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Em primeiro lugar, deve-se entender que a designação “mortos” é absolutamente errônea, visto que as entidades nela englobadas estão tão vivas como nós — a maior parte das vezes têm mesmo uma vitalidade muito maior. Quando dizemos mortos, queremos apenas referir-nos àqueles indivíduos que momentaneamente se libertaram do corpo físico.
Distinguimos nove espécies principais:
1.° — Os Nirmânakáyas. (4)
Referindo-nos a esta classe tão-somente para não deixar a enumeração incompleta, porque é muito raro que Seres tão elevados se manifestem nos planos, inferiores. No entanto, quando por qualquer forte necessidade, derivada da missão sublime que lhes foi confiada, uma destas Entidades julgue necessário descer ao plano astral, trata de se rodear de um corpo dessa matéria, precisamente, como vimos, o faz um Adepto que, revestido do corpo mental, não poderia ser percebido à luz astral. Para poder manifestar-se imediatamente em qualquer dos planos, retém sempre dentro de si alguns átomos de cada um deles, em volta dos quais, como núcleo, pode instantaneamente agregar outra matéria e assim ter sempre à sua disposição o veículo que deseja. Acerca dos Nirmânakáyas pode consultar-se, para mais ampla informação, o livro de Madame Blavatsky, A Voz do Silêncio, e o meu pequeno volume Auxiliares Invisíveis.
2.º — Os Discípulos à espera da reencarnação.
Na literatura teosófica está escrito em várias obras que quando o discípulo chega a um certo grau de desenvolvimento, está em condições de, com o auxílio do Mestre, libertar-se da lei da natureza que faz passar todos os seres humanos, depois da morte, para o mundo-céu, para aí gozar os resultados espirituais das aspirações elevadas que teve durante a vida terrestre. Gomo, na hipótese considerada, o discípulo deve ser uma criatura de grande pureza de vida e de grande nobreza de pensamentos, é natural que estas forças espirituais tenham uma intensidade anormal. Portanto, se ele, servindo-me de uma expressão técnica, “tomar o seu Devachân”, é provável que este seja de longa duração; mas se, em vez de se conservar no Devachân,. preferir o “Caminho da Renúncia” (começando assim, embora em grau muito inferior e pelos caminhos, mais humildes, a seguir as – pegadas do Grande Mestre da Renúncia, que foi o próprio Gautama Buda), pode despender essa reserva de força numa direção oposta; empregá-la em benefício da humanidade, e, por a mais infinitesimal que seja a sua contribuição, tomar a sua minúscula parte na grande obra dos Nirmânakáyas.
Seguindo este caminho de abnegação, sacrifica, é certo, séculos da mais intensa bem-aventurança, mas, em compensação, fica com a enorme vantagem de poder continuar a sua vida de trabalho e de progresso sem interrupção. Quando o discípulo, que escolheu este caminho, morre, esta morte é apenas mais uma saída do corpo, além das muhas que já praticou, e uma espera no plano astral até que o Mestre lhe destine uma reencarnação conveniente e merecida. Isto só pode ser feito com permissão de uma autoridade de categoria muito elevada, porque, constituindo uma exceção à lei geral, ninguém deve tentá-lo sem obter essa autorização. E mesmo depois de conseguida esta, a força da lei natural é tão grande, que se o discípulo não se confinar estritamente no plano astral, e por um momento tocar o plano mental, será de novo arrastado por uma corrente irresistível para o curso normal da evolução. Em alguns casos, embora muito raros, pode-se lhe evitar um novo renascimento, dando-se-lhe imediatamente um corpo de adulto cujo antigo habitante já não precise dele. É, porém, difícil encontrar disponível um corpo apropriado, de modo que a maior parte das vezes tem de esperar no plano astral, até que se lhe apresente a oportunidade de um renascimento apropriado. Entretanto, enquanto espera, não perde o seu tempo, porque não deixa de ser quem era e está em melhores condições para continuar a obra que lhe foi atribuída pelo Mestre. Digo em melhores condições porque, despojado do corpo físico, não tem a entravá-lo a possibilidade da fadiga. Com a consciência alerta e absolutamente plena, pode vaguear à vontade e facilmente por todas as divisões do plano. O discípulo à espera da reencarnação não é, evidentemente, um dos habitantes mais comuns do plano astral, mas pode lá encontrar-se ocasionalmente. Forma, por isso, uma das nossas classes, que se hoje é reduzida, há de aumentar em número à medida que a evolução da humanidade vá avançando no seu caminho progressivo.
3.° — dos – mortos vulgares.
