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O escritor Rubens Saraceni, babalorixá da umbanda e pesquisador de magia e espiritualismo, vem se destacando no mero por entender que a mediunidade não pode estar restrita a um ou outro Caminho Espiritual
– Alex Alprim
Rubens Saraceni nasceu em 1951, e há mais de 25 anos exerce sua mediunidade e faz seus estudos no campo da espiritualidade. Seus inúmeros livros já publicados são psicografados, ditados e orientados pelos Mestres da Luz. Sua jornada, segundo conta, foi iniciada no espiritismo de “mesa branca”, passando posteriormente para a umbanda, onde se tornou babalorixá.
No entanto, como gosta de deixar bem claro, o universo da umbanda não é o único no qual ele se movimenta e realiza seus estudos, uma vez que o dom da mediunidade não pode estar restrito a uma ou outra linha religiosa, doutrinária ou de pesquisas.
Recebendo a outorga dos planos superiores para iniciar pessoas em magia, também recebeu a autorização para começar a divulgar o que foi denominado “Magia Divina das Sete Chamas”, que explica em seus livros.
Hoje com mais de vinte livros publicados, Saraceni é um dos autores mais procurados da editora Madras. Nesta entrevista, ele fala sobre seus estudos, sobre o aspecto teórico e prático da umbanda, magia e espiritualismo em geral.
Qual a relação entre a umbanda e as mensagens espirituais ditadas pelos Mestres da Luz? Quem são os Mestres da Luz e como eles se encaixam na tradição umbandista?
Os Mestres da Luz são espíritos mentores da umbanda; são regentes de grandes linhas espirituais, ainda que eles não se apresentem formalmente. Mas regem as gigantescas correntes de espíritos e, através dessas psicografias, eles têm procurado passar noções sobre o mundo espiritual.
Quais noções?
Principalmente, eles procuram transmitir às pessoas que a vida não se encerra aqui no plano material, por isso é necessário que a pessoa vigie os seus atos, seus sentimentos, e trabalhe para que, quando vier a passagem para o outro lado, a pessoa esteja bem preparada para vivenciar a sua realidade maior, que é a realidade do espírito. Então, eles têm uma finalidade. Os livros às vezes mostram determinados eventos, determinadas vivências, que muitos classificam como sendo um pouco chocantes, porque mexem na ferida mesmo, sem muito rodeio; mas tudo isso visa despertar nas pessoas uma conscientização.
O que é considerado chocante?
Quando se descrevem algumas quedas espirituais que aconteceram com pessoas. O desencarne jogou essas pessoas de encontro a uma realidade que elas achavam que não existiria; achavam que não teria aquela punição divina, que não viria para ela uma sentença que a jogasse de encontro ao próprio universo sombrio que ela havia criado à sua volta aqui na Terra.
Então, de acordo com essa visão, existe uma estrutura maniqueísta do mundo muito próxima à que a moral cristã vem desenvolvendo nos últimos dois mil anos?
A moral cristã prega o seguinte: se você faz o bem, você vai para o céu; se você faz o mal, você vai para o inferno. Ela está correta, só que temos de entender o que é esse céu e esse inferno. Para nós, o céu são as faixas de luz para as quais cada um é atraído por afinidade de sentimentos, afinidades vibracionais; e o inferno também são faixas específicas da Criação, para as quais são recolhidos espíritos que, aqui em cima, no plano material, não desenvolveram sua consciência. Se nós simplificarmos, está correto. A pessoa é atraída pelas faixas vibratórias com as quais tem afinidade. Esse é o céu e o inferno para mim – e dentro da umbanda também é isso.
Seria semelhante às teorias das sintonias dos grandes mestres ascensionados, com as pessoas sintonizadas com faixas de mais ou menos luz?
É isso mesmo. Essa é uma consciência que está se desenvolvendo muito rapidamente dentro da umbanda e sendo bem aceita, porque nos explica o porquê da existência do suposto inferno: ele não existe por acaso, porque tem a finalidade de recolher espíritos que, de uma forma ou de outra,sofreram regressões conscienciais quando passaram pela carne.
Qual o ponto em comum entre a umbanda, o candomblé e o espiritismo hoje?
