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Dhammapada: O Caminho da Sabedoria do Buddha

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Buda Shakyamuni

Tradução e notas: Acharya Buddharakkhita
Tradução portuguesa de Bhikkhu Dhammiko

O Dhammapada (“Os Versículos do Darma”) é considerado por muitos como o melhor dos clássicos budistas. É uma coleção de ditos do Siddhartha Gautama em forma de verso e tornou-se uma das escrituras budistas mais lidas e conhecidas. A versão original do Dhammapada está no Khuddaka Nikaya, uma das partes do Cânon Pali do Budismo Theravada.

SUMÁRIO

Publicações – Mosteiro Budista Theravada
A edição da versão portuguesa do Dhammapada, traduzido
pelo Venerável Dhammiko Bhikkhu é uma oferta de Dhamma do
grupo Kataññutā da Malásia, de Singapura e da Austrália ao qual
expressamos a nossa gratidão por tornar possível esta publicação
para distribuição gratuita.

O “The Dhammapada: The Buddha’s Path of Wisdom”,
com tradução do pāli por Acharya Buddharakkhita foi editado
em 1985, pelo Buddhist Publication Society.

Termos de uso: Pode-se copiar, reformatar, reimprimir, re-publicar, e redistribuir este trabalho por qualquer meio, desde que: (1) sejam disponíveis gratuitamente e, no caso de reimpressão, apenas em quantidades não superiores a 50 cópias, (2) que quaisquer edições derivadas deste trabalho indiquem claramente que (incluindo traduções) são derivados deste documento original, e (3) se incluir o texto integral desta licença em quaisquer cópias ou derivados deste trabalho. Caso contrário, todos os direitos são reservados. Para obter informações adicionais sobre esta licença, consulte a secção FAQ em www.accesstoinsight.org

Prefácio

O Dhammapada é o texto mais conhecido e o mais respeitado do Tipitaka Pāli, as Sagradas Escrituras do Budismo Theravada. A obra está incluída no Khuddaka Nikaya (“Colecção Menor”) do Sutta Pitaka, mas a popularidade que ganhou elevou-a para as fileiras de um clássico do mundo religioso, muito acima do simples lugar que ocupa nas escrituras. Composta em antigo idioma pāli, esta sucinta antologia de versos constitui um compêndio perfeito de ensinamentos do Buddha, compreendendo em sua dissertação todos os princípios essenciais elaborados ao longo dos quarenta e tantos volumes do Cânone Pāli.

De acordo com a Tradição Budista Theravada, cada verso do Dhammapada foi originalmente proferido pelo Buddha como respostas a episódios específicos. Relatos destes, juntamente com a exegese dos versos são preservados no comentário clássico da obra, compilados pelo grande erudito Bhadantacariya Buddhaghosa no século V a.C., assente em textos que remontam a tempos muito antigos. O conteúdo dos versos, no entanto, transcende as circunstâncias limitadas e particulares da sua origem, alcançando através dos tempos, vários tipos de pessoas em diversas situações da vida. Para o simples e humilde, o Dhammapada é um bom conselheiro; para o exigente intelectual, os ensinamentos claros e directos inspiram respeito e reflexão; para aquele que busca com sinceridade, funciona como uma fonte perene de inspiração e instrução prática. As compreensões que brilharam no coração do Buddha, cristalizaram-se nestes versos luminosos de pura sabedoria. Como expressões profundas de espiritualidade, cada verso é uma directriz para um viver correcto. O Buddha de uma forma inequívoca salientou que quem praticasse sinceramente os ensinamentos encontrados no Dhammapada, provaria da felicidade da libertação.

Devido à sua profunda importância, o Dhammapada tem sido traduzido em várias línguas. Só em inglês há várias traduções, incluindo edições de eruditos como Max Muller e Dr. S. Radhakrishnan. No entanto, quando apresentado a partir de uma perspectiva de referência não-budista, os ensinamentos do Buddha, inevitavelmente, sofrem algumas distorções. Isso, na verdade, já aconteceu com a nossa antologia: uma selecção infeliz de versões tem sugerido por vezes interpretações incorrectas, a par de alguns comentários críticos. A presente tradução foi escrita, originalmente, no final dos anos de 1950. Alguns anos antes, consultada uma publicação do Dhammapada em língua inglesa, observou-se que as interpretações eram demasiado livres e imprecisas ou então muito académicas e, portanto, houve a necessidade de fazer uma nova tradução, evitando estes dois extremos, no sentido de servir um propósito valioso. O resultado final deste projecto, aqui apresentado, é uma humilde tentativa de um praticante seguidor do Buddha transmitir o espírito e conteúdo, bem como a linguagem e estilo, dos ensinamentos originais.

Na preparação deste volume consultei inúmeras edições e traduções do Dhammapada em várias línguas, incluindo o sânscrito, o hindi, o bengali, cingalês, birmanês e nepalês. Beneficiei particularmente das excelentes traduções da obra do falecido Venerável Narada Mahathera de Vajirarama, Colombo, Sri Lanka, e do Professor Bhagawat de Poona, Índia, aos quais deixo o meu profundo agradecimento.

Uma primeira edição desta tradução foi publicada em 1959 e uma segunda em 1966, ambas pela Maha Bodhi Society, em Bangalore, Índia. Para esta terceira edição, a tradução tem sofrido considerável revisão. O subtítulo recentemente adicionado, “O Caminho da Sabedoria do Buddha” não é literal, mas plenamente aplicável tendo em conta que os versos do Dhammapada têm origem na sabedoria do Buddha e guiam aqueles que seguem uma vida inspirada nessa sabedoria.

Estou grato aos editores da Buddhist Publication Society pelas suas úteis sugestões, e à própria sociedade pela forma geerosa com que empreendeu a publicação deste trabalho.

Faço esta oferta de Dhamma em memória de gratidão aos meus professores, pais e parentes falecidos e aos ainda vivos. Que eles possam encontrar o caminho na Dispensação do Buddha e atingir o Nibbāna!

Que todos os seres possam ser felizes!

Acharya Buddharakkhita

Yamakavagga: Os Pares

1. A mente antecede todos os estados mentais. A mente é o seu criador, pois são todos forjados pela mente. Se uma pessoa fala ou age com uma mente impura, o sofrimento segue-a como a roda que segue o pé do boi.

2. A mente antecede todos os estados mentais. A mente é o seu criador, pois são todos forjados pela mente. Se uma pessoa fala ou age com uma mente pura, a felicidade segue-a como uma sombra que jamais a abandona.

3. “Ele abusou de mim, ele bateu-me, ele dominou-me, ele roubou-me”. Aqueles que abrigam tais pensamentos não acalmam o seu ódio.

4. “Ele abusou de mim, ele bateu-me, ele dominou-me, ele roubou-me”. Aqueles que não abrigam tais pensamentos acalmam o seu ódio.

5. Neste mundo o ódio nunca é apaziguado pelo ódio. O ódio é apaziguado unicamente através de não-ódio. Esta é uma lei eterna.

6. Há aqueles que não percebem que um dia todos nós morreremos. Mas aqueles que percebem isso resolvem as suas desavenças.

7. Assim como uma tempestade deita abaixo uma árvore fraca, o mesmo sucede quando Mara(a) vencer o homem que vive para a busca de prazeres, descontrolado nos seus sentidos, imoderado no comer, indolente, e disperso.

8. Assim como uma tempestade não abala uma montanha rochosa, da mesma forma Mara jamais controla o homem que vive a meditar sobre o que é impuro(b), que tem controlo nos seus sentidos, moderado no comer, cheio de fé e esforço sincero.

9. Quem for depravado, destituído de auto-domínio e veracidade, ao vestir o hábito amarelo do monge, certamente não é digno dele.

10. Mas quem quer que se tenha depurado da depravação, bem estabelecido nas virtudes e pleno de auto-domínio e veracidade, é na realidade digno do hábito amarelo.

11. Aqueles que confundem o que não é essencial como sendo essencial e o que é essencial com não sendo essencial, nutrindo pensamentos errados, nunca chegarão ao que é essencial.

12. Aqueles que conhecem o essencial como sendo essencial e aquilo que não é essencial como não essencial, nutrindo pensamentos correctos, chegarão ao essencial.

13. Assim como a chuva penetra na casa mal coberta de colmo, também a paixão penetra numa mente pouco vigiada.

14. Assim como a chuva não penetra numa casa bem coberta de colmo, também a paixão jamais penetra uma mente bem vigiada.

15. Aquele que faz o mal sofre no presente e no futuro, sofre em ambos os mundos. Lembrando-se dos seus actos impuros, ele lamenta e fica aflito.

16. Aquele que faz o bem, alegra-se no presente e no futuro, alegra-se em ambos os mundos. Relembrando as suas acções puras, ele se alegra-se e exulta.

17. Aquele que faz o mal sofre no presente e no futuro, sofre em ambos os mundos. O pensamento “Eu fiz mal” atormenta-o e sofre ainda mais quando renascer nos reinos de aflição.

18. Aquele que faz o bem rejubila no presente e no futuro, é feliz em ambos os mundos. O pensamento “Eu fiz o bem”, encanta-o e deleita-se ainda mais quando renascer nos reinos de felicidade.

19. Por muito que recite os textos sagrados, se não agir nesse sentido, o homem descuidado é como um pastor que só conta as vacas dos outros ele não beneficia das bênçãos da vida santa.

20. Por pouco que recite os textos sagrados, se o homem colocar o Ensinamento em prática, abandonando a luxúria, o ódio e a ilusão, com verdadeira sabedoria e espírito livre, apegado a nada deste ou de qualquer outro mundo ele realmente participa das bênçãos de uma vida santa.

Appamādavagga: A Diligência

21. A diligência é o caminho para a imortalidade(c). A negligência é o caminho para a morte. Os conscientes não morrem. Os inconscientes são como se já estivessem mortos.

22. O sábio, entendendo claramente a excelência da diligência, exulta e compraz-se na companhia dos Nobres(d).

23. Os sábios, sempre meditativos e firmemente perseverantes, experimentam sozinhos o Nibbāna, a incomparável liberdade da escravidão.