Escusado é dizer que esta classe é milhões de vezes maior do que as já estudadas, e que o caráter e condições de seus membros oscilam entre larguíssimos limites. E é também dentro de larguíssimos limites que varia a duração da sua estada no plano astral, pois, enquanto uns aí passam apenas algumas horas, outros podem lá permanecer durante anos e até séculos. O homem que levou na terra uma vida de pureza, cujos sentimentos e aspirações predominantes foram sempre altruístas e espirituais, pouca atração sente pelo plano astral, e, não havendo nada que lá o prenda, a sua atividade não chega a ser despertada durante o pequeno período da sua vida astral. A razão disto reside no fato de que depois da morte o homem verdadeiro recolhe-se em si mesmo. Logo ao primeiro passo deste processo, arroja de si o corpo físico, e quase logo a seguir o duplo etérico, para que possa libertar-se tão cedo quanto possível do corpo astral ou de desejos, e ingressar no mundo-céu, que é a única região onde as suas aspirações espirituais podem frutificar de uma forma consentânea com os sentimentos elevados que teve na terra. O homem nobre, de espírito elevado, pode fazer isto, porque soube dominar todas as paixões terrenas durante a vida física. Sua força de vontade foi dirigida para canais elevados e pouca energia de desejos inferiores tem disponível para ser utilizada no plano astral. Portanto, a sua permanência aí será de breve duração, e segundo todas as probabilidades, passará a sua curta vida astral num estado letárgico de semi-consciência até mergulhar no sono profundo, durante o qual os seus princípios elevados se libertam do invólucro astral e ingressam na vida bem aventurada do mundo-céu. Para aqueles que ainda não entraram no caminho do desenvolvimento oculto, como no caso que estamos considerando, o que acabamos de descrever representa o mais que se pode conseguir, e na melhor das hipóteses. Mas, geralmente, poucos o atingem, porque o homem mediano raras vezes consegue libertar-se na terra de todos os desejos inferiores, de modo que é sempre necessário uma demora mais ou menos longa nas várias subdivisões do plano astral, para que as forças geradas na terra possam consumir-se mutuamente e pôr em liberdade o Ego superior. Todos, sem exceção, têm de passar por todas as subdivisões do plano astral no seu caminho para o mundo-céu, mas alguns há que os percorrem inconscientemente. Precisamente como é necessário que o corpo físico contenha dentro da sua constituição matéria física em todos os estados — sólido, líquido, gasoso e etérico — é indispensável também que o veículo astral contenha partículas pertencentes a subdivisões similares da matéria astral, embora em proporções variáveis segundo o caso.
Ora, não devemos esquecer que, justamente na matéria do seu corpo astral, o homem colhe a essência elemental correspondente, e que durante a vida esta essência é segregada do oceano de matéria semelhante, e transforma-se no que se pode chamar uma espécie de elemental artificial. Durante algum tempo, este elemental tem uma vida sua, separada, e segue independentemente o curso de sua evolução própria, descendente para a matéria, sem preocupações — e mesmo sem conhecimento — da conveniência ou interesse do Ego a que está ligado. É isto que dá lugar à perpétua luta entre a vontade da carne e a vontade do espírito, de que tanto falam os escritores religiosos. Contudo, se é certo existir “uma lei dos membros cm guerra com a lei do espírito”,e se é certo que se o homem ceder em vez de tentar dominar-se, o progresso da sua evolução se ressentirá extraordinariamente, nada nos autoriza, porém, a considerar isso um mal, porque é apenas e sempre a Lei — o eterno fluir do poder Divino no seu curso regular, embora neste caso esse curso seja descendente para a matéria em vez de ascender em sentido contrário, para longe dela, como é o nosso.
Quando o homem, ao morrer, abandona o plano físico, as forças desintegrantes da natureza começam a exercer a sua ação sobre o corpo astral; este elemental se vê ameaçado da perda da independência da sua existência, e naturalmente reage, procurando defender por mais tempo possível a integridade do corpo astral. Para isso trata de lhe modificar a estrutura, tentando dispor-lhe a matéria em camadas concêntricas, das quais a externa pertence ao subplano mais inferior e é, portanto, a mais espessa, a mais grosseira e a mais resistente à destruição. Mas o homem não pode abandonar o sétimo subplano senão depois de ter libertado o mais possível o seu eu real da matéria deste subplano. Feito isto, a sua consciência vai focar-se na camada concêntrica imediatamente a seguir (que é formada pela matéria da sexta subdivisão) ou, exprimindo a mesma idéia por outras palavras, o homem passa para o próximo subplano. Em suma, quando o corpo astral esgotou todos os atrativos oferecidos por uma certa divisão, quase toda a matéria desta se solta dele e entra num mais elevado estado de existência. A sua gravidade específica, por assim dizer, vai diminuindo constantemente, e ele vai-se elevando gradualmente dos estratos mais densos aos mais sutis, demorando-se apenas onde se sinta sob a ação de um perfeito equilíbrio. É evidentemente esta a explicação para o fato de os mortos que aparecem nas sessões espiritistas dizerem que estão para ingressar numa esfera superior, da qual lhes será impossível, ou pelo menos mais fácil, a comunicação com a terra por meio de médium. E é realmente um fato positivo que quando um morto chega à subdivisão superior deste plano, é-lhe absolutamente impossível comunicar-se com qualquer médium vulgar. Assim, vemos que a duração da permanência de um indivíduo em qualquer das subdivisões do plano astral, é rigorosamente em função da quantidade de matéria dessa subdivisão, subsistente no seu corpo astral, e por sua vez, depende do gênero de vida que levou na terra, dos desejos que acalentou e da espécie de matéria que, com o seu procedimento, atraiu para si. É, pois, possível reduzir ao mínimo a quantidade de matéria das subdivisões astrais inferiores, por meio de uma vida cheia de purezae de pensamentos nobres e, em todos os casos, elevá-la ao que se pode chamar o ponto crítico, no qual basta o mais leve toque de força desintegrante para lhe romper a coesão, reduzindo-a ao seu estado original e deixando ao homem a passagem livre para o próximo subplano.
