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Eram tantas as pessoas que iam procurar a libertação de seus encantamentos com aquela bruxa de Reichshofen, já mencionada que o conde daquele castelo estabeleceu uma bilheteria e todos que estavam enfeitiçados em suas próprias pessoas ou em suas posses tinham de pagar uma moeda para visitar a casa dela; e ele conta ter auferido ganho substancial por esse meio.
Sabemos por experiência própria que existem muitas bruxas na diocese de Constança: não que essa diocese seja mais infestada que outras. visto ser essa forma de infidelidade geral em todas as dioceses. mas essa diocese tem sido vasculhada mais completamente. Descobriu-se que consultas diárias vinham sendo feitas a um homem chamado Hengst, por largo número de pobres que estavam enfeitiçados e vimos com nossos próprios olhos multidões tão grandes na cidade de Eningen. que certamente os pobres nunca foram a nenhum altar da Santa Virgem ou a um poço sagrado ou a uma ermida em numero tão grande quanto ao dos que iam ao feiticeiro. Pois, mesmo no mais frio inverno, quando todas as estradas e caminhos estavam bloqueados de neve, vinham a ele de uma distancia de 2 ou 3 milhas, a despeito de grandes dificuldades, e alguns eram curados, mas outros não. Pois suponho que nem todos as encantamentos são igualmente fáceis de remover. por causa dos vários obstáculos de que se falou antes. E essas bruxas removem os encantamentos por meio de uma invocação declarada ao diabo, a maneira do segundo tipo de remédios, que e ilícito, mas não na mesma medida que o primeiro tipo.
O terceiro tipo de remédio e aquele que e feito por meio de certas cerimônias supersticiosas, mas sem nenhum dano a ninguém e não por uma bruxa confessa. Exemplo desse método e o seguinte: Certo comerciante do mercado na cidade de Spires relatou a seguinte experiência que lhe aconteceu. Estava hospedado, disse ele na Swabia, no conhecido castelo de certo nobre e um dia depois do jantar, quando eu passeava calmamente com dois criados de campo, uma mulher veio a nosso encontro. Quando ela ainda estava longe, meus companheiros a reconheceram e um deles me disse: “Faça o sinal-da-cruz, rápido”, e o outro insistiu comigo da mesma maneira. Eu lhes perguntei o que temiam e eles responderam: “A bruxa mais perigosa da província está vindo ao nosso encontro e ela pode encantar um homem com um simples olhar”. Porem, eu obstinadamente me gabei de não temer essas coisas e, nem bem tinha acabado de dizer essas palavras, senti meu pe esquerdo dolorosamente ferido, de modo que não podia mover-me ou caminhar sem sentir grande dor. E eles voltaram rapidamente ao castelo para buscar um cavalo e assim me levaram de volta. Mas as dores continuaraM aumentando por três dias.
As pessoas do castelo, sabendo que eu tinha sido enfeitiçado, contaram o que tinha havido a certo camponês que vivia a 1 milha de distancia e que eles sabiam capaz de remover encantamentos. Esse homem veio rapidamente e, depois de examinar meu pe, disse: “Farei um teste para saber se essas dores tem causa natural e, se descobrir que não, você deve recorrer aos remédios naturais”. E eu respondi: “Se eu puder ser curado sem nenhuma mágica e com o auxilio de Deus, concordarei; mas não quero saber do diabo, nem preciso de sua ajuda.” E o camponês prometeu que ele não usaria nada disso, mas sim meios lícitos e que eu curaria com o auxilio de Deus, se ele se certificasse as minhas dores devidas a bruxaria. Então consenti em suas propostas. Ele, então, pegou chumbo derretido (da mesma maneira que a outra bruxa que mencionamos), numa concha de metal sobre meu pé e verteu-o em água e imediatamente surgiram varias formas, como que de espinhos e cabelos e ossos e coisas que tais na vasilha. “Agora”, disse ele, “vejo que essa enfermidade não é natural, mas sim devida a bruxaria.” E, quando lhe perguntei como podia ler essas coisas no chumbo derretido, ele respondeu: “Existem sete metais pertencentes aos sete planetas e sendo Satumo o senhor do chumbo, quando o chumbo e vertido sobre alguém que esta enfeitiçado, e de sua propriedade revelar a bruxaria por seu poder. E assim se comprovou e você breve estará curado, mas terei de visita-lo por tantos dias quantos esteve doente”. E ele me perguntou quantos dias se haviam passado e quando eu lhe disse que aquele era o terceiro dia, ele passou a vir me ver diariamente pelos próximos três dias e meramente examinando e tocando meu pe e dizendo para si mesmo certas palavras, dissolveu o encantamento e restaurou-me a completa saúde.
Nesse caso, e claro que o curandeiro não e uma bruxa, apesar de seu método ser algo supersticioso. Pois, por ter prometido a cura pelo auxílio de Deus e não por obra do diabo e por ter alegado a influencia de Satuno sobre o chumbo, ele foi irrepreensível e deveria mesmo ser elogiado. Mas restam algumas duvidas quanto ao poder pelo qual o encantamento da bruxa foi removido e quanto as figuras que se formaram do chumbo. Pois nenhuma bruxaria pode ser removida por nenhum poder natural, apesar de poder ser mitigada, conforme será provado mais adiante para aqueles que estão possuídos: parece, portanto, que ele efetuou a cura por meio, ao menos, de algum pacto tácito com o diabo.