24. A glória cresce sempre naquele que é enérgico, consciente e puro em conduta, com discernimento e auto-domínio, justo e diligente.

25. Com esforço e diligência, disciplina e auto-domínio, deixai o sábio criar para si uma ilha que dilúvio nenhum possa invadir.

26. Os tolos e ignorantes entregam-se à negligência, mas o sábio mantém a diligência como seu melhor tesouro.

27. Não dês azo à negligência. Não te entregues aos prazeres sensuais. Só quem é diligente e medita é que alcança grande felicidade.

28. Tal como alguém que observa do topo de uma montanha os pequenos humanos em baixo, na terra, assim também sempre que o sábio troca a negligência por diligência e sobe a alta torre da sabedoria, este sábio, liberto da tristeza contempla a multidão tola e sofredora.

29. Consciente entre os inconscientes, bem desperto entre os sonolentos, o homem sábio, avança tal como um cavalo veloz ultrapassa os que são lentos.

30. Foi por diligência que Indra(e) se tornou o soberano dos deuses. A diligência sempre é elogiada, e a negligência sempre desprezada.

31. O monge que se compraz na diligência e olha com medo para a negligência, avança como o fogo, queimando todos os grilhões, pequenos e grandes.

32. O monge que se compraz na diligência e olha com medo para a negligência, não vai cair. Está próximo do Nibbāna.

Cittavagga: A Mente

33. Assim como um arqueiro endireita a haste da flecha, também o homem firme endireita a sua mente volúvel e instável, tão difícil de domar.

34. Tal como um peixe que retirado da água, salta e estrebucha, também assim é esta mente agitada. Por isso mesmo se deve abandonar o reino de Mara.

35. Maravilhoso é na realidade, domar a mente, tão difícil de subjugar, sempre veloz e apossando-se de tudo o que deseja. Uma mente controlada traz a felicidade.

36. Deixai que o homem sensato vigie a sua mente, tão difícil de detectar e extremamente subtil, apossando-se de tudo o que deseja. Uma mente vigiada traz a felicidade.

37. Permanecendo na gruta (do coração), a mente, sem forma, deambula longe e sozinha. Aqueles que subjugam esta mente ficam libertos das cadeias de Mara.

38. A sabedoria nunca será perfeita na mente sem determinação, que não conhece o Bom Ensinamento e cuja fé oscila.

39. Não existe medo para aquele que despertou, cuja mente não está embriagada (pela luxúria) nem aflita (pelo ódio), e que superou tanto o mérito(f) como o demérito.

40. Percebendo que este corpo é tão frágil como um vaso de barro, e fortalecendo esta mente como uma cidade bem fortificada, combate Mara com a espada da sabedoria. Depois preservando a conquista, mantém-te em desapego.

41. Cautela! Em breve este corpo se deitará sobre a terra, ignorado e sem vida, como um tronco inútil.

42. Seja qual for dano que possa causar entre dois inimigos, uma mente mal dirigida inflige a si mesma um dano ainda maior.

43. Nem mãe, nem pai, nem qualquer outro parente, ninguém pode fazer um bem maior do que cada um a si próprio, com a sua mente bem orientada.

Pupphavagga: As Flores

44. Quem vencerá esta terra, este reino de Yama, esta esfera de homens e deuses? Quem alcançará a perfeição no bem ensinado caminho da sabedoria, tal como a florista faria com perfeição o seu arranjo floral?

45. Aquele que se esforça no caminho(g) há-de superar esta terra, este reino de Yama e esta esfera de homens e deuses. Aquele que se esforça no caminho há-de levar à perfeição o bem ensinado caminho da sabedoria, assim como a florista faria com perfeição o seu arranjo floral.

46. Percebendo que este corpo é como espuma, penetrando na sua natureza ilusória, e arrancando as flechas de sensualidade de Mara com flores na ponta, segue para além da visão do Rei da Morte!

47. Assim como uma inundação poderosa leva de enxurrada a aldeia que dorme, também a morte leva de enxurrada a pessoa de mente distraída que só arranca as flores (do prazer).

48. O Destruidor traz sob sua influência a pessoa de mente distraída que, insaciável em desejos sensuais, apenas arranca as flores (do prazer).

49. Assim como a abelha recolhe o mel da flor sem ferir sua cor ou fragrância, assim vai o sábio(h) na sua ronda a recolher comida na vila.

50. Que ninguém procure o defeito nos outros; que ninguém observe as omissões e acções dos outros. Mas observemos os nossos próprios actos.

51. Tal como uma flor bonita cheia de cores mas sem fragrância, da mesma maneira, infrutíferas são as palavras justas de quem não as pratica.

52. Tal como uma flor bonita cheia de cor e também fragrância, da mesma maneira, frutuosas são as palavras justas de quem as pratica.

53. Assim como de um grande molhe de flores se podem fazer muitos arranjos florais, também muitas acções boas deviam ser feitas por quem nasce mortal.

54. Não é o doce cheiro das flores, nem sequer a fragrância do sândalo, tagara(i), ou do jasmim que sopra contra o vento. Mas a fragrância do virtuoso sopra contra o vento. Na verdade, o homem virtuoso atravessa todas as direcções com a fragrância da sua virtude.

55. De todas as fragrâncias – sândalo, tagara, lótus azul e jasmim – a mais doce de todas é a da virtude.

56. Débil é a fragrância de tagara e sândalo, mas excelente é a fragrância do virtuoso, flutuando até por entre os deuses.

57. Mara nunca consegue encontrar o caminho de quem é verdadeiramente virtuoso, que persevera diligentemente e que se liberta pelo conhecimento perfeito.

58. Sobre um monte de esterco na valeta à beira da estrada, cresce um lótus, agradável e com fragrância.

59. Da mesma maneira, no monte de esterco dos cegos mortais, o discípulo d’Aquele que se Iluminou de forma Exímia brilha resplandecente em sabedoria.

Bālavagga: O Louco

60. Longa é a noite para aquele que não dorme; longa é a légua para o fatigado. Longa é a existência mundana para os tolos que não conhecem a Verdade Sublime.

61. Se aquele que busca não encontra companhia melhor ou igual, deixá-lo perseguir resolutamente um caminho solitário, não tem que se associar aos tolos.

62. O tolo preocupa-se, pensando: “Eu tenho filhos, eu tenho riqueza”. Na verdade, se nem ele próprio pertence a si próprio, quanto mais os filhos, ou a riqueza?

63. Um tolo que conhece a sua loucura é sábio, pelo menos até esse ponto, mas um tolo que se julga sábio é seguramente um tolo.

64. Mesmo que um tolo se associe toda a sua vida com um homem sábio, ele não compreende a verdade mais do que a colher prova o sabor da sopa.

65. Mesmo que por apenas um momento, uma pessoa com discernimento se associe a um homem sábio, ela rapidamente compreende a verdade como a língua saboreia o sabor da sopa.

66. Tolos de fraco discernimento são inimigos para si próprios, sempre que se movimentam fazem coisas más, cujos frutos serão amargos.

67. Mal feita é aquela acção que a seguir traz o arrependimento, cujo fruto que se colhe com lágrimas.

68. Bem-feita é aquela acção que a seguir não traz o arrependimento, cujo fruto se colhe com alegria.

69. Enquanto uma má acção não tiver amadurecido o tolo acha-a doce como mel. Mas quando a má acção amadurece, o tolo entra em aflição.

70. Mês após mês, um tolo pode comer o seu alimento com a ponta de uma folha de grama, mas, ainda assim não tem o mérito nem da décima sexta parte daqueles cujo pensamento se alimenta da Verdade.

71. Verdadeiramente, assim como o leite não azeda de repente, também cometido um mau acto não frutifica imediatamente, mas latente, segue o tolo como fogo coberto por cinzas.

72. Para sua própria ruína, o tolo ganha conhecimento, pois abre uma fenda na cabeça e destrói a sua bondade inata.

73. O tolo busca prestígio imerecido, precedência entre os monges, autoridade sobre mosteiros, e honra entre chefes de família.

74. “Que os leigos e monges pensem que fui eu que fiz. Em toda a obra, grande e pequena, que eles me sigam”tal é a ambição do tolo; assim aumenta o seu desejo e orgulho.

75. Um coisa é a busca de ganho mundano, outra coisa bem diferente é o caminho para o Nibbāna. Que o monge, discípulo do Buddha, entenda isso claramente, não se deixe levar pela aclamação do mundo, mas em seu lugar cultive o desapego.

Paṇḍitavagga: O Sábio

76. Se alguém encontrar um homem que aponta as falhas e que reprova, que pessoa tão sábia e sagaz seja seguida como um guia para o tesouro escondido. Cultivar tal associação é sempre melhor e nunca pior.

77. Deixai-o alertar, instruir e proteger alguém do que é errado, ele na verdade é querido para os bons e detestável para os maus.

78. Não te associes com más companhias; não procures o que é vil. Associa-te com os bons amigos, procura a companhia de homens nobres.

79. Aquele que segue profundamente o Dhamma vive feliz com uma mente tranquila. O homem sábio sempre se deleita no Dhamma dado a conhecer pelo Nobre Senhor (o Buddha).

80. Os construtores de canais regulam os rios; os arqueiros endireitam o eixo das flechas; os carpinteiros dão forma à madeira; os sábios controlam-se a si próprios.

81. Assim como uma rocha sólida não é abalada pela tempestade, da mesma forma o sábio não se deixa afectar por louvor ou culpa.

82. Ao ouvir o Ensinamento, os sábios tornam-se naturalmente purificados, tal como um lago profundo, claro e sereno.

83. Aquele que é bom renuncia (desapego) a tudo. O virtuoso não faz conversa vã sobre desejos de prazeres. Os sábios não mostram euforia ou depressão quando tocados pela felicidade ou tristeza.

84. É realmente virtuoso, sábio e justo, aquele que nem para a sua própria causa, nem para a causa de outrem (faz nada de errado), anseia por filhos, riqueza, ou reino, e não deseja sucesso por meios injustos.

85. Poucos entre os homens são aqueles que atravessam para a outra margem. O resto, a maior parte, apenas corre para cima e para baixo na margem de cá.