Esta passagem é, como já se disse, extremamente rápida para as pessoas de espírito elevado, pois atingem facilmente esse ponto crítico, de forma que se pode dizer que tais pessoas só recuperam a plenitude da consciência no plano mental. É claro que, sempre é bom insistir, esses subplanos não ocupam espaços diferentes; interpenetram-se mutuamente, de modo que dizer-se que uma pessoa passa de um subplano para outro, não quer dizer que realize qualquer deslocamento no espaço, mas tão só que o foco da sua consciência transita da camada externa para a que internamente lhe fica mais próxima. As únicas pessoas que normalmente despertam no sétimo subplano do plano astral, são as de aspirações grosseiras e brutais — os ébrios, os sensuais e quejandos. A sua permanência depende da intensidade dos seus desejos; geralmente o seu sofrimento é horrível pelo fato de, conservando vivos os grosseiros apetites que os dominaram na terra, lhes é impossível agora satisfazê- los, exceto, uma vez por outra, quando conseguem apoderar-se de uma criatura viva, com vícios iguais aos seus, e obcecá-la completamente. As pessoas de moralidade mediana não terão de permanecer muito tempo neste sétimo subplano. É geralmente no sexto que a sua demora se acentuará, principalmente se os seus desejos e pensamentos predominantes giraram em torno de coisas mundanas, porque é nessa subdivisão que encontrarão os lugares e pessoas com quem na terra andaram mais ligadas. O quinto e o quarto subplanos são semelhantes ao sexto. À medida que ascendemos através deles, as associações de idéias puramente terrestres perdem gradualmente sua importância, e há uma tendência para moldarmos o ambiente em concordância com os mais persistentes dos nossos pensamentos. Chegados à terceira subdivisão, reconhece-se que esta característica substituiu inteiramente a visão das realidades do plano. Porque, aqui, os seus habitantes criaram cidades imaginárias para si mesmos, e nelas vivem com a sua fantasia — criações não exclusivas da imaginação de cada um deles, como no mundo-céu, mas calcadas sobre a herança dos pensamentos e fantasia dos seus predecessores. É nesta subdivisão que se encontram as tais igrejas e escolas e “habitações na Summerland” de que falam os espiritistas americanos, embora menos reais e muito menos magnificentes para qualquer observador sem preconceitos do que para os seus entusiásticos criadores. O segundo subplano parece ser o habitat dos devotos egoístas e pouco espirituais. É lá que eles usam as coroas de ouro e adoram a representação material e grosseira da divindade peculiar da sua terra e do seu tempo.
A subdivisão mais elevada é especialmente destinada àqueles que em vida se dedicaram a trabalhos de ordem material, mas de caráter intelectual, e que os seguiram não com o fito de com eles bem servir e ajudar os seus semelhantes, mas impelidos por motivos egoístas ou simplesmente por exercício intelectual. Tais criaturas estacionam nesta divisão por bastante tempo — deliciados por poder prosseguir na ocupação dos seus problemas intelectuais, mas sem fazer bem a ninguém e pouco progredindo no caminho para o mundo-céu. Repito mais uma vez que a estes diferentes subplanos não deve ligar-se a idéia de localização no espaço. Qualquer entidade que funcione num deles poderia ser repentinamente transportada dali para a Austrália, ou para onde quer que qualquer pensamento momentâneo se lembrasse de a levar. Mas o que não é lhe possível é transferir a consciência de um subplano para o imediatamente a seguir, sem ter-se dado o processo de libertação de matéria, a que já nos referimos. Não há, que se saiba, exceção a esta regra, apesar de as ações de um homem, quando se acha consciente num dos subplanos, poderem, até certo ponto, abreviar ou prolongar a sua permanência ali. Mas o grau de consciência que um indivíduo terá num determinado subplano, não obedece à mesma lei. Tomemos um exemplo extremo para melhor compreensão. Suponhamos um homem que trouxe da última encarnação tendências que exigem para a sua manifestação grande quantidade de matéria do sétimo ou último subplano, mas que na vida presente teve a felicidade de se convencer, logo de princípio, da possibilidade e da necessidade de dominar essas tendências. Não é provável que os seus esforços sejam inteiramente bem sucedidos; mas se o fossem, a substituição no corpo astral das partículas grosseiras pelas mais sutis, dar-se-ia regularmente, embora com lentidão.
Este processo é, na melhor das hipóteses, sempre lento e gradual, de modo que nada mais natural que o homem em questão morresse antes tê-lo meio terminado. Neste caso lhe restaria ainda bastante matéria grosseira na constituição do corpo astral, suficiente para lhe prolongar a sua estada no plano astral. Mas como a sua consciência não chegou a se habituar a funcionar nessa matéria, e como não lhe era possível adquirir esse hábito, o resultado seria que, embora a sua permanência nesse subplano dependesse do tempo que essa parte de matéria levasse a desintegrar-se, ele estaria sempre num estado de inconsciência. Isto é, ele ficaria como se estivesse a dormir durante o período dessa permanência, e portanto, passaria absolutamente ileso, não se sentindo afetado por nenhuma contrariedade nem pelas misérias do subplano considerado. Diga-se de passagem que, no plano astral, a extensão das comunicações é determinada, como na terra, pelo conhecimento da entidade. Ao passo que um discípulo, revestido do corpo mental, pode comunicar os seus pensamentos mais facilmente e mais rapidamente que sobre a terra, por meio de impressões mentais, às entidades humanas que habitam o mundo astral, estas não têm geralmente a mesma faculdade e parecem mesmo estar sujeitas a restrições iguais às nossas, ou talvez menos rígidas, mas pouco menos. Resulta daí que estas se reúnem, como na terra, em grupos, ligados por uma comunhão de idéias, de crenças e de língua. A idéia poética de que a morte nivela todos não passa de um absurdo, fruto da ignorância, porque, na grande maioria dos casos, a perda do corpo físico não tem a menor influência no caráter e na inteligência da pessoa, e, entre aqueles a que chamamos mortos, há tantas variedades de inteligências como entre aqueles a que chamamos vivos. As teorias correntes no Ocidente a respeito do destino do homem post-mortem estão tão longe da verdade que mesmo pessoas muito inteligentes se sentem extremamente confusas e pasmadas ao despertarem no plano astral.
