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excerto de O Ramo de Ouro
Sir James George Frazer. Trad. Waltensir Dutra.
Reis que são mortos quando sua força decai.
Se os altos deuses, que vivem distantes das agitações da vida terrena, devem finalmente morrer, não se pode esperar que um deus que tenha sua morada num frágil tabernáculo de carne escape à mesma sorte, embora tenhamos ouvido falar de reis africanos que se imaginavam imortais em virtude de suas feitiçarias. Os povos primitivos, como já vimos, acreditam que sua segurança e mesmo a segurança do mundo depende da vida de um desses deuses-homens ou encarnações humanas da divindade. É natural, portanto, que tenham o maior cuidado com a vida do rei, como medida de preservação de suas próprias vidas. Mas, por mais cuidado que tiverem, será impossível impedir que o homem-deus envelheça, se torne fraco e acabe morrendo. Seus fiéis têm de aceitar essa triste necessidade e enfrentá-la da melhor maneira possível. O perigo é formidável, pois, se o curso da natureza depende da vida do homem-deus, que catástrofes podem ocorrer com o enfraquecimento gradual de seus poderes e a extinção final deles pela morte? Só há uma maneira de evitar esses perigos. O homem-deus deve ser morto tão logo demonstre sintomas de que os seus poderes estão começando a diminuir, e sua alma deve ser transferida para um vigoroso sucessor antes que tenha sido seriamente prejudicada pela temida degeneração. As vantagens de eliminar, dessa forma, o homem-deus, em lugar de permitir que morra de velhice ou de doença, são bastante óbvias para o selvagem. Primeiro, se o homem- deus morre do que chamamos de morte natural, isso significa, de acordo com o selvagem, que a sua alma abandonou voluntariamente o corpo e se recusa a voltar, ou, mais comumente, que foi arrancada, ou pelo menos retida em suas andanças, por um demônio ou feiticeiro. Em qualquer desses casos, a alma do homem-deus está perdida para seus fiéis, e com ela desaparece a prosperidade destes, e a sua própria existência corre perigo. Mesmo que pudessem recapturar a alma do deus agonizante no momento em que deixa o seu corpo pela boca ou pelas narinas e transferi-la para um sucessor, isso não atingiria os objetivos desejados, pois, se
- rei morresse de doença, sua alma necessariamente deixaria o corpo no último estágio de debilidade e exaustão, e, assim enfraquecida, continuaria a arrastar uma exis- tência lânguida, inerte, em qualquer corpo para
- qual fosse transferida. Mas se eles próprios eliminarem o rei, os fiéis podem, em primeiro lugar, ter certeza de capturar sua alma no mo- mento em que deixa o corpo e transferi-la a um sucessor adequado.
Em segundo lugar, eliminando-o antes que sua força natural diminua, estarão seguros de que o mundo não sofrerá a mesma decadência do homem-deus. Todos os objetivos são, portanto, atendidos, e evitados todos os perigos, com a eliminação do homem-deus e a transferência de sua alma, ainda em pleno vigor, para um sucessor digno.
Os reis místicos do fogo e da água, do Camboja, não podem morrer de morte natural. Assim, quando um deles adoece seriamente, e os anciãos acham que não se pode curar, matam-no a punhaladas. O povo do Congo acreditava, como já vimos, que, se seu pontífice chitóme perecesse naturalmente, o mundo desapareceria com ele, e a terra, mantida por seu poder e mérito, seria imediatamente aniquilada. Assim sendo, quando ele adoecia e sua morte tornava-se provável, aquele que estava indicado para sucedê-lo entrava na casa do pontífice com uma corda ou uma clava e o estrangulava ou golpeava até a morte. Os reis etíopes de Méroe eram adorados como deuses, mas, sempre que os sacerdotes assim o desejavam, enviavam um mensageiro ao rei, anunciando-lhe que havia chegado a hora de morrer; sua autoridade para emitir tal ordem en- contrava fundamento num suposto oráculo dos deuses. A ordem foi sempre obedecida até o reinado de Ergámenes, contemporâneo de Pto- lomeu II, rei do Egito. Tendo recebido uma educação grega que o libertou das superstições de seus concidadãos, Ergámenes aventurou-se a desobedecer a ordem dos sacerdotes e, entrando no Templo de Ouro com um grupo de soldados, passou-os a fio de espada.
O hábito de eliminar os reis divinos aos primeiros sintomas de debilidade ou velhice existiu até recentemente, se é que chegou mesmo a desaparecer totalmente, e não apenas hibernar, entre os chiluks do Nilo Branco. A região em que vivem os chiluks é quase que totalmente coberta de pastagens, e, por isso, a principal riqueza é constituída por seus rebanhos, embora também plantem, em quantidades consideráveis, uma variedade de painço, conhecida como milhete da Índia. Embora os chiluks sejam principalmente pastores, não são nômades, vivendo em muitas aldeias fixas. A tribo conta atualmente com cerca de quarenta mil almas, e é governada por um único rei (rei), cuja residência é em Fachoda. Seus súditos cuidam muito bem dele, cumulando-o de honrarias.
