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Quando se fala na história dos Pactos com o Diabo, no Ocidente, a feiticeira de Berkeley é uma figura sempre lembrada, referência obrigatória pela originalidade de sua trajetória e desfecho fantástico de sua aventura. Esta mulher viveu na segunda metade do século XI (anos 1000) na pequena cidade de Berkeley, Inglaterra. Ao contrário das feiticeiras típicas do imaginário popular, a Senhora de Berkeley era bem conceituada em sua comunidade, mãe de família com muitos filhos e filhas, dois dos quais, os caçulas, eram dedicados à vida religiosa: o rapaz era monge e moça, freira. Além disso era uma mulher rica e caridosa embora fosse público e notório que dispunha de certos dons sobrenaturais. Em pleno período de repressão às modalidades de bruxaria, esta feiticeira conseguiu escapar de qualquer perseguição não obstante de sua fama de vidente capaz de ler o destino das pessoas na formação dos bandos de pássaros em vôo. Como animal de estimação, possuía um pequeno corvo.
Durante uma tarde, o corvo morreu nos braços da dona. Um enorme apreenção apoderou-se da feiticeira que então, teria exclamado, aterrorizada: “Acabou-se! Minha fortuna se foi e a desgraça, sem demora, deve já bater à minha porta.” Nem bem dissera tais palavras e um mensageiro chegou afogueado trazendo péssimas notícias: uma fatalidade, um acidente estúpido acabava de matar todos os filhos da Senhora de Berkeley, com exceção dos dois religiosos. Foi a estes sobreviventes que ela confessou: todas as suas riquezas e boa sorte na vida deviam-se a um terrível Pacto que firmara com o próprio Diabo, em sua juventude. Ela tentou anular os efeitos futuros do pacto usando os poderes que o Diabo lhe dera para a prática do bem mas, tendo estudado magia, justamente porque buscava um meio de se salvar, percebera que não havia como desfazer o malígno contrato mas poderia tentar um ritual póstumo que impedisse Satanás de cobrar a dívida. A morte do Corvo (na verdade, um demônio) era o sinal de que o prazo do Pacto findara e logo, ela mesma encontraria a morte, ocasião combinada com Demo para a entrega do penhor prometido, seu corpo e sua alma. Para evitar tamanha desgraça, instruía os filhos sobre como proceder em suas cerimônias fúnebres a fim de tentar evitar o mal definitivo: a eternidade no Inferno! O complexo ritual consistia nas seguintes providências e práticas:
…deveriam costurar seu cadáver num couro de veado e colocá-lo num sarcófago de pedra lacrado com chumbo derretido e amarrado com correntes. Cinquenta sacerdotes deveriam rezar a missa pela sua alma enquanto outros cinquenta deveriam cantar nênias para a proteção de seu corpo. Tudo isso deveria durar três dias e três noites. Todas as instruções foram meticulosamente observadas mas …um bando de demônios invadiu a igreja, tanto na primeira como na segunda noite. Tentaram abrir o caixão mas foram rechaçados pelos efeitos combinados dos lacre de chumbo e do culto dos sacerdotes. Na terceira noite, contudo, um “horrendo espectro, um diabo de forma gigantesca e de semblante malígno” apareceu durante os últimos ritos e, ignorando o cântico frenético, berrou que a mulher tinha de ir com ele. Uma voz feminina foi ouvida e dizia que não se podia mover, pois estava bem segura no caixão lacrado. Com um sopro o diabo varreu os sacerdotes para os lados, rompeu as correntes e abriu o sepulcro. … então, a figura tirou a velha mulher do caixão …
(HAINING, 1976 – p 26)
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