A situação em que o recém-vindo se encontra é tão radicalmente diferente daquilo que o levaram a acreditar, que não é raro encontrarem-se lá criaturas que se recusam obstinadamente a crer que já transpuseram os portais da morte. Realmente, a nossa tão gabada fé na imortalidade da alma é tão pouco firme, que a maioria das criaturas vê no simples fato de ainda se acharem conscientes uma prova absoluta de que não morreram. Também a horrível doutrina da punição eterna é a culpada da grande dose de terror, grandemente lamentável e profundamente injustificado, com que os mortos ingressam na vida superior. Em muitos casos passam longos períodos de um sofrimento mental de intensa agudeza enquanto não conseguem libertar-se desta monstruosa blasfêmia, e convencer-se de que o mundo é governado, não segundo o capricho de qualquer demônio, ávido de angústias humanas, mas segundo a grande lei da evolução, profundamente benévola e maravilhosamente paciente. Muitos dos que estamos estudando não chegam a apreender este fato da evolução, mas continuam a flutuar ao acaso no mundo astral, tal qual impelidos por influências do que fizeram na vida física precedente. Qualquer que seja o nível intelectual da entidade, a sua inteligência varia sempre em vigor, tendendo mesmo a diminuir, porque a mente inferior do homem é levada em direções opostas, pela natureza espiritual superior que atua de cima e pelas intensas forças de desejos, que vêm de baixo. Por isso, ele oscila entre as duas atrações, com uma tendência crescente para as superiores, à medida que os desejos inferiores se vão consumindo. Tem aqui cabimento uma das críticas que se fazem às sessão espiritistas. Evidentemente um homem ignorante ou degradado pode aprender muito, depois da morte, em contato com assistentes sérios, dirigidos por pessoa competente, e ser assim ajudado e erguido da sua degradação. Mas no homem comum, a consciência se eleva constantemente da parte inferior da natureza para a superior; e, evidentemente, nunca pode ser útil e favorável à sua evolução o redespertar-lhe esta consciência inferior, arrebatando-o do seu estado atual e arrastando-o de novo ao contato com a terra por meio de um médium.
Compreenderemos melhor o perigo deste despertar inoportuno, se nos lembrarmos de que o homem real, retirando-se cada vez mais em si mesmo, torna-se cada vez menos apto para influenciar e governar a sua parte inferior que, todavia, à separação completa, fica em condições de gerar Karma, e abandonado às suas próprias forças, é mais provável que crie mau Karma e não bom. Independente de qualquer questão de desenvolvimento por meio de um médium, há uma outra influência, bastante freqüente, que pode retardar consideravelmente o caminho do mundo–céu à entidade desencarnada: são as manifestações intensas de exagerados desgostos dos sobreviventes por causa da partida do seu parente ou amigo. As idéias do Ocidente sobre a morte, velhas de séculos, mas falsas e, direi mesmo, irreligiosas, dão o triste resultado de não só nos causarem um sofrimento moral tão intenso quão desnecessário pela partida temporária dos entes queridos, mas de nos fazerem contribuir, com o nosso desgosto inútil, para o mal daqueles que tanto amamos. Ao passo que o nosso irmão desaparecido cai sossegada e naturalmente no sono inconsciente que precede o despertar magnífico nos esplendores do mundocéu, nós o obrigamos por vezes a sair dos seus sonhos venturosos, chamando-o à recordação da vida terrestre pela violência do desgosto e das saudades apaixonadas dos seus mais próximos, que lhe despertam- vibrações correspondentes no corpo de desejos e lhe causam assim uma aguda sensação de mal-estar. Seria de grande utilidade que aqueles cujos entes queridos a morte separou, aprendessem nestes fatos indubitáveis a refrear, por amor dos seus mortos queridos, as suas manifestações de um desgosto, que embora natural, é na sua essência um sinal de egoísmo. Não que as doutrinas ocultas aconselhem o esquecimento dos mortos. Longe disso. O que elas sustentam e defendem é que a recordação afetuosa de um amigo que a morte levou, é uma força que devidamente canalizada por meio de convictos e sinceros votos pelo seu progresso para o mundo-céu, e pela tranqüilidade da sua passagem pelo estado intermediário, lhe pode ser de altíssima vantagem. Ao passo que essa recordação, tornada pelo desgosto moralmente doentia, exagerada com lutos e lágrimas, pode impedir-lhe o caminho, fazendo-o árduo e penoso. É precisamente por isso que a religião hindu prescreve acertadamente as cerimônias Shrâddha pelos mortos e a religião católica manda que se façam orações por eles.
