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Inocêncio III

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Santiago Bovisio.

Inocêncio III, instruído pelas lutas das investiduras, contra as quais tanto havia combatido Gregório VII, baseou todo o poder do pontificado romano sobre uma face jurídica absolutista.
No ano de 1198, subiu para ocupar a cadeira de São Pedro, o homem da nobre família de Signa, na flor da idade, que, sob o nome de Inocêncio III, deveria lutar com incontrastável valor contra todos os inimigos da justiça e da Igreja, e dar ao mundo o modelo mais acabado de um soberano pontífice, o verdadeiro Rei-Sacerdote Iniciado, o protótipo do Vigário de Jesus Cristo.

Era gracioso e benévolo em suas maneiras. Dotado de uma presença e qualidades físicas pouco comuns, diz-se dele que seu rosto era perfeito e sua figura admirável. Confiante e extremamente terno em seus afetos, generoso como nenhum outro em suas fundações e esmolas; grande e profundo jurisconsulto, como convinha a um juiz da cristandade, sem apelação; orador eloquente e fecundo; escritor ascético e sábio; cioso protetor das ciências e dos estudos religiosos; severo guardião da manutenção das leis da Igreja e de sua disciplina; possuía, além disso, todas as qualidades capazes de ilustrar sua memória, se houvesse governado a Igreja em tempos tranquilos e fáceis ou se seu governo pudesse restringir-se ao cuidado das coisas espirituais. Mas estava-lhe reservada outra missão.

Antes de ascender ao trono sacerdotal, havia compreendido – e também dado a entender em seus escritos – o objetivo e destino do pontificado romano. Este não devia atender somente à salvação das almas, mas ocupar-se também do bom governo da sociedade cristã. No entanto, cheio de desconfiança em si mesmo, mal foi eleito, dirigiu-se a todos os sacerdotes do orbe católico, pedindo-lhes, com instância, orações especiais para conseguir de Deus que o iluminasse e confortasse. Deus ouviu essas preces gerais, dispensando-lhe os auxílios necessários para continuar e levar a cabo a grande obra de Gregório VII, a Soberania Espiritual de Roma.

Mas, enquanto defendia essa primazia, a constituição da Europa dessa época lhe conferia a função gloriosa de zelador dos interesses dos povos, de amparo de todos os seus direitos e de vigia do cumprimento de todos os seus deveres.

Durante os dezoito anos de seu pontificado, manteve-se sempre à altura de missão tão elevada e vasta.

Ameaçado e atacado sem trégua por seus súditos imediatos, os turbulentos habitantes de Roma, nem por isso deixava de abarcar com seu olhar toda a Igreja e o mundo cristão, com imperturbável calma, com permanente e minuciosa solicitude, sem que nada escapasse a seus olhos de pai e de juiz.

Da Islândia à Sicília, de Portugal à Armênia, não se transgredia uma lei eclesiástica que não fosse, no mesmo momento, por ele desagravada e restaurada; não houve injúria contra o fraco que não reparasse, garantia atacada que não protegesse. A cristandade inteira não foi, a seus olhos, outra coisa senão uma majestosa unidade, um só reino, sem fronteiras interiores nem distinção de raças, da qual lhe coube ser o defensor intrépido no exterior, e o juiz inexorável e incorruptível no interior.

Reanimando o entibiado ardor das Cruzadas, defendeu-as dos inimigos exteriores. Por isso, foi visto entusiasmado pelos combates em favor da Cruz, lutas gloriosas que inflamaram o coração dos pontífices romanos, desde Gregório VII até Pio II, que morreu como cruzado.

Os papas eram, então, o foco de onde irradiava o ardor santo das nações cristãs. Seus olhos estavam incessantemente fixos nos perigos que ameaçavam a Europa. E, enquanto Inocêncio empregava seu esforço em mandar todos os anos um exército contra os sarracenos vitoriosos no Oriente, no Norte, propagava a fé entre os povos eslavos e sármatas; e, no Ocidente, ia pregando aos reis da Espanha a união e a concórdia, exortando-os a fazer, contra os mouros, um esforço decisivo, predizendo-lhes suas milagrosas vitórias contra a Meia Lua.

Sem outras armas, além da força da persuasão e da autoridade de um grande caráter, reduziu à unidade católica os mais afastados reinos, como a Armênia e a Bulgária, que, vitoriosas dos exércitos latinos, não hesitaram em submeter-se ao escutar a voz de Inocêncio.
Seu infatigável e ardente zelo pela verdade não o impedia de ser tolerante em alto grau com as pessoas. Protegia os judeus contra as exações dos príncipes e o cego furor dos povos, testemunho vivo da verdade cristã, imitando nisso, além do mais, todos os seus predecessores, sem exceção. Em favor da paz e da salvação das almas, mantinha correspondência com os príncipes muçulmanos. Enquanto lutava com incansável constância e rara perspicácia contra as mil heresias que, brotando por toda parte, ameaçavam derrubar os fundamentos da ordem social e moral do universo inteiro, não cessava de inculcar aos católicos vitoriosos e irritados – e ainda aos próprios bispos – princípios de moderação e clemência.