86. Mas aqueles que agem de acordo com o Dhamma perfeitamente instruídos, atravessarão o reino da morte, tão difícil de atravessar.

87-88. Ao abandonar o caminho escuro, que o homem sábio cultive o caminho brilhante. Tendo saído de casa para a mendicidade, possa ansiar pelo deleite no desapego, tão difícil de apreciar. Deixando os prazeres sensuais, sem apego, que o homem sábio se limpe das impurezas da mente.

89. Aqueles cujas mentes atingiram a excelência total nos Sete Factores de Iluminação, que, tendo renunciado à ganância se alegram no desapego – livres de obstáculos(j), brilhando com sabedoria, alcançam o Nibbāna nesta mesma vida.

Arahantavagga: O Arahant ou Aperfeiçoado

90. A febre da paixão não existe para aquele que tenha concluído a jornada, que não tem tristezas e está totalmente liberto, que quebrou todos os laços.

91. Aqueles que são conscientes esforçam-se. Eles não estão apegados a lar algum, como cisnes que abandonam o lago, eles deixam para trás casa após casa.

92. Aqueles que não acumulam e que são sábios quanto a comida, cujo objecto é o Nada, a Liberdade Incondicional – o seu rasto não se consegue descobrir, tal como o dos pássaros no ar.

93. Aquele cujas impurezas são destruídas e não está apegado à comida, cujo objecto é o Nada, a Liberdade Incondicional
– o seu caminho não se consegue descobrir, como o dos pássaros no ar.

94. Até mesmo os deuses reverenciam o sábio, cujos sentidos estão dominados como cavalos bem treinados pelo cocheiro, cujo orgulho é destruído e que está livre de impurezas.

95. Não existe mais existência mundana para o sábio que, como a terra, de nada se ressente, que é firme como um pilar alto e tão puro como um poço profundo livre de lama.

96. Calmo é o seu pensamento, calmo é o seu discurso e calma a sua acção, daquele que, conhecendo verdadeiramente, está totalmente livre, tranquilo e sábio.

97. O homem que não tem fé cega, que conhece o Incriado, que cortou todas os laços, destruiu todas as causas (para o kamma, bom e mau), e deitou fora todos os desejos – ele, na verdade, é o mais excelente dos homens(k).

98. Inspirador, na verdade, é aquele lugar onde habitam
Arahants, seja uma aldeia, uma floresta, um vale, ou uma colina.

99. Inspiradoras são as florestas onde as pessoas mundanas não encontram prazer. Aí, os livres de paixão alegrar-se-ão, pois eles não buscam prazeres sensuais.

Sahassavagga: Os Milhares

100. Melhor do que mil palavras inúteis é uma palavra útil, com a escuta da qual, se alcança a paz.

101. Melhor do que mil versos inúteis, é um verso útil, com a escuta do qual, se alcança a paz.

102. Melhor do que recitar uma centena de versos sem sentido é o recitar um verso do Dhamma, com a escuta do qual, se alcança a paz.

103. Embora se possa conquistar mil homens mil vezes em batalha, contudo aquele que se vence a si mesmo é sem dúvida o mais nobre dos vencedores.

104-105. A auto-conquista é de longe melhor que a conquista de outros. Nem mesmo um deus, um anjo, Mara ou Brahma(l) pode transformar em derrota a vitória de uma pessoa com auto-
-domínio, sempre com controlo na conduta.

106. Mesmo que mês após mês, mesmo que por cem anos se oferecessem sacrifícios aos milhares, contudo, se apenas por um momento se reverenciassem aqueles de mentes aperfeiçoadas, essa honra é sem dúvida melhor do que um século de sacrifício.

107. Mesmo que se observasse o sacrifício do fogo na floresta por cem anos, contudo, se apenas por um momento se reverenciassem aqueles de mentes aperfeiçoadas, essa reverência é sem dúvida melhor do que um século de sacrifício.

108. Quaisquer presentes e oblações, que alguém ofereça neste mundo por um ano inteiro em busca de mérito, nada disso vale, nem um quarto do mérito obtido por reverenciar os Justos, o que é verdadeiramente excelente.

109. Para aquele sempre pronto a reverenciar e servir os mais velhos, estas quatro bênçãos resultam: vida longa, felicidade, beleza e poder.

110. Vale mais viver um dia virtuoso e meditativo do que viver cem anos, imoral e descontrolado.

111. Vale mais viver um dia sábio e meditativo do que viver cem anos, tolo e descontrolado.

112. Vale mais viver um dia diligente e resoluto do que viver cem anos, preguiçoso e disperso.

113. Vale mais viver um dia a ver a ascensão e a queda das coisas do que viver cem anos sem nunca ver a ascensão e a queda das coisas.

114. Vale mais viver um dia a ver a Realidade Imortal do que viver cem anos sem nunca ver a Realidade Imortal.

115. Vale mais viver um dia a ver a Verdade Suprema do que viver cem anos sem nunca ver a Verdade Suprema.

Pāpavagga: O Mal

116. Sê diligente a fazer o bem; refreia a tua mente de fazer o mal. Quem é lento a fazer o bem, sua mente deleita-se no mal.

117. Se uma pessoa cometer o mal, que ela não o repita. Que não encontre aí prazer, pois penosa é a acumulação do mal.

118. Se uma pessoa fizer o bem, que o faça repetidamente. Que aí encontre prazer, pois abençoada é a acumulação do bem.

119. Tudo pode correr bem com aquele que faz o mal, enquanto o mal não amadurece. Mas quando o mal amadurece, o malfeitor vê (penosos resultados) as suas más acções.

120. Tudo pode correr mal com aquele que faz o bem, enquanto o bem não amadurece. Mas quando o bem amadurece, então o benfeitor vê (bons resultados) as suas boas acções.

121. Que não se pense levianamente acerca do mal, dizendo: “A mim ele não me tocará.” A água que cai em gotas enche um cântaro. Da mesma forma, o tolo, pouco a pouco, enche-se de mal.

122. Que não se pense levianamente acerca do bem, dizendo: “A mim ele não me tocará.” A água que cai em gotas enche um cântaro. Da mesma forma, o sábio, pouco a pouco, enche-se de bem.

123. Assim como um comerciante com uma escolta pequena e grande riqueza evitaria uma rota perigosa, ou como quem deseja viver evita o veneno, da mesma maneira se deve evitar o mal.

124. Se na mão não existe nenhuma ferida, até veneno nela pode levar. O veneno não afecta quem está livre de feridas. Para quem não faz o mal, não existe prejuízo.

125. Tal como poeira fina atirada contra o vento, o mal vai para cima do tolo que ofende um homem inofensivo, puro e inocente.

126. Alguns nascem no ventre; os maldosos nascem no inferno; os devotos vão para o céu; o puro passa para o Nibbāna.

127. Nem no céu nem no meio do oceano, nem entrando nas fendas da montanha, não há lugar algum no mundo, onde se possa libertar dos resultados das más acções.

128. Nem no céu nem no meio do oceano, nem entrando nas fendas da montanha, não há lugar algum no mundo, onde se possa escapar da morte.

Daṇḍavagga: A Violência

129. Todos tremem diante da violência; todos temem a morte. Colocando-se no lugar do outro, não se deve matar, nem levar alguém a matar.

130. Todos tremem diante da violência, a vida é querida a todos. Colocando-se no lugar do outro, não se deve matar, nem levar alguém a matar.

131. Aquele que, ao buscar a felicidade, oprime com violência outros seres que também desejam a felicidade, não alcançará felicidade daí em diante.

132. Aquele que, ao buscar a felicidade, não oprime com violência outros seres que também desejam a felicidade, encontrará felicidade daí em diante.

133. Que não se fale asperamente a ninguém, pois aqueles a quem se fala podem retaliar. Em verdade, o discurso irado dói, e a retaliação pode avassalar.

134. Se, como um gongo quebrado, a pessoa silenciar, aproxima-se do Nibbāna, porque nela já não mora a vingança.

135. Assim como um pastor conduz o gado ao pasto com um cajado, também a velhice e a morte conduzem a força da vida dos seres (de existência em existência).

136. Quando o tolo comete maldades, ele não percebe (a sua má). natureza O homem insensato é atormentado por seus próprios actos, como queimado pelo fogo.

137. Aquele que inflige violência sobre os desarmados, e ofende os inofensivos, logo chegará a um destes dez estados:

138-140. Dor aguda, ou desastre, lesão corporal, doença grave, ou perturbação mental, problemas que advêm do governo, ou graves acusações, perda de parentes, ou perda de riqueza, ou casas destruídas assoladas pelo fogo; após a dissolução do corpo esse homem ignorante nasce no inferno.

141. Nem caminhando nu, nem cabelos emaranhados, nem lama, nem jejum, nem deitando-se no chão, nem cobrindo-se de cinzas e poeira, nem sentado sobre os calcanhares (em penitência) pode purificar um mortal que não tenha superado a dúvida.

142. Mesmo que se apresente ricamente vestido, se for calmo, controlado e estabelecido na vida santa, tendo posto de lado a violência contra todos os seres – esse, verdadeiramente, é um homem santo, um renunciante, um monge.

143. Raro é o um homem neste mundo que, comedido por modéstia, evita qualquer censura, como um cavalo puro-sangue evita o chicote.

144. Tal como um cavalo puro-sangue tocado pelo chicote, sê diligente, cheio de vontade espiritual. Pela fé e pureza moral, pelo esforço e pela meditação, pela investigação da verdade, por ser rico em conhecimento e virtude, e por ser consciente, destrói este sofrimento ilimitado.

145. Os construtores de canais regulam as águas, os arqueiros endireitam os eixos das flechas, os carpinteiros dão forma à madeira, e os bons dominam-se a si próprios.

Jarāvagga: A Velhice

146. Estando este mundo sempre a arder, porquê as risadas, porquê este júbilo? Envolto em trevas, consegues ver a luz?

147. Observa este corpo uma imagem pintada, uma massa de chagas amontoadas, adoentado, cheio de ansiedade do qual nada é duradouro ou estável!

148. Totalmente desgastado está este corpo, um ninho de doença e frágil. Esta massa putrefacta desintegra-se, porque a morte é o fim da vida.

