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As Definições; Asclépios ao Rei Ammon – Corpus Hermeticum

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Acerca de Deus, da matéria, sobre o mal, a fatalidade, o sol, a substância inteligivel, sobre a essência divina, sobre o ser humano, a disposição do pleroma, os sete astros e sobre o ser humano segundo a imagem.

1 Eu te envio, ó rei, um importante discurso que é como o coroamento e o complemento de todos os outros, não foi concebido conforme as idéias da massa, contrariamente as refuta em mais de um ponto. Perceberás nele mesmo algumas discordâncias relativas aos meus próprios discursos. Hermes então, meu mestre, nos freqüentes diálogos que tinha como que em sua casa, privadamente; quer em presença de seu filho Tat, tinha o costume de me dizer que aqueles que lerão meus livros acharão a composição simples e clara, enquanto que, obscuro e oculto o significado das palavras e que será ainda mais obscuro quando os Gregos, mais tarde, traduzirem-nos de nossa língua para a sua, o que conduzirá a uma completa distorção do texto e a uma total obscuridade.

2 – Por outro lado, expresso em nossa língua original, esse discurso conserva com toda clareza o sentido das palavras: e na verdade a particularidade mesmo do som e da entonação dos vocábulos egípcios retém neles mesmos a energia das coisas que se dizem.

Enquanto esteja sob teu poder, ó rei – e tudo podes – preserva bem este discurso de toda tradução a fim de que tão grandes mistérios não cheguem aos Gregos e que a orgulhosa elocução dos mesmos, com a sua falta de sensibilidade e com o que se poderia dizer falsas graças, faça empalidecer e desaparecer a gravidade, a solidez, a virtude eficaz dos vocábulos de nossa língua. Pois os Gregos, ó rei, possuem apenas discursos vazios, bons para o efeito de demonstrações: e é isto que é toda a filosofia dos Gregos, um rumor de palavras. Quanto a nós, não nos servimos de simples palavras, mas de sons repletos de eficácias.

3 Começarei dest’arte meu discurso, por uma invocação à Deus, o mestre, criador, pai e envoltório do universo inteiro, aquele que sendo o Um é tudo e que sendo tudo é Um. Pois o pleroma de todos os seres é um e está no Um, não que o Um se desdobre, mas os dois conjuntamente perfazem apenas a unidade. Guarda este modo de pensar, ó rei, durante todo o decurso de minha exposição. Pois se alguém tenta separar do Um, tomando a palavra, tudo, no sentido de uma pluraridade e não de uma totalidade, o que parece ser tudo e um e mesmo, acaba, coisa impossível, por ter separado o Todo do Um, por destruir o Todo. É necessário, verdadeiramente que tudo seja um, se pelo menos existe um Um – ora existe e jamais deixa de ser um – para que o pleroma não seja dissolvido.

4 Eis então, que na terra, nas suas partes mais centrais, jorram muitas fontes d’água e de fogo e que desta forma podemos ver juntas no mesmo lugar as três naturezas do fogo, da água e da terra, dependentes de uma mesma raiz. O que leva a acreditar que existe um mesmo depósito que, de um lado, provê ao fornecimento de matéria e por outro recebe de volta a substância que vem do alto. 5 É desta forma que o demiurgo, quero dizer, o Sol, conjunta o céu e a terra, enviando para baixo a substância e elevando a matéria, levando para perto de si e para si as coisas e fazendo sair de si e dando tudo a todos e espargindo sobre todos, liberalmente, a luz: pois ele é aquele cujas boas energias penetram não somente no céu e no ar, mas também na terra, até o golfo mais profundo e no abismo.

6 Por outro lado, se existe também alguma substância inteligível, ela é o volume do Sol e a luz do Sol poderia ser dita o receptáculo dessa substância. Agora, do que se compõe ou de onde é proveniente esta substância, apenas o próprio Sol o sabe e para sabê-lo seria necessário ser-lhe próximo ou do lugar ou da natureza.

7 Quanto à visão do Sol, esta não é objeto de conjectura, mas o raio solar envolve com seu próprio brilho mais rutilante o mundo inteiro e a parte que está embaixo é a parte que está em cima: pois o Sol está estabelecido no meio do mundo, portando o mundo como uma coroa e como um bom conduto assegurou o equilíbrio do carro do mundo, subiu, e ele com medo que este fosse colocado em um curso desordenado. As renas são a vida, a alma, o sopro, a imortalidade e a geração. Deixou de tanto sofrear as renas para que o mundo pudesse conduzir seu curso não longe dele, mas para dizer a verdade, com ele, 8 e é desta maneira que as coisas são continuamente criadas, dando aos seres imortais a duração eterna e alimentando com a parte de sua luz que se dirige para o alto, isto é, com os raios projetados pela sua face voltada para o céu, as partes imortais do mundo, enquanto que, com a luz que está aprisionada no mundo e que banha com seu brilho, inteiramente, a concavidade da água, da terra e do ar, vivifica e põe em movimento, pelos nascimentos e metamorfoses, os seres viventes que subsistem nestas partes do mundo, remodelando-os e transformando-os uns nos outros como numa espiral – a mudança de uns nos outros operando uma troca contínua de gênero a gênero e de espécie – logo, exercendo sobre esta parte do mundo a mesma atividade criadora que sobre os grandes corpos. Pois de todo corpo a duração é mudança: do corpo imortal uma mudança sem dissolução, do corpo mortal uma mudança acompanhada de dissolução. E esta é precisamente a diferença do imortal relativamente ao mortal e do mortal com o imortal.

