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Há tantas histórias a respeito do aparecimento de anjos da guarda-nos momentos de crise, que mesmo os mais céticos devem admitir que esse é um caso a ser considerado .
Existe uma tradição em Devon, de acordo com a qual, se o Tambor de Drake, conservado na Abadia de Buckland, nas proximidades de Tavistock, é batido num tempo de crise, o próprio Drake retornará para conduzir a armada britânica. Newbolt imortalizou essa lenda em seu famoso poema: ‘Toma meu tambor em Devon e leva-o para o litoral. Toca-o quando tua força escasseia .
Se os Dons mirarem Devon, deixarei o porto do Céu, E como outrora reunirei a toque de tambor o Canal da Mancha.” A idéia do herói que retorna para conduzir o seu povo, ou a do anjo da guarda que aparece nas horas de crise, está profundamente entranhada no coração de todas as nações, e nada a extirpará. Inúmeros exemplos foram relatados pelos homens que retomavam das trincheiras durante a guerra .
Voltemos uma vez mais à antiga sabedoria da Cabala, esse depósito de conhecimentos ocultos. Aprendemos aqui sobre o Anjo Bom e o Anjo Mau da alma do homem, que ficam atrás de seu ombro direito e esquerdo, um tentandoo e o outro inspirando-o. Traduzamos o Anjo Sombrio nos termos do pensamento moderno e teremos o subconsciente freudiano .
Mas os freudianos não compreendem que há também um Anjo Luminoso que permanece atrás do ombro direito de todos os homens. Trata-se da superconsciência ou, em outras palavras, do Eu Superior, o Santo Anjo da Guarda que Abramelin buscava com tanto ardor e esforço .
Todos sabemos que quando baixamos nossa guarda uma negra tentação surge das profundezas de nosso eu inferior, que algo atávico se agita e que temos pensamentos, ou mesmo fazemos coisas de que nunca nos teríamos julgado capazes. Ouvimos a voz do Anjo Sombrio falando .
Da mesma maneira, nas horas de terrível tensão, quando estamos encostados na parede e estamos lutando por mais do que nossas vidas físicas, outra Voz se faz ouvir, a voz do Anjo Luminoso. Eu nunca soube que isso tenha ocorrido quando um homem estava lutando simplesmente por sua vida física. Para aqueles que vêem além do véu, a morte não é nenhum grande mal; mas nas horas de crise espiritual, quando o verdadeiro eu está sendo arrebatado, então é o grito da alma que é ouvido, e Algo se manifesta das névoas do Invisível, manifesta-se numa forma que é compreensível a quem chama. Se a pressão intensa provoca uma expansão temporária da consciência, um psiquismo fugidio, ou se um Ser de sua própria vontade atravessa o véu e se manifesta, eu não sei; nunca há detalhes disponíveis desses incidentes. Eles ocorrem apenas nas horas de terrível tensão e vão tão rapidamente quanto vieram, não deixando nenhum traço a não ser sobre a alma.Eu afirmo que assim como o Ser Inferior pode elevar-se em momentos de tentação, o Eu Superior pode descer nos momentos de crise espiritual. O objetivo do místico é viver exclusivamente no Eu Superior. O objetivo do ocultista é trazer esse Eu Superior para manifestar-se na consciência do cérebro: “Em minha carne verei a Deus”. Assim como o Eu Inferior pode levantar-se e induzir-nos a algum ato horrível, o Eu Superior pode vir em nosso socorro, “terrível’ como um exército embandeirado” .
Já falei da voz misteriosa que me instruiu sobre como livrar-me de grave perigo psíquico. Em outras ocasiões de tensão e violento esforço experimentei uma súbita expansão ou alteração do nível de consciência. O Eu Superior desceu e assumiu o controle. Quando estamos no meio do tumulto, somos subitamente elevados para cima deste e vemos todas as circunstâncias da vida desenrolaremse num relance, como se víssemos uma região de um local elevado, e sabemos intuitivamente o resultado do assunto. Todo tumulto emocional cessa, e somos como um navio à capa, suportando seguramente a tempestade. Quando isso me ocorre, as lembranças de minhas encarnações passadas são sempre muito vividas. É esse ‘despertar simultâneo do passado que me faz sentir que a voz é a do meu Eu Superior, e não de outra entidade .