Acontece, às vezes, o contrário, isto é, o desejo de fazer comunicações vem do outro lado, eco morto que deseja ardentemente comunicar-se com aqueles que deixou. Por vezes se trata de uma mensagem de importância, por exemplo, a indicação do lugar onde está escondido um testamento desaparecido; porém, na maioria das vezes, são mensagens triviais. Mas seja como for, é sempre da máxima importância que o morto comunique o mais depressa a sua mensagem, principalmente se a tem fortemente gravada na mente, para que não se dê o caso de, conservando-a, manter-se num estado de ansiedade, que lhe desviaria constantemente a consciência de novo para a terra, impedindo de se focar nas esferas superiores. Neste caso, um médium por intermédio de quem o morto possa falar ou escrever, ou um psíquico que o compreenda, presta-lhe evidentemente um grande serviço. E por que não pode ele falar ou escrever sem a intervenção de um médium? A razão reside no fato de um estado de matéria poder geralmente atuar apenas sobre o estado que lhe está imediatamente inferior, e como no seu organismo apenas há a matéria grosseira que também entra na composição do corpo astral, torna-se-lhe impossível enviar vibrações à substância física do ar ou mover o lápis, também de matéria física, sem pedir emprestada matéria viva da ordem intermédia contida no duplo etérico, e é graças a esta que qualquer impulso se transmite de um plano para outro. E a qualquer outro indivíduo que não fosse um médium, não lhe seria fácil utilizar a matéria, por causa da extrema justeza em que se acham os princípios numa criatura vulgar, dificilmente separáveis pelos meios geralmente ao alcance dos mortos, ao passo que num médium, e é precisamente esta a característica essencial das suas faculdades, os princípios podem separar-se rapidamente e fornecer a matéria para a desejada manifestação. Quando não vê possibilidade de estabelecer a comunicação por meio de um médium, ou porque não o ache, ou porque não saiba fazer-se compreender por meio dele, o morto recorre muitas vezes a si mesmo, fazendo toda a espécie de tentativas grosseiras e desastradas, pondo em ação, numa atividade desordenada, forças elementais. É talvez por isso que tantas vezes se vêem nas sessões espiritistas essas incompreensíveis manifestações de espíritos, derrubando mesas, atirando pedras, pondo campainhas a tocar, etc. Pode acontecer que um médium que se encontre no local onde se dão estas manifestações, compreenda e venha a descobrir o que a entidade que as origina quer dizer, pondo fim aos distúrbios. Mas isso é raro, visto que essas forcas elementais são geralmente postas em ação por causas múltiplas e variadíssimas.
4.º As Sombras.
Quando a extinção dos princípios num indivíduo é completa, isso é sinal de que acabou a sua vida astral e, como se disse, de que ele passa para o plano devachânico. Mas, assim como ao passar do plano físico para o astral, há um abandono do corpo físico, assim também na passagem do astral para o mental há uma desintegração do corpo astral, que é por sua vez abandonado. Se o indivíduo em questão se depurou completamente, durante a vida, de todos os desejos e instintos terrestres, e dirigiu todas as energias num sentido de aspirações espirituais e altruístas, o seu Ego superior está em condições de absorver em si mesmo toda a mente inferior que projeta em cada encarnação. Neste caso, o corpo abandonado no plano astral é um verdadeiro cadáver, como o corpo abandonado no plano físico, e não pertence a esta classe, mas à seguinte, a dos invólucros. Para um homem que levou uma vida física um pouco menos perfeita, o resultado pode ser quase o mesmo, se o que lhe resta de desejos inferiores pôde esgotar-se no plano astral. Mas a maior parte da gente poucos esforços faz para se libertar das tendências inferiores da sua natureza, criando para si mesma uma permanência prolongada no mundo intermédio, e, ainda mais, perdendo ainda, por assim dizer, uma porção de sua mente inferior. Embora isto seja uma forma muito material para representar o reflexo da mente superior na inferior, poderemos ter uma idéia mais perfeita e bastante aproximada do processo, admitindo a hipótese de que o princípio manásico envia, a cada encarnação, uma parte de si mesmo para a vida física, com a esperança de a reaver no fim de cada vida, enriquecida da várias experiências por que passou. Infelizmente o homem vulgar deixa-se dominar a tal ponto por todas as espécies de desejos inferiores, que uma parte da mente inferior se funde com o corpo de desejos, e tão estreitamente que, quando chega a separação no fim da vida astral, o princípio, por assim dizer, rasga-se, deixando a porção degradada dentro do corpo astral desintegrado. Este corpo se compõe então das partículas da matéria astral, de que a mente inferior não conseguiu soltar-se, e que, portanto, a mantêm prisioneira; porque, quando o homem passa para o mundo-céu, estes fragmentos pendentes aderem a uma porção de sua mente, e, por assim dizer, arrastam-na para longe.
A matéria astral de cada subplano encontra-se no corpo astral em decomposição, na proporção em que a mente se deixou absorver e invadir pelas paixões inferiores. E, portanto, visto a mente, ao passar de subplano para subplano, não poder libertar-se completamente da matéria de cada um deles, o remanescente astral mostrará a presença de cada espécie mais grosseira que conseguiu manter uma estreita conexão com ele. Aparece assim uma outra classe de entidades a que se chama “sombras”. Deve, porém, observar-se que uma sombra não é o indivíduo real, visto que este já passou para o mundo-céu; mas conserva absolutamente a semelhança física, a memória e até as pequenas idiossincrasias daquele de quem é a imagem fiel, de maneira que é facílima uma confusão, como acontece muitas vezes nas sessões espiritistas. Não que a sombra tenha consciência de se ter personalizado, pois que, na sua inteligência limitada supõe-se ser o próprio indivíduo, mas imagine-se qual seria o horror e o desgosto dos amigos do morto se por um momento compreendessem que tinham diante de si, não aquele que amavam, mas um simples farrapo das suas piores qualidades. A duração da vida de uma sombra varia segundo a qualidade de mente inferior que a anima; mas como esta vai diminuindo sempre, a sua inteligência diminui também, embora possa conservar uma espécie de astúcia instintiva, animal, a tal ponto que mesmo no fim da sua carreira pode comunicar-se ainda por meio da inteligência que o médium lhe ceda temporariamente. A essência da sua natureza é ceder a todas as influências más, e, como se acha separada do Ego superior, já não contém em si elementos que lhe permitam responder às boas. Presta-se, portanto, facilmente às mesmas operações dos magos negros de categoria inferior. Tudo o que em si encerre de matéria mental acaba por se desintegrar e reabsorver no respectivo plano, mas não em qualquer mente individual — e a sombra vai-se degradando imperceptível até cair na classe seguinte.
