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Amor é Tudo Que Você Precisa

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Uma palestra editada por Christopher Titmuss no Festival Ängsbacka, Suécia, 2004. Traduzido por Felipe Marx

Você poderia pensar que agora todos nós seríamos mega-especialistas em questões de amor. No nosso dia a dia, mal podemos escapar. As transmissões de novelas intermináveis ​​e filmes de televisão lidam com as questões do coração e da complexidade das relações humanas. Pop, rock, R&B, rap e todas as outras formas de música cantam sobre o amor. Poesia, romances, peças e artes são tudo sobre amor. Amor, amor, amor …

Como seres humanos, somos infinitamente fascinados com essa emoção particular do coração. Nós colocamos uma tremenda quantidade de tempo no amor. O amor vem de todas as crianças. Alguém poderia pensar que já teríamos controle sobre o amor. Deveríamos ter realmente entendido, encontrado alguma percepção e compreensão em torno dele para podermos expressar nosso amor facilmente, livre e generosamente. Não parece ser o caso.

Bloqueamos o amor verdadeiro, inibimos, cortamos ou secamos. Experimentamos uma relutância em compartilhar amor, dar, oferecer ou falar do nosso amor. Tratamo-lo como bens de consumo: “Eu vou te dar amor com uma condição; Você me dá seu amor. Eu vou fazer uma troca com você. Você pode ter um pouco do meu amor, contanto que eu tenha alguns dos seus. Mas você não vai conseguir mais nenhum dos meus se você parar de dar o seu amor para mim.”

Oferecido apenas em troca de amor, esse amor de consumo se mostra em nossos principais papéis e relacionamentos. Incapaz de oferecer amor, quem sofre mais? Quando nosso coração seca, nos tornamos rígidos, controladores e relutantes em estar abertos. Quem sofre? Os corações secos afetam outros, homens, mulheres e crianças, mas nossa dor permanece mais próxima de nós mesmos. Sofremos quando negamos amor aos outros. Por que queremos viver assim? Como é miserável viver assim. Se começarmos a explorar o coração de forma profunda, então portas internas se abrem para nós, incluindo felicidade e liberdade de ser.

Eu estava ouvindo as notícias da rádio BBC pouco antes de vir para cá. O repórter estava entrevistando um especialista educacional – a sociedade adora especialistas. O especialista disse que o interesse dos jovens pela ciência diminui cada vez mais. Os jovens fazem cada vez menos aplicações em faculdades e universidades para estudar física, biologia e química. Menos dinheiro vai para esses departamentos devido ao declínio dos alunos. Se continuar assim, haverá uma crise científica, disse o especialista.

Para onde vai o interesse? Qual é o assunto que substitui a ciência por um número crescente de jovens? A maior área de crescimento nas universidades britânicas é a psicologia. Esta é uma mudança interessante. A mudança está na saída do objeto chamado ciência para o sujeito – o percebedor. Há um desejo de conhecer a psicologia da mente, o instrumento usado para olhar para o mundo ao nosso redor inclui a ciência. Alguns amigos que estudam psicologia me dizem que não estão entusiasmados com a metodologia da universidade para seus estudos. Eles preferem experiência à teoria. No entanto, a mudança de objeto para sujeito (o eu, a consciência, o percebedor) é importante. O mundo é um adereço para a vida interior. O mundo apoia a vida interior, não apenas o contrário. Assim, qualquer ser humano atencioso e cuidadoso dá atenção à relação do coração/mente com o exterior. Há desafios que vem com certa atenção plena para com o outro e sua situação.

Vou dar um exemplo histórico. Tivemos um retiro de fim de semana em Pauenhof, um centro de Dharma a 40 minutos de carro de Düsseldorf, Alemanha. Como uma fazenda em funcionamento, durante a 2ª Guerra Mundial, famílias judias costumavam se esconder lá da Gestapo e da SS. Sob as velhas escadas de madeira, o fazendeiro construiu um armário secreto para esconderijo quando os soldados estavam caçando judeus. A família e os trabalhadores rurais tiveram que confiar em todos para manter o sigilo absoluto. Os nazistas condenavam aqueles que escondiam judeus à morte ou ao campo de concentração. O fazendeiro, sua família e trabalhadores demonstraram imenso amor em nome dos outros. Eles se arriscaram muito. Esse tipo de risco enorme você e eu provavelmente nunca teríamos que correr.

Tal amor revela algo profundo na profundidade dos seres humanos. Famílias alemãs comuns deram apoio às famílias judias. Um senso de consciência, um profundo senso de interconexão, permite que o amor se mostre de formas extraordinárias. A mola para tal amor, a faísca para ele, revela empatia pelos outros, revela algo em comum.