Creio que nas horas de crise espiritual o homem que tem fé na lei de Deus pode levantar-se e invocar a sua proteção e um aparente milagre será realizado em seu benefício. Entretanto, pode não haver nenhuma infração da lei natural; portanto, esse milagre deve simplesmente ser um exemplo da operação de uma lei com a qual ainda não estamos familiarizados, como um eclipse se afigura ao selvagem como um milagre, mas ao astrônomo como um fenômeno natural que pode ser previsto com exatidão .
O que induz essa mudança de controle em nossas vidas? Estamos famiiarizados com o fato de que o motor de um carro tem três marchas à frente e uma à ré. Não é possível que as nossas mentes também tenham marchas, e que é uma mudança de marcha que induz o psiquismo? Não há ocasiões em que marchamos à ré e o macaco e o tigre em nós assumem o comando? Atrás do plano físico está o plano astral, e atrás do plano astral está o plano mental, e atrás do plano mental está o plano espiritual, e cada plano age como um plano causal para o plano inferior, e cada um por sua vez é controlado do plano mais sutil. Quando “mudamos de marcha”, a consciência é deslocada de um plano mais denso para um mais sutil e começamos a pôr em movimento causas muito remotas de que os acontecimentos no plano físico são resultados finais; manipulamos essas causas e os resultados se produzem imediatamente.Quando mudamos de marcha do físico para o astral, achamo-nos no plano da consciência psíquica e da magia menor. Supondo-se que um combate psíquico ocorra entre dois ocultistas, se um deles é de um grau que lhe permite mudar a marcha, de modo que a consciência se eleva do plano astral para o mental, ele estará na esfera da magia maior e terá pleno controle da situação. O outro nada pode fazer contra ele. Mas o que acontece no caso da rara e mística alma que pode mudar outra vez a consciência e engatar a marcha de um poder puramente espiritual? Ele desbanca o adepto. Há muitas almas que têm essa mística consciência espiritual, embora não tenham nenhum conhecimento oculto. Entre os modos de pensamento superiores e inferiores, há um grande abismo que elas saltam temerariamente. Se numa hora de crise elas são capazes de elevar-se na fé e penetrar essa consciência mística e ficar em silêncio, elas terão o ar superior de qualquer ocultista que não conta com nada a não ser a técnica do ocultismo .
A questão da consciência mística está, contudo, fora do objetivo de nossa presente investigação, que diz respeito aos métodos psíquicos e à técnica tradicional do ocultismo. Temperamentos diferentes empregarão métodos diferentes, e o método místico não interessa a todos .
O ocultista não ignora a força de Cristo; ele sabe que ela se enquadra na hierarquia das forças supremas do universo, embora possa não estar preparado para conferir-lhe a posição exclusiva que essa força ocupa no coração do místico cristão. Na Tradição ocidental ela é simbolizada por Tiphareth, a Sephira central dos Dez Sephiroth Sagrados da Árvore da Vida Cabalística .
A força de Cristo é o fator equilibrante, compensador, curativo, redentor e purificador do universo. Ela deveria ser invocada em toda operação de autodefesa psíquica, na qual qualquer elemento humano, encarnado ou desencarnado, está envolvido. Quando se tem que enfrentar elementos nãohumanos, tais como elementais, formas da mente ou o Qlippoth, é o poder de Deus Pai, como Criador do universo, que é invocado, afirmando-se a Sua supremacia sobre todos os remos da natureza, visível e invisível. Deus Espírito Santo é a força que é empregada nas iniciações, e não deve ser invocada durante as horas de dificuldade psíquica, pois sua influência tenderá a intensificar o estado e tornar o Véu ainda mais fino .
Há um aspecto muito curioso do mundo oculto a respeito do qual se deve dizer algo nas presentes páginas, embora não muito possa ser revelado e, para ser franca, eu própria não saiba o bastante sobre ele, mas apenas os aspectos com que, deparei realmente. Eu já ouvi chamarem-no de Polícia Oculta; outros podem conhecê-lo por nomes diferentes, mas acredito que se trata de uma coisa real e concreta, embora a sua organização não esteja no plano físico, nem, até onde eu saiba, estejam as suas atividades mundanas concentradas num único par de mãos. Eu cruzei o seu caminho em várias ocasiões, e cumpri meu papel em suas atividades, e conversei com outras pessoas que também estiveram envolvidas com ela, e todos disseram o que eu disse, que é a voz interior e as circunstâncias que dirigem as nossas atividades quando cooperamos com essa misteriosa organização .