E chamamos tal pacto tácito quando o praticante concorda tacitamente, de forma qualquer, em empregar a ajuda do diabo. E dessa maneira muitos trabalhos supersticiosos são feitos, com variado grau de ofensa ao Criador, desde que pode haver muito mais ofensa numa operação que noutra.
Por estar esse camponês certo da cura e por ter tido de visitar o paciente por tantos dias quantos estivera enfeitiçado e apesar de não usar nenhum remédio natural, ter efetuado a cura conforme a promessa feita, por essas razoes, apesar de não ter entrado em pacto aberto com o diabo, deve ele ser julgado não apenas como suspeito mas como plenamente culpado de heresia e deve ser preso e submetido pelo menos as penalidades estabelecidas ‘no segundo método de sentenciar bruxas; parem, sua punição deve ser acompanhada de solene exortação, a menos que ele seja protegido por outras leis que pareçam ser de intenção contrária e a atitude do ordinário em tais casos será demonstrada mais tarde na solução dos argumentos.
A quarta categoria de remédios, no tocante aquilo em que os canonistas concordam parcialmente com alguns dos teólogos, não e nada pior que escuso ou vão, uma vez que e apenas supersticioso e não ha pacto, nem aberto, nem tácito, como diabo no que tange a intenção ou propósito do praticante. Notemos que os canonistas e alguns teólogos estão apenas parcialmente de acordo na tolerância a esse tipo de remédio, pais sua concordância ou discordância depende de saber se incluem esse tipo de remédio .no terceiro tipo. Porem, esse tipo de remédio escuso e exemplificado acima no caso da mulher que bate no balde suspenso sobre o fogo a fim de que a bruxa que secou o leite da vaca seja golpeada, se bem que isso pode ser feito ou em nome do diabo ou sem nenhuma referencia a ele.
Devemos acrescentar outros exemplos do mesmo tipo. Pois, as vezes, quando uma vaca foi injuriada dessa maneira e se quer descobrir quem a enfeitiçou dessa forma, as mulheres as levam para o campo com uma calça de homem ou outra peça sobre a cabeça ou costas. E isso se faz principalmente em dias de festa ou santificados e possivelmente, com algum tipo de invocação ao diabo e elas batem na vaca com uma vara e as levam. E então a vaca corre direto para a casa da bruxa e bate veementemente na porta com os chifres, mugindo alto todo o tempo e o diabo faz com que a vaca continue nisso ate que seja pacificada por meio de outro feitiço.
Na verdade, e segundo os doutores supramencionados, esses remédios podem ser tolerados, mas não são meritórios como alguns tentam afirmar. Pois São Paulo diz que tudo o que fazemos por palavras ou atos deve ser feito em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ora, nesse tipo de remédio, pode não haver invocação direta do diabo, mas o nome do diabo pode ser mencionado e, ainda, pode não haver intenção de fazer tais coisas por meio de um pacto aberto ou tácito com o diabo, mas se um homem diz: “Quero fazer isso, tenha ou não participação do diabo”, essa própria temeridade, por colocar de lado o temor a Deus, ofende a Deus, que, conseqüentemente, concede ao diabo poder para realizar tais curas. Portanto, os que fazem uso de tais curas devem ser orientados para o caminho da penitencia e exortados a abandonar tais praticas e voltar-se mais para os remédios mencionados.
A mesma luz deveriam ser vistos aqueles que usam do seguinte método. Quando um animal foi morto por bruxaria e se deseja saber quem e a bruxa, ao certificar-se se a morte foi natural ou devida a bruxaria. vai-se a um lugar onde as animais abatidos são esfolados e arrasta-se as intestinos no chão ate a casa do dono do animal não entrando na casa pela porta principal, mas por sobre o batente da porta para dentro da cozinha e se faz um fogo e colocasse a intestino sabre ele numa grelha. Entao, segundo o que nos foi contado muitas vezes, da mesma maneira que os intestinos esquentam e queimam. também os intestinos da bruxa são afligidos com dores ardentes. Mas, quando essa experiência é feita. deve-se tomar o maior cuidado em trancar a porta, porque a bruxa e levada por suas dores a tentar entrar na casa e. se ela consegue pegar um carvão do fogo todas as suas dores desaparecerão. E fomos muitas vezes informados de que quando não consegue entrar na casa a bruxa a cerca por dentro e por fora com a mais densa neblina e com gemidos e comoções tão horríveis que finalmente todos os da casa pensam que o teto vai cair e esmagá-los. a menos que abram a porta.
Dessa forma, temos respondido o argumento de que nenhum encantamento ou bruxaria deve ser removido. Pois, os dois primeiros remédios São totalmente ilícitos. o terceiro remédio e tolerado pela lei, mas precisa ser cuidadosamente examinado por parte do juiz eclesiástico. E o que a lei civil tolera esta demonstrado no capitulo sobre bruxas, onde se diz que aqueles que tem capacidade de impedir que obras humanas sejam estragadas por chuvas de granizo e tempestades devem ser, não punidos, mas recompensados.
Santo Antonino também, em sua Summa, aponta essa discrepância entre a lei canônica e a lei civil. Portanto, a lei civil concede legalidade a essas práticas de preservação das colheitas e do gado e, no evento de certos homens usarem tais artes, devem eles não apenas serem tolerados, mas mesmo recompensados. Porquanto, o juiz eclesiástico deve notar particularmente se os métodos usados contra chuvas de granizo e tempestades estão dentro do espírito da lei ou se são de alguma maneira supersticiosos e, então, se não há nenhum escândalo da fé em questão, podem eles ser tolerados.
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