149. Estes ossos cor de pomba são como cabaças espalhadas no Outono. Tendo-as visto, como pode uma pessoa procurar o deleite?

150. Esta cidade (corpo) é construída de ossos, repleta de carne e sangue; dentro jazem a decadência e a morte, o orgulho e a inveja.

151. Mesmo os belíssimos carros reais acabam por se desgastar, e na verdade, também este corpo se desgasta. Mas o Dhamma (o Bem) não envelhece; assim os Bons dão-no a conhecer aos bons.

152. O homem de pouca educação envelhece como um touro. Cresce apenas no físico, mas, a sua sabedoria não cresce.

153. Em vão vagueei durante muitos nascimentos no saṃsāra, buscando o construtor desta casa (da vida). Repetidos nascimentos são sem dúvida sofrimento!

154. Ó construtor da casa, estás à vista! Não construirás esta casa de novo. Pois as tuas vigas estão quebradas e a cumeeira esmagada. Minha mente atingiu o Incondicionado; alcancei a destruição do desejo(m).

155. Aqueles que na juventude não levaram vida santa, ou falharam na prosperidade, definham como velhas garças na lagoa sem peixe.

156. Os que na juventude não levaram vida santa, ou falharam em adquirir riqueza, vivem suspirando sobre o passado, como setas velhas (disparadas) dum arco.

Attavagga: O Eu

157. Se alguém se estima, devia vigiar-se com diligência. Que o homem sábio mantenha a vigília em qualquer uma das três vigílias da noite.

158. Primeiro uma pessoa deve estabelecer-se no que é próprio; só então deve instruir os outros. Assim, o homem sábio não será repreendido.

159. Uma pessoa deve fazer primeiro aquilo que ensina os outros a fazer; se uma pessoa treina os outros, deve ter ela mesma auto-domínio. Difícil na verdade é o auto-domínio.

160. Uma pessoa é na realidade, o protector de si mesmo; quem mais o poderia ser? Totalmente controlada, a pessoa ganha uma mestria difícil de obter.

161. O mal que o homem ignorante faz a si próprio, mal esse nascido e produzido por si, tritura-o como um diamante tritura uma dura pedra preciosa.

162. Assim como uma trepadeira estrangula a árvore onde cresce, assim também, um homem depravado se prejudica a si mesmo como só um inimigo poderia desejar fazer.

163. Fáceis de fazer ao próprio. são as coisas prejudiciais. Mas, são extremamente difíceis de fazer são as coisas benéficas.

164. Quem por causa de pontos de vista perversos, despreza o ensino dos Aperfeiçoados, dos Nobres e Justos esse tolo, tal como o bambu(n), só produz frutos para a auto-destruição.

165. O mal é feito a si mesmo; a si mesmo a pessoa se conspurca. A si mesmo deixa de fazer o mal; a si mesmo a pessoa se purifica. Pureza e impureza dependem de si mesmo; ninguém pode purificar outra pessoa.

166. Que ninguém negligencie o seu próprio bem-estar por causa de outra pessoa, seja qual for a sua grandeza. Entendendo claramente o bem para si próprio, que a pessoa se preste ao bem.

Lokavagga: O Mundo

167. Não sigas o caminho fácil; não vivas descuidadamente; não te agarres a opiniões falsas; não te demores na existência mundana.

168. Eleva-te! vigia o descuido! Leva uma vida correcta. O justo vive feliz tanto neste mundo como no próximo.

169. Leva uma vida justa; não leves uma vida decadente. O justo vive feliz tanto neste mundo como no próximo.

170. Aquele que olha o mundo como uma bolha e uma miragem, esse escapa à vista do Rei da Morte.

171. Vem! Observa este mundo que é como uma carruagem real decorada. Aqui os tolos chafurdam, mas o sábio não se apega.

172. Aquele que tendo sido descuidado deixa de o ser, ilumina este mundo como a lua descoberta de nuvens.

173. Ele, que por boas acções compensa o mal que fez, ilumina este mundo como a lua descoberta de nuvens.

174. Cego é o mundo; aqui apenas alguns possuem o discernimento. Só uns poucos, como pássaros escapando-se da rede, vão para os reinos da felicidade.

175. Cisnes voam no caminho do sol; os homens passam pelo ar através de poderes paranormais; os sábios são levados para longe do mundo depois de vencerem Mara e a sua legião.

176. Para um mentiroso que tenha violado a lei una (da veracidade) que despreza o mundo superior, não há mal que não possa fazer.

177. Na verdade, os avarentos não se deslocarão para os reinos celestiais, nem os tolos de facto louvam a generosidade. Mas o homem sábio alegra-se em dar, e tão só por isso se torna feliz.

178. Melhor do que a soberania exclusiva sobre a terra, melhor do que ir para o céu, melhor ainda do que reinar em todos os mundos é a Fruição supramundana da Entrada na Corrente(o).

Buddhavagga: O Buddha

179. Por que caminho poderás detectar aquele Buddha de alcance infinito que não deixa rasto, cuja vitória jamais pode ser desfeita, a quem nenhuma impureza vencida jamais pode perseguir?

180. Por que caminho poderás detectar aquele Buddha de alcance infinito que não deixa rasto, em quem jamais existe o desejo que perpetua o vir a ser?

181. Os sábios que se dedicam à meditação e que se deliciam na calma da renúncia – tais seres conscientes, Buddhas Supremos, até os deuses os estimam.

182. Difícil é nascer humano, dura é a vida dos mortais. Difícil é ganhar a oportunidade de ouvir a Verdade Sublime, e difícil é de se encontrar o despontar dos Buddhas.

183. Evitar todo o mal, cultivar o bem e purificar a mente Este é o ensinamento dos Buddhas.

184. Permanecer paciente é a maior austeridade. “Nibbāna é supremo”, dizem os Buddhas. Não se é um verdadeiro monge quando se prejudica outra pessoa, nem um verdadeiro renunciante quando se oprime os outros.

185. Não desprezar, não prejudicar, conter-se de acordo com o código da disciplina monástica, moderar-se na comida, viver solitário, devotar-se à meditação este é o ensinamento dos Buddhas.

186-187. Não há desejos sensuais satisfatórios, mesmo que chovam moedas de ouro. Porque os prazeres sensuais dão pouca satisfação e muita dor. Tendo entendido isso, o homem sábio nem mesmo nos prazeres celestiais encontra deleite. O discípulo do Buddha Supremo deleita-se na destruição do desejo.

188. Exclusivamente levados pelo medo, os homens procuram refúgio em muitos lugares montes, florestas, árvores sagradas e santuários.

189. Esse de facto não é o refúgio seguro; não é o refúgio supremo. Não é recorrendo a tal refúgio que se livra de todo o sofrimento.

190-191. Aquele que se refugiou no Buddha, no Ensinamento e no Sangha(p), penetra com sabedoria transcendental as Quatro Nobres Verdades o sofrimento, a causa do sofrimento, a cessação do sofrimento e o Nobre Caminho Óctuplo que conduz à cessação de sofrimento.

192. Isto é na realidade o refúgio seguro, este é o supremo refúgio. Tendo ido para tal refúgio, é livre de todo o sofrimento.

193. Difícil de encontrar é o homem desperto (o Buddha), ele não nasce em qualquer lugar. No lugar onde nasce homem tão sábio, essa comunidade prospera feliz.

194. Bendito é o nascimento dos Buddhas; bendito é a enunciação da doutrina sagrada: bendita é a harmonia no Sangha, e bendita é a busca espiritual daquele que busca a verdade em harmonia.

195-196. Aquele que reverencia os dignos de reverência, os Buddhas e seus discípulos que transcenderam todos os obstáculos e passaram além do alcance da tristeza e lamentação aquele que reverencia tais seres pacíficos e destemidos, o seu mérito não é mensurável.

Sukhavagga: A Felicidade

197. Felizes vivemos, na realidade, amistosos entre as pessoas hostis. Vivemos livres de ódio no meio de pessoas hostis.

198. Felizes vivemos, na realidade, amistosos no meio dos aflitos (de desejo). No meio de pessoas aflitas vivemos livres de aflição.

199. Felizes vivemos, na realidade, livres de avareza no meio de avarentos. No meio de homens gananciosos vivemos livres de avareza.

200. Felizes na realidade, vivemos nós, os que nada possuímos. Alimentadores de felicidade seremos como os Deuses Radiantes.

201. A vitória gera inimizade, os derrotados vivem na dor. Feliz vive o pacífico, descartando tanto a vitória como a derrota.

202. Não há fogo como a luxúria nem crime como o ódio. Não existe doença como os agregados(q) (da existência) nem felicidade como a da paz (Nibbāna).

203. A fome é a pior doença, as coisas condicionadas o pior sofrimento. Sabendo disso como realmente é, o sábio realiza o Nibbāna, a maior felicidade.

204. Saúde é o ganho mais precioso e contentamento a maior riqueza. Uma pessoa de confiança é o melhor parente, Nibbāna a maior felicidade.

205. Tendo saboreado o recolhimento e a paz (do Nibbāna), o discípulo torna-se livre de dor e sem mácula, bebendo profundamente o sabor da felicidade e da Verdade.

206. É bom ver os Justos; viver com eles é sempre uma felicidade. Uma pessoa será sempre feliz ao não encontrar tolos.

207. Na verdade, a pessoa que anda na companhia de tolos sofre de nostalgia. Associar-se com os tolos é sempre penoso, como uma parceria com um inimigo. Mas a associação com os sábios é feliz, semelhante ao encontro com parentes.

208. Portanto, segue o Justo, aquele que é firme, sábio, culto, responsável e devoto. Devia-se seguir unicamente uma pessoa assim, que é verdadeiramente boa e consciente, assim como a lua segue o caminho das estrelas.

Piyavagga: O Afecto

209. Entregar-se a coisas que devem ser evitadas e não se esforçar onde é necessário, quem busca prazeres transitórios e esquece o seu verdadeiro bem, inveja os que se afirmam no seu próprio bem-estar.

210. Não busques intimidade com pessoas queridas, como também com as que não são queridas, pois não ver a pessoa querida e ver a que não é querida, ambos os casos são dolorosos.

