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Giovanni Pico della Mirandola

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Santiago Bovisio

Uma das figuras mais debatidas no mundo literário e filosófico é a de Giovanni Pico della Mirandola. Nem mesmo o esplendor do nascente e glorioso Renascimento conseguiu dissipar completamente as trevas medievais de engano e superstição que envolveram a figura deste homem. Pico foi verdadeiramente um dos elos principais entre a era medieval, em seu ocaso, e o Renascimento em plena ascensão.

Tudo o que cercou seu nascimento e infância possuía, talvez por isso, um aspecto sombrio e antiquado. Tal era o Castelo de Mirandola, com suas torres pontiagudas, muralhas altas e sem adornos, e pontes elevadiças rangentes, situado entre as montanhas escuras da Toscana central.

Nascido em uma antiga família de nobre estirpe, destinada à guerra e às armas, este foi o ambiente que o rodeou desde a infância. No entanto, ocorre um milagre. O menino, de longos cabelos loiros, olhos azuis profundos e um rosto ovalado e delicado, destacava-se entre todos. Os guerreiros rudes, habituados a gritar e proferir blasfêmias, não ousavam levantar a voz em sua presença.

Sua doçura impunha-se, sua modéstia cativava e sua beleza física resplandecia como uma chama que emanava uma luz interior. Tudo o que era velho e tradicional o aborrecia: as guerras, os costumes, os modos de vida. O único aspecto antigo que ele amava eram os livros. E, como se de um manancial puro brotassem, fluíam dos lábios do menino, de forma espontânea, as mais belas poesias.

Ninguém podia com ele. Sua doçura vencia a todos. Seu pai, inicialmente relutante, resignou-se a não transformá-lo nem em homem de armas, nem em sacerdote, mas a deixá-lo seguir livremente suas quimeras.

E Pico não tinha mais do que dez anos. Contudo, já representava toda uma nova expressão, uma imagem viva do Renascimento, para o qual tanto contribuiria. Aos catorze anos, já estava em Bolonha, debatendo questões de direito canônico com os mais velhos doutores, desafiando os escolásticos e decantando a filosofia grega.

Mas havia ainda mais. Nessa idade, já havia sido laureado. Quem poderia saciar sua sede de conhecimento? O mundo era pequeno demais para ele; o tempo, breve.

Ano após ano, como um peregrino do saber, percorreu todas as universidades, conheceu todos os centros de estudo e assistiu às cátedras dos sábios mais renomados da época. Essa peregrinação intelectual durou sete anos.

Diz-se que, aos dezoito anos, Pico já dominava vinte e dois idiomas e conhecia todas as ciências oficiais de sua época. Onde poderia fixar-se esse renascentista, senão em Florença, berço da nova era e viveiro de homens de ciência, arte e letras?

Lourenço, o Magnífico, duque de Florença, desenvolveu um profundo afeto por esse sábio adolescente e não conseguia separar-se dele. Não compunha poesias nem as publicava sem antes submetê-las à aprovação de Pico. Apesar das insinuações maliciosas lançadas sobre a intimidade desses dois amigos, essa foi uma das mais belas e duradouras amizades, interrompida apenas pela morte – e por um curto período.

Foi nesse contexto que o jovem Pico publicou suas noventa proposições, reunidas sob o título “De Omni Re Scibili”. Estas foram condenadas pelo Papa, uma vez que Pico pretendia estimular o estudo de todas as questões universais e humanas, mas fracassou diante da intransigência eclesiástica.

A obra mais notável de Pico della Mirandola foi sua colaboração com Marsílio Ficino, o grande filósofo platônico, para reviver o estudo e o amor pelos filósofos gregos e para fundar a célebre Academia Florentina. Profundamente religioso e interessado em compreender o lado esotérico do cristianismo, Pico relacionou-se com sacerdotes veneráveis e influenciou Lorenzo de Medici a trazer Girolamo Savonarola de volta a Florença.

Savonarola e Pico eram personalidades totalmente distintas. Contrastavam o aspecto severo e apocalíptico do frade com o porte refinado e senhorial do poeta. No entanto, devia haver entre eles uma profunda aspiração espiritual comum, já que se uniram em estreita intimidade.

Na mesma época, alguns Iniciados do Fogo, adeptos da astrologia, da metapsíquica e da Cabala, também residiam em Florença. Pico, sempre ávido por conhecimento, estudou com afinco as ciências ocultas. Se tivesse vivido alguns anos mais, é provável que tivesse colaborado com eles na fundação da Ordem Secreta dos Frates Lucis, instituída em 1498.

Mas sua missão já estava cumprida. A filosofia grega estava no auge e firmemente estabelecida. Por séculos, os homens continuariam a estudá-la e admirá-la. Pico podia agora retirar-se para os mundos superiores.

Lourenço, o Magnífico, havia falecido em 1492, e seu outro grande amigo, o poeta Angelo Poliziano, morreu em 29 de setembro de 1494. Em 17 de novembro desse mesmo ano, aos 31 anos, enquanto Carlos VIII entrava com um poderoso exército na cidade de Florença, este grande iniciado deixava o plano terrestre.

Meses antes, a vidente savonaroliana Camilla Rucellai havia predito o momento de sua morte, e Pico, tomado pelo medo, procurou ingressar na ordem dominicana. No entanto, adiando essa decisão de um dia para o outro, não conseguiu realizá-la. Ainda assim, em seu leito de morte, assim como Poliziano, pediu ao amigo Savonarola que o enterrasse com o hábito branco e negro da Ordem dos Pregadores, e Savonarola cumpriu sua promessa.

Embora não se possa afirmar com certeza se Pico della Mirandola tinha plena consciência da grande missão que os Iniciados do Fogo lhe conferiram na Terra, é certo que ele a reconheceu no instante de sua morte. De seu convento, enquanto estava em oração, Camilla Rucellai viu a alma de Pico elevar-se aos céus, envolta por uma aura de fogo.


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