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Texto de G. B. Marian. Traduzido por Caio Ferreira Peres
Explicando kheper, o antigo conceito egípcio de transformação divina, e como ele se relaciona com o escaravelho, a divindade Criadora solar Atum-Rá e Set como o campeão de Rá.
Na mitologia egípcia, a divindade solar Rá (ou para ser mais específico, Atum-Rá) não é apenas o nosso sol literal, mas o primeiro deus, o progenitor de todas as coisas e a fagulha divina que está oculta em cada pessoa. Eles são o fogo estelar do qual o nosso planeta e nossos próprios corpos são forjados, e me refiro a eles com pronomes neutros sempre que possível, dado que eles também são conhecidos como “o Grande Ele-Ela.”
Não é dito que Rá projetou o universo como arquiteto, mas que o reproduziu assexuadamente por meio de um ato de masturbação divina (pode-se dizer que um “Big Bang” teológico e literal) logo após criar a si mesmo através de um ato de introspecção divina. Primeiramente Rá ergueu-se do Nun, o oceano primordial do caos infinito, proclamando “Khepera Kheper Kheperu”—o que significa algo como:
“Eu me transformei,
e pela minha transformação,
outros também se transformarão.”
Então, Rá assexuadamente gerou a infinita pluralidade de deuses, animais e pessoas que existem hoje. Cada ser senciente é, de fato, uma miniatura alternativa de Rá dentro de um Rá macrocósmico coletivo, desde o maior dos Netjeru até o minúsculo bebê humano ou animal.
Os primeiros filhos de Rá, Shu e Tefnut, foram separados do Ser Auto-Criado pouco após seus nascimentos. Então Rá removeu um de seus Olhos brilhantes, a qual se tornou a deusa vaca solar Hathor, e a enviou à procura dos filhos desaparecidos. Quando Hathor reuniu Shu e Tefnut com Rá, os filhos já tinham atingido a maioridade gerado seus próprios bebês: a deusa do céu Nut e o deus da terra Geb (que depois geraram Osíris, Ísis, Set e Néftis). E quando Rá se reuniu com todas essas crianças, eles choraram em lágrimas de felicidade que caíram sobre Geb e se misturaram com a terra, se tornando os primeiros seres humanos. Logo, enquanto os deuses podem ser maiores e mais poderosos que nós, cada pessoa é um semideus vivo, uma particularização humana do Grande Ele-Ela, e nós possuímos certos direitos e dignidades que nem mesmo os Netjeru podem nos tirar. Nós não somos suas criações e nem seus brinquedos, mas algo como os seus primos mais novos.
Em um momento posterior do ciclo mítico, Rá diz que eles são “Khepera ao amanhecer, Rá ao meio-dia e Atum ao pôr do sol.” Eles são uma criança pela manhã, um adulto à tarde e um ancião à noite. Quando a noite cai, Rá morre e se torna um fantasma ou o “Sol da Noite” que viaja pelo Submundo para renascer novamente como Khepera. É nas horas mais escuras antes do amanhecer que eles são atacados pela Serpente do Caos, que é repelida com segurança por Set e Seu Ferro estelar. Isso não é apenas um mito solar, mas uma alegoria para o ciclo do sono. É dito que muitos dos Netjeru seguem o padrão de Rá de morrer e renascer, adormecer e despertar, assim como fazemos todos os dias. Assim como o ataque da Serpente contra Rá é de fato um ataque a todos os deuses e mortais por extensão, logo também a batalha de Set contra o monstro é uma batalha por todos nós, desde o próprio Criador até aquele cliente irritado que você tem de lidar no trabalho. Set é o deus que nunca morre e que nunca dorme, para que o resto de nós possa dormir, morrer, acordar e renascer em segurança.
O nome Khepera é especialmente interessante devido a ele estar relacionado à palavra kheper, que tem pelo menos dois significados inter-relacionados. A tradução mais óbvia é “escaravelho”, um inseto que é sagrado para Rá. Os egípcios admiravam os escaravelhos pelo seu ciclo de vida (do ovo à larva, à pupa ao adulto), e por seu comportamento reprodutivo único. Eles colocam seus ovos no esterco, que depois enrolam em grandes bolas e movimentam conforme necessário. As pessoas traçavam paralelos entre essas bolas de esterco cheias de ovos e o sol, imaginando que Rá rolava uma bola de ovo radiante pelo céu. Além disso, o ciclo de vida do escaravelho era comparado ao ciclo de Rá da noite/fantasma ao amanhecer/criança ao meio-dia/adulto ao anoitecer/ancião, o que nós leva a segunda tradução para kheper. Como um verbo significa “transformar”, e como substantivo significa “uma transformação”. Sempre que você experimenta algo que muda profundamente a sua vida, despertando-o para um novo horizonte inexplorado, você KHEPER. E cada um dos vários “vocês” que se manifestam desde o seu nascimento à sua morte e até o seu pós-vida é um kheper único no fluxo de metamorfoses que é a sua vida.
Considerando que kheper está codificado nas primeiras palavras de Rá na Aurora do Tempo (“Khepera Kheper Kheperu”), essa é de fato uma “palavra mágica” extremamente poderosa. Tão poderosa que, de fato, quando Michael Aquino, um dos principais ministros da Igreja de Satã, invocou “o diabo” para obter orientação sobre o que fazer após um cisma na igreja em 1975, ele não foi atendido por Lúcifer mas sim por Set, que imprimiu permanentemente o conceito de kheper em Aquino naquela mesma noite. Aquino e seus colegas no Templo de Set preferem capitalizar e soletrar essa palavra com a letra grega chi (ou seja, Xeper) para significar sua centralização em sua corrente setiana particular. Prefiro soletrar a palavra foneticamente para evitar qualquer confusão para os meus leitores, e divirjo dos membros do Templo de Set na medida em que priorizo o meu amor por Set acima de kheper na minha hierarquia de valores espirituais. Concordo que kheper é importante e que Set se preocupa mais em levar todos nós a kheper do que em ser adorado. No entanto, eu me identifico como um setiano porque amo Set acima de tudo; se kheper ou Khepera fosse o verdadeiro foco do meu caminho, eu me identificaria como um kheperiano.
Dito isso, kheper é o que acontece quando o sol nasce na aurora, quando uma larva emerge do solo como um besouro adulto e quando uma alma ou espírito é fundamentalmente transformado por uma experiência profunda que transforma a vida. Ele é o princípio que permite que todos nós—os deuses cósmicos e os semideuses mortais—teoricamente vivamos além da morte. Além do mais, Set é a única outra divindade que desejou a Própria existência além de Rá (Arrancando-se do ventre de Sua mãe, Nut). Uma vez que os Netjeru são seres distintos e extensões da essência primordial de Rá, pode-se argumentar que Set é o aspecto de Rá que o permitiu a realizar kheper em primeiro lugar, mesmo antes do Grande Vermelho vir a ser como uma entidade em Seu próprio direito. Isso explicaria por que Ele continua a desempenhar um papel importante na garantia de um renascimento seguro de Khepera, tanto no macrocosmo quanto no microcosmo. Da mesma forma que São João acreditava que Cristo estava com Javé no início, antes da Criação do céu e da terra, você pode dizer que eu acredito que Set estava com Rá no início, antes da Aurora dos Tempos.
Fonte: https://desertofset.com/2020/06/16/scarab/
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