O respeito que os chiluks têm para com seu rei parece advir principalmente da convicção de que ele é a reencarnação do espírito de Nyakang, o herói semidivino fundador da dinastia e consolidador da tribo em seu atual território, para o qual a teria levado a partir do oeste ou do sul. A tradição preservou a árvore genealógica dos reis desde Nyakang até hoje.
Os chiluks que vivem em Kodok (Fachoda) imaginam Nyakang com aparência e qualidades físicas humanas, embora, ao contrário de seus reais descendentes de épocas mais recentes, ele não morra, mas simplesmente desapareça. Sua santidade manifesta-se principalmente pela sua relação com Juok, o grande deus dos chiluks, que criou o homem e é responsável pela ordem da natureza. Juok não tem forma, é invisível e, como o ar, está em toda parte ao mesmo tempo. Está muito acima de Nyakang e dos homens, mas não é cultuado diretamente e sim por intermédio de Nyakang, cujos favores os chiluks obtêm oferecendo-lhe sacrifícios, de modo a que induza Juok a mandar-lhes a chuva necessária ao gado e às colheitas. Em seu caráter de propiciador das chuvas, Nyakang é o grande benfeitor dos chiluks, cuja religião consiste, hoje, principalmente no culto a esse herói semidivino, ancestral tradicional de seus reis. Não parece haver razão para duvidarmos de que as tradições relacionadas com ele sejam substancialmente corretas. Com toda a probabilidade, ele era simplesmente um homem a quem a superstição de seus companheiros, em sua época e posteriormente, elevou ao grau de divindade. Nada menos de dez santuários são dedicados ao seu culto; os três mais famosos ficam em Fachoda, Akurwa e Fenikang. Todos os santuários de Nyakang são chamados de túmulos de Nyakang (kengo Nyakang), embora se saiba perfeitamente que ninguém está enterrado ali. Duas grandes cerimônias são realizadas anualmente nesses santuários: uma delas é destinada a assegurar a vinda da chuva; a outra é celebrada por ocasião da colheita.
É artigo de fé fundamental para os chiluks o fato de que o espírito do divino ou semidivino Nyakang se encarna no monarca reinante, o qual, nessa medida, está ele próprio investido, até certo ponto, do caráter de divindade. Embora os chiluks tenham seus reis em alta estima, dedicando-lhes uma reverência realmente religiosa, e tomem todas as precauções contra a sua morte acidental, ainda assim partilham da “convicção de que não se pode deixar que ele adoeça ou envelheça, para que, com a redução de seu vigor, o gado também fique doente e deixe de reproduzir-se, as plan- tações apodreçam nos campos e os homens, atingidos pela enfermidade, morram em quan-.tidades cada vez maiores”. Para evitar tais calamidades, era costume regular entre os chiluks eliminar o rei sempre que ele demonstrava sinais de doença ou diminuição de vigor. Um dos sintomas fatais de decadência era a incapacidade de satisfazer as paixões sexuais de suas mulheres, que eram numerosas, distribuídas entre várias casas de Fachoda.
O rei chiluk podia ser morto, com as devidas cerimônias, aos primeiros sintomas de uma decadência incipiente; além disso, mesmo quando ainda no vigor da saúde e da força, podia ser atacado a qualquer momento por um rival e ter de defender sua coroa em combate singular até a morte. De acordo com a tradição chiluk, todo filho de rei tinha o direito de lutar com o ocupante do trono e, se conseguisse matá-lo, reinar em lugar dele. O combate era realizado habitualmente à noite e em meio a pesado silêncio, rompido apenas pelo entrechocar de lanças e escudos, pois era ponto de honra para o rei não invocar a ajuda de ninguém.
Quando o rei, em lugar de perecer em combate singular, era eliminado pela aproximação de enfermidade ou velhice, tornava-se necessário encontrar-lhe um sucessor. Ao que tudo indica, este era escolhido pelos chefes mais poderosos entre os príncipes (niaret), filhos do recém-falecido ou de um de seus antecessores. Parte importante das solenidades que marcavam a coroação de um rei chiluk parece ter sido a que se destinava a transmitir-lhe o espírito divino de Nyakang, que vinha passando, desde o fundador da dinastia, a todos os seus sucessores.
Como o próprio Nyakang, todo rei chiluk é, depois de morto, venerado num santuário erguido sobre seu túmulo, que fica sempre na aldeia onde nasceu. O santuário-túmulo de um rei assemelha- se ao de Nyakang, consistindo em umas poucas choças dentro de um cercado: uma delas é levantada sobre o túmulo do rei, e as outras são ocupadas pelos guardiães do santuário. Dificilmente se distinguem os santuários de Nyakang dos santuários dos reis, e os ritos religiosos celebrados em todos eles são idênticos na forma, variando apenas em questões de detalhe, aparentemente em conseqüência da maior santidade atribuída aos santuários de Nyakang. A cerimônia da colheita, realizada nestes, também o é em geral, mas não necessariamente, nos santuários-túmulos dos reis. Finalmente, as pessoas enfermas mandam animais para serem sacrificados como oferendas nos santuários dos reis do mesmo modo como os enviam para os santuários de Nyakang.
