não é mais. Os números são degraus sólidos que nos permitem a conexão entre o visível e o invisível, por meio deles podemos ir da multiplicidade manifesta do mundo até a Unidade Primordial que é Deus.
A tradição esoterica chama este saber de “Aritmosofia”, que significa literalmente “sabedoria dos números” e que despertou o interesse unanime de todos os grandes místicos do passado e discutida por alquimistas, hermetistas, cabalistas e filósofos de todas as eras.
Entre estes o nome de Pitagoras é reconhecido como de grande renome. Nascido em Samos, na Grécia no século VI a.C é considerado um dos mais importantes filósofos pré-socráticos. Ele viajou por todo mundo conhecido em busca de sabedoria. Esteve no Egito (onde recebeu a iniciação), Babilônia, Gália e Fenícia e notou que embora os costumes, idiomas e aparência dos povos mudassem os números permaneciam como uma realidade perene por trás de todas as culturas. Após passar vinte anos no Egito, onde foi iniciado, estabeleceu uma escola em Crotona, na Itália.
Pitagoras infelizmente não deixou nenhum escrito e tudo o que sabemos dele vem por meio de seus discípulos conhecidos como pitagóricos. Graças a eles sabemos que seu mestre buscou dar um resposta alternativa a questão que intrigava os filósofos naturalistas de sua época: Qual o Princípio da Realidade? As respostas anteriores orbitavam em torno da escolha de um ou mais elemento primordial como Água, Fogo ou Terra. Pitágoras deslocou a questão para um plano novo e mais elevado. Para ele o princípio da realidade não era algo físico, mas o “número”
Para comprovar isso demonstrava que todos os fenômenos tem por trás de si uma realidade mensurável e exprimível numericamente. Tire o 12 de uma dúzia de ovos e você não terá nada. Para sermos mais exatos os pitagóricos não diziam que eram os Números esse fundamento da realidade mas sim os “Elementos Numéricos”, ou seja o Limite e o Ilimitado. O Limite é o princípio determinado e determinante e o ilimitado o princípio indeterminado. Cada Número é assim a síntese desses dois elementos. Nos impares prevalece o Limite, e nos pares o Ilimitado.
Se tudo é Número, tudo possui regularidade e assim o universo todo é visto como um cosmos (ordem) derivado desses Números. Esta regularidade pode ser vista nas harmonias musicais, nos fenômenos astronômicos e nos ciclos climáticos e biológicos, entre outros.
Historicamente os pitagoricos surgiram do Orfismo, do qual trouxeram também conceitos como metempsicose e da vida como uma purificação para retornarmos aos deuses. Mas enquanto os mistérios órficos atribuiam aos rituais a virtude catartica, os discipulos de pitágoras buscavam isso pela “vida contemplativa” ou “vida pitagórica” como passou a ser chamada, vendo na aritmosofia o meio mais rápido para dominar abstrato e elevar seus pensamentos acima das coisas terrestres.
Os pitagóricos davam um destaque especial a Década, a sequência inicia dos dez primeiros números naturais: 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 e 10. Diziam que a Década contem todas as coisas, pois além dela a apenas a repetição dos dez primeiros 11 como 10 +1; 12 como 10 + 2 e dai por diante.
Por esta mesma razão davam um destaque ainda maior para a Tétrade Divina ou , a sequência inicial dos quatro primeiros números naturais: 1, 2, 3 e 4, cuja soma leva a Década.
Nos Versos Dourados de Pitágoras , texto pseudo-epigrafo atribuído a Lísis, um dos discípulos do mestre podemos ler:
47. Eu o juro por aquele que transmitiu às nossas almas o Quaternário Sagrado.
48. Aquela fonte da natureza cuja evolução é eterna.
49. Nunca começa uma tarefa antes de pedir a bênção e a ajuda dos Deuses.
50. Quando fizeres de tudo isso um hábito,
51. Conhecerás a natureza dos deuses imortais e dos homens,
52. Verás até que ponto vai a diversidade entre os seres, e aquilo que os contém, e os mantém em unidade.
53. Verás então, de acordo com a Justiça, que a substância do Universo é a mesma em todas as coisas.
No discurso conhecido como “Hiéros Logos”, considerao sagrado pelos pitagoricos lemos sobre a relevância especial atribuida “Tetractys Sagrada”:
Abençoa-nos, Divino Número, que geraste os deuses e os homens! Santa Tetractys, tu conténs a raiz e a fonte do fluxo eterno da Criação. Número Divino, tu principias pela unidade pura e profunda, e atinges a seguir o Quaternário Sagrado. Em seguida, geras a mãe de tudo, que tudo une, primeira nascida, que jamais se desvia, A Década Sagrada, que detém a chave de todas as coisas”.
