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Humanizando as correspondências do Tarô

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Kao Kazlaucka

O tarô é um sistema rico e multifacetado, e as correspondências que encontramos nele servem como um meio poderoso de aprofundar a compreensão das cartas. Elas atuam como uma espécie de memória associativa, revelando nuances de cada arcano e destacando aspectos que talvez não fossem tão evidentes à primeira vista. Essas correspondências, no entanto, não têm como único propósito fazer paralelos com outros sistemas; são ferramentas para ampliar a percepção sobre o tarô em si.

Como um verdadeiro “zeitgeist”, ou espírito do tempo, o tarô permite uma infinidade de interpretações e relações. Na prática, isso significa que podemos encontrar uma conexão simbólica entre o tarô e quase qualquer coisa — de filmes e livros a eventos históricos. Cada arcano, maior ou menor, pode ser associado a uma obra artística ou literária, por exemplo, expandindo ainda mais o entendimento das cartas.

Ao longo dos séculos, o desenvolvimento literário do tarô foi enriquecido por diversas analogias e correspondências com outros sistemas de conhecimento. O objetivo maior disso é trazer uma visão mais ampla da carta, de acordo com o sistema com o qual o estudante de tarô mais se identifica.

Para exemplificar, podemos analisar a carta do Mago e algumas de suas correspondências, lembrando sempre que elas não possuem um caráter definitivo e inflexível. Um exemplo claro disso são as diferenças entre as analogias astrológicas e cabalísticas das escolas francesa e inglesa.

O único grande “perigo” ao tratar de correspondências no tarô é acreditar que o tarô depende ou nasceu com determinada analogia — seja ela alquímica, astrológica, cabalística ou outra. Talvez pelo fato de o tarô ter surgido no Renascimento, as cartas do triunfo já possuíam correlações populares da época, como a mitologia greco-romana e o misticismo judaico-cristão, que estavam em evidência e eram fontes de inspiração. Assim, o tarô pode ter sido, de certa forma, uma ferramenta de educação para os nobres, gerando discussões filosóficas e servindo como um jogo lúdico — uma espécie de “dois em um”. No entanto, afirmar uma relação profunda e inquestionável com a Cabala ou qualquer outro sistema é, ao mesmo tempo, charmoso e inspirador, mas também incerto.

Incerto ou não, o fato é que as correspondências tornam o tarô o mais rico dos oráculos em termos de diversidade de escolas de pensamento. Como exemplo dessa riqueza, podemos usar a carta do Mago e explorar algumas possíveis correlações com outros sistemas simbólicos para observar paralelos que ressaltam sua essência de ação, iniciativa e habilidade criativa.

  • Runa Ansuz: Ansuz é uma boa correspondência para o Mago, ligada ao conhecimento, à comunicação e à inspiração divina, remetendo ao poder de expressão e ao uso habilidoso das palavras — qualidades centrais para o Mago, que manipula elementos e se comunica entre mundos com facilidade.
  • Mercúrio na astrologia: Mercúrio é o planeta associado à comunicação, inteligência, agilidade mental e movimento entre diferentes esferas de realidade, atributos que o Mago também representa. Assim como Mercúrio, o Mago é ágil, astuto e habilidoso, usando o poder da mente para manifestar ideias no mundo físico. Essa associação é utilizada pela escola inglesa.
  • Hexagrama 1 – Ch’ien (O Criativo) no I Ching: O hexagrama 1, Ch’ien, reflete o poder criador e a iniciativa do Mago. Ele representa o impulso primordial, a energia de manifestação, a força de vontade pura e o potencial criativo em ação — qualidades presentes no Mago, que realiza sua vontade e cria algo novo.

Essas são apenas algumas das inúmeras analogias que poderiam ser exploradas.

As correspondências entre o tarô, outros sistemas simbólicos e a arte têm como função principal ampliar e enriquecer a interpretação das cartas. Cada sistema traz seu próprio conjunto de símbolos, arquétipos e valores, e, ao relacioná-los com o tarô, criamos uma rede de significados que aprofunda nossa compreensão e prática.

Essas correspondências funcionam como camadas adicionais de informação, trazendo novas perspectivas para cada carta. No caso das relações com outros sistemas, como astrologia, runas ou I Ching, cada símbolo empresta ao tarô algo de sua essência, ajudando-nos a ver as cartas sob diferentes ângulos — seja como arquétipos de forças naturais, padrões comportamentais ou energias universais.

Já as correspondências com a arte, como associar um arcano a um filme, obra literária ou quadro, agregam uma camada cultural e pessoal ao tarô. A arte reflete o espírito humano e o zeitgeist; ao fazer essas conexões, o tarô passa a dialogar com nossas experiências contemporâneas, ganhando um sentido específico em cada contexto. Assim, relacionar o tarô com a arte permite que ele se transforme em uma linguagem viva, capaz de ressoar profundamente com quem o estuda.

Essas analogias e correspondências, portanto, não servem apenas para “encaixar” o tarô em outros sistemas, mas para transformar a experiência do consulente e do leitor, tornando a leitura mais rica, simbólica e conectada com a vida e a cultura que os rodeiam.

Por fim, digo: use as analogias com responsabilidade. Como já dizia minha avó, tudo em excesso faz mal.


Kao Kazlaucka ama um bom café e uma conversa de final de tarde com pessoas ricas de espírito e de histórias. Criado num ambiente em que se contavam muitos causos, a narrativa sempre foi algo da sua natureza. Formou-se em Jornalismo e cursou mestrado em Edição de Textos. Estuda Tarô, astrologia, sistemas mágicos e yoga há anos.
Atualmente, Kao é estudante da área médica e trabalha como tarólogo, professor de Tarô e escritor. Acredita que o contato diário com o Tarô é uma jornada para a alma.


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