Numa visão geral, o elemento principal da religião dos chiluks parece ser o culto dos reis sagrados ou divinos, mortos ou vivos. Segundo se acredita, esses reis são animados por um mesmo espírito divino, transmitido pelo fundador da dinastia — semimítico, mas provavelmente, em substância, histórico —, através de todos os seus acessores, até o dia de hoje. Não obstante, o espírito divino não é, evidentemente, congênito aos membros da família real: ele só é transmitido a cada rei quando de sua ascensão ao trono e por meio de um objeto misterioso, também chamado Nyakang, no qual se pode supor que viva o espírito sagrado de Nyakang. Assim, considerando os seus reis como divindades encarnadas das quais depende implicitamente o bem-estar dos homens, do gado e dos cereais, os chiluks lhes dedicam, é claro, o maior respeito e tomam grande cuidado com eles. E, por mais estranho que nos pareça, o costume de eliminar o rei divino tão logo mostre indícios de má saúde ou perda de força nasce diretamente da profunda veneração que sentem por ele e da preo- cupação com preservá-lo, ou, antes, com pre- servar o espírito divino que o anima no mais perfeito estado de eficiência. Podemos mesmo ir mais longe e dizer que a prática do regicídio é a melhor prova que os chiluks podem dar da elevada consideração que têm para com seus reis.
De um modo geral, a teoria e a prática dos reis divinos dos chiluks corresponde muito de perto à teoria e à prática dos sacerdotes de Nemi, dos reis do bosque, se é correta a minha interpretação deste último. Em ambos os casos, vemos uma série de reis divinos de cuja vida se acredita depender a fertilidade dos homens, dos animais e da vegetação, e que são mortos, em combate singular ou não, para que seu espírito divino possa ser transmitido aos seus sucessores em pleno vigor, livre da debilidade e da decadência da enfermidade ou da velhice, porque essa degeneração, da parte do rei, implicaria — na opinião de seus súditos — uma degeneração correspondente da humanidade, dos animais e das plantações.
Os dinkas são um conjunto de tribos inde- pendentes do vale do Nilo Branco, cujo território, situado principalmente na margem leste do rio e estendendo-se do sexto ao décimo segundo grau de latitude norte, tem, segundo se calcula, entre cento e cinqüenta e cento e setenta e cinco quilômetros quadrados.
Apesar, ou antes, em virtude da elevada posição que ocupa, nenhum fazedor-de-chuva dinka pode ter morte natural de enfermidade ou velhice, pois os dinkas pensam que, se tal fato adverso ocorresse, a tribo sofreria de doenças e de fome e os rebanhos não se multiplicariam. Assim, quando um fazedor-de-chuva sente que está ficando velho e doente, diz aos seus filhos que quer morrer. Entre os agar dinkas uma grande cova é aberta, e o fazedor-de-chuva nela se deita, sobre o lado direito, com a cabeça sobre uma pele. É cercado pelos amigos e parentes, inclusive os filhos mais novos. Os mais velhos, porém, não podem apro- ximar-se da cova, para que, em seu sofrimento e desespero, não venham a ferir-se. Durante muitas horas, em geral por mais de um dia, o fazedor-de- chuva fica ali, sem comer nem beber. De tempos em tempos, fala aos que o cercam, lembrando o passado da tribo, recordando-lhes como os governou e aconselhou, e dando instruções sobre como agir no futuro. Concluídas as suas recomendações, diz-lhes que está acabado e pede que o cubram. A terra é lançada sobre ele na cova, causando a morte por sufocação. Tão logo o fazedor-de-chuva é morto, seu valioso espírito deve passar a um sucessor adequado, que pode ser seu filho ou parente consanguíneo próximo.