Penso que ela está organizada em unidades nacionais, pois as pessoas parecem entrar e sair das jurisdições, ou passar de uma para outra. Pelo que sei, ela não tem nenhuma tendência política particular, estando envolvida exclusivamente com os métodos ocultos aplicados para fins criminosos e ofensivos à sociedade .
Um ou dois casos ilustrativos podem nos ajudar a esclarecer o assunto. Um ocultista indiano que estava visitando a Inglaterra, a fim de fundar uma escola, experimentou alguns problemas. Ele estava profundamente envolvido na política de seu próprio país e não havia dúvida de que antipatizava radicalmente com os ingleses. Penso que fui a única anglo-saxônica de sangue puro a entrar em contato com ele. Até onde sei, ele não se interessava pelas atividades políticas mundanas, mas era sua idéia organizar um grupo de meditação que deveria despejar a força espiritual regenerativa do Oriente sobre a alma grupal do Império Britânico, que, segundo afirmou, estava em péssimo estado. Eu afirmei, contudo, que a alma grupal não estava morrendo, como ele afirmava, mas exausta, pois havíamos saído há pouco da Guerra. Além disso, eu não podia ver como alguém que antipatizava tanto com ela poderia ser capaz de regenerá-la. Eu não estava certa também de que a regeneração seria de nosso agrado, caso a recebêssemos. Esse homem, que chamarei de X., tinha um intenso orgulho espiritual, e sua idéia básica era que a Inglaterra devia reconhçcer a supremacia espiritual da índia e receber sua inspiração espiritual do Oriente. Eu era jovem e inexperiente, mas comecei a me perguntar que espécie de força espiritual estava para ser despejada através do canal que estávamos construindo. Supondo-se que durante a Guerra um grupo de ocultistas ingleses tivesse tentado realizar um serviço semelhante para a Alemanha, que linha teria sido adotada? Não teriam eles tentado influenciar a mente grupal alemã a abandonar seus ideais militaristas e a concentrar-se na Liga das Nações? Não era exatamente o mesmo que tentava fazer o nosso amigo indiano ao tentar dissuadir-nos de nossas tendências imperialistas? Não lhe teria parecido, sofrendo como sofria sob o preconceito racial do homem branco, que o mundo seria um lugar bem melhor para a humanidade se o inglês cuidasse de seu próprio jardim e deixasse os outros povos em paz? Fiquei mais e mais inquieta e X., sendo um bom sensitivo, detectou minha inquietação, e fui convidada a me retirar do grupo que ele estava organizando .
Eu sentia que algo sinistro estava sendo tentado contra a mente grupal de minha raça, mas não tinha meios de avaliar a sua extensão ou potência. Essa não era uma história que se pudesse contar à Scotland Yard; além disso, muitos de meus amigos pessoais acreditavam na bona fides de X. e estavam tomando parte no grupo que ele organizava, e eu estava aflita para não envolvê-los em qualquer aborrecimento. Em minha perplexidade, resolvi nada fazer no plano físico e invocar os Mestres dos Planos Internos .
Nessa época, eu não era de um grau que tem acesso direto aos Mestres, mas resolvi tentar entrar em contato telepático com eles, embora não soubesse se aqueles com quem procurava comunicar-me telepaticamente fossem entidades humanas ou não, encarnadas em corpos físicos ou desencarnadas, pois àquele tempo eu não havia avançado muito em meus estudos ocultos .
A única coisa em que podia basear-me era uma idéia abstrata e o reconhecimento de que nas dificuldades anteriores eu tinha sido capaz de entrar em contato com Algo nos Planos Internos que mostrara ser um amigo poderoso .
Na telepatia, o método usual para estabelecer contato é visualizar a pessoa com quem se deseja comunicar e chamá-la pelo nome. Eu nada tinha para visualizar e não conhecia nenhum nome. Entretanto, resolvi fazer a tentativa o melhor que podia e, falando metaforicamente, pus minha cabeça para fora da janela deste tabernáculo carnal e chamei a polícia. E recebi uma resposta. A Voz Interior respondeu-me clara e distintamente: “Procure o Coronel.” Fiquei muito surpresa, pois o Coronel Y. era uma pessoa muito ilustre a quem eu fora apresentada uma vez, e a última pessoa no mundo a quem alguém convidaria para’ contar coisas do arco da velha. Eu não tinha a menor intenção de passar ridículo enfrentando esse formidável guerreiro em sua toca. Meus estudos psicológicos me haviam familiarizado com os trabalhos da mente subconsciente e o que ela pode fazer quando dissociada, e senti que a situação precisava ser tratada com extrema cautela, pois os resultados de um passo em falso poderiam ser desagradáveis .
