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Tamosauskas.
Com esse texto começo, sem muita pressa de acabar, uma nova série de ensaios, que chamarei de “Os Novos Discursos de Atalanta”. Ela será baseada no Atalanta Fugiens, um dos tratados alquímicos mais importantes da história que junto com os emblemas de Mattaus Merian e a música e poesia de Michael Maier oferece também 50 discursos filosóficos que muitos acreditam ser do mesmo autor dos famosos manifestos rosacruzes. Como um conjunto o livro fala a mente, as emoções e ao pensamento em uma espécie de currículo hermético que conjuga o intelecto e via cardíaca.
Mas ao contrário das ilustrações e da música os discursos intelectuais me parecem distantes dos dias de hoje. As imagens e a música se provaram imortais, tanto a forma de escrita como as referências textuais dos ensaios estão datadas. Farei portanto uma tentativa de revitalizar sua linguagem e seus exemplos aos alquimistas da nossa época. Para um efeito total peço que apreciem o emblema que acompanha o texto e a musica correspondentes (ver acima). Tentarei aqui apenas revitalizar o discurso e evitar me distanciar do tópico proposto.
Espero que apreciem.
I. O Ar o carrega em seu Ventre
Imagine uma substância que não fosse apenas invisível e sutil como o ar, mas também uma força criativa e transformadora, capaz de dar origem a tudo. Onde quer que você vá, em qualquer parte do universo, essa substância também estará presente. Ela contém todas as coisas, mas não pode ser completamente contida por coisa alguma. Dela emergem todos os tipos de energia e matéria. Em última instância, dela surge tudo, inclusive os seres humanos e o próprio conhecimento.
Antigamente, acreditávamos que os metais surgiam da condensação de vapores no interior da Terra. Hoje, sabemos que os metais nascem da fusão nuclear promovida pela gravidade nas estrelas. Em ambos os casos, temos algo sutil, como vapores ou gravidade, que, embora facilmente vencidos por um passo ou um abanar de mãos, dão origem a elementos pesados como o chumbo ou a formação de gigantes vermelhas. A metáfora se mantém: algo denso nasce do sutil.
Mas isso não é apenas uma metáfora, é uma ideia filosófica que Hermes Trismegisto, o mítico alquimista original, teria registrado em sua famosa Tábua de Esmeralda: “O vento o carrega em seu ventre”. O ar está associado à mente, aos pensamentos. Ambos são invisíveis, mas podem ser percebidos indiretamente, e ambos são puro movimento. No entanto, não se limite ao intelecto. Esse ar representa a mente como um todo: não apenas a mente que pensa, mas também a que sente, que deseja e que torna os cinco sentidos possíveis.
Os alquimistas também chamam essa substância de Mercúrio. Note que Mercúrio, ou Hermes, o mensageiro dos deuses, tem asas nos pés. Ele não apenas voa pelos céus com suas sandálias aladas, mas também nos lembra de que há algo que serve como intermediário entre o espiritual e o material, entre os deuses e os humanos. Por isso, ele é também o agente da transformação, levando o enxofre – que representa o espírito – para maturar, assim como o vento do céu carrega o pólen. A ideia aqui é que o vento espiritual carrega um outro tipo de germe.
E que germe é esse? Seja o que for, os alquimistas o chamam de Enxofre. Fisicamente, é o número atômico; biologicamente, é o DNA; psicologicamente, é o Ego; nas plantas, é a semente; nos animais, é o embrião. Aritmeticamente, é a raiz de um cubo; musicalmente, é a partitura; geometricamente, é o ponto que inicia uma linha; astronomicamente, é o centro de um sistema gravitacional.
Na mitologia, Jasão precisou dos dois Filhos de Bóreas (o vento do norte) para libertar o profeta Fineu das Harpias. As Harpias, aqui, simbolizavam o enxofre decaído, distantes da perfeição, algo que os cabalistas chama de qlipohot e alguns alquimistas de Antimônio. Apenas pela ação desses ventos, ou seja, apenas através da ação da própria consciência, é que o caminho para o Velocino de Ouro se torna claro.
E por que dois ventos? José Newton já dizia: “Se subiu tem que descer”, e na Tábua de Esmeralda lemos: “Sobe da terra para o Céu e desce novamente à Terra.” Basil Valentine também fala desse vento duplo, Vulturnus e Notus, e sua interação como a força criadora. Esse vento, soprado do leste e do sul, gera água a partir do ar. É uma imagem poderosa de como, pela agitação da consciência a transformamos em experiências como amor e ódio, ou mesmo em sensações como uma carícia ou uma dor de dente.
E se esse sobe e desce participa da criação, também participa na transformação, porque a sabedoria não é uma viagem só de ida. George Ripley e outros alquimistas também nos lembram que todo verdadeiro “filho do sábio” nasce no ar, pois sobe da terra ao céu e, depois, desce novamente, trazendo em si as virtudes do superior e do inferior. Essa é a chave do processo alquímico: o movimento do espiritual para o físico e do físico para o espiritual, ou, se preferir, da matéria para a mente e da mente para a matéria. Isso acontecerá com todos, cedo ou tarde, seja lentamente, através das incontáveis mortes e renascimentos de uma eternidade, seja de modo mais acelerado, como propõem os alquimistas. Quer acelerar o processo? Esforce-se para ver como sua realidade é construída por você, mas do que por qualquer outra pessoa ou circunstância.
Então, o que o primeiro capítulo de Atalanta nos ensina, afinal? Que a consciência – esse vento em perpetuo movimento – é o grande construtor da realidade. Ela conecta o céu e a terra, o espiritual e o material, o micro e o macrocosmo. Ao compreender esse movimento, podemos começar a compreender a nós mesmos e a natureza do universo. E, ao compreendê-los, podemos transformá-los.
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