Reis que são mortos ao fim de um prazo determinado
Nos casos que descrevemos até agora, o rei ou sacerdote divino conserva sua função com o assentimento do povo até que alguma deficiência evidente, algum sintoma visível de má saúde ou envelhecimento, mostre sua incapacidade de cumprir os deveres divinos; mas só quando tais sintomas são claros é ele eliminado. Há certos povos, porém, que julgam pouco seguro esperar até mesmo pelo mais leve sinal de decadência, e em lugar disso preferem matar o rei enquanto ainda está em pleno vigor. Assim, fixam um prazo para o seu reinado, findo o qual ele tem de morrer. Esse prazo é bastante curto, para excluir a possibilidade de degeneração física durante o reinado. Em certas regiões do sul da Índia, o período fixado era de doze anos. Assim, de acordo com um velho viajante que percorreu a província de Querala, cerca de vinte léguas a nordeste do cabo Comorim, “há uma casa de orações dos gentios, onde há um ídolo por eles muito respeitado, e, a cada doze anos, celebra-se uma grande festa para esse ídolo, à qual os gentios comparecem como se fossem a um jubileu. Esse templo tem muitas terras e muitas rendas: é um negócio de grandes proporções. A província tem um rei, cujo reinado dura apenas doze anos, de jubileu a jubileu. O comportamento do rei é, quanto a isso, sábio, ou seja: quando os doze anos se completam, no dia da festa, reúnem-se muitas pessoas, e muito dinheiro é gasto para dar comida aos brâmanes. O rei faz com que seja erguido um catafalco de madeira, forrado de seda e, nesse dia, vai banhar-se num tanque com grandes cerimônias e muita música, depois do que se dirige ao ídolo e faz orações, sobe ao catafalco e ali, à frente de todos, com facas muito afiadas, começa cortando o nariz, depois as orelhas, os lábios e todos os seus membros, e o máximo de carnes que pode cortar de si mesmo, lançando tudo isso fora, apressadamente, até que tanto sangue se derrama que ele começa a desmaiar, quando então corta a própria garganta. Realiza esse sacrifício para o ídolo, e quem desejar reinar durante doze anos e sofrer esse martírio por amor ao ídolo tem de estar presente, presenciando o acontecimento, e daquele lugar o levam, como rei”.
Quando os reis estavam condenados à morte ao término de um certo prazo, era natural que procurassem delegar o penoso dever, juntamente com alguns dos privilégios da soberania, a um substituto que sofresse em seu lugar. A transferência do dever de morrer pelo seu país talvez tenha sido praticada pelos sultões de Java. Isso pelo menos explicaria uma cena estranha, testemunhada na corte de um deles pelo famoso viajante Ibn Battuta, natural de Tânger, que visitou as Índias holandesas na primeira metade do século
XIV. Diz ele: “Durante minha audiência com o sultão, vi um homem que tinha na mão uma faca semelhante à que é usada por um colhedor de uvas. Colocou-a contra o próprio pescoço e falou durante muito tempo numa língua que eu não compreendi. Depois disso, segurou-a com as duas mãos e cortou a própria garganta. Sua cabeça caiu no chão, tão afiada era a lâmina e tão grande a força por ele empregada. Fiquei estarrecido com esse comportamento, mas o sultão me disse: ‘Ninguém faz isso, em seu país?’ Respondi: ‘Jamais vi tal coisa’. Ele sorriu e respondeu: ‘São escravos nossos e se matam por amor a nós’. Mandou em seguida que levassem o corpo e o queimassem. Os oficiais, os dignitários, os soldados do sultão e o povo em geral compareceram à cremação. O soberano fixou uma pensão bastante liberal para os filhos do morto, para sua mulher e seus irmãos, que receberam muitas honrarias devido ao seu comportamento. Alguém que estava presente à audiência em que ocorreu o fato descrito informou-me que o discurso feito pelo homem que se sacrificara falava de sua dedicação ao monarca. Disse que desejava imolar-se por afeição ao soberano, como seu pai havia feito por amor do pai do príncipe, e seu avô também fizera por amor do avô do príncipe”. Podemos conjeturar que antigamente os sultões de Java, como os reis de Querala, estavam condenados a cortar a própria garganta ao término de um determinado prazo, mas que posteriormente passaram a delegar o de- ver, doloroso, embora glorioso, de morrer pelo seu país aos membros de uma certa família, que, como recompensa, recebiam generosa assistência durante toda a vida e um belo funeral.
Há também algumas razões para supor que o reinado de muitos dos antigos soberanos gregos era limitado a oito anos, ou pelo menos que, ao cabo de cada período de oito anos, uma nova consagração, uma nova unção de graça divina, era considerada como necessária para permitir-lhes o bom desempenho de seus deveres civis e religiosos. A constituição de Esparta determinava que, a cada oito anos, os éforos escolhessem uma noite clara e sem luar e, sentando-se, observassem os céus em silêncio. Se durante essa vigília vissem um meteoro ou estrela cadente, deduziam que o rei havia pecado contra a divindade e o suspendiam de suas funções até que o oráculo deifico ou olímpico o restabelecesse no cargo. Esse costume, que tem toda a aparência de ser muito antigo, não foi letra morta nem mesmo no período final da monarquia espartana, pois, no século II a.C., um rei, que se havia tornado desagradável ao partido reformista, foi deposto sob várias acusações forjadas, entre as quais a alegação de que o pressago sinal havia sido visto. Esta é uma sobrevivência, sob forma atenuada, de uma instituição que pode ter desfrutado outrora de grande significação, e lança uma luz importante sobre as restrições e limitações impostas antigamente, pela religião, aos reis dórios. Qual era exatamente a importância de um meteoro na opinião dos antigos dórios, dificilmente podemos ter esperanças de determinar; mas uma coisa é clara: consideravam-no como um sinal tão sombrio e ameaçador que seu aparecimento em certas circunstâncias justificava, e até mesmo exigia, a deposição do rei. Esse medo exagerado de um fenômeno natural tão simples é comum a muitos selvagens até hoje, e dificilmente estaremos errados supondo que os espartanos o herdaram de seus ancestrais bárbaros, que podem ter visto com consternação, em muitas noites estreladas nas florestas da Alemanha, um meteoro cruzar o céu.
