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Eduardo Berlim[1]
Em outra conversa com meu anônimo amigo CAIO (e talvez eu não canse dessa piada até o final dos ensaios), estávamos falando sobre o papel da intenção no trabalho mágico. Em meio às mais diversas conjecturas, nos pareceu que a intencionalidade é não apenas parte necessária no ato mágico, mas que pode chegar a ser tudo o que se faz necessário no ato em si.
Obviamente, não estou falando sobre intenção no sentido de “o que você acha que quer” ou mesmo no sentido de “desejo momentâneo”, mas de uma intenção que se assemelha à do norueguês Magnus Carlsen em sua sanha por se tornar o maior jogador de xadrez da história. Intenção aqui será referida como algo inato ao mais profundo ponto da alma do ser, algo capaz de ser visceral ao mesmo tempo em que bate no ápice da intelectualidade possível àquela pessoa: é o todo da capacidade, o chamado eixo mente-coração.
Essa conexão racional que molda o emocional é parte inerente do caminho de subida dentro dos quatro mundos da Kabbalah (dentro da ordem dos elementos comumente encontrada na Golden Dawn). Essa ordem existe por um motivo natural para que nossa parte humana seja capaz de transcender a si mesma e tocar aquilo que é alvo do seu trabalho, sua verdadeira intenção. Uma forma interessante de se observar isso é analisar a própria tradução dos mundos na Árvore da Vida, e eis que ouso fazer um breve resumo elucidativo, junto ao qual exemplificarei de forma esdrúxula:
Assiah ou Mundo da Ação
A ação inicia-se buscando a intencionalidade do ato. É estranho pensarmos em agir antes de sequer sabermos o que devemos fazer, mas eu posso arriscar a dizer que a maior parte dos trabalhos mágicos intencionam justamente a se conseguir algo cuja ação não basta. Um trabalho de amor não ocorre para quem já conseguiu esta conquista, da mesma forma que um bilionário provavelmente não faz ritos de prosperidade financeira. No nosso exemplo esdrúxulo, vamos supor que você queira um cavalo. O cavalo que você busca é o impedimento de ação de tê-lo, comprá-lo ou mesmo de conseguir atravessar um terreno longo e penoso sem ajuda de um outro veículo qualquer. Então você agora quer um cavalo!
Yetzirah ou Mundo da Formação
O passo seguinte é entender como você formata o teu trabalho mágico. Formar é literalmente dar forma – e acho curioso como isso pode não passar naturalmente nas nossas cabeças – e dar forma tem uma direta relação com o ato de conceber, criar, idealizar e organizar. Todas essas características são partes do trabalho mágico pelo qual você conseguirá seu belo equino do sexo masculino. Essa formação é intelectual, pois, neste momento, a fluidez emocional certamente lhe impedirá de conseguir seu cavalo. Ficar com raiva não adianta e menos ainda ficar triste; é tempo de pensar!
Briah ou Mundo da Criação
Eis que é chegado o momento catártico onde toda a tua necessidade torna-se emotiva, alcançando o âmago do teu ser através do que você formatou como um plano de ação. Percebem que gramaticalmente isso segue uma lógica bastante interessante? Isso se dá justamente pelo formato que a magia age na subida: ela precisa compreender os passos necessários de forma coesa para que você finalmente alcance aquilo que é realmente desejado. A má notícia é que, se você não consegue compreender qual é a força emocional que te leva ao cavalo, você não terá o cavalo.
Atziluth ou Mundo da Emanação
A intenção chega ao ponto em que você finalmente será capaz de emanar aquilo que deseja. É magnífico como livros como ‘O Segredo’ parecem focar apenas no ponto de “vibrar” e “emanar” aquilo que se deseja sem compreender o contexto que precisa ser cumprido para chegar até este ponto. Certamente não deve ser fácil emanar um cavalo, mas e se voltarmos ao exemplo do Magnus Carlsen?
Magnus Carlsen ou Mundo do Xadrez
Este jovem norueguês nascido em 1990 é o atual campeão de xadrez clássico desde 2013 (sim, por dez anos seguidos) e o primeiro na classificação mundial de xadrez FIDE desde 2011, ficando atrás apenas do lendário Garry Kasparov. É mais do que evidente um talento dotado de um esforço hercúleo e milhares de horas de dedicação. Para Carlsen, provavelmente não há vida sem xadrez da mesma forma que não haveria vida sem música para Mozart.
A ação a ser batida é tornar-se o maior enxadrista da história e, para isso, é necessário que Carlsen ultrapasse Kasparov em todos os recordes de seu antecessor. Carlsen sabe que ele tem uma vantagem nesta ação que é a de poder estudar Kasparov. Formatando adequadamente seus conhecimentos e ampliando todos os campos de estudo ao máximo, ele é capaz de aproveitar o fulgor de sua juventude e criar toda a sua jornada; seu sentimento necessário é a gana. É bem possível que vejamos um futuro melhor enxadrista da história conforme Carlsen envelhece, mas ele certamente já emana aquela espécie de aura ou presença tão típica de quem alcança o topo do mundo.
Carlsen como um trabalho mágico é a síntese do que poderia ser visto como perfeição ao buscar um objetivo. Contudo, não estou fazendo qualquer afirmação de que ele tenha realizado um ato mágico (da forma como estamos acostumados) para chegar neste ponto: só estou dizendo que ele teve intenção.
Tal qual Carlsen, não nos faltam exemplos de pessoas que alçam longos voos e alcançam objetivos antes impossíveis com mera intenção. Ou melhor, não tão “mera” assim. Afinal, tendo um plano e todas as faculdades emocionais apontadas para o alvo correto, passamos a ter a capacidade de realmente fazer a magia funcionar. Provavelmente é por isso que benzedeiras não precisam de tanto para abençoar e curar os enfermos ou porque algumas pessoas parecem incapazes de realizar qualquer magia de forma correta…
Eduardo Berlim é músico, tarólogo e estudante de hermetismo com vasta curiosidade. Tem apetite por uma série de correntes diferentes de magia e se considera um eterno principiante. Assumidamente fanboy dos projetos da Daemon e das matérias do Morte Súbita inc.
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