Repliquei, portanto, à Voz Interior: “Não acredito em você, a menos que me dê um sinal” .
A réplica não tardou: “O Coronel Y. estará em sua próxima conferência. Falelhe então” .
Repliquei: “Eu sei que o Coronel Y. não irá à minha conferência, pois o seu regimento está no exterior e ele não voltará antes que a conferência se realize”.A resposta foi: “O Coronel Y. estará em sua próxima conferência” .
“Muito bem”, disse eu, “esse será o meu sinal. Se o Coronel Y. estiver lá, eu lhe falarei, e se não estiver, deixarei que o caso siga o seu curso” .
Quando chegou o dia aprazado, fui dar a minha conferência numa certa cidade. Cheguei ao salão na hora devida, e a primeira pessoa que vi foi o Coronel Y. subindo as escadas! Resolvi, portanto, pegar o touro à unha e imediatamente após a conferência fui diretamente a ele e lhe disse: “Tenho uma mensagem para o senhor .
“Eu sei”, respondeu ele, “pois me disseram para aguardá-la” .
Parece que ele estava em seus aposentos uma tarde com seus dois cães. Eles subitamente ficaram perturbados e começaram a investigar algo que não estava lá. O Coronel Y. ouviu’ uma voz dizer-lhe distintamente ao ouvido interior que eu pediria sua ajuda e que ele deveria dá-la. Ele ficou tão impressionado com essa ocorrência que se dirigiu a uma amiga comum e lhe perguntou se eu estava em alguma confusão. A seu pedido, ela me escreveu para saber como eu estava passando, mas não mencionou nenhum nome, e eu, não compreendendo o significado do incidente, dei-lhe uma resposta evasiva .
Ele ouviu a minha história e pediu-me para deixar o assunto em suas mãos, o que eu fiz .
Essa é uma história de coincidências bastante estranhas, mas a conclusão é ainda mais estranha. Depois de deixar o Coronel Y., perguntei uma vez mais ao Invisível se eu deveria fazer mais alguma coisa. A resposta que chegou era a de que no momento eu não devia fazer nada, mas que eu seria informada quando a ação posterior devesse ser empreendida. Soube, depois, que X. havia deixado o país poucos dias após a minha entrevista com o Coronel Y .
Nada aconteceu durante cinco meses, e então uma tarde, estando eu sentada diante da lareira na penumbra, ouvi distintamente a Voz Interior dizer-me que agora era a hora de tomar providências em relação ao caso de X., e que eu devia ir ao Sr. Z. e contar a minha história. Ora, o Sr. Z. era uma pessoa muito ilustre, que eu sabia ser um ocultista elevado, mas a quem eu nunca havia encontrado. Repliquei à voz interior que era impossível aproximar-me do Sr. Z., que me mostrariam a porta e que a não ser que abrissem o caminho para esse fim, eu não via como isso pudesse se realizar. A resposta, muito nítida, foi de que o caminho estaria livre. E foi verdade.Dois dias depois anunciaram uma visita, um velho amigo a quem eu via ocasionalmente, e após as saudações usuais e a troca das novidades, ele disse: “Eu gostaria muito que você encontrasse um amigo meu que, acredito, teria muito interesse por seu trabalho. Posso apresentá-la a ele? Seu nome é Sr. Z.”. Não é preciso dizer que concordei .
Quando cheguei ao encontro combinado, disse ao Sr. Z., após ter sido apresentada: “Tenho uma mensagem para o senhor”, pensando que me poderiam tomar tanto por uma demente quanto por uma basbaque. Ele me ouviu atentamente, e quando mencionei o nome do indiano, meu amigo, que estava presente, exclamou: “E curioso que você esteja tratando desse assunto neste momento. X. regressou à Inglaterra há dois dias” .
Note-se que assim que X. deixou a Inglaterra, eu fui instruída a nada fazer, e que assim que ele retornou, após uma ausência de cinco meses, eu fui instruída a agir novamente. A não ser que estejamos preparados para arrancar o longo braço da coincidência de seu bolso, devemos concluir que alguma inteligência diretiva estava em ação. Esse é apenas um exemplo entre muitos de minha experiência. As limitações de espaço me proibem mencionar muitos outros .
