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O Porque e o Como do Êxtase

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“Há uma terra de puro prazer, Onde reinam santos imortais.”

Assim alguns de nós costumávamos cantar em nossa infância. E costumávamos pensar nessa terra tão longínqua, mais distante até que a morte, que naqueles dias parecia muito remota.

Mas eu sei agora: tal terra não está tão longe quanto minha carne de meus ossos! Está mesmo Aqui e Agora.

Se há uma nuvem neste tranquilo azul celeste, é este pensamento: que existem seres conscientes que são infinitamente felizes, mestres do êxtase.

Então, para remover essa nuvem, eu dediquei satisfeito tudo o que eu tenho e tudo o que eu sou.

Eu não sou alguém que nega a si mesmo as boas coisas deste mundo. Há vários místicos por aí que são como a raposa que perdeu a cauda. Eles não podem aproveitar a vida, então fazem de conta que têm algo melhor.

Mas eu janto no Cafe Royal, em vez de mascar nozes e “cenouras mignon”. Eu faço expedições às grandes montanhas dos Himalayas e caço tigres e búfalos nas selvas do Terai; eu amo a beleza na pintura e na escultura; eu amo poesia e música; e eu amo carne e sangue.

Não há nada que você aproveite que eu não goste tanto quanto você; eu eu sou testemunha de que nada se compara ao êxtase.

Qual é o caminho para essa terra imortal?

Para o oriental, cuja mente é, por assim dizer, estática, a meditação oferece o melhor caminho, o qual nos parece (e de fato é) intolerável, cansativo e tedioso.

Para o ocidental, cuja mente é ativa e dinâmica, não há caminho melhor que o cerimonial.

O êxtase é causado pela combinação de duas idéias, como o hidrogênio e o oxigênio se unem explosivamente. Um exemplo similar, num reino mais elevado, ocorrerá a todos.

Mas este êxtase religioso toma lugar nos mais elevados centros do organismo humano; é a própria alma que se une ao seu Deus; e por tal razão, o êxtase é mais poderoso, o prazer mais duradouro, e a energia resultante mais pura e esplêndida do que em algo terrestre.

No ritual, portanto, nós buscamos continuamente unir a mente a alguma pura idéia através de um ato de vontade. Isto fazemos sempre, mais e mais apaixonadamente, com mais e mais determinação, até que, no fim, a mente aceite a dominação da Vontade, e mova-se por si própria até o objeto desejado. Tal submissão da mente ao seu Senhor dá o completo êxtase que buscamos. Fala-se disto em todas as religiões, usualmente sob a figura da noiva indo ao encontro de seu esposo. É a consecução disto que cria o santo e o artista.

Agora, em nossas cerimônias nós nos esforçamos para ajudar todos os presentes a experienciar isto. Nós colocamos a mente do espectador em sintonia com a pura idéia de austeridade e melancolia que chamamos de Saturno, ou com a idéia de força e fogo que chamamos de Marte, ou com a idéia de natureza e amor que chamamos Vênus, e assim por diante. Se ele se identifica com esta idéia, a união é de felicidade extasiante, e a única imperfeição é devida ao fato de que a idéia em questão, qualquer que seja ela, é apenas parcial.

O êxtase, portanto, é progressivo. Gradualmente, o adepto une-se a idéias mais santas e altas, até que ele se torna um com o próprio universo, e mesmo Aquilo que está além do universo. Para ele, não há mais Morte; tempo e espaço são aniquilados; nada é, salvo o intenso êxtase que não conhece mudança para sempre.

E quanto ao corpo? O corpo de alguém assim continua sujeito às leis de seu próprio plano. Porém, seus amigos acham-no mais calmo, mais feliz, com mais saúde; seus olhos brilham e sua pele é jovem, mesmo quando ele é velho. Mas ele tem aquilo que eles não têm, o poder de passar instantaneamente para fora da consciência mutante, adentrando a Eterna, e a permanente, supremamente única e completa, banhado em inexprimível felicidade, um com o Todo. E ele sabe que esse corpo, sujeito à doença e à morte, não é ele mesmo, mas apenas como que um instrumento de seu prazer, um tipo de yate que ele comprou para o verão.

A presente série de cerimônias é feita para iniciantes, para aqueles que não têm qualquer experiência. Apenas as fórmulas mais simples serão usadas, de modo que apenas aqueles que são totalmente desconhecedores dos métodos e objetivos do ritual possam obter o resultado e compreender o método. Porém, eles serão profundos e perfeitos, de modo que até aqueles que säo habilidosos possam obter maior sucesso.

Deixem-nos adicionar uma curta análise da presente série de ritos; eles podem ser tomados como ilustradores da humanidade, seu destino bom e mau.

O homem, incapaz de resolver o Enigma da Existência, toma conselho de Saturno, de extrema antiguidade. A resposta que obtém é a palavra “Desespero”.

Há mais esperança na dignidade e sabedoria de Júpiter? Näo, pois o nobre senhor carece do vigor de Marte, o guerreiro. Conselho é vão, sem a determinação de levá-lo em frente.

Marte, invocado, é realmente capaz de vitória: mas ele já perdeu a controlada sabedoria da idade; no momento da conquista, ele perde seu fruto nos braços da luxúria.

É por essa fraqueza que o homem perfeito, o Sol, é de natureza dual, e seu gêmeo, mau, o mata em sua glória. Então, o triunfante Senhor do Céu, o Amado de Apolo e das Musas, é trazido de volta das cinzas, e quem chorará por ele senäo sua Mãe Natureza, Vênus, a dama de amor e Tristeza? Seria bom se ela carregasse consigo o Segredo da Ressurreição.

Mas mesmo Vênus deve seu encanto ao veloz mensageiro dos deuses, Mercúrio, o alegre e ambíguo garoto, cujos truques primeiro escandalizam e depois alegram o Olimpo.

Porém Mercúrio também deixa a desejar. Nele sozinho não se encontra a cura para toda a ferida da raça humana. Rápido como sempre, ele passa, e dá lugar à mais jovem dentre os deuses, a Lua Virginal.

Olhem-na, tal qual Madonna, entronada e coroada, velada, silente, aguardando a promessa do Futuro. Ela é Isis e Maria, Ishtar e Bhavani, Artemis e Diana.

Entretanto, Artemis também é destituída de esperança até que o espírito do Infinito Todo, grande Pan, dilacere o véu e exponha a esperança da Humanidade, a Criança Coroada do Futuro. Tudo isso é simbolizado nos ritos sagrados que nós recuperamos das trevas da história, e agora, na plenitude do tempo, descobre-se que o mundo pode ser redimido.

Pois o corrupto tornar-se-á incorruptível; o mortal tornar-se-á imortal; meus adeptos caminharäo coroados nos Jardins do Mundo, aproveitando a brisa e a luz do sol, colhendo as rosas e enchendo suas bocas com suculentas uvas. Eles dançaräo sob o luar diante de Dionysus, e deliciar-se-äo sob as estrelas com Afrodite; eles ainda habitaräo além de todas essas coisas no imutável Céu – Aqui e neste instante.

-Tradução (c) Dom Marcelo Santos –

por Aleister Crowley


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