Na Babilônia, em tempos históricos, o reinado era praticamente vitalício, mas, em teoria, ao que parece, era apenas anual. Isso porque todos os anos, no festival de Zagmuk, o rei tinha de renovar seus poderes segurando as mãos da imagem de Marduck, em seu grande templo de Esagil, na Babilônia. Mesmo quando a Babilônia ficou sob o domínio assírio, os monarcas da Assíria deviam legitimar sua pretensão ao trono todos os anos indo à Babilônia e realizando a antiga cerimônia na festa do Ano-Novo.
Alguns deles acharam tão incômoda essa obrigação que, em lugar de cumpri-la, preferiram abrir mão do título de rei, contentando-se com outro, menos importante, de governador. Parece, além disso, que em épocas remotas, embora não no período histórico, os reis da Babilônia, ou seus predecessores bárbaros, perdiam não apenas a co- roa, mas também a vida, depois de um ano de monarquia. Pelo menos é essa a conclusão a que as evidências que se seguem parecem levar. De acordo com o historiador Beroso, que, como sacerdote babilónico, falava com amplo conhecimento, celebrava-se anualmente na Ba- bilônia um festival chamado Sacaea. Começava no décimo sexto dia do mês de lous e durava cinco dias. Durante a festa, senhores e criados trocavam de lugar, passando os segundos a dar ordens e os primeiros a obedecer-lhes. Um prisioneiro condenado à morte era vestido com as roupas do rei, sentado no seu trono, e podia dar as ordens que desejasse, beber, comer, divertir-se e dormir com as concubinas do rei. Mas, ao fim dos cinco dias, era despido de suas vestes reais, flagelado e enforcado ou empalado. Durante seu breve reinado, tinha o título de zoganes.
Se na Babilônia, antes do alvorecer da história, o próprio rei costumava ser imolado no festival de Sacaea, é natural supor que Sacaea não fosse outra senão Zagmuk ou Sakmuk, a grande festa do Ano-Novo, durante a qual, até os tempos históricos, o poder do rei tinha de ser formalmente renovado por uma cerimônia religiosa no templo de Marduck. Uma reminiscência da festa de Zagmuk parece perdurar na crença dos iezídis de que, no dia do Ano-Novo, Deus senta-se em seu trono, ordenando os decretos para o novo ano, atribuindo aos dignitários as suas várias funções e entregando-lhes credenciais, com a sua assinatura e selo.
Essa compreensão de que, na Babilônia, o prisioneiro condenado que vestia as roupas reais
era imolado como um substituto do rei pode ser reforçada pela prática da África ocidental, onde, nos funerais de um rei, os escravos costumavam ser vestidos como ministros de Estado e, em seguida, sacrificados como tais em lugar dos verdadeiros ministros, seus senhores, que compravam por uma soma de dinheiro esse privilégio de morrer por procuração. Esses sacrifícios de substitutos foram testemunhados por um missionário católico em Porto Novo, na Costa dos Escravos. Os banyoros ou bakitaras, de Uganda, tinham um notável costume, que parece indicar que, até tempos recentes, observavam o hábito seme lhante de limitar a um só ano o reinado e a vida de seus monarcas.
O costume é assim descrito pelo Cônego Roscoe: “Aproximadamente na época do ano em que o rei havia sido enterrado, o monarca reinante disse a Bamuroga que preparasse uma festa para o falecido rei. Bamuroga escolheu um homem pobre do clã babito para representar o rei morto, e o escolhido passou a viver regiamente no túmulo do rei e a ser chamado pelo nome do monarca que representava, pois se acreditava ser ele o velho rei ressuscitado. Vivia no túmulo, era festejado e cumulado de honrarias e tinha pleno uso das mulheres do túmulo, isto é, as viúvas do velho rei. O monarca reinante mandava-lhe presentes e ele retribuía com bênçãos que enviava ao rei, à terra e aos animais. Distribuía à vontade presentes de vacas pertencentes ao rei e, durante oito dias, viveu ele mesmo como um rei. No nono dia, foi retirado do túmulo e estrangulado, e não se ouviu mais falar dele. Era uma cerimônia anual”. Parece provável que esse falso rei que reinava por oito dias todos os anos fosse um substituto do próprio rei, que, dessa forma, morria anualmente na pessoa de seu substituto. Em tempos mais remotos, o rei talvez não tivesse outra escolha senão morrer ele próprio ao final de um breve reinado de apenas um ano.]