O ponto em comum das três é a manifestação dos espíritos através da incorporação das mensagens, ainda que no candomblé a dinâmica seja um pouco diferente da dinâmica da umbanda, e totalmente diferente da dinâmica do espiritismo. A umbanda mantém a ponte de contato tanto com o candomblé quanto como espiritismo. Todas essas três doutrinas, ou essas três religiões – vamos colocar assim – têm como ponto em comum a mediunidade como sustentação. No candomblé, tem de haver a manifestação do orixá; na umbanda, tem de haver a manifestação dos espíritos e, eventualmente, do orixá do médium; e no espiritismo, existe a manifestação das entidades e o trabalho desenvolvido pelos espíritos que incorporam nos médiuns, curando e orientando as pessoas – tudo visando o crescimento e a melhoria do ser.
Como você encara, na umbanda e no candomblé, prática de sacrifícios animais, principalmente com relação ao conhecimento que os Mestres de Luz vêm trazendo?
Quando estudamos um pouco o candomblé, vemos que o sacrifício animal tem uma função específica já tradicional, secular. Então, nada contra, porque é algo que já vem de gerações. A umbanda não adota sacrifícios de animais. Algumas pessoas que transitam tanto no candomblé quanto na umbanda fazem, mas a umbanda em si não adota sacrifícios animais. Ela não condena. Acho que cada um tem o seu processo de feitura de trabalhos, sua dinâmica, que deve ser respeitada. No verdadeiro candomblé, o sacrifício só é ritualizado em ocasiões muito específicas, mas vemos pessoas não-preparadas desvirtuando, desenvolvendo métodos próprios que consideram que para tudo tem de haver sacrifícios. Os verdadeiros praticantes do candomblé, pessoas muito bem preparadas, dizem que o sacrifício é muito raro e, mesmo assim, é tirado só o axé do animal, porque o alimento é compartilhado na ceia coletiva.
Como é a estrutura tradicional da umbanda, e que caminhos evolutivos ela está seguindo nos últimos anos?
A estruturação da umbanda começou por volta de 1908, com o médium Zé Fernandino de Moraes, quando, através dele, foi dito que estava se iniciando uma religião e que todos os espíritos seriam bem-vindos a ela. A faculdade de incorporação é anterior à umbanda, candomblé e espiritismo, mas ali estava o marco inicial, estruturado na manifestação dos espíritos por nomes simbólicos, tal como o próprio fundador da religião, o espírito chamado Caboclo das Sete Encruzilhadas, os sete cruzamentos, as sete irradiações. Os espíritos se manifestariam não com nomes próprios, mas como símbolos das hierarquias às quais estavam ligados, entre caboclos, pretos velhos, crianças, exus.
Ela se expandiu muito rapidamente, porque tinha o amparo do Astral, e se estruturou assim: o espírito se manifesta, auxilia o encarnado que vai até ele e, ao mesmo tempo, vai passando uma doutrina de vida, de melhoria de consciência. Com aquele linguajar simples deles, bem direto e objetivo, eles vão tocando nos pontos que interessam àquela pessoa e, a partir dali, a pessoa vai despertando para a realidade do espírito. Então, a religião procura trabalhar as pessoas. Sua estrutura tem o objetivo de resgatar as pessoas para a realidade espiritual. Não é um processo rápido, violento, mas um processo de atração permanente, principalmente voltado ao ser humano que está passando por dificuldades.
Como você começou a psicografar? Já havia psicografia na umbanda?
Se existia a psicografia pura, eu não tenho elementos para falar sobre isso. Existiam muitos escritores de umbanda desde o começo do século. Eles poderiam estar escrevendo inspirados, mas sem dar essa conotação. Quando eu iniciei a psicografia – com alguns livros que foram publicados e outros que não foram – e quando surgiu O Guardião da Meia-Noite, que foi um marco na umbanda como psicografia de um médium umbandista, isso foi um pouco assustador porque a psicografia estava associada ao espiritismo, ao kardecismo. Na época, eu recebi críticas de irmãos kardecistas; pois, se eu era da umbanda, como é que podia psicografar? Médium é médium, seja da umbanda, candomblé ou espiritismo – não importa a doutrina que ele siga. Eu mostrei que o dom da pessoa independe da formação religiosa; tendo o dom, ela canaliza o que o astral quer. Um tem dom para psicografar, outro para fazer pinturas mediúnicas, dar consultas, ler as cartas, as mãos…
E hoje isso já é aceito? Existem outros trabalhos desse tipo?