Foram também os pitagóricos os primeiros a contemplarem a Proporção Aurea e que buscaram dar uma explicação a ela.
A proporção áurea é uma constante real algébrica irracional representada pela divisão de uma reta em dois segmentos (a e b), sendo que quando a soma desses segmentos é dividida pela parte mais longa, o resultado obtido é de aproximadamente 1,61803398875… Esse número é hoje representado pela letra grega Phi (φ) e utilizada na arquitetura, nas artes e no design gráfico pois fornece a obra uma aparência particularmente bela e harmoniosa. Não por acaso a Proporção Aurea é chamada também de “Proporção Divina” pois pode ser vista em muitos elementos da natureza como plantas, animais, minerais e mesmo furacões e nas moléculas de DNA.
φ também está presenta no Pentagrama, a Estrela de Cinco pontas que os Pitagóricos usavam para se identificar
Após o desaparecimento da escola pitagorica que não foi feita sem uma boa dose de violência de gregos que a viam como uma ameaça, a Aritmosofia foi transmitida de maneira velada. Mas dois séculos depois já era considerada como de elevado valor por Platão e por toda Escola de Atenas. Podemos encontrar derivações da ideias dos números em Timeu, Leis, Filebo e na República, entre outros.
No século I, Nicômaco de Gerase, resgatou e assumiu para si o termo pitagórico ao compor uma teologia matemática na qual buscou demonstrar a natureza Divina da Década. Nos séculos seguintes sua teologia foi reproveitada pelos filósofos neoplatônicos com destaque para as obra de Jâmblico, Proclo e Santo Agostinho.
Após a queda do Império Romano a ciência dos números foi transmitida principalmente pelos árabes e místicos judeus. Aos poucos a ciência dos números passou a ser considerada uma ciência oculta e a partir do século XVI estudada por cabalistas cristãos como Marsilio Ficino, Pico della Mirandola e Cornélius Agrippa que expôs sua pesquisa em aritmosofia no seu “Magia Celeste”, o segundo livro de sua “Filosofia Oculta”.
Aritmosofia Martinista
No século XVII, Martines de Pasqually trouxe a baila uma nova camada de interpretação dentro da aritomosofia, trazendo um ensinamento que, segundo seu “Tratado da Reintegração” foi dado a Seth, (o terceiro filho de Adão) por Cristo.
“O próprio Criador instruiu, através de seu enviado espiritual chamado Heli, O bem-aventurado homem Seth sobre as secretas forças Divinas que continham e dirigiam toda a natureza, tanto material quanto espiritual. Ele recebeu imediatamente do Criador, pelo espirito, todo o conhecimento das leis imutáveis do Eterno e aprendeu com isso que toda a lei de criação temporal e toda ação Divina esta vem baseadas em diferentes números. Ele aprendeu, por intermédio desse mesmo Heli, que todo número era coeterno com o Criador e que era por esses diferentes números que o Criador formava todas as imagens, todas as suas convenções de criação e todas as suas convenções com sua criatura”.
A partir dos ensinamentos e meditações de Martines de Pasqually e de contribuições de Karl von Eckarlshausen e Louis-Claude de Saint-Martin desenvolveu-se um sistema aritmosofico bastante avançado que caracterizou o esoterismo iluminista do século XVIII
Louis-Claude de Saint-Martin ensinava que há uma distinção entre a matemática e a ciência dos números. Enquanto aritmosofia se vale de “números vivos” a matemática utiliza apenas “números mortos” e se aplica a “objetos mortos”. Uma comparação muito semelhante a diferença entre a Química e a Alquimia.
Em outras palavras, para Saint Martin os números que se limitam a função qualitativa estão limitados em sua função pois são negligenciados em sua função qualitativa de serem a expressão sensível, visível ou intelectual das diversas propriedades dos seres da Criação (como centrais ou periféricos, puros ou impuros, etc..) e suas funções dentro do Plano Divino.
Ensina o Filosofo Desconhecido em “Quadro Natural das relações que existem entre Deus, o Homem e o Universo” que “Os números são tão-somente a tradução abreviada ou a linguagem concisa das verdades e das leis, das quais o texto e as ideias estão em Deus, no homem e na natureza”.
