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por: Juliana Rissardi
Historicamente, a mulher foi controlada, subjugada e condenada. Sua sexualidade e seu corpo, tidos como tabu, foram associados a um grande pecado. O sistema opressor causou consequências emocionais e mentais devastadoras. Em todas as épocas, tivemos mulheres que se mantiveram desta forma para não sofrerem a repressão, o castigo e a tortura, e tivemos as mulheres que não se importaram com a tortura, mas suas almas, sendo tão livres, preferiran o desconforto e a destruição à viverem uma vida que as prendia como animais domésticos.
Recentemente, escrevi um ensaio no qual o assunto central foram as ocultistas Rosaleen Norton e Marjorie Cameron. Em conjunto acabei me deparando com a também ocultista Maria de Naglowska. Através de livros, artigos e audiovisuais, o estudo de uma me levou consequentemente a outra.
Especificamente sobre a vida delas, vou deixar um breve parágrafo sobre cada uma para contextualizar, porém, a vida dessas três mulheres é tão fascinante que poderiam ser redigidas páginas e páginas sobre cada uma delas. Em um panorama geral, essas mulheres viveram entre o ínicio até um pouco mais da metade da década de XX, e embora em culturas e sociedades diferentes, em comum, todas elas foram artistas, escritoras, poetas, bruxas e ocultistas.
Rosaleen Norton (1917-1979), “Roie” ou mais conhecida como a “Bruxa de King’s Cross”, cresceu em uma Austrália conservadora, cheia de normas sociais e religiosas restritas. Além de escrever poesias e textos, Roie pintava telas com temáticas que envolviam divindades e seres como Pan, Hécate, Lúcifer, Lilith e temas ligados a magia sexual, motivos estes tidos como obscenos pela sociedade e a mídia que a perseguiu durante toda sua vida. O que ela retratava em sua arte era o que vivia em sua vida em práticas de magia. Assumidamente bruxa, Roie acreditava que a magia sexual era uma poderosa forma de transcendência espiritual e através destas práticas, mantinha contato com seres sobrenaturais e energias cósmicas, acessando através de estados alterados de consciência o divino.
Marjorie Cameron (1922-1995), uma ocultista e artista americana, que apesar de sempre ter vivido questões fora do padrão tido como “normal”, teve sua ascensão no ocultismo através dos ensinamentos e ritualísticas de seu marido Jack Parsons, Thelemita adepto à tradição de Crowley, mantinha a função de Cameron nos rituais como a representante da grande deusa Babalon. Após a morte de Jack, Cameron intensificou suas práticas, criando reuniões e grupos em sua casa para práticas de magia sexual, que para ela era uma ferramenta capaz de liberar o poder feminino e alcançar a transformação pessoal. Artisticamente participou de vários curta metragens em Los Angeles, além de pintar telas com temas esotéricos.
Maria de Naglowska (1883-1936), ocultista e escritora russa, nasceu em 1883. Como característica em comum com as mulheres anteriores, desafiou as normas religiosas e sociais de sua época em sua constante busca pela transformação e sede espiritual através da magia sexual. Naglowska criou um movimento espiritual destinado a realização de rituais, conhecido como Confrérie de la Flèche d’Or “Confraria da Flecha Dourada”, na década de 30, que chamou a atenção de intelectuais e artistas da alta sociedade parisiense (onde residiu), que se juntaram a ela para a exploração dos conhecimentos mágicos e sexuais de forma sagrada, reconciliando o poder da luz e das trevas. Suas obras “Magia Sexualis: Sexual Practices for Magical Power” e “The Light of Sex: Initiation, Magic, and Sacrament”, podem ser facilmente encontradas em inglês para os apreciadores dos estudos da magia sexual.
As práticas dessas mulheres eram tidas como chocantes e imorais para o momento de suas existências. O fato de serem mulheres independentes já chocava a sociedade o suficiente, quem dirá assumidamente bruxas, thelemitas e para fechar com chave de ouro, assumidamente através de suas vivências e suas artes, praticantes de magia sexual. Fato que terminou quebrando qualquer fio de aceitação e marcando um contrato com a subversão. Mulheres que significavam “o perigo em pessoa” para a sociedade”.
Para essas mentes á frente de seu tempo, o sexo ritual era uma força de equilíbrio cósmico entre as forças masculinas e femininas, luz e sombra, permitindo ao praticante se unir ao divino, um portal sagrado para alcançar o intento de sua Verdadeira Vontade, a força mais poderosa para chegar a Grande Obra.
O fato é que ter uma visão a frente de seu tempo, sempre leva a algum tipo de fogueira, e com elas não foi diferente. A paz de fato faltou em suas vidas femininas por transgredirem e quebrarem os padrões impostos pelo que a sociedade entendia como uma mulher deveria ser ou se tornar.
Hoje, no meio espiritualista ou ocultista, dependendo da vertente em que estamos inseridos, ainda é um grande tabu falar sobre o sexo ritualistico. Quando nos colocamos no lugar de mulheres vivendo isso na prática há mais de 50 anos, podemos imaginar o quanto elas não foram desbravadoras do caminho oculto e da liberdade individual para tantas mulheres.
Através destes desafios, elas buscavam a liberação do espírito através de seus corpos, que eram delas naquele momento e não da sociedade, quebraram barreiras entre o sagrado e o profano, entre o que era considerado o ideal e foram até o limite da aceitação.
Usando o poder sexual como ferramenta de profunda transformação, essas mulheres (e tantas outras que permanecem anônimas ou apagadas no cenário ocultista) apareceram atrás de nós com grandes facões e abriram espaço para que eu e tantas outras mulheres pudéssemos hoje nos expressar, escrever reflexões como esta e praticar magia com um pouco mais de liberdade (e ainda tem muito a se melhorar).
Elas nos deixaram bem claro, marcado na história da magia como o uso da energia sexual criativa é uma das formas de trabalhar o autodomínio, o autoconhecimento, o conhecimento de seu corpo, a libertação das amarras sociais da submissão, promovendo a integração entre a vida material e espiritual em uma das mais poderosas fontes de magia.
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