O amor precisa de movimento, uma habilidade de fluir através de ver algo em comum entre as pessoas. A partir desse reconhecimento, o amor pode fluir. Se não podemos sentir tanta empatia, o amor não pode fluir. Veremos as diferenças entre nós. Vamos sentir medo. Seremos polarizados e fragmentados pelas diferenças ou pelos medos. Temos a capacidade de sermos firmes, refletir e meditar sobre o que compartilhamos. Sempre que você e eu exageramos as diferenças entre nós, é às custas do amor. Quando vemos o que é comum, o amor começa a se mover.

O Percebedor e o Percebido

Há alguns anos fui para a Birmânia ter uma reunião com Aung San Suu Kyi, líder muito amada do país que está em prisão domiciliar há anos por causa de sua crítica aberta a um regime militar brutal que comanda a região há décadas. Ela é uma mulher de Vipassana (Meditação Insight) dedicada e a primeira meditadora vipassana a receber o Prêmio Nobel da Paz. Espero que não seja a última. Seu professor, U Pandita da Birmânia, é como seu professor, Mahasi Sayadaw. Como diríamos em português, farinha do mesmo saco. Ele faz os mestres Zen parecerem professores do jardim de infância.

Fui fazer uma visita à U Pandita em seu mosteiro em Rangum. Quando ele veio pela primeira vez ao Ocidente para dar ensinamentos Vipassana, utilizou muito o estilo de ensinar feito na Birmânia – esforço longo, duro, heroico, começando às quatro horas da manhã ao longo do dia. Se você fosse para a cama antes da meia-noite, seria considerado um covarde. Ele enfatizava sessões de uma hora e meditações de caminhada de uma hora muito lentas. Ele oferecia uma meditação disciplinada rigorosa, firme e linha-dura.

Ele perguntava diariamente a cada meditador quantas horas de meditação sentada e caminhando eles faziam. O que mais eles observaram além da ascensão e queda do abdômen na meditação sentada? Que pensamentos estavam surgindo em sua mente? Ele ensinou forte concentração para que o meditador notasse quais pensamentos surgiram entre o abdômen se expandindo e contraindo. É preciso muita concentração para notar esses pensamentos no meio da atenção plena da respiração.

Eu disse a ele na nossa reunião, “Sayadaw, ouvi dizer que você ensina meditação metta no Ocidente?” Meditação metta é meditação de bondade amorosa. Eu expressei surpresa porque ele é conhecido como este professor absolutamente linha-dura de meditação com o objetivo de olhar para a sutileza de qualquer experiência e ver através dela.

Ele disse “sim”.

Eu perguntei “Por quê? A bondade amorosa parece leve em comparação com a prática rígida do Vipassana.”

O Sayadaw explicou que viu muita dor no Ocidente. Externamente as coisas parecem bem, mas não interiormente. Ele acrescentou que uma prioridade da meditação vipassana é enfrentar questões de dor no corpo, mente, sentimentos e dor existencial. Ele disse que muitos ocidentais não podem chegar a uma percepção clara das situações porque a maneira como percebem a dor também é dolorosa. Disse que decidiu ensinar meditação da bondade amorosa, juntamente com meditações de absorção profunda e Vipassana.

Eu disse: “Você fez uma mudança nos ensinamentos, então?”

“Sim”. Ele é famoso no mundo budista por raramente sorrir. Ele senta lá, nada se move. É como falar com uma imagem de Buda. Ele expressa grandes insights. Ele disse que tinha feito uma mudança para os ocidentais, por causa de sua dor em torno de objetos de interesse. Meditações de Metta ajudaram a abrir e amolecer o coração. Essa abordagem, disse ele, desenvolve a felicidade e uma absorção mais profunda na paz interior. Isso muda a percepção e permite ver mais claramente o que está acontecendo porque as percepções não estão cheias de reatividade, angústia e negatividade.

O cultivo de meditações de bondade amorosa ajudam a clarear a percepção que permite olhar mais claramente para questões problemáticas. Não são apenas questões que importam para nós, mas nossos pensamentos sobre as questões, nosso engajamento com o mundo. O que trazemos para o que olhamos? O que molda nossa percepção e a forma como percebemos os acontecimentos. Nossas percepções têm uma influência muito direta da condição do coração.

A vida interior é tão extraordinária. Um aspecto da nossa vida interior pode e olha para outro aspecto. Eu sento aqui e você senta lá. Eu falo com você sobre algo que eu estou experimentando. Eu sento aqui e fecho meus olhos. Um aspecto da minha vida interior percebe e vê outro aspecto. O experienciador se conecta à experiência, o observador olha para o observado. Uma parte da vida interior é chamada de testemunha, o observador, olha para a outra parte da vida interior. A condição do observador importa significativamente. Desenvolvemos bondade e felicidade, para filtrarmos em nossas percepções, no observador da experiência.