Alternativas à eliminação do rei Reis temporários
Em certos lugares, a forma modificada do antigo costume de regicídio que parece ter pre- dominado na Babilônia foi ainda mais amenizada. O rei ainda abdicava anualmente por um curto período de tempo e seu lugar era ocupado por um soberano mais ou menos nominal; este, porém, ao final de seu breve reinado, já não era morto, embora por vezes um simulacro de exe- cução ainda pudesse sobreviver como lembrança da época em que ele era realmente eliminado. No mês de méac (fevereiro), o rei do Camboja abdicava, todos os anos, por três dias. Durante esse tempo, ele não exercia sua autoridade, não tocava nos selos, nem mesmo recebia as rendas que lhe eram devidas. Em seu lugar ficava um rei temporário, chamado de sdach méac, isto é, rei de fevereiro. O papel de rei temporário era hereditário entre os homens de uma família remotamente ligada à casa real: os filhos sucediam aos pais, os irmãos mas novos aos mais velhos, tal como na sucessão real. Num dia favorável, fixado pelos astrólogos, o rei temporário era levado pelos mandarins em procissão triunfal. Era conduzido sobre um dos elefantes reais, sentava-se no palanquim real e era escoltado por soldados que, vestidos de forma apropriada, representavam os povos vizinhos do Sião, do Anam, do Laos e assim por diante. Em lugar da coroa de ouro, usava um gorro branco de pala, e os seus símbolos do poder, em vez de serem de ouro incrustados de diamantes, eram de madeira tosca. Depois de prestar homenagem ao verdadeiro rei, de quem recebia seu mandato de três dias, juntamente com toda a receita recolhida durante esse período (embora esse último costume tenha sido deixado de lado por algum tempo), desfilava em procissão em torno do palácio e pelas ruas da capital. No terceiro dia, depois da procissão habitual, o rei temporário dava ordens para que os elefantes esmagassem sob seus pés a “montanha de arroz”, que era uma armação de bambu, cercada de montes de arroz. O povo catava e recolhia o arroz espalhado, do qual todos levavam consigo um pouco para assegurar uma boa colheita. Um pouco desse arroz era também levado ao rei, que o mandava cozinhar e o oferecia aos monges.
No Sião, no sexto dia da lua no sexto mês (fim de abril) é nomeado um rei temporário, que durante três dias desfruta das prerrogativas reais, enquanto o verdadeiro soberano fica trancado em seu palácio. Esse rei temporário envia seus numerosos acólitos em todas as direções para que se apossem e confisquem tudo o que encontrem no bazar e nas lojas abertas. Até mesmo os navios e juncos que chegam ao porto nesses dias passam a ser de sua propriedade e têm de ser resgatados. O falso rei vai para um terreno no meio da cidade e para ali também é levado um arado dourado, puxado por bois enfeitados. Depois que o arado é ungido e os bois são esfregados com incenso, o falso rei traça nove sulcos com o arado, no que é seguido pelas damas idosas do palácio, que vão espalhando as primeiras sementes da estação. Tão logo os nove sulcos são abertos, a multidão de espectadores se precipita e luta pelas sementes que acabaram de ser semeadas na crença de que, de mistura com as sementes de arroz, virá uma colheita abundante. Depois, os bois são desatrelados, e, à sua frente, são colocados arroz, milho, sésamo, bananas, cana- de-açúcar, melões, etc. Aquilo que os bois co- merem primeiro constituirá, segundo a crença comum, um gênero caro no ano seguinte, em- bora certas pessoas interpretem o presságio de maneira contrária. Durante todo esse tempo, o rei temporário fica encostado a uma árvore com o pé direito sobre o joelho esquerdo. Por ficar assim num pé só, é conhecido popularmente como o rei perneta, embora seu título oficial seja phaya phollathep, “senhor das hostes celestiais”. É uma espécie de ministro da agricultura; todas as disputas sobre campos, arroz, etc, lhe são submetidas. Há, além disso, outra cerimônia na qual personifica o rei, realizada no segundo mês do ano (que cai na estação fria) e que dura três dias. Nessa ocasião, ele é levado em procissão a um lugar a céu aberto, em frente ao templo dos brâmanes, onde vários mastros foram levantados, como os mastros de maio, e sobre os quais se balançam os brâmanes. Enquanto estes se balançam e dançam, o senhor das hostes celestiais tem de ficar de pé, sobre apenas um dos pés, num palanque de tijolos, forrado de tecido branco e adornado de tapeçarias. O falso rei fica em cima de um suporte de madeira dotado de uma cobertura dourada, com um brâmane de cada um dos lados. Os brâmanes que dançam têm consigo chifres de búfalo com os quais tiram, de um grande recipiente de cobre, água que aspergem sobre os espectadores. Acredita-se que isso trará boa sorte, fazendo com que as pessoas vivam em paz e tenham tranqüilidade, gozem de boa saúde e sejam prósperas. O tempo durante o qual o senhor das hostes celestiais tem de ficar sobre um dos pés é de cerca de três horas. Acredita-se que isso “ponha à prova as disposições dos devattas e dos espíritos”. Se ele baixar o pé, “estará sujeito a perder suas propriedades, e sua família poderá ser escravizada pelo rei, pois isso é considerado como um mau presságio, prenunciando a destruição do Estado e a instabilidade do trono. Mas, se ele agüentar com firmeza, acredita-se que tenha conquistado uma vitória sobre os espíritos malignos, e lhe é conferido o privilégio suplementar, pelo menos ostensivamente, de confiscar qualquer navio que entre na baía durante aqueles dias e ficar com sua carga, bem como o privilégio de entrar em qualquer loja da cidade e levar o que quiser”. Eram esses os deveres e os privilégios do rei perneta siamês até meados do século XIX ou mais tarde ainda.