Além da Policia Oculta, que funciona apenas nos Planos Internos, existem também certos grupos de ocultistas que se reúnem no propósito de combater o Ocultismo Negro. Suponho que eles se dêem diferentes nomes, mas não sei quais são; já ouvi referirem-se genericamente a eles como Pavilhões de Caça. Em várias ocasiões, travei escaramuças em seus flancos e presenciei algumas animadas pilhagens. Imagino que eles estão organizados em associação com a Polícia Oculta, pois possuem meios de obter informação que sugerem uma cooperação oriunda dos Planos Internos. Eles parecem possuir alianças em quadrantes inesperados e ser capazes de puxar um considerável número de fios. Não sei que armas psíquicas utilizam, mas no plano físico parecem contar grandemente com os relatos dos jornais, vigiando os indesejáveis em trânsito e nunca os deixando estabelecer-se e organizar-se. Sabendo o que sei de seus métodos, de tempos em tempos reconheço a sua marca em várias transações pelas quais os cidadãos decentes têm toda a razão de serem gratos .
Eu os encontrei certa vez numa circunstância que serve para ilustrar a maneira pela qual os ocultistas podem “pedir” as informações de que necessitam, e a trilha fortuita de circunstâncias as fornece .
Quando eu era jovem, no início do meu interesse pelo ocultismo, entrei em contato com um adepto que logo compreendi estar no Caminho da Mão Esquerda, e com quem logo cortei o meu contato. Pouco depois de ter rompido com ele, eu estava assistindo a uma gincana com alguns amigos, entre eles um estudante de ocultismo, e começamos a discutir assuntos de interesse mútuo. Impelida por não sei que impulso para confiar a ele o que jamais havia falado a ninguém, contei-lhe as minhas experiências com o adepto a que me referi. Para minha surpresa, ele sabia tudo sobre essa pessoa. Parece que meu novo amigo estava ligado a um grupo de ocultistas que tinha por tarefa caçar as Lojas Negras; eles já haviam cruzado o caminho de meu adepto negro e o haviam obrigado a cessar totalmente as atividades, e ele havia jurado não reorganizar a sua Ordem. Eles haviam tido razões recentemente para acreditar que esse juramento não estava sendo mantido e que ele tinha novamente organizado uma Loja e estava operando seus rituais, mas não sabiam onde lhe pôr as mãos. E aí fui eu, um pedaço dos destroços lançados num campo esportivo, a dar-lhe a informação de que precisavam no exato momento em que dela precisavam. Essas coisas acontecem regularmente demais no ocultismo para que alguém possa considerá-las como fortuitas .
Acredito que é possível, para quem quer que dela tenha necessidade, entrar em contato telepático com essa força policial oculta. O símbolo que me ensinaram a usar era uma Cruz do Calvário negra sobre um círculo escarlate. Devemos formulá-la na imaginação, e enquanto a miramos mentalmente o pedido é enviado para o Invisível, emanando do centro da testa .
Várias tentativas foram feitas para provar que as fraternidades ocultas são dirigidas de algumas sedes, pretensamente situadas na Alemanha, no Tibete, na Mongólia e na América do Sul. Pessoalmente, não acredito nisso. Suponho que tenho um conhecimento bastante variado dos trabalhos interiores do movimento oculto, e nunca vi qualquer coisa que indicasse um controle centralizado, seja para o bem, seja para o mal. Na verdade, tudo aponta para o contrário, e indica que não há um vínculo unificador, a não ser o de uma literatura comum, um idealismo comum e um conjunto de símbolos que, se não são comuns a todas as seções, são facilmente traduzíveis por meio de equivalentes bem compreendidos. A situação no mundo oculto é análoga à da Cristandade Protestante, não à da Cristandade Romana. O ocultista não tem um Papa .
Penso também que o bolchevismo jamais instalou qualquer cabeça de ponte nas Lojas, embora eu acredite que tenha tentado, como o testemunha a solicitação à minha própria fraternidade. O ocultista comum não se interessa por política, seu interesse é pelas coisas invisíveis. Além disso, as fraternidades ocultas estão desorganizadas e dispersas demais para constituírem formidáveis armas políticas, mesmo se fossem imbuídas de bolchevismo .