Já. Quando o Pai Benedito se manifestou, incorporado mesmo em mim, e conversou com a minha esposa, ele disse que estava começando a psicografia na umbanda, que a espiritualidade estava iniciando um processo de psicografia nos moldes do kardecismo através de médiuns dentro da umbanda. Ainda estava sendo considerado um fenômeno, mas com o tempo outros surgiriam. E, de fato, passaram uns cinco ou seis anos depois de eu estar psicografando, e outros médiuns da umbanda começaram a chegar a mim e dizer que estava acontecendo a mesma coisa; estavam psicografando livros e até tinham medo de falar. Pai Benedito falou que muitos espíritos estão preparados para trazer romances mediúnicos, histórias sobre espíritos ou vivenciadas há séculos ou milênios, tendo como fundo a vida de espíritos que são grandes mentores da umbanda e que comandam um trabalho imenso em benefício da humanidade. Eu já conheço dezenas de pessoas que estão psicografando, médiuns desenvolvidos dentro da umbanda.
Fale um pouco sobre o trabalho espiritual que você vem desenvolvendo ultimamente.
Estou desenvolvendo vários trabalhos paralelos, todos visando o crescimento das pessoas. O mais marcante tem sido o trabalho de magia, porque nela nós não diferenciamos as pessoas, nem por seu grau escolar, nem por sua religiosidade.
A magia é neutra e praticada por todas as pessoas que queiram aflorar o seu dom íntimo. Outro campo em que venho desenvolvendo um trabalho muito grande é na teologia da umbanda. Comecei esse trabalho mais ou menos em 1996, e foi difícil falar nisso porque era uma coisa inédita até então – nem existia esse termo na umbanda. É outra inovação que, hoje, muitas pessoas já estão usando na umbanda, com cursos de teologia da umbanda, ou seja, o estudo do universo divino. Ele veio ao encontro da necessidade do momento dentro da religião, e está começando a gerar muitos trabalhos.
Também visa dotar a religião de um conhecimento próprio dela, não mais dependente de outras doutrinas, sem precisar buscar lá fora e adaptar para a umbanda. As pessoas não precisam buscar no espiritismo ou no candomblé a explicação para os mistérios que fluem através de sua prática religiosa.
Em várias estruturas religiosas, em especial as afro-brasileiras, parece existir uma forte tendência a tentar adaptar a linguagem mágica européia do período renascentista – mais recentemente, das vertentes americanas ligadas aos mestres ascensionados e agregar essa linguagem à sua religiosidade. Como você vê essa situação em seu trabalho?
A teologia que estamos desenvolvendo é pura, fundamentada unicamente nos orixás, sem recorrer às doutrinas alheias para extrair de lá a explicação dos mistérios. Houve a revelação do que nós classificamos como os fatores de Deus, as qualidades divinas. A partir daí foram desenvolvidos vários livros como a Gênesis da Umbanda, Código de Umbanda, Sete Linhas de Umbanda, Orixás Ancestrais, livros que, fundamentados no mistério orixá, explicam tudo que a pessoa precisa saber sem recorrer ao candomblé, ao espiritismo ou a qualquer outra doutrina.
O mistério orixá começou a ser explicado de uma forma que eu chamo de científica, porque ela tem uma lógica, segue um padrão repetitivo, explicando o mistério para a época em que vivemos. E isso é o que traz às pessoas a satisfação quando estudam teologia, porque explica o universo divino de uma forma muito ordenada, não mitológica, mítica ou mística, mas racional. Isso, somando-se à magia, criou todo um universo que completa a umbandista, porque a umbanda é uma religião mágica por excelência.
O trabalho dos guias espirituais é realizar magias que beneficiem as pessoas, magias que utilizam elementos da natureza, sejam ervas, flores, frutos, pedras, sementes ou raízes: tudo é elemento mágico que eles utilizam para curar pessoas, limpar ambientes, etc. Então, trouxemos também uma magia nova, cada etapa fundamentada em um elemento: magia das chamas, magia das ervas, magia das pedras, do pó, etc. São vinte e um graus no total, e tudo vai sendo explicado de forma racional. A nossa teologia é bem racionalista; estuda os mistérios de Deus a partir de uma interpretação trazida pela espiritualidade, uma interpretação superior, não criada aqui pela nossa mente terrena. A magia não está conectada diretamente à umbanda; a teologia sim, foi pensada pela espiritualidade, pelos Mestres da Luz, para religião de umbanda, mas é uma fonte de informações pra qualquer pessoa.