211. Assim, não guardes nada que te é querido, pois a separação do que é querido é dolorosa. Não há laços para aqueles que não têm apegos.

212. Do encanto nasce a mágoa, do encanto nasce o medo. Não existe mágoa para quem se encontra totalmente livre de encanto, de onde então o medo?

213. Do afecto nasce a mágoa, do afecto nasce o medo. Não existe mágoa para quem é totalmente livre de afecto, de onde então o medo?

214. Do apego nasce a mágoa, do apego nasce o medo. Não existe mágoa para quem é totalmente livre de apego, de onde então o medo?

215. Da luxúria nasce a mágoa, da luxúria nasce o medo. Não existe mágoa para quem é totalmente livre de luxúria, de onde então o medo?

216. Do anseio nasce a mágoa, do anseio nasce o medo. Não existe mágoa para quem é totalmente livre de anseio, de onde então o medo?

217. As pessoas prezam aquele que encarna a virtude e o discernimento, que tem princípios, que realizou a verdade, e que faz o que deve fazer.

218. Aquele que tem como objectivo o Inefável (Nibbāna), vive com a mente inspirada (pela sabedoria supramundana), e não mais é condicionado pelo prazer dos sentidos – tal homem é chamado “aquele destinado a atravessar a Corrente”(r).

219. Quando, após uma longa ausência, um homem regressa de longe em segurança, ao chegar a casa, seus parentes, amigos e simpatizantes dão-lhe as boas vindas.

220. Assim como um parente dá as boas vindas à pessoa querida, da mesma maneira as suas boas acções receberão o benfeitor que tenha partido deste mundo para o próximo.

Kodhavagga: A Raiva

221. Uma pessoa devia abandonar a raiva, renunciar ao orgulho, e superar todas as limitações. O sofrimento nunca atinge aquele que é desapegado, que nem se prende à mente nem ao corpo.

222. Aquele que trava a crescente raiva como um cocheiro trava a carruagem em movimento, a esse eu chamo um verdadeiro cocheiro. Os outros meramente seguram as rédeas.

223. Supera a raiva com a serenidade; supera a maldade com a bondade; supera a avareza com a generosidade; supera a mentira com a verdade.

224. Fala a verdade; não te rendas à ira; quando te pedem, dá mesmo que tenhas pouco. Por estes três meios se pode chegar à presença dos deuses.

225. Aqueles sábios inofensivos e sempre com domínio no corpo, vão para a Realidade Imortal, onde, depois de chegados, não se afligem mais.

226. Àqueles sempre vigilantes, que se disciplinam dia e noite, sempre decididos ao Nibbāna – desaparecem as suas impurezas.

227. Ó Atula! Na verdade, este é um dizer antigo, não só de hoje: eles culpam os que permanecem em silêncio, eles culpam os que falam muito, culpam os que falam com moderação. Não há ninguém no mundo que não seja culpado.

228. Nunca houve, nunca haverá, nem há agora, alguém totalmente culpado ou totalmente elogiado.

229. Mas o homem a quem os sábios elogiam, observado dia após dia, encontra-se-lhe carácter impecável, sábio, e dotado de conhecimento e virtude.

230. Quem pode culpar tal pessoa, tão digna como uma moeda de ouro puro? Até os deuses o louvam; Brahma também o enaltece.

231. Que um homem vigie o seu corpo; que seja comedido em acção. Que abandone a má conduta, e exerça actos bons.

232. Que um homem vigie a sua fala; que seja contido a falar. Que abandone a má conduta verbal, e fale correctamente.

233. Que um homem vigie a sua mente; que controle o seu pensamento. Que abandone a má conduta da mente, e pense correctamente.

234. Os sábios têm domínio na acção corporal, no falar e no pensamento. Eles dominam-se verdadeiramente bem.

Malavagga: A Impureza

235. Agora, és como uma folha murcha; os mensageiros da morte aguardam-te. Está na véspera da tua partida, no entanto não arranjaste provisões para a viagem!

236. Ergue uma ilha para ti próprio! Esforça-te bastante e torna-te sábio! Livre de impurezas sem manchas, entrarás na morada celestial dos Justos.

237. A tua vida chegou agora ao fim; estás avançando para a presença de Yama, o rei da morte. No caminho não há nenhum lugar para descansares, no entanto não arranjaste provisões para a tua viagem!

238. Ergue uma ilha para ti! Esforça-te bastante e torna-te sábio! Livre de impurezas e sem manchas, não voltarás ao nascimento e à decadência.

239. Uma por uma, pouco a pouco, a cada momento deveria um homem sábio remover as suas próprias impurezas, tal como um ferreiro remove as impurezas da prata.

240. Assim como a ferrugem corrói a base de onde surge, também, os actos dos transgressores os conduzem a estados de aflição.

241. Não orar é a ruína para as escrituras; negligência é a ruína para uma casa; desleixo é a ruína para a aparência pessoal, e desatenção é a ruína para um guarda.

242. Lascívia é a mácula numa mulher; avareza é a mácula de quem doa. As impurezas, na verdade, são todas coisas más, tanto neste mundo como no próximo.

243. A pior mancha de todas estas é a ignorância, a pior de todas as impurezas. Destruí esta mancha e tornai-vos imaculados, ó monges!

244. Fácil é a vida para o desavergonhado que é imprudente como um corvo, que calunia e é descarado, arrogante e corrupto.

245. Difícil é a vida para o modesto que sempre procura a pureza, que é desapegado e despretensioso, puro na vida e com discernimento.

246-247. Aquele que destrói a vida, profere mentiras, toma o que não é seu, vai ter com a esposa de outro, e é viciado em bebidas alcoólicas tal homem desenterra a sua própria raiz mesmo neste mundo.

248. Sabe, ó homem bom: as coisas más são difíceis de controlar. Não deixes que a ganância e a maldade te arrastem para uma miséria prolongada.

249. As pessoas dão de acordo com sua fé ou respeito. Se uma pessoa fica descontente com a comida e bebida dada por outros, não alcançará a absorção meditativa, seja de dia seja de noite.

250. Mas aquele em que este (descontentamento) é totalmente destruído, desenraizado e extinto, alcança a absorção, tanto de dia como de noite.

251. Não há fogo como a luxúria; não há aperto como o ódio; não há rede como a ilusão; não há rio como o anseio.

252. Fácil de ver é o defeito nos outros, mas um defeito próprio é difícil detectar. Tal como a palha ao vento uma pessoa apregoa os defeitos dos outros, mas esconde os seus, tal astuto caçador que se esconde por detrás de ramos disfarçados.

253. Aquele que procura os defeitos dos outros, que censura constantemente – faz crescer as suas impurezas. Ele está longe da destruição das impurezas.

254. Não há nenhum traço no céu, e nenhum renunciante(s) fora (do ensinamento do Buddha). A humanidade deleita-se na mundanidade, mas os Buddhas estão livres.

255. Não há nenhum traço no céu, e nenhum renunciante fora (do ensinamento do Buddha). Não há coisas condicionadas que sejam eternas, e não há instabilidade nos Buddhas.

Dhammatthavagga: O Justo

256. Não é por fazer juízos arbitrários que um homem se torna justo; um homem sábio é aquele que investiga tanto o certo como o errado.

257. Aquele que não julgar os outros de forma arbitrária, mas que faça juízo imparcial de acordo com a verdade, esse homem sagaz é um guardião da lei e é chamado de justo.

258. Ninguém é sábio por falar muito. Aquele que é pacífico, amigável e sem medo é chamado de sábio.

259. Um homem não é versado no Dhamma por falar muito. Aquele que, depois de ouvir um pouco de Dhamma, realiza directamente a sua verdade sem se esquecer desta, é na verdade versado no Dhamma.

260. Um monge não é Sénior pelos seus cabelos grisalhos. Esse só é maduro na idade, e então envelheceu em vão.

261. Aquele no qual existe veracidade, virtude, contenção e auto-domínio, que é inofensivo, livre de impurezas e sábio esse é realmente chamado Sénior.

262. Não é por mera eloquência nem por beleza de forma que um homem se realiza, se ele for ciumento, egoísta e traiçoeiro.

263. Mas aquele no qual estes defeitos são totalmente destruídos, desenraizados e extintos, e que deitou fora o ódio – esse sábio é verdadeiramente realizado.

264. Não é pela cabeça rapada que um homem indisciplinado e mentiroso se faz um monge. Como pode aquele que está cheio de desejo e ganância ser um monge?

265. Aquele que subjuga totalmente os males tanto pequenos como grandes é chamado de monge, porque ele superou todos os males.

266. Ele não é um monge só porque vive de esmola. Não é por adoptar exteriormente um hábito que alguém se torna um verdadeiro monge.

267. Quem quer que aqui (no Ensinamento) viva uma vida santa, transcendendo tanto mérito como demérito, caminhando com compreensão neste mundo – esse é verdadeiramente chamado de monge.

268. Não é por observar o silêncio que alguém se torna sábio, se for tolo e ignorante. Contudo, o sábio é quem, com uma balança na sua mão aceita somente o bem.

269. O sábio ao rejeitar o mal, é verdadeiramente um sábio, uma vez que compreende ambos os mundos (presente e futuro), é chamado de sábio.

270. Aquele que fere os seres vivos não é nobre. É chamado de nobre porque é inofensivo para os seres vivos.

271-272. Não é pelas regras e rituais, nem mesmo por muito aprender, nem por se alcançar estados de absorção, nem por uma vida de reclusão, nem por pensar “Eu desfruto da felicidade da renúncia que não é vivida pelos mundanos” que vocês, monges, ficarão contentes, mas só quando a destruição total das impurezas (Arahant) for atingida.

Maggavagga: O Caminho

273. O Caminho Óctuplo é o melhor de todos os caminhos; as Quatro Nobres Verdades são as melhores de todas as verdades; a melhor de todas as coisas é ser desapaixonado: dos homens o melhor é Aquele que Vê (o Buddha).

274. Este é o único caminho; não há nenhum outro para a purificação da visão introspectiva. Trilha este caminho, e confundirás Mara.

