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por Santiago Bovisio.
Johannes Trithemius, uma figura de destaque na alvorada do Renascimento, impulsionou o aspecto científico deste período, sendo reconhecido como precursor de grandes humanistas. Nascido em 1º de fevereiro de 1462 e falecido em 13 de dezembro de 1518, seu nome de batismo era Johannes Heidenberg. No entanto, ele é amplamente conhecido como Trithemius, ou João de Trittenheim, em referência à sua cidade natal, Trittenheim, na Alemanha.
Apesar de sua origem nobre, sua educação foi inicialmente negligenciada. Até os quinze anos, Trithemius não sabia ler nem escrever, uma condição agravada por ter ficado órfão aos dois anos. Seu padrasto, contrário ao seu desenvolvimento intelectual, restringiu ao máximo seu acesso à educação formal. Para contornar essas limitações, Trithemius, movido por uma curiosidade inabalável, estudava em segredo, durante a noite, na casa de um vizinho. Lá, aprendeu a ler e escrever, além de estudar declinações e conjugações em latim. Esse aprendizado clandestino, embora rudimentar, permitiu-lhe ao mesmo tempo satisfazer sua sede de conhecimento e cumprir as exigências impostas pelo padrasto.
Ainda insatisfeito com suas limitações acadêmicas, Trithemius decidiu abandonar a casa materna e buscar uma educação mais sólida em cidades como Tréveris e, finalmente, Heidelberg. Nesta última, completou sua formação, adquirindo todo o conhecimento que era possível obter na época.
A caminho de sua casa, no entanto, um evento inesperado mudou o rumo de sua vida. Em 25 de janeiro de 1482, uma forte nevasca impediu seu retorno e o levou a se refugiar na abadia beneditina de Sponheim. Encantado pela vida dos monges, decidiu se unir à Ordem e, em 21 de novembro do mesmo ano, tomou o hábito monástico. Sua permanência como simples monge foi breve, pois, apesar de sua juventude e de seu curto tempo na Ordem, foi eleito abade devido à sua competência e zelo.
Trithemius encontrou o mosteiro em condições precárias, tanto material quanto espiritualmente. Demonstrando um notável espírito empreendedor, ele se dedicou primeiro a restaurar a abadia fisicamente, alcançando rapidamente uma prosperidade que superava a de seus tempos áureos. Sua tarefa mais árdua, porém, foi a reforma moral e espiritual dos monges, que ele conduziu com base na Regra de São Bento, conforme os preceitos da Reforma de Bursfeld. Sob sua liderança, os monges retomaram o hábito de estudar e copiar livros, prática que resultou na criação de uma vasta e valiosa biblioteca. Em 1502, a biblioteca da abadia já contava com 640 volumes, número que subiu para mais de dois mil em poucos anos, uma conquista impressionante considerando que, ao assumir o cargo, o mosteiro possuía apenas 48 livros.
A reputação de Trithemius rapidamente ultrapassou os limites da abadia. Príncipes, bispos e intelectuais de várias partes do mundo viajavam a Sponheim para consultá-lo e se beneficiar de seus vastos conhecimentos. Sua fama, contudo, não foi universalmente aceita. A inveja de alguns monges, incomodados pela rigorosa disciplina imposta, resultou em rumores e calúnias, chegando a acusá-lo injustamente de práticas de feitiçaria.
Em 1505, enquanto estava em Heidelberg, a serviço de Filipe, Conde Palatino do Reno, Trithemius soube que seus monges haviam se rebelado contra ele, destituindo-o de sua posição de abade. Tentando entender a gravidade da situação, ele se retirou para Colônia e depois para Espira, mas as notícias eram desanimadoras: os monges mantinham-se firmes em sua decisão. Diante disso, Trithemius renunciou à ideia de retornar à sua antiga abadia, onde passara mais de vinte anos e construíra uma biblioteca inestimável. Aceitou, então, viver seus últimos dez anos na abadia de Wurzburgo, onde se dedicou integralmente aos seus estudos, recusando as várias ofertas de cargos honoríficos que lhe foram feitas.
A obra de Trithemius foi alvo de controvérsias e até hoje desperta o interesse de estudiosos. Embora muitas de suas obras ascéticas sejam vistas como monumentos da Reforma de Bursfeld, suas compilações históricas sofreram críticas devido a erros, contradições e à superficialidade de algumas de suas pesquisas. Um exemplo disso é sua “História dos Francos” (Mogúncia, 1515) e os “Anais da Abadia de Hirsangia”, que mencionam fontes de autenticidade duvidosa, como os autores Hunibaldo e Meginfrido, cujos escritos já estavam completamente esquecidos no século XVI. Autores como G. Mentz defenderam Trithemius, afirmando que muitas das acusações contra ele resultaram de falsificações históricas, mas, ainda assim, há dificuldade em assegurar a plena veracidade de suas afirmações devido a certos procedimentos questionáveis adotados por ele.
Por outro lado, suas obras de história literária são mais seguras e têm sido amplamente aceitas pela crítica moderna.
Em suma, Trithemius foi um escritor prolífico e, apesar das controvérsias que cercaram alguns de seus trabalhos, sua contribuição à ciência e às letras no final do século XV foi significativa. Acusado, em certos casos, de envolvimento com a magia e a nigromancia, ele desempenhou um papel crucial no despertar do interesse pelo conhecimento científico, posicionando-se como um verdadeiro precursor do Renascimento científico.
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