E, de uma forma geral, como você vê o desenvolvimento do espiritualismo hoje?
O espiritualismo sempre foi praticado pela humanidade sob muitos nomes, mas hoje em dia eu vejo o espiritualismo assumindo o seu lugar em função do próprio relaxamento dos preconceitos. Tivemos um período de perseguição às práticas espiritualistas, qualquer que seja o nome que se dê a essas práticas.
Hoje o espiritualismo tem uma grande oportunidade de se firmar como alternativa para evolução das pessoas. Se cada religião tem os seus dogmas e doutrinas, até fazendo com que o fiel desenvolva dentro de si determinados preconceitos contra outras religiões, o espiritualismo é irreligioso.
O espiritualismo seria a chave do processo evolutivo humano neste plano?
Com certeza, porque dando às pessoas a oportunidade de manifestar os seus dons, dons dos espíritos, é que essas pessoas vão encontrar a si próprias, vão se conhecer. Os dons dos espíritos têm de ser vivenciados aqui na carne. Em determinados segmentos religiosos esses dons são reprimidos e vistos como coisas demoníacas, mas essas pessoas não entendem nada de dons. Dom é uma qualidade que o espírito desenvolve e que se torna um meio para que todo um universo oculto flua através dele, um universo espiritual, divino. O espiritualismo tem a grande oportunidade, agora, de não se deixar levar pelas influências do dogmatismo. O dogmatismo mata tudo.
Qualquer dogma mata uma estrutura religiosa?
Mata, porque se as pessoas começam a dizer que só um dom é aceitável e os outros não, que a pessoa pode incorporar um guia espiritual mas não pode psicografar, ou pode psicografar mas só pode falar de Jesus (pois, se falar de um orixá ou caboclo é heresia), então já matou. É isso que faz o espiritismo. Com todo o respeito que eu tenho, o espiritismo dogmatizou a mediunidade de psicografia, porque só se pode falar de Jesus. Se um médium kardecista encostar um espírito que não professe, ou não professou o cristianismo em sua última encarnação, e não fale as verdades na linguagem ali codificada, ele é bloqueado.
Nós não devemos deixar que esses dogmas existam dentro da umbanda. O dom é meu, eu conquistei. Sei lá quantas vidas eu precisei viver aqui na Terra para desenvolver esse dom e, se hoje ele flui naturalmente, eu não vou dizer que só tenho de escrever sobre orixás. Em meus livros escrevo sobre tudo. Em A Princesa dos Encantos falo sobre o nascimento do hinduísmo, em O Livro da Vida falo sobre Akhenaton; e falo sobre o surgimento dos templários na Europa, do início da civilização egípcia, etc.
O importante é o que esse espírito viveu no passado. Pouco importa se esse espírito de hoje se manifesta na umbanda com o nome simbólico de caboclo tal, se o grande momento dele, sua grande experiência humana foi na Índia, no Egito, na Mesopotâmia, na Europa ou no Brasil pré-cristão. Espírito não tem identidade.
Você gostaria de deixar alguma mensagem para as pessoas que estão se iniciando nesse caminho espiritual, não só da umbanda mas na espiritualidade de uma forma geral?
Na espiritualidade de uma forma geral, todas as vias de crescimento para o ser humano, colocadas por Deus à nossa disposição, são boas.
Eu não desenvolvi dentro de mim esse preconceito de que a minha é melhor, a do fulano é pior; para mim, todas são boas. Então, eu digo às pessoas, que queiram se iniciar ou estão se iniciando, que façam sua caminhada sem temor. Confie que tudo está sendo conduzido pelo Superior. Mas procure se instruir; procure aprender e não colocar bloqueios dentro de si mesmo, contra isso ou aquilo, mas sim ir até cada coisa e aprender sobre ela, e delas extrair o seu juízo, a sua experiência, porque isso é que vai contar.
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Fonte: Revista Sexto Sentido – Número 30
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