É que, tendo sua vida identificada com a religião e a justiça, estas eram tudo para ele. O amor ardente pela justiça inflamava sua alma de tal modo que não reparava na posição social das pessoas, nos obstáculos nem nos contratempos; desde que o direito aparecesse numa contenda, de forma alguma levava em consideração nem os reveses nem a fortuna. Doce e misericordioso com os débeis e vencidos, inflexível com os soberbos e poderosos. Em toda parte e sempre, protetor do oprimido, do fraco e da equidade contra a força triunfante e injusta. Por isso, defendeu com nobre encarniçamento a santidade do laço conjugal como chave da esfera social e da vida cristã. Nunca a esposa ultrajada se refugiou em vão sob sua mediação poderosa. O mundo, admirado, o viu lutar por quinze anos contra seu amigo e aliado, Felipe Augusto, defendendo os direitos daquela infortunada Ingeburga, vinda da Dinamarca para ser objeto do ludíbrio e desprezo desse príncipe; sozinha, prisioneira, abandonada por todos em meio a uma terra estranha, exceto pelo Pontífice, que soube, ao fim, reintegrá-la ao trono de seu marido, entre os aplausos do povo, que se considerava feliz em ver no mundo uma justiça igual para todos. Também saiu triunfante na defesa da rainha Maria de Aragão, quando chegou a servir de carga a um marido libertino; e da rainha Adelaida de Boêmia, a quem seu esposo queria repudiar para contrair outra união mais vantajosa e já condenada por um concílio.
O mesmo espírito de justiça era o que o impulsionava a velar com paternal cuidado, até nos mais remotos países, pelos direitos e títulos legítimos dos herdeiros das coroas e pela sorte de mais de um régio órfão.

Soube manter, em seus direitos e patrimônio, os príncipes da Noruega, da Polônia e da Armênia (1199); os infantes de Portugal, o jovem rei Ladislau da Hungria e até os filhos dos inimigos da Igreja, como Jaime de Aragão, cujo pai morreu nas fileiras dos hereges e que, tendo caído prisioneiro do exército católico, foi libertado por ordem de Inocêncio. Frederico II, único herdeiro da raça imperial dos Hohenstaufen, o rival mais temível para a Santa Sé, mas que, posto sob a guarda de Inocêncio durante sua minoridade, foi educado, instruído e amparado por ele, mantido em seu patrimônio com o afeto e zelo não de um tutor, mas de um pai.

Poderia causar admiração que, numa época em que a fé era vista como a base de todos os tronos e quando a justiça, personificada dessa maneira, se sentava na cátedra de Pedro, os reis procurassem se unir a ela com os mais fortes vínculos? Parecerá estranho que o valente Pedro de Aragão não encontre, para a nascente independência de sua coroa, melhor garantia do que atravessar os mares para depô-la aos pés de Inocêncio e recebê-la de sua mão, como vassalo? Que João da Inglaterra, perseguido pela justa indignação de seu povo, proclame-se também vassalo daquela Igreja a quem ele tão cruelmente havia vexado, seguro de encontrar nela o asilo e o perdão que os homens lhe negavam? Que, além dos dois reinos mencionados, os de Navarra, Portugal, Escócia, Hungria e Dinamarca se sentissem honrados em pertencer, de algum modo, à Santa Sé por meio de um vínculo de proteção inteiramente especial?
Ninguém ignorava que, para Inocêncio, o direito dos reis, com respeito à Igreja, era tão sagrado quanto o desta a respeito daqueles. O culto que tributava à equidade ia unido a uma elevada e previdente política, imitando nisso seus ilustres predecessores.

Por isso, opondo-se à incorporação do império por herança na casa de Suábia, sustentando a liberdade das eleições na Alemanha, foi como salvou este nobre país da centralização monárquica que, alterando sua natureza, teria afogado todos os germes da prodigiosa fecundidade intelectual de que, justamente, ufanava-se.

Assim, restaurando e defendendo com infatigável constância a autoridade temporal da Santa Sé, assegurou a independência da Itália, não menos que a da Igreja. Com seu exemplo e seus preceitos, formou toda uma geração de pontífices igualmente aditos a esta independência e dignos auxiliares seus – como o foram Stephen Langton, na Inglaterra, Henrique de Gnesen, na Polônia, Rodrigo de Toledo, na Espanha, Foulquet de Tolosa, em meio aos hereges; ou dignos de morrerem mártires desta causa santa – como São Pedro Parentício e Pedro de Castelnau (ambos mortos em mãos dos hereges; o primeiro em Oviedo, em 1199, e o segundo em Languedoc, em 1209).

Sua gloriosa vida termina com aquele célebre concílio de Latrão (1215-1216), que convocou e presidiu. Sua maior obra espiritual foi apresentar ao orbe cristão as duas grandes instituições ou ordens religiosas de São Domingos e São Francisco, que deveriam infundir-lhe uma nova vida, e que Inocêncio III teve a glória de ver nascer, ambas sob seu pontificado.


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