Alguns aspectos relativos a esses reis tem- porários merecem comentário especial antes de passarmos às evidências seguintes. Em primeiro lugar, os exemplos mostram claramente que só são transferidas para o substituto temporário do rei as funções mágicas ou divinas. Isso se evidencia pelo detalhe de que, ao manter levantado o seu pé, o rei temporário do Sião conquistava uma vitória sobre os maus espíritos e, se o deixasse pousar no chão, punha em risco a existência do Estado. A cerimônia cambojana dos elefantes pisando a “montanha de arroz” e a cerimônia siamesa de dar início à aradura e à semeadura da terra são encantamentos destinados a propiciar uma seara abundante, como se percebe pela crença de que aqueles que levarem para casa um pouco do arroz pisoteado ou da semente espalhada terão uma boa colheita. Além disso, quando o representante siamês do rei manobra o arado, o povo o observa ansiosamente, não para ver se abre um sulco reto, mas para marcar o ponto exato de sua perna a que chega a barra de sua roupa de seda, pois disso parecem depender as condições do tempo e a colheita na estação seguinte. Se o senhor das hostes celestiais levanta sua saia acima do joelho, o tempo será chuvoso e as plantações poderão ser prejudicadas. Se deixa a roupa arrastar-se até o calcanhar, haverá uma seca. Mas haverá bom tempo e boas colheitas se a barra da roupa ficar exatamente no meio da sua canela. O curso da natureza, e com ele a felicidade ou desgraça do povo, tem, portanto, uma ligação extremamente íntima com os menores atos ou gestos do representante do rei. Mas a tarefa de fazer com que as plantações cresçam, assim transferida ao rei temporário, é uma das funções mágicas que devem ser cumpridas pelos reis na sociedade primitiva. A exigência de que o falso rei fique em um pé só sobre um suporte elevado num campo de arroz talvez significasse originalmente um encantamento para fazer com que as plantações crescessem bastante, e em boa posição.
Vimos como o rei temporário é nomeado anualmente de acordo com o costume. Em outros casos, porém, a nomeação é feita apenas para atender a uma emergência, como, por exemplo, para proteger o verdadeiro rei de um mal real ou potencial, que é desviado para um substituto que ocupa o seu lugar no trono por um breve período. A história da Pérsia nos oferece exemplos desses substitutos ocasionais do Xá.
Um deles relaciona-se com o Xá Abas, o Grande, o mais eminente de todos os reis persas, que reinou de 1586 a 1628 de nossa era. Seus astrólogos advertiram-no de que, no ano de 1591, um sério perigo pairava sobre ele, e o rei tentou contorná-lo abdicando do trono em favor de um certo infiel, de nome Yus-suf, provavelmente um cristão. O substituto foi devidamente coroado e, durante três dias, a acreditar nos historiadores persas, não só usou o nome do rei, como também gozou da sua condição e do seu poder. Ao fim desse breve reinado, foi executado: a vontade das estrelas foi cumprida com esse sacrifício, e Abas, que reassumiu seu trono numa hora mais propícia, teve de seus astrólogos a promessa de um longo e glorioso reinado.
O sacrifício do filho do rei
Um detalhe a notar sobre os reis temporários descritos acima é que, no Camboja, eles vêm de uma família que parece estar ligada por parentesco à família real. Se a interpretação dada aqui à origem desses reinados temporários é correta, podemos compreender facilmente porque o substituto do rei deve, em certos casos, ser da sua mesma raça. Quando o rei conseguiu que a vida de outra pessoa fosse aceita em sacrifício, em lugar da sua própria vida, teve de mostrar que a morte desse outro serviria tão bem aos propósitos visados quanto o sacrifício do próprio rei. Ora, era como deus, ou semideus, que o rei tinha de morrer; portanto, o substituto que morria em seu lugar tinha de ser investido, pelo menos para essa ocasião, dos atributos divinos do rei. Isso, como acabamos de ver, ocorria certamente no caso dos reis temporários do Sião e do Camboja: eram investidos das funções sobrenaturais que, numa fase anterior da sociedade, eram atributos específicos do rei. Mas ninguém poderia representar melhor o rei em seu caráter divino do que seu próprio filho, que poderia compartilhar da condição divina de seu pai. Ninguém, portanto, mais indicado para morrer pelo rei e, através dele, por todo o povo, do que o filho do rei.