Importante destacar que dentro do martinismo não nos interessa quaisquer virtudes mágicas ou poderes sobrenaturais atribuídos aos números. O foco é sempre a busca pela sabedoria por trás deles como um auxilio ao objetivo de Reintegração.
Assim como os pitagóricos antes, a Tradição Martinista reconhece que o mundo foi concebido pelos números, mas diz também que estes existem como número, medida e peso, ou qualidade, quantidade e manifestação e assim são tidas como a ação das leis Divinas no mundo material. Antes da Queda do Primeiro Ser Humano, o Espírito Quaternário (que somos nós) podia compreender o número, a medida e o peso por meio da aplicação das Três Faculdades Divinas correspondentes, ou seja Pensamento, a Vontade e a Ação.
Após nossa prevaricação, ensina o martinismo, possuímos essas três Faculdades em um grau muito inferior que fizeram sede nas nas três partes que compõem nosso corpo material: a cabeça para o Pensamento, o tórax para a Vontade, e o abdômen para a Ação.
Por isso Saint-Martin deu tanto destaque ao “O Livro do Homem” e a importância de sabermos lê-lo, pois no próprio ser humano esta a chave para a compreensão desta sabedoria pela qual podemos encontrar todas as verdades eternas. Conforme diz o filósofo:
“O homem é o Único Livro escrito pela mão de Deus, enquanto que todos os outros Livros que chegaram até nós, Deus ordenou ou permitiu que fossem escritos”.
Mesmo que sua condição atual pós-prevaricação tenha comprometido e obscurecido sua inteligência e em certa medida impedido de contemplar o Pensamento, Vontade e Ação Divinas, ainda assim o ser humano pode por sua leitura aprender as Leis da Criação e agir segundo a Vontade Divina. Mesmo o “Livro da Natureza” se torna secundário diante do “Livro do Homem” e afirmar que “não é pelo mundo que se pode explicar o homem, mas pelo homem que se pode explicar o mundo”. Isso porque o Livro da Natureza revelará apenas um aspecto das leis da Criação enquanto o Livro do Homem oferece à nossa inteligência “a razão das coisas”, “a justiça do Mestre” e a “ternura do Pai”.
Vejamos por fim, como podemos usar os números para ilustrar a situação do Ser Humano antes e depois da prevaricação.
1, 4, 9
Em sua origem ao ser humano foi dada a missão de ser o intermediário de Deus para supervisionar toda Criação universal dentro do Eixo ‘Fogo Central incriado’. Isso é simbolizado na sequência 1, 4, 9 na qual Deus é a unidade, o ser humano o Quaternário e a Criação Universal o número 9. Essa sequência também simboliza a própria Queda, na qual o 4 se distancia de 1 e se aproxima de 9 ao se revestir de um corpo material. Assim o caminho da Reintegração é a sequência oposta 9,4,1
40
Esse caminho de retorno não ocorre sem dificuldades. Isso é ilustrado pelo número 40 ou pela imagem do 4 dentro de um círculo. O Circulo (ou zero) representa a Criação, o Quatro mais uma vez o ser humano (Quaternário Menor). Por isso na Aritmosodia o 40 é o número da provação como podemos ver nas Escrituras Sagradas nos 40 dias e 40 noites que a Arca de Noé suportou o dilúvio, nos 40 dias que Jesus jejuou no deserto e nos 40 anos que Israel levou para cruzar o deserto do Egito até a Terra Prometida.
Mas ainda que o ser humano tenha perdido sua posição Deus não o abandona e ainda habita em seu interior, habilitando-o a reintegração. Por isso a Década é derivada da Tétrade. Isso é demonstrado também por uma Cruz ou Ponto no interior de um círculo ou pela figura da Rosa Cruz, entre outros símbolos poderosos.
Os mestres do passado, sejam pitagóricos ou martinistas viviam em um mundo que era entendido em termos materiais. Contido, podemos, não sem nos arriscar a enfurecer alguns irmãos mais ortodoxos enxergar o conceito de Numero, Métrica e Peso na própria constituição ondular que é a base da física moderna.
Sabemos hoje que em seus níveis mais fundamentais tanto a matéria quando a energia são ondas que vibram. Uma onda é composta de Curvatura, Amplitude e Frequência, temos portanto mais uma manifestação Tríplice para relacionarmos com os elementos formadores da Criação Universal e as Potências Divinas.
Em outras palavras podemos agora não apenas derivar de nossa observação do mundo matérial a Realidade Numérica, mas pelo contrário derivar da Realidade Numérica aquilo que chamamos de mundo material.
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