Diz-se também que as fraternidades ocultas são controladas pelos judeus no interesse do sionismo. Isso é totalmente falso. Há pouquíssimos judeus no movimento oculto. É verdade, no entanto, que a Cabala, o misticismo tradicional da raça judia, é uma das fontes principais do ocultismo ocidental, e que todo ocultista que trabalha sobre essa tradição deve pelo menos conhecer um pouco de hebraico para poder transliterar a escrita hebraica. O estudo da moderna Cabala mística está quase exclusivamente nas mãos dos gentios e os eruditos judeus ortodoxos pouco ou nada sabem de sua literatura e absolutamente nada de seu sentido místico .
Ninguém disse coisas mais pesadas sobre o movimento ocultista do que eu, e se eu pensasse que há qualquer sistema organizado de más influências, não hesitaria em dizê-lo, pois prezo bastante a integridade do movimento; mas não acredito honestamente que exista qualquer organização generalizada do movimento ocultista, seja para o bem ou para o mal, qualquer que seja a concepção de bem e mal que tenhamos. Só podemos, naturalmente, falar daquilo que vemos, mas penso que seria impossível para mim estar tão intimamente associada ao movimento como estive e nunca ter cruzado o seu caminho em algum lugar. Eu cruzei muitos caminhos, e vi, não o negarei, muitas coisas más, mas esse mal particular eu jamais testemunhei, e não acredito que ele exista a não ser na imaginação das pessoas que vêem a mosca azul. O verdadeiro vínculo do movimento ocultista é a devoção a um ideal comum, mas esse ideal é alcançado por uma infinita diversidade de caminhos, tantos quanto as vidas dos filhos dos homens .
Lamento pela hipotética pessoa que tem a tarefa de organizar o movimento ocultista, pois os ocultistas das diferentes escolas não podem ser induzidos a cooperar. Toda técnica que difere da que eles utilizam é suspeita; todo contato estranho é negro. A grande maioria dos líderes das escolas que conheci senta-se cada qual em seu próprio círculo de luz e amaldiçoa tudo o mais. Como a velha senhora que observava o filho desfilar com os soldados, eles exclamam: “Estão todos em passo errado, menos o meu João”. Eu sonhei outrora com uma federação de sociedades ocultas com uma convenção anual, mas logo compreendi que ela era impraticável. Se os ocultistas não podem ser convencidos a se organizar para servirem aos seus próprios interesses, é muito improvável que eles se organizem para servir aos de outros .
Os abusos que mais ocorrem no ocultismo ocidental são a imoralidade, o uso de drogas e a mistificação de mulheres estúpidas. Suas piores faltas são a credulidade, uma cultura relaxada que raia à ignorância, e uma tolice intelectual muito difundida. A leitura da sorte em todas as suas formas e algumas curas espirituais espúrias constituem outra mancha sobre o que deveria ser um campo santo. É difícil fazer justiça aos ideais que não partilhamos, mas sempre me pareceu que o humanitarismo grandemente colorido de que certas seções do movimento estão saturadas não é um ornamento. “Há de conhecê-los por seus frutos.” Os frutos desse que eu vi pareceram-me um tanto quanto passados.As mentes mais finas do ocultismo são totalmente desconhecidas fora de suas próprias Ordens. Uma cláusula muito comum nos juramentos de iniciação intima o candidato a não revelar os nomes de seus companheiros. Se esse juramento fosse quebrado, o público em geral teria uma grande surpresa. Como o ocultismo não tem uma boa reputação para o público em geral, os homens em posições públicas não podem permitir que os seus nomes se associem a ele; seu interesse é, portanto, cuidadosamente dissimulado, e eles só falam disso àqueles com cuja simpatia e discrição podem contar .
Aqueles que sabem o que buscar, contudo, podem reconhecê-los facilmente. Todo aquele que está acostumado com a análise do estilo literário pode detectar o leitor habitual da Bíblia. Todo aquele que conhece os rituais ocultistas detectará o seu aroma no estilo literário ou oratório do homem que está habituado à sua utilização. Será que depois de tanto tempo eu possa ser perdoada se quebrar o Juramento dos Mistérios que proíbe a divulgação dos nomes dos iniciados e sugerir que a chave para a controvérsia BaconShakespeare pode residir no fato de que Bacon e Shakespeare eram membros da mesma Ordem?
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