De acordo com a tradição, Aun ou On, rei da Suécia, sacrificou nove de seus filhos a Odin, em Uppsala, para que sua vida fosse poupada. Depois de ter sacrificado o segundo filho, rece- beu do deus a resposta de que poderia viver enquanto lhe sacrificasse um de seus filhos a cada nove anos. Ao sacrificar o sétimo filho, ainda vivia, mas estava tão fraco que não podia andar e tinha de ser levado numa cadeira. Ofereceu então o oitavo, e viveu mais nove anos, deitado numa cama. Depois, sacrificou o nono filho, viveu outros nove anos, mas de tal modo que tinha de beber de um chifre como uma criança pequena. Quis, então, sacrificar seu último filho a Odin, mas os suecos não permitiram. Morreu, portanto, e foi enterrado em Uppsala.
Um costume semelhante existiu entre alguns chefes chaggas, no monte Kilimanjaro, na África oriental. A respeito deles “diz-se que, antigamente, quando um chefe estava seriamente doente, sacrificava primeiro animais, em grande número, aos seus ancestrais; em seguida, sacrificava aos ancestrais dos chefes que haviam sido vencidos e mortos, e, finalmente, aos ancestrais de todos os que havia matado na guerra. O grande chefe Rongoma sacrificou a Ruwa até mesmo seu primogênito, e o mesmo se diz de outros chefes, em tempos antigos”.
Entre os semitas da Ásia ocidental, o rei, num momento de perigo nacional, dava por vezes seu próprio filho em sacrifício pelo povo. Assim, Filo de Biblos, em sua obra sobre os judeus, diz: “Era costume antigo numa crise de grande perigo dar o governante da nação ou da cidade o seu filho bem-amado para morrer por todo o povo, como um resgate oferecido aos demônios vingadores, e esses filhos assim oferecidos eram sacrificados com ritos místicos”. Assim Cronus, a quem os fenícios chamam Israel, sendo rei da terra e tendo um único filho, chamado Jeud (pois, na língua fenícia, Jeud significa “unigénito”), vestiu-o com roupas reais e o sacrificou num altar, em tempo de guerra, quando o país corria grande perigo diante do adversário. Quando o rei de Moab foi sitiado pelos israelitas e corria grande risco, tomou seu primogênito, que deveria reinar em seu lugar, e sacrificou-o como uma oferenda candente sobre a muralha.
Entre os semitas, porém, a prática de sacrificar filhos não se limitava aos reis. Em tempos de grande calamidade, como a peste, a seca ou a derrota na guerra, os fenícios costumavam sacrificar uma pessoa querida a Baal. ”A história fenícia”, diz um autor antigo, “está cheia desses sacrifícios.” Crianças eram publicamente imoladas pelos cartagineses até a época do proconsulado de Tibério, que fez crucificar os sacerdotes nas árvores ao lado de seus templos. Não obstante, o costume continuou sendo observado secretamente até a época de Tertuliano.
Entre os cananeus, ou habitantes aborígines da Palestina, que os israelitas conquistaram mas não exterminaram, o sombrio costume de queimar suas crianças em honra de Baal ou Moloch parece ter sido praticado regularmente. Quando o cronista hebreu registrou a maneira pela qual Shalmaneser, rei da Assíria, sitiou Samaria durante três anos e a tomou, levando Israel em cativeiro, explica que isso foi um castigo divino que caiu sobre seu povo por este ter sido complacente com os costumes malignos dos cananeus. Eles haviam construído edificações elevadas em todas as suas cidades, levantado pilares e mastros sagrados (asherim) em todas as altas colinas e sob todas as árvores verdes g ali queimavam incenso à maneira dos pagãos. “E esqueceram todos os mandamentos do Senhor seu Deus, e fizeram imagens moldadas, até mesmo dois bezerros, e fizeram um Asherah, e adoraram todas as hostes celestiais e serviram a Baal. E fizeram com que seus filhos e filhas passassem pelo fogo, e usaram encantamentos e adivinhações.” Podemos, portanto, deduzir com segurança que um costume de permitir aos reis que matassem seus filhos como substitutos, num sacrifício
indireto, não seria excepcional nem sur- preendente, pelo menos em terras semitas, onde em verdade a religião parece ter, em certa época, recomendado ou concitado todos os homens, como a um dever para com seu deus, a tirarem a vida do filho mais velho. E estaria totalmente de acordo com a analogia se, muito depois de ter sido o bárbaro costume abando- nado por outros, continuasse a ser observado por reis que permaneceram, sob muitos aspectos, como representantes de um mundo desa- parecido, como pináculos solitários resistindo à montante devastação das águas sob as quais jaz o passado.
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