275. Ao ir neste caminho porás fim ao sofrimento. Tendo descoberto a forma de retirar o espinho da luxúria, Eu dou a conhecer o caminho.

276. Vocês próprios devem esforçar-se; os Buddhas só apontam o caminho. Aqueles que meditam e trilham o caminho ficam livres dos laços de Mara.

277. “Todas as coisas condicionadas são impermanentes”
quando se vê isso com sabedoria, uma pessoa afasta-se do sofrimento. Este é o caminho para a purificação.

278. “Todas as coisas condicionadas são insatisfatórias” –
-quando se vê isso com sabedoria, uma pessoa afasta-se do sofrimento. Este é o caminho para a purificação.

279. “Todas as coisas são não-eu” quando se vê isso com sabedoria, uma pessoa afasta-se do sofrimento. Este é o caminho para a purificação.

280. O ocioso que não se esforça quando deveria, que apesar de ainda jovem e forte está cheio de preguiça, com uma mente cheia de pensamentos vãos um homem tão indolente não encontra o caminho para a sabedoria.

281. Que uma pessoa vigie o seu discurso, a mente bem controlada, e que não cometa o mal com acção corporal. Que purifique esses três cursos de acção, e ganhe o caminho dado a conhecer pelo Grande Sábio.

282. A Sabedoria brota da meditação; sem meditação a sabedoria diminui. Tendo conhecido estes dois caminhos de progresso e declínio, que um homem se conduza de forma a aumentar a sua sabedoria.

283. Corta a floresta(t) (luxúria), mas não a árvore; da floresta nasce o medo. Tendo cortado a floresta e o mato (desejo), sejam desapaixonados, ó monges!

284. Enquanto o mato do desejo de um homem por uma mulher, mesmo o mais subtil, não for cortado, a sua mente está presa, como um bezerro de mama à sua mãe.

285. Corta o teu afecto como um homem arranca com a sua mão um lótus de Outono. Cultiva somente o caminho para a paz, o Nibbāna, assim como foi dado a conhecer pelo Excelso.

286. “Aqui devo viver durante as chuvas, aqui no Inverno e no Verão” assim pensa o tolo. Ele não percebe o perigo (que a morte pode intervir).

287. Tal como uma grande enchente leva de enxurrada uma aldeia que dorme, também a morte apanha e leva de enxurrada o homem de mente apegada, delirando pelos seus filhos e gado.

288. Para aquele que é assaltado pela morte não há protecção por parte de parentes. Nenhum pode salvá-lo nem filhos, nem pai, nem parentes.

289. Percebendo este fato, que o homem sábio, contido pela moral, se apresse a limpar o caminho que conduz ao Nibbāna.

Pakiṇṇakavagga: Vários

290. Se renunciando a uma felicidade menor se pode perceber uma felicidade maior, que o homem sábio renuncie à menor, considerando a maior.

291. Enredado pelos laços do ódio, aquele que procura a sua própria felicidade infligindo dor aos outros, jamais se libertará do ódio.

292. As impurezas só aumentam para aqueles que são arrogantes e descuidados, que deixam de fazer o que deve ser feito e que fazem o que não deve ser feito.

293. As impurezas cessam para aqueles de compreensão clara e consciente, que sempre praticam fervorosamente a consciência de corpo, que não recorrem ao que não deve ser feito, e firmemente perseguem o que deve ser feito.

294. Tendo morto a mãe (anseio) o pai (presunção), dois reis guerreiros (eternalismo e niilismo) e destruído um país (órgãos e objectos dos sentidos), juntamente com o seu tesoureiro (apego e luxúria), sem aflição caminha o homem santo.

295. Tendo morto a mãe, o pai, dois reis brāhmanes (dois pontos de vista extremos), e um tigre como o quinto (dos cinco obstáculos mentais), sem aflição caminha o homem santo.

296. Os discípulos de Gotama que dia e noite constantemente recordam as qualidades do Buddha, acordam sempre felizes.

297. Os discípulos de Gotama que dia e noite constantemente recordam as qualidades do Dhamma, acordam sempre felizes.

298. Os discípulos de Gotama que dia e noite constantemente recordam as qualidades do Sangha, acordam sempre felizes.

299. Os discípulos de Gotama que dia e noite constantemente praticam a Consciência do Corpo, acordam sempre felizes.

300. Os discípulos de Gotama cujas mentes dia e noite se deleitam na prática da não-violência, acordam sempre felizes.

301. Os discípulos de Gotama cujas mentes dia e noite se deleitam na prática da meditação, acordam sempre felizes.

302. Difícil é a vida como monge; difícil é ter prazer nisso. Também difícil e penosa é a vida doméstica. O sofrimento advém da associação com os desiguais; o sofrimento advém por se vaguear no saṃsāra. Portanto, não sejas um andarilho sem rumo, não persigas o sofrimento.

303. Aquele que é cheio de fé e virtude, e possui boa reputação e riqueza é respeitado em toda parte, em qualquer terra onde viaje.

304. Os justos brilham de longe, como as montanhas dos Himālayas. Mas os ímpios são invisíveis, como flechas disparadas na noite.

305. Aquele que se senta sozinho, que dorme sozinho, e anda sozinho, que se esforça e se domina a si próprio, encontrará prazer no retiro da floresta.

Nirayavagga: O Estado de Aflição

306. O mentiroso dirige-se para o estado de aflição; como aquele que tendo agido (errado), diz: “Eu não fiz isso”. Ambos, cometeram infracções e ao partir, compartilham o mesmo destino no outro mundo.

307. Há muitas personalidades más e homens sem contenção vestindo o hábito açafrão. Estes homens ímpios nascerão em estados de aflição por causa de suas más obras.

308. Seria melhor engolir uma bola de ferro em brasa, do que como monge imoral e vicioso, comer as esmolas do povo.

309. Quatro infortúnios recaem sobre um homem imprudente que coabita com a mulher de outro: aquisição de demérito, sono perturbado, má reputação e (renascimento em) estados de aflição.

310. Tal homem adquire demérito e um nascimento infeliz no futuro. Breve é o prazer do homem e da mulher assustados, e o rei impõe punição pesada. Portanto, que nenhum homem coabite com a mulher do outro.

311. Tal como a grama kusa se for mal agarrada com a mão, corta da mesma forma uma vida monástica mal vivida arrasta a pessoa para estados de aflição.

312. Qualquer acto impensado, qualquer observância corrupta, qualquer forma de celibato questionável – nada disto dá grandes frutos.

313. Se é para fazer alguma coisa, que se faça com vigor sustentado. A vida monástica relaxada ainda levanta mais a poeira das paixões.

314. É melhor não fazer uma má acção, pois a seguir tal acto, atormenta quem o faz. Melhor é praticar uma boa acção, fazendo com que uma pessoa não se arrependa depois.

315. Assim como a fronteira de uma cidade é muito bem guardada, tanto por dentro como por fora, da mesma forma, protege-te. Não deixes escapar esta oportunidade (para o crescimento espiritual). Quem a deixou escapar aflige-se na verdade, quando entregue à escuridão.

316. Aqueles que têm vergonha do que não se deviam envergonhar, e não se envergonham do que se deviam envergonhar – vendo as coisas de uma forma errada, dirigem-se para estados de aflição.

317. Aqueles que temem algo quando não há nada a temer, e não vêem nada a temer, onde há algo a temer vendo as coisas de uma forma errada, dirigem-se para estados de aflição.

318. Aqueles que imaginam o mal onde este não existe, e não vêm o mal onde ele existe vendo as coisas de uma forma errada, dirigem-se para estados de aflição.

319. Aqueles que discernirem o errado como errado e o certo como certo vendo as coisas de uma forma correcta, dirigem-se para os reinos da felicidade.

Nāgavagga: O Elefante

320. Tal como um elefante no campo de batalha resiste ao tiro de flechas disparadas de arcos em volta, assim também devo eu suportar o abuso. Há muitas pessoas a quem de facto, falta a virtude.

321. Um elefante treinado é conduzido à multidão, e o rei monta um elefante treinado. O melhor dos homens é aquele que se dominou e que suporta o abuso pacificamente.

322. Excelentes são as mulas bem treinadas, os cavalos puro-sangue Sindhu e os elefantes adultos fortes. Mas melhor ainda é o homem que se disciplina a si próprio.

323. No entanto, não é usando as montadas que alguém chega à Terra Inexplorada (Nibbāna), mas com auto-domínio, com a mente bem disciplinada.

324. Com o cio o elefante adulto chamado dhanapālaka é incontrolável. Mantido em cativeiro, o elefante não toca num pedaço de comida, mas unicamente se lembra com saudade da floresta.

325. Quando um homem é preguiçoso e glutão, dormindo e rolando na cama como um porco doméstico, esse preguiçoso está sujeito ao constante renascer.

326. Anteriormente esta mente vagueou como quis, aonde bem desejava e de acordo com o seu prazer, mas agora está aperfeiçoada naturalmente com sabedoria, tal como o tratador de elefante o controla com seu aguilhão na altura do cio.

327. Delicia-te na diligência! Guarda bem os teus pensamentos! Sai para fora deste lodaçal do mal, tal como um elefante sai da lama.

328. Se, como companhia encontras um amigo sábio e prudente, levando uma vida boa, deves, superando todos os obstáculos, manter essa companhia com alegria e consciência.

329. Se como companhia não encontras um amigo sábio e prudente que leva uma vida boa, então, como um rei que deixa para trás um reino conquistado, ou como um elefante solitário na floresta, segue o teu caminho sozinho.

330. Melhor é viver sozinho; não há camaradagem com um tolo. Vive sozinho e não faças mal algum; sê despreocupado como um elefante na floresta.

331. Bons são aqueles amigos, quando precisamos de ajuda; bom é estar contente com o que se tem; bom é ter mérito quando a vida chega ao fim, e bom é abandonar todo o sofrimento (pelo caminho do Arahant).

332. Neste mundo, bom é servir a mãe, bom é servir ao pai, bom é servir os monges, e bom é servir os homens santos.

333. Bom é ter virtude até ao final da vida, bom é ter fé que se mantém firme, bom é a aquisição de sabedoria, e bom é evitar o mal.