5.° Os invólucros (cascas ou cascões astrais).
O invólucro é apenas o cadáver astral nas suas últimas fases de desintegração, quando o estão abandonando as últimas partículas mentais. Desprovidos de qualquer espécie de consciênciae de inteligência, vagueiam passivamente nas correntes astrais “como nuvens impelidas por ventos contrários”. Mas, galvanizadas pelo contato da aura de um médium, podem, contudo, animar-se ainda, por instantes, de um simulacro burlesco e caricatural de vida. Neste caso uma perfeita semelhança têm com o morto e podem mesmo reproduzir até certo ponto as suas expressões favoritas e até mesmo a sua caligrafia. Contudo, isto é apenas um ato automático das células, que tendem, logo que são sujeitas a qualquer excitação, a repetir mecanicamente os movimentos habituais; e se alguma inteligência parece haver nestas entidades, não procede do morto, mas é, por assim dizer, emprestada do médium ou dos seus “guias” ocasionais. Mas a sua vitalização temporária dá-se mais frequentemente por outro processo, que estudaremos no parágrafo seguinte. Conservam também a qualidade de poder responder cegamente às vibrações, geralmente grosseiras, que lhes eram familiares durante o seu período de existência como sombras. Conseqüentemente, as criaturas em que predominavam os desejos inferiores e as paixões grosseiras sentem por vezes estas extraordinariamente intensificadas, quando assistem a sessões espiritistas, como se o invólucro fizesse incidir sobre todas as suas más qualidades. Há uma outra variedade de cadáver que se deve mencionar neste parágrafo, embora pertença a uma fase anterior da vida post-mortem. Já se disse que, depois da morte do corpo físico, o veículo astral é reorganizado com uma relativa rapideze que o duplo etérico é abandonado e exposto a uma lenta desintegração, precisamente como acontece ao invólucro astral na última fase do processo. Este invólucro etérico não vagueia daqui para ali, como a variedade que acabamos de descrever; conserva-se a uma distância de alguns metros do corpo físico em. via de decomposição. Corno é facilmente perceptível por qualquer pessoa, mesmo levemente sensitiva, é ele a origem das histórias correntes sobre espectros e fantasmas que aparecem nos cemitérios. Qualquer criatura psiquicamente desenvolvida, ao travessar um dos nossos grandes cemitérios, pode observar às centenas essas formas azuladas, com a aparência de vapores, flutuando sobre as campas daqueles que recentemente deixaram. E não se pode dizer que o espetáculo seja muito agradável, visto elas se acharem, como os seus duplicados físicos enterrados, nos vários graus de decomposição. Como o invólucro ou casca astral, esta espécie de invólucro é absolutamente desprovida de inteligência e de consciência, e apenas pode ser trazida a uma espécie de simulacro de vida. sempre hedionda, por um desses repugnantes ritos de uma das piores formas da magia negra, de que é melhor não falarmos. Resumindo: em cada etapa do seu caminho da Terra ao Céu, o homem arroja para longe e abandona três cadáveres: o corpo físico, o duplo etérico e o veículo astral, que se resolvem gradualmente nos seus elementos constituintes, e cuja matéria é utilizada de novo nos planos respectivos pela admirável química da natureza.
6.° Os invólucros vitalizados.
Propriamente, não deviam classificar-se entre os “humanos”, visto que apenas o seu revestimento exterior, um invólucro passivo e insensível, é que teve outrora qualquer coisa de humano. A vida, inteligência, desejos e vontade que possuem são os que lhes vêm do dementai artificial que os anima. Embora devamos curvar-nos ante a terrível verdade de serem criações dos maus pensamentos do homem, não podemos considerá-los intrinsecamente humanos. Parece-nos, portanto, mais sensato abordá-los com mais desenvolvimento quando tratarmos da classe das entidades artificiais, visto que a sua natureza e gênese serão mais facilmente compreendidos quando o nosso estudo chegar a essa altura. Basta, por enquanto, dizer-se que o invólucro vitalizado é um ser malévolo — verdadeiro demônio tentador, que faz todo o mal que está no seu poder, e se mais não faz, é porque este é relativamente limitado. Como a sombra, é muitas vezes utilizado nos horríveis desígnios das formas de magia do Voodoo e do Obeah. Alguns escritores têm-lhes dado a designação de “elementares”, mas este termo, que se tem aplicado em várias épocas a quase todas as variedades de entidades post-mortem, tornou-se tão vago e de sentido tão pouco preciso, que preferimos evitá- lo tanto quanto possível.
7.° Os suicidas e as vítimas de morte súbita.