Leitura Espiritual

Eu envio um boletim informativo do dharma a cada poucos meses. Em uma edição, fiz uma lista dos meus nove livros espirituais favoritos. Ela acabou em nove porque olhei todos os livros da minha casa e escolhi meus favoritos. Chegaram a nove livros, e fiz uma pequena revisão desses. Uma jovem judia Etty Hilesum escreveu e manteve seus diários de 1941 a 1943 em Amsterdã durante a ocupação nazista. Seu livro revela a determinação de uma mulher de 27 anos de viver o mais livre, independente e amorosamente possível, apesar da ocupação. Visitei o apartamento de Etty em Amsterdã, e Westerbork, o campo de transição para o campo de concentração, onde ela passou as últimas semanas de sua vida antes de embarcar no trem para o campo de concentração.

Etty disse que com todo o ódio, via fascismo, ficamos absolutamente presos nos sistemas que nós ou outros criamos. Ela disse que qualquer ódio é uma doença da alma. Se houvesse um único bom alemão, ela escreveu, eu colocaria minha atenção para ele, em vez de odiá-los todos.

Essas mudanças internas indicam uma mudança no coração. Essa mudança no coração então dá outras oportunidades. A mudança de Etty é um exemplo dramático. Também se aplica em nossas circunstâncias interpessoais. Alguém pode me odiar, alguém pode me explorar, alguém pode mentir sobre mim ou se envolver em fofocas maliciosas sobre mim, ou dizer coisas cruéis sobre mim. Alguém pode trair minha confiança. Alguém está em um relacionamento e o parceiro tem um caso secreto. Quão facilmente escorregamos para um padrão doloroso. “Eu fui ferido. Você me machucou.” Nossas mentes começam a pensar em maneiras de machucar de volta. Você nunca deve subestimar a potência do desejo de vingança.

Recebi um e-mail há alguns dias. Um marido e uma mulher se separaram. Inicialmente, a mudança foi tranquila. Eles estavam juntos há vários anos e aceitaram a necessidade de se separarem. Então, um dia, o marido foi para uma transição de amizade e aceitação da mudança para ficar muito chateado, irritado e magoado. “Você não vai tirar um centavo de mim”, disse ele à ex-mulher. Memórias dolorosas, percepções dolorosas e imaginação dolorosa com interpretações dolorosas do passado vieram à sua mente. Ele tinha o desejo de machucar a ex-mulher. Ele usou dinheiro. Alguns usam coisas materiais, crianças ou cortam contato futuro para infligir dor.

O que vai manter o amor estável, apesar da mudança indesejada? Tais mudanças testam nossa maturidade emocional, nosso desenvolvimento interior como ser humano. É o teste do que vemos em comum. Alguns dirão para lutarmos, brigarmos, não sermos atropelados, e conseguir o que queremos. Podemos ser encorajados a mostrar agressividade, competitividade e fazer exigências. O que importa profundamente é a capacidade de um ser humano lidar com as coisas com amor. Outros dirão que você é estúpido, você é ingênuo, você é fraco, você é um fracasso, e você é medroso. Se vingue!

Poderia esse evento doloroso ser tratado com sabedoria e amor? Essas meditações de bondade amorosa que praticaremos nos próximos dias servem como preparação para o momento em que estamos no limite. Vai ser amor ou vingança? É amor ou culpa? É o amor ou a troca de insultos? É nobre amar apesar do que enfrentamos.

O que renova o amor?

Minhas viagens me levam regularmente para o Leste, para a Índia. Tenho o privilégio de ir à Mãe Índia todos os anos desde a década de 1970. Eu vou ensinar, particularmente em Bodh Gaya, onde temos uma escola. Tenho vários amigos lá – ONGs, funcionários do governo, professores e outros que trabalham nas aldeias. Eles se envolvem em manter o espírito e a confiança do serviço vivos e contínuos. Notei que eles demonstram um tremendo amor. As dificuldades surgem quando colocamos altas expectativas sobre nós mesmos ou sobre os outros.

O amor não é algo eterno, não é algo consistentemente disponível para nós. O amor precisa ser compartilhado. O amor também precisa de renovação. O que renova o amor? Quando há expectativas de dar constantemente, amar constantemente e servir constantemente, pegamos o caminho rápido para o desgaste. Eu conheci e conversei com centenas de pessoas envolvidas em um maravilhoso trabalho de serviço para os outros. Eles focam, se concentram e se dedicam aos outros, mas eles podem não se conhecer bem o suficiente. Depois de um período de tempo, há cada vez menos energia e mais exaustão.