Taṇhavagga: O Anseio

334. O anseio de uma pessoa que vive descuidada cresce como uma trepadeira. Tal como o macaco buscando frutas na floresta, essa pessoa pula de vida em vida (provando o fruto do seu kamma).

335. Quem quer que se deixe vencer por este anseio miserável e pegajoso, as suas tristezas crescerão como a erva depois das chuvas.

336. Mas quem quer que vença este anseio miserável, tão difícil de superar, suas tristezas cairão como a água cai da folha de lótus.

337. Por isso digo: Boa sorte a todos reunidos aqui! Desenterrem a raiz do anseio, como alguém em busca da perfumada raiz da erva birana. Não deixem que Mara vos esmague vezes sem conta, como a inundação esmaga a cana.

338. Assim como uma árvore, que apesar de cortada, se as raízes se mantiverem intactas e firmes, brota de novo da mesma forma, até que o desejo latente seja desenterrado, o sofrimento surge vezes sem conta.

339. O homem equivocado no qual as 36 correntes(u) do anseio ainda correm fortemente em direcção aos objectos deliciosos, é varrido pelo dilúvio dos seus pensamentos apaixonados.

340. Essas correntes fluem por todo o lado, e a trepadeira (do anseio) brota e cresce. Vendo que a trepadeira despontou, corta a sua raiz com sabedoria.

341. Fluindo (vindo de todos os objectos) e regados pelo anseio, os sentimentos de prazer despontam nos seres. Presos aos prazeres e buscando o gozo, estes homens são vítimas do nascimento e da morte.

342. Atormentadas pelo anseio, as pessoas correm como uma lebre prisioneira. Presas por bloqueios mentais, regressam ao sofrimento, uma e outra vez por um longo tempo.

343. Atormentadas pelo desejo, as pessoas correm como uma lebre perseguida. Portanto, aquele que anseia por ser livre de paixões deve destruir o seu próprio desejo.

344. Existe quem se afasta dos desejos adoptando a vida da floresta (i.e., de monge). Mas depois de sair dos hábitos mundanos, corre de volta para eles. Observai esse homem! Apesar de livre retorna para essa mesma escravidão!

345-346. Os sábios dizem que correntes de ferro, madeira ou corda, não são fortes. Mas a paixão e o anseio por jóias e ornamentos, crianças e mulheres isso, dizem, é uma corrente bem mais forte e que, embora aparentemente solta, é difícil de tirar. Esta também os sábios cortam. Sem saudade alguma, abandonando o prazer sensual, renunciam ao mundo.

347. Aqueles que são apaixonados pela luxúria caiem de novo na corrente em redemoinho (do saṃsāra) como uma aranha em sua teia. Esta também os sábios cortam. Sem qualquer saudade, abandonam todo o sofrimento e renunciam ao mundo.

348. Deixa o passado, deixa o futuro, deixa o presente, e passa para a margem mais distante da existência. Com a mente plenamente livre, não regressarás jamais ao nascimento e à morte.

349. Para uma pessoa atormentada por maus pensamentos, que é dominada pela paixão e dada à busca do prazer, o seu anseio cresce constantemente. Ele cria de facto uma forte prisão.

350. A pessoa que com alegria subjuga os maus pensamentos, que medita sobre as impurezas e está sempre consciente é ela que porá um fim ao anseio e que despedaça a prisão de Mara.

351. Aquele que alcançou a meta, é destemido, livre de anseio, livre de paixão, e arrancou os espinhos da existência – para ele este é o último corpo.

352. Aquele que está livre de desejo e apego, que se aperfeiçoou em descobrir o verdadeiro significado do Ensinamento, e que conhece a combinação dos textos sagrados na sequência certa
– ele na verdade, é o portador de seu corpo final. Ele é verdadeiramente chamado de profundamente sábio, o grande homem.

353. Um vencedor, Eu sou acima de tudo, tudo eu conheci. No entanto desapegado estou de tudo o que foi conquistado e conhecido. Abandonando tudo, sou livre pela destruição do anseio. Tendo assim compreendido directamente tudo por mim mesmo, a quem devo chamar meu professor?

354. O dom do Dhamma supera todas as prendas; o gosto do Dhamma supera todos os gostos, o prazer no Dhamma supera todas as delícias. Quem se libertou do anseio vence todo o sofrimento(v).

355. As riquezas arruínam só os tolos, não os que buscam o Além. Por ansiar riquezas o imbecil arruína-se tanto a si como os outros.

356. As ervas daninhas são a ruína dos campos, a luxúria é a ruína da humanidade. Portanto, tudo quanto é oferecido aos que são livres de luxúria, produz frutos abundantes.

357. As ervas daninhas são a ruína dos campos, o ódio é a ruína da humanidade.

Portanto, tudo quanto é oferecido aos que são livres de ódio, produz frutos abundantes.

358. As ervas daninhas são a ruína dos campos, a ilusão é a ruína da humanidade. Portanto, tudo quanto é oferecido aos que são livres de ilusão, produz frutos abundantes.

359. As ervas daninhas são a ruína dos campos, o anseio é a ruína da humanidade. Portanto, tudo quanto é oferecido aos que são livres de anseio, produz frutos abundantes.

Bhikkhuvagga: O Monge

360. Bom é o domínio da visão; bom é o domínio da audição; bom é o domínio do olfacto; bom é o domínio do paladar.

361. Bom é ter domínio do corpo, bom é o domínio da fala; bom é o domínio do pensamento. Comedimento em qualquer lugar é bom. O monge comedido em todos os sentidos está livre de todo sofrimento.

362. Aquele que tem o controlo sobre suas mãos, pés e língua, que é totalmente controlado, deleita-se no desenvolvimento interior, é concentrado na meditação, mantém-se discreto e está contente – a esse as pessoas chamam monge.

363. Aquele monge que tem controlo sobre sua língua, que é moderado em discurso, despretensioso e que explica o Ensinamento tanto na letra como em espírito o que quer que diga é agradável.

364. O monge que permanece no Dhamma, que se deleita no Dhamma, medita sobre o Dhamma, e tem o Dhamma bem em mente não se afasta do Dhamma sublime.

365. Não se deve desprezar o que se recebeu, nem invejar o ganho dos outros. O monge que inveja o ganho dos outros não alcança a absorção meditativa.

366. Um monge que não despreza o que recebeu, mesmo que seja pouco, que é puro na subsistência e incessante em esforço até mesmo os deuses o elogiam.

367. Aquele que não tem qualquer apego de mente e corpo, que não se lamenta por aquilo que não tem é verdadeiramente chamado um monge.

368. O monge que permanece no amor universal e é profundamente devotado ao Ensinamento do Buddha, alcança a paz do Nibbāna, a bem-aventurança da cessação de todas as coisas condicionadas.

369. Esvazia este barco, ó monge! Vazio, navegarás leve. Livre da paixão, luxúria e ódio, alcançarás o Nibbāna.

370. Corta os cinco(w) inferiores, abandona os cinco superiores e cultiva as cinco faculdades de controlo. O monge que superou as cinco prisões é chamado aquele que atravessou o dilúvio.

371. Medita, ó monge! Não sejas negligente. Não deixes a tua mente girar em prazeres sensuais. Inconsciente, não engulas uma bola de ferro em brasa, não chores quando queima. “Como isto é doloroso!”

372. Não há concentração meditativa para aquele que não tem compreensão introspectiva, e nenhuma sabedoria introspectiva para aquele que não tem concentração meditativa. Aquele em que se encontram tanto a concentração meditativa como a compreensão introspectiva, na verdade, está perto do Nibbāna.

373. O monge que se retirou para um local isolado e acalmou a sua mente, que profundamente compreende o Dhamma, existe nele uma felicidade que transcende todas as delícias humanas.

374. Sempre que com clareza introspectiva, ele vê a ascensão e a queda dos agregados, enche-se de alegria e felicidade. Para os sábios isso reflecte a Realidade Imortal(x).

375. Controlo dos sentidos, contentamento, o comedimento de acordo com o código da disciplina monástica estes são a base da vida santa para o monge sábio.

376. Que ele se associe com amigos nobres, enérgicos e com vida pura, seja cordial e educado na conduta. Assim, cheio de alegria, ele porá fim ao sofrimento.

377. Assim como a trepadeira de jasmim larga as suas flores murchas, da mesma maneira, ó monges, largai totalmente a luxúria e o ódio!

378. O monge calmo no corpo, calmo na fala, calmo no pensamento, bem controlado e que renunciou à vida mundana esse, na verdade, é chamado de sereno.

379. Cada um deve censurar-se e examinar-se a si mesmo. O monge que se vigia e é consciente vive sempre em felicidade.

380. Cada um é o protector de si mesmo, cada um é o refúgio de si mesmo. Assim, cada um deve dominar-se, da mesma maneira que um comerciante domina um nobre corcel.

381. Cheio de alegria, cheio de fé no Ensinamento do Buddha, o monge atinge o estado de paz, a felicidade da cessação das coisas condicionadas.

382. Aquele monge que, embora jovem, se dedica ao Ensinamento do Buddha, ilumina este mundo como a lua liberta das nuvens.

Brahmaṇavagga: O Homem Santo

383. Esforça-te, ó homem santo! Corta o fluxo (do anseio), e descarta desejos sensuais. Conhecendo a destruição de todas as coisas condicionadas, torna-te, ó homem santo, o conhecedor do Incriado (Nibbāna)!

384. Quando um homem santo atingiu o ápice dos dois caminhos (concentração meditativa e compreensão introspectiva), sabe a verdade e todos os seus bloqueios caiem.

385. Aquele para quem não existe nem esta nem a outra margem, nem mesmo ambas, que está livre de preocupações e sem apegos – a esse chamo de homem santo.

386. Aquele que medita, sem mancha e pacífico, que faz o seu trabalho e está livre de impurezas, tendo atingido o mais alto objectivo a esse chamo de homem santo.

387. O sol brilha de dia, a lua brilha à noite. O guerreiro brilha na armadura, o homem santo brilha ao meditar. Mas o Buddha brilha resplandecente sempre dia e noite.