Compreende-se facilmente que um indivíduo que foi arrancado à vida física repentinamente, em pleno gozo da sua saúde e energias, se ache, no plano astral, em condições consideravelmente diferentes daquelas a que estão sujeitos os que morrem com a idade ou por doença. Nestes casos, os laços de desejos terrestres que ligavam o velho ou o doente à terra, estão naturalmente mais ou menos enfraquecidos; as partículas mais grosseiras estão, com certeza, já libertas, de modo que é a sexta ou quinta subdivisão, e talvez a uma mais elevada do plano astral, a que deve passar. Os princípios foram por um processo gradual, preparados para a separação, e portanto, o choque é muito menos violento. Mas no caso de suicídio ou de morte por desastre, não se realizaram estes preparativos graduais, e a saída brusca dos princípios do seu estojo físico pode comparar-se, com felicidade, como alguém já o fez, ao arrancar repentino do caroço de um fruto ainda verde. Grande quantidade de matéria astral, da categoria mais densa, está ainda suspensa em volta da personalidade, que, porconseguinte, fica presa na sétima ou última subdivisão do plano astral. Já vimos, pela descrição que dela tentamos fazer, que esta subdivisão não é realmente uma estância muito agradável; mas os seus efeitos não são os mesmos para todos os que são obrigados a habitá-la. As vítimas de morte súbita, cujas vidas na terra foram puras e nobres, não têm afinidade por esse subplano, de modo que o tempo da sua permanência lá é passado, citando as palavras de uma carta a esse respeito, ou “num feliz alheamento e esquecimento completos, ou num estado de tranqüila sonolência, povoado de sonhos cor de rosa.” Se, porém, a vida na terra foi baixa, brutal, egoísta, cheia de sensualismo, haverá da parte dos que por qualquer meio foram violentamente arrebatados à vida, plena consciência desta pouco hospitaleira região, e estarão sujeitos a transformar-se em entidades terrivelmente malfazejas. Inflamados por apetites horríveis, de todas as espécies, que de modo nenhum podem satisfazer diretamente, por não terem corpo físico, tentam aplacar suas revoltantes paixões servindo-se de um médium ou de qualquer pessoa sensitiva que obsedam. E não há maior alegria para eles do que se servirem de quantos artifícios o plano astral lhes pode incorrer, para iludir os vivos, levando-os a esses mesmos excessos que tão fatais foram para eles próprios. A mesma carta diz também, noutra passagem, “são os Pisâ-chas, os íncubos e súcubos dos escritores da idade média, os demônios da embriaguez, da gula, da luxúriae da avareza, poderosamente astuciosos, cruéis e maus, cujas vítimas são incitadas por eles, com uma alegria cínica, a cometer os piores crimes.” São eles que fornecem,- com a classe anterior, os tentadores, os diabos dos livros religiosos, mas falham completamente perante um espírito puro e reto, nada podendo contra qualquer indivíduo que jamais tenha acalentado em si semelhantes tendências criminosas.
Aqueles que têm a vista psíquica desenvolvida, podem ver multidões destes desgraçados junto de açougues, tabernase outros lugares ainda mais vergonhosos, onde encontram a atmosfera grosseira que lhes convém e os indivíduos de ambos os sexos, de hábitos semelhantes aos seus. Para uma entidade destas, é uma verdadeira desgraça encontrarem um médium com quem tenham afinidade. Isso concorrerá para o prolongamento da sua vida astral, além de a pôr em condições de gerar mau Karma, durante um período talvez indefinido, e, preparando assim, por suas mãos uma encarnação futura da pior espécie, acrescida do perigo da perda de grande porção de poder mental. Mas, se a entidade em questão tem a sorte de não encontrar um sensitivo através do qual possa satisfazer suas paixões, estas, não encontrando satisfação, vão-se consumindo a pouco e pouco, e o sofrimento que daí resulta concorre talvez para ir desfazendo o seu mau Karma da última vida. A situação do suicida é ainda complicada pelo fato de a violência do seu ato ter diminuído enormemente o poder que o Ego Superior tem de reabsorver em si mesmo a sua parte inferior, o que o coloca sob a ameaça de novos e variados perigos. Mas é necessário que se note que nem todos os suicidas são igualmente condenáveis. As circunstâncias determinantes do ato variam desde o ato refletido e irrepreensível de um Sêneca ou de um Sócrates até ao do miserável que se mata para fugir às conseqüências das vilanias a que o seu mau caráter o levou, e conseqüentemente, a situação depois da morte varia igualmente. Esta classe, assim como a das sombras e dos invólucros vitalizados, formam o que se poderia chamar “os vampiros menores”, visto todos procurarem prolongar a existência subtraindo a vitalidade necessária aos seres humanos submetidos à sua influência. É esta a razão por que tantas vezes os médiuns e os assistentes se sentem completamente esgotados no fim de uma sessão de espiritismo. Os estudantes de ocultismo são ensinados a defender-se dos seus ataques. Mas o indivíduo que sem esse conhecimento se aventure a cruzar-se com tais entidades no seu caminho, dificilmente as evitará, ou pelo menos não deixará de mais cedo ou mais tarde vir a sofrer os resultados da sua influência.
8.° Os Vampiros e os Lobisomens.
Resta-nos ainda falar de duas espécies de entidades, ainda mais repelentes, mas felizmente muito raras. Embora difiram muito e tenham várias características, podemos talvez juntá-las no mesmo grupo, visto terem em comum caracteres de horror sobrenatural e de extrema raridade, devido ao fato de serem legados de raças primitivas. São anacronismos monstruosos, relíquias horrorosas de um tempo em que o homem e o seu ambiente eram, sob muitos pontos de vista, diferentes do que o são hoje. Nós que pertencemos à quinta grande raça (*) devíamos estar, atendendo ao nosso estado de civilização, absolutamente livres de um tão terrível destino, e realmente assim o é, tanto que essas entidades são hoje consideradas apenas como fábulas da Idade Média. Contudo, há exemplos do seu aparecimento, principalmente em povos onde há ainda uma forte corrente de sangue da quarta raça, como na Rússia e na Hungria. As lendas populares são evidentemente exageradas mas, no fundo, há qualquer coisa de verdade, de impressionante realismo, nas estranhas histórias que ainda hoje correm de boca em boca entre os camponeses da Europa Central. Os traços gerais dessas histórias são bem conhecidos para que valha a pena fazer-lhes mais do que uma referência de passagem. Como exemplo típico, embora produto de imaginação, encontra-se um em Carmitta, de Sheri-dan lê Fanu, e a descrição de um vampiro de espécie rara cm em Isis Unveiled, vol. I, pág. 454. Os leitores de literatura teosófica sabem que é possível viver-se de maneira tão degradante e egoísta, tão criminosa e brutal, que a mente inferior se encontre por completo encarcerada nos desejos e absolutamente separada da sua origem espiritual no Ego superior. E muitos haverá que supõem que este acidente é muito vulgar e que estamos expostos a encontrar pelas ruas dezenas dessas “criaturas sem alma”; mas, felizmente, isso não é verdade. Para atingir tão baixo nível no mal, a ponto de perder completamente a personalidade, seria necessário que um homem tivesse abafado até ao último estertor o seu altruísmo e espiritualidade, e não tivesse nem a mais pálida sombra de uma boa qualidade. Ora, se até no mais ínfimo dos patifes se encontra frequentemente qualquer coisa que não é de todo má, compreende-se que essas personalidades abandonadas pelo Ego constituem pequena minoria. Todavia, embora raras, existem; e é entre elas que se encontra a categoria ainda mais rara dos vampiros.