Pensamentos surgem; “Eu não posso continuar fazendo isso” É uma grande pena se você e eu não entendemos as condições para o fluxo do amor. Também precisamos entender igualmente o que dá renovação. Podemos ter um monte de amor dentro de nós, mas às vezes há um buraco no balde. Está faltando alguma coisa em nossa vida? Alguém está faltando em nossa vida? Se há um sentimento dentro de uma lacuna; que é o buraco no balde. Então uma pessoa pode estar dando amor, através do trabalho, amizades, família, mas dentro de si tem um forte desejo. Você pode ter o desejo de um amigo muito próximo, de viver no campo, de ter um namorado, uma relação íntima ou de filhos. Essa sensação de que algo está faltando é o buraco no balde do amor. Uma mudança reconhece uma sensação de crescimento e aprofundamento e apreciação.

O buraco no balde nos faz sentir exaustos, infelizes, e até mesmo deprimidos. Tudo porque acreditamos na ideia de que algo está faltando. A vida estava cheia quando nascemos, estava cheia ontem, estava cheia hoje, estará cheia amanhã, e estará cheia no dia seguinte. Até que realmente apreciemos isso, estamos vivendo em sonhos.

É tão plena essa existência que não podemos mostrar a alguém que algo está faltando. Da plenitude vem a renovação do amor, que continua fluindo através da plenitude. Não é preciso muito para ser recarregado com amor. Você dá um passeio pelo caminho e através das árvores, você vê muitos cogumelos. Você adora ver cogumelos crescendo naturalmente na floresta. A renovação do amor não leva muito – algumas linhas de poesia, um pouco de música, uma meditação, silêncio, um contato momentâneo com um belo ser humano.

Vou mencionar uma última história. Uma amiga do Dharma em Totnes escreve documentários. Ela foi convidada a escrever e preparar um documentário sobre suicídio. O que acontece quando as pessoas cometem suicídio? O que está acontecendo? Poucas pessoas que cometem suicídio já foram ao médico por causa de uma deficiência psíquica grave ou um distúrbio mental. Falei com ela sobre pessoas ao longo dos anos que tentaram suicídio ou se sentiram muito, muito suicidas. Ela me relatou uma situação de um médico, que trabalhava em São Francisco. O médico deixou um bilhete na mesa dela. “Se alguém sorrir para mim esta manhã, eu não vou me matar. Se ninguém sorrir, vou pular da Ponte da Baía de São Francisco”. Ninguém sorriu. A polícia encontrou aquele bilhete na mesa da cozinha dela.

Às vezes esquecemos a incrível importância na vida do amor, do sorriso, da felicidade e do seu poder de nutrir, interior e externamente. Nossa sobrevivência emocional e talvez nossa sobrevivência física e global dependem de cada gota de amor que trazemos ao nosso ser e aos seres dos outros. O amor é profundamente importante.

Fomos criados, pelo menos até certo ponto, na cultura cristã. Meu rabino favorito, como digo aos meus queridos amigos em Israel, é Jesus de Nazaré. Ele lembra a todos nós que o amor revela o Reino dos Céus. Conhece-se os ensinamentos de Jesus através da experiência do amor. A revelação do Reino se manifesta através do amor. Jesus revela amor através de suas histórias, metáforas e analogias. Ele dá ensinamentos profundos sobre o amor para passar sua mensagem para saber a verdade, conhecer Deus, conhecer o verdadeiro reino, não os terrenos.

A verdadeira experiência e vida religiosa deixam clara a importância da meditação da bondade amorosa do Buda, os lembretes da compaixão com a tradição mahayana, a exploração do “ame o próximo” nas tradições religiosas do Oriente Médio. O amor nos lembra de algo profundo. O amor revela conflito e nos lembra de não alimentá-lo, não de nos preocuparmos com conflitos. O amor alimenta nosso coração ao invés de ter que confiar nos velhos sistemas religiosos com seus patriarcas e visões dogmáticas.

Temos que encontrar novas maneiras de explorar, novas orações, novos rituais, novas meditações, novas formas de viver juntos, e manter algo fresco, vivo e aberto. Tais explorações revelarão o amor do coração. Esta exploração tomará uma profundidade de investigação para que o amor, a felicidade e a liberdade confirmem que não há uma gota de diferença entre os três.

QUE TODOS OS SERES VIVAM COM AMOR.

QUE TODOS OS SERES PERMITAM QUE O AMOR FLUA EM TODAS AS DIREÇÕES.

QUE TODOS OS SERES VIVAM UMA VIDA LIVRE E FELIZ.

Fonte: LOVE IS ALL YOU NEED. An edited talk by Christopher Titmuss in Ängsbacka Festival, Sweden, 2004 – Christopher Titmuss Dharma Blog (christophertitmussblog.org)


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