388. Porque se descartou do mal é chamado de homem santo. Porque é sereno na conduta, é chamado de solitário. E porque renunciou às suas impurezas, é chamado de renunciante.

389. Não se deve atacar um homem santo, nem deve um homem santo, quando atingido, dar lugar à raiva. Vergonha para aquele que atinge um santo homem, e mais vergonha sobre aquele que dá lugar à raiva.

390. Nada é melhor para um homem santo do que refrear a mente das suas tendências. À medida que a intenção de fazer o mal desaparece, também o sofrimento desaparece.

391. Aquele que não faz nenhum mal em acção, em palavra e em pensamento, que é comedido nestas três formas – a esse chamo de homem santo.

392. Assim como um sacerdote brāhmane reverencia seu fogo sacrificial, da mesma forma se deve reverenciar a pessoa de quem se aprendeu o Dhamma ensinado pelo Buddha.

393. Nem pelo cabelo emaranhado, nem pela linhagem, nem pelo nascimento alguém se torna um homem santo. Mas aquele onde a verdade e a justiça existem é puro, esse é um homem santo.

394. De que serve o teu cabelo emaranhado, ó homem insensato? E a vestimenta de pele de antílope? Dentro de vós está o emaranhado (da paixão); só exteriormente se limpam.

395. Aquele que usa um hábito feito de trapos, que é magro, mostrando veias sobre todo o seu corpo, e que medita sozinho na floresta – a esse chamo de homem santo.

396. Eu não chamo um homem santo a alguém só por causa de sua linhagem. Se ele está cheio de apegos impeditivos, é ape-

nas um homem arrogante. Mas aquele que é livre de impedimentos e apego – a esse chamo de homem santo.

397. Aquele que, depois de ter cortado todos os grilhões, não treme jamais, que superou todos os apegos – a esse chamo de homem santo.

398. Aquele que cortou o fio (do ódio), o laço (da cobiça), e a corda (de falsos pontos de vista), juntamente com os pertences (tendências más latentes), aquele que removeu a trave (da ignorância) e é iluminado – a esse chamo de homem santo.

399. Aquele que sem ressentimento aguenta o abuso, espancamento e punição; cujo verdadeiro poder, é a paciência – a esse chamo de homem santo.

400. Aquele que está livre da raiva, que é devoto, virtuoso, sem cobiça, comedido e que carrega o seu último corpo – a esse chamo de homem santo.

401. Como água sobre uma folha de lótus, ou um grão de mostarda na ponta de uma agulha, é aquele que não se apega aos prazeres sensuais – a esse chamo de homem santo.

402. Aquele que nesta vida compreende por si mesmo o fim do sofrimento, que deixou de lado o fardo e se libertou – a esse chamo de homem santo.

403. Aquele que tem conhecimento profundo, que é sábio, preciso em discernir o caminho certo ou errado, e que atingiu o mais alto objectivo – a esse chamo de homem santo.

404. Aquele que se mantém distante tanto de chefes de família como dos ascetas, e que perambula sem residência fixa e que precisa de pouco – a esse chamo de homem santo.

405. Aquele que renunciou à violência para com todos os seres vivos, fortes ou fracos, que não mata nem faz com que os outros matem – a esse chamo de homem santo.

406. Aquele que é amigável entre os hostis, pacífico entre os violentos, e desapegado entre os apegados – a esse chamo de homem santo.

407. Aquele cuja luxúria e orgulho, ódio e hipocrisia caíram como uma semente de mostarda cai da ponta de uma agulha – a esse chamo de homem santo.

408. Aquele que profere suavemente, palavras instrutivas e verdadeiras, que não ofende ninguém – a esse chamo de homem santo.

409. Aquele que neste mundo nada tira que não lhe seja dado, seja isso longo ou curto, grande ou pequeno, bom ou ruim
– a esse chamo de homem santo.

410. Aquele que nada quer, tanto deste mundo como do próximo, livre de cobiça e em liberdade – a esse chamo de homem santo.

411. Aquele que não tem apego, que através do conhecimento perfeito é livre de dúvidas e mergulhou na Realidade Imortal
– a esse chamo de homem santo.

412. Aquele que neste mundo transcendeu tanto os laços do mérito e do demérito, que não tem tristeza, imaculado e puro – a esse chamo de homem santo.

413. Aquele, que, como a lua, é impecável e puro, sereno e claro, que destruiu o prazer da existência – a esse chamo de homem santo.

414. Aquele que, depois de ter atravessado este pântano, esta roda da existência perigosa e ilusória, que atravessou e chegou à outra margem; que medita, calmo, livre de dúvidas, que não se apegando a nada, alcança o Nibbāna – a esse chamo um homem santo.

415. Aquele que, tendo abandonado os prazeres sensuais, renunciou à vida doméstica, tornando-se um mendicante; destruiu tanto o desejo sensual como a existência continuada – a esse chamo de homem santo.

416. Aquele que, tendo abandonado o desejo, renunciou à vida doméstica, tornando-se um mendicante, destruiu tanto o anseio como a existência continuada a esse chamo um homem santo.

417. Aquele que, deitando fora laços humanos e transcendendo laços celestes, é totalmente livre de todas as prisões – a esse chamo de homem santo.

418. Aquele que, tendo deitado fora gostos e desgostos, se tornou tranquilo, livre dos substratos da existência e como um herói conquistou todos os mundos – a esse chamo de homem santo.

419. Aquele que de toda a maneira conhece a morte e o renascimento de todos os seres, e é totalmente desapegado, abençoado e iluminado – a esse chamo de homem santo.

420. Aquele que nem deuses, nem anjos, nem humanos conseguem encontrar rasto, o Arahant que destruiu todas as impurezas – a esse chamo de homem santo.

421. Aquele que não se apega a nada do passado, presente e futuro, que não tem apego a nada – a esse chamo de homem santo.

Ele, o Justo, o Excelente, o Heróico, o Grande Sábio, o Conquistador, o Desapaixonado, o Puro, o Iluminado – a esse chamo de homem santo.

422. Aquele que conhece os seus nascimentos prévios, que vê o céu e o inferno, que chegou ao fim dos nascimentos e atingiu a perfeição da sabedoria introspectiva, o sábio que alcançou o cume da excelência espiritual – a esse chamo de homem santo.

Notas

a) Mara: a tentação no Budismo, representada nas escrituras como uma deidade de má índole que tenta desviar as pessoas do caminho da libertação. Os comentários apresentam Mara como o deus das forças malignas, como obstrutor mental e como morte.

b) As impurezas (asubha): assuntos de meditação que se focam na inerente repugnância do corpo, recomendados, especialmente, como poderosos antídotos da luxúria.

c) Os Imortais (amata): assim chamados porque os que atingem a imortalidade ficam livres do ciclo do renascimento e da morte.

d) Os Nobres (ariya): os que alcançaram qualquer dos quatro estádios da realização supramundana o que conduz irreversivelmente ao Nibbāna.

e) Indra: o governador, rei dos deuses na antiga mitologia indiana.

f) Arahat: diz-se que o Arahat existe para lá do mérito e do demérito, porque como abandonou todos os obstáculos, já não poderá agir negativamente; e como já não tem mais apegos, suas virtuosas acções não produzirão mais kamma (karma).

g) O que se esforça no caminho (sekha): aquele que alcançou qualquer dos primeiros três estádios da realização supramundana: o que entrou na corrente, o que regressa uma vez, e o que não regressa.

h) O sábio na aldeia é o monge budista que recebe a comida na sua malga, aceitando o que lhe for oferecido.

i) Tagara: um pó perfumado obtido de um tipo especial de arbusto.

j) Este verso descreve o Arahat, apresentado mais profundamente no capítulo seguinte. Os “cancros” (āsava) são os quatro obstáculos base: o desejo sensual, desejo por continuidade da existência, visão errada e ignorância.

k) Em pāli este verso traduzido literalmente, lê-se: “O homem que não tem fé, ingrato, ladrão, que destrói as oportunidades e come vómito – é verdadeiramente o mais excelente dos homens”.

l) Brahma: uma elevada divindade da antiga religião indiana.

m) De acordo com o comentário, estes versos são a «Canção de Vitória» do Buddha, na sua primeira enunciação depois da Iluminação. A casa é existência individualizada no saṃsāra, o construtor o desejo, as vigas as paixões, a cumeeira a ignorância.

n) darem frutos.

o) A entrada na corrente (sotapatti): o primeiro estádio da realização supramundana.

p) A Ordem: tanto a Ordem monástica (Sangha dos Bhikkhus) como a Ordem dos Nobres (Sangha dos Ariyas), o que já alcançaram os quatro estádios supramundanos.

q) Agregados (de existência) (Khanda): os cinco grupos de factores nos quais o Buddha analisa o ser humano – forma material, sentimento, percepção, formações mentais (pensamentos) e consciência.

r) Para além da corrente: o que já não regressa (anagami.)

s) O renunciante (samana): aqui usado no sentido especial dos que alcançaram os estádios supramundanos.

t) O significado deste ditame é: “Abate a floresta da luxúria, mas não mortifiques o corpo”.

u) (339) As trinta e três correntes do desejo: os três desejos – por prazer sensual, pela continuidade da existência, e pela anulação – em relação a cada uma das doze bases – o seis órgãos dos sentidos, incluindo a mente e seus correspondentes objectos.

v) Esta foi a resposta do Buddha a um asceta que lhe perguntava sobre o seu professor. A resposta do Buddha demonstra que a Iluminação Suprema era realização sua.

w) Os cinco para cortar são os cinco grilhões inferiores: auto ilusão, dúvida, acreditar em ritos e rituais, luxúria e má vontade. Os cinco para abandonar são os grilhões superiores: desejo por reinos divinos com forma, desejo por reinos sem forma, preconceito, desassossego, e ignorância. Os cinco para cultivar são as cinco faculdades espirituais: fé, energia, plena atenção,

concentração, e sabedoria. As cinco ligações são: ganância, ódio, ilusão, visão errada e prejuízo. Os Que Entram na Corrente e os Que Só Voltam Mais Uma Vez eliminam os primeiros três grilhões, os Que Não Voltam os dois seguintes, e os Arahats os últimos cinco.

x) Ver nota do v. 202


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