A entidade perdida achar-se-ia pouco tempo depois da morte incapaz de se demorar no mundo astral, e seria levada irresistivelmente para o “seu legítimo lugar”, a misteriosa oitava esfera, onde se desintegraria completamente depois de passar por provas que vale mais não descrever. Se, contudo, a entidade em questão pereceu de suicídio ou morte súbita, pode, em certas circunstâncias, especialmente se sabe alguma coisa da magia negra, escapar a essa terrível sorte, trocando-a por uma não menos horrível, a vida na morte, que tal se pode chamar a horrorosa existência do vampiro. Como à oitava esfera só tem direito ao defunto considerado depois da desintegração do seu corpo físico, ele o mantém num estado cataléptico, servindo-se para isso do repugnante expediente da transfusão de sangue roubado a seres humanos pelo corpo astral parcialmente materializado, e assim retarda o seu destino final à força de assassinatos. E é precisamente o recurso apontado pela superstição popular — a exumação e cremação do corpo — o melhor remédio para tais casos, visto que assim se priva a criatura do seu ponto de apoio. Quando se procede à abertura do caixão, é vulgar encontrar-se o corpo fresco e sadio, mergulhado num lago de sangue. Nos países onde existe a cremação, esta espécie de vampirismo é naturalmente impossível. O lobisomem, apesar de igualmente repugnante e horrível, é resultado de um karma um tanto diferente. Deveria, talvez, ser incluído na segunda e não na primeira das divisões dos habitantes humanos deste plano, visto quee sempre durante a vida terrena de um homem que ele se manifesta pela primeira sob esta forma; é uma habilidade que implica necessariamente certo conhecimento de magia negra — suficiente pelo menos para se poder projetar o corpo astral. Quando um indivíduo, absolutamente cruel e brutal, faz isto, há certas circunstâncias que permitem que o corpo possa ser arrebatado por outras entidades astrais, e materializado, não na forma humana, mas na de qualquer animal perigoso, e mais geralmente o lobo. Sob esta nova forma devasta a região em roda, matando outros animais, e mesmo seres humanos, satisfazendo assim não só sua ânsia de sangue, mas ainda a dos demônios que o estimulam e excitam. Neste caso, como acontece frequentemente na materialização vulgar, qualquer ferida infligida nessa forma animal reproduz-se no corpo físico humano, graças ao extraordinário fenômeno da repercussão. Depois da morte deste corpo, o astral — que provavelmente continuará a aparecer sob a mesma forma — apresenta-se menos vulnerável. Será, portanto, menos perigoso, visto não poder, a não ser que encontre um médium apropriado, materializar-se já completamente. Nestas manifestações há provavelmente muita matéria do duplo etérico e sem dúvida também uma parte dos elementos constituintes do corpo físico, como acontece noutras materializações. Em qualquer dos casos, este corpo fluídico parece poder afastar-se do corpo físico, muito mais do que geralmente acontece a um veículo que encerra, pelo menos, certa quantidade de matéria etérica. É moda em nosso tempo escarnecer daquilo a que se chama “superstições tolas da gente rude”; mas o estudante de ocultismo descobre nestas tradições, e em muitas outras, sob a capa de absurdos, vestígios de verdades esquecidas da natureza e aprende a ser cauteloso na sua aceitação ou rejeição. Os que desejam explorar as regiões astrais não devem ter receio de encontrar as entidades cujos nomes encimam este parágrafo, porque, como já disse, são extremamente raras e o seu número tem diminuído considerável e constantemente. E de resto, a sua ação, a julgar pela sua natureza constitucional extremamente material, limita–se às proximidades imediatas dos seus corpos físicos.
9.° Os magos negros ou os seus discípulos.
Pertencem, no outro extremo da escala, à nossa segunda classe de entidades defuntas: discípulos que aguardam a sua reencarnação. Mas estes, em lugar de obter permissão para adotar um método não comum de progresso, tratam de violar as leis da evolução, mantendo-se no mundo astral, por meio de artes mágicas — por vezes de caráter horroroso. Poder-se-iam subdividir as entidades desta classe, segundo o processo empregado e segundo a duração possível das suas existências neste plano. Mas o assunto não é de molde a fascinar-nos e o que o ocultista precisa saber é a maneira como as há de evitar. Parece-nos, portanto, mais interessante passarmos ao estudo de outra parte do nosso assunto. Deve, no entanto, frisar-se que qualquer criatura humana que tente prolongar assim a sua vida no plano astral, além dos limites naturais, só o pode conseguir à custa de outras, absorvendo-lhes de uma forma ou outra as suas legítimas existências.
C. W. Leadbeater.
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