10 Da mesma forma que o Sol expande sem cessar sua luz, também continua indefinidamente a criar a vida sem jamais interromper o seu trabalho, nem quanto ao lugar, nem quanto à produção. E efetivamente, o Sol tem ao seu redor numerosos coros de daimons, semelhantes a grupos armados de forma diversa, que convivem com os mortais sem perder a imortalidade e que após terem recebido como sua parte a região dos homens, velam sobre seus negócios. E executam o que lhes é ordenado pelos deuses, por meio de tempestades, de ciclones, de maremotos, de vicissitudes no elemento ígneo, terremotos e fome e guerra, castigando a impiedade. 11 Este é realmente o maior pecado dos homens contra os deuses: pois aos deuses pertence fazer o bem, aos humanos serem pios, e aos daimons ajudar aos deuses. Todos os outros pecados que os humanos ousam cometer por estupidez, temeridade ou pela coerção que se chama Destino, ou ainda por ignorância, todos esses pecados não são levados em conta pelos deuses: somente a impiedade cai sob os golpes do julgamento.

12 O Sol é, portanto, o conservador e a nutriz de toda espécie de seres e da mesma forma que o mundo inteligível envolvendo o mundo sensível, preenche este de todas as formas com a infinita diversidade de suas figuras, o Sol envolvendo tudo o que está no mundo, dá seu volume a todos os seres que nascem e os fortifica, ainda que os absorva em si mesmo quando estes morrem.

13 Ora, sob as ordens do Sol, foi posto o coro de daimons, ou melhor, os coros: pois são numerosos e diversos, colocados sob os comandos dos quadrados dos astros. Dispostos desta forma servem próximos a cada um dos astros, bons ou maus quanto à sua natureza, isto é, quanto às suas atividades – pois a essência de um daimon é a atividade – existem alguns entre eles que são uma mistura de bem e de mal.

14 Todos esses demônios receberam pleno poder sobre os sucederes da terra e sobre as desordens que aí se produzem e provocam toda espécie de problemas, em geral para as cidades e povos e particularmente para cada indivíduo. Pois buscam remodelar nossas almas segundo seu interesse a excitá-las, instalado em nossos músculos e medula, em nossas veias e artérias, em nosso cérebro e penetrando até nas nossas entranhas.

15 Pois, tendo cada um de nós nascido e sido animado, foi tomado a cargo dos daimons que estavam de serviço sob as ordens de cada um dos astros. Pois os daimons se substituem de instante em instante: os mesmos não permanecem em função mas em rodízio. Esses daimons após terem penetrado no corpo nas duas partes da alma, atormentam-na, cada um no sentido de sua própria atividade. Somente a parte racional da alma escapando à soberania dos daimons, permanece estável, pronta a tornar-se receptáculo de Deus.

16 Se então, na parte racional de sua alma, um ser humano recebe a luz do raio divino através do Sol (esses humanos são poucos entre todos) os daimons ficam reduzidos à impotência, pois nenhum dos demônios, nem dos deuses possui poder contra um único raio de Deus. Quanto aos outros humanos são levados a torto e a direito, corpos e almas, pelos daimons e amam, acariciam essas atividades dos daimons neles. É a razão, não o amor que é ao mesmo tempo a vítima e a causa do dissabor. Desta forma o governo de nossa vida terrestre está inteiramente no poder dos daimons, pelo intermédio de nosso corpo: é a este governo que Hermes chamou Destino.

17 Bem, o mundo inteligível depende de Deus, o mundo sensível do inteligível e o Sol através do mundo inteligível e do mundo sensível recebe de Deus, por sua providência, o influxo do Bem, isto é, a ação criadora. Por outro lado, em torno do Sol gravitam as oito esferas, dependendo do Sol, e dos astros fixos, as seis esferas dos planetas e a esfera única que envolve a terra. É dessas esferas que dependem os daimons, e dos daimons, os homens: e desta maneira tudo e todos estão na dependência de Deus.

18 É por isto que Deus é o Pai, das coisas, o Sol é o criador e o mundo o instrumento desta ação criadora. O céu é governado pela substância inteligível, governa por sua vez os deuses e os daimons colocados sob as ordens dos deuses, governam os humanos: é desta maneira que está disposta e armada dos deuses e dos daimons. 19 Deus criou as coisas por si só, por seu intermédio e as coisas são partes de Deus: ora se são partes de Deus, Deus é seguramente tudo. Criando então as coisas Deus criou a si mesmo e é impossível que cesse de criar pois não pode deixar de ser.

E do mesmo modo que Deus não tem fim, também sua atividade criadora não tem começo nem fim.

Este fragmento a seguir, embora ligado ao manuscrito do capítulo precedente, constitui segundo a edição de Flussas (1574), o capítulo XVII.

“Se refletes, ó rei, verás que entre os corpos também existem incorpóreos.” “Quais?” diz o rei. – “Os corpos que aparecem nos espelhos não te parecem incorporais?” -.- “Exato, ó Tat, divinamente pensado”, diz o rei. “Mas existem ainda outros incorpóreos: por exemplo, não crês que existem, ainda que incorporais, essas formas que aparecem nos corpos dos seres animados e no dos inanimados?” “Bem o dizes, ó Tat.” – Por tanto os incorpóreos refletem-se nos corpos e os corpos nos incorpóreos, isto é, o mundo sensível reflete-se no inteligível e o mundo inteligível no sensível. É esta razão de se adorarem estátuas, pois estas contêm também formas do mundo inteligível.”

Nesse momento o rei se levanta e diz: “É tempo, ó profeta, de ocupar-me de meus hóspedes. Mas amanhã continuaremos a teologizar este assunto, em sua seqüência”.

Corpus Hermeticum


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