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“Too much love will kill you”
– Brian May(Queen)
Se a alquimia tivesse um calendário próprio, ele poderia ser dividido entre antes e depois de Paracelso. O Hermes suíço, como era conhecido, foi responsável por dar o pontapé inicial em conceitos importantíssimos como Espagiria, Arquétipos, Psicossomatismo e até mesmo Elementais. Mas, para a maioria, ele é provavelmente conhecido por sua célebre máxima “A dose faz o veneno”, que de fato é muito importante, pois encapsula uma lição fundamental sobre toxicidade e substâncias químicas.
Os tratamentos sugeridos por Paracelso para diversos males do corpo, mente e alma incluíam ingredientes como tinturas vegetais, sais, óleos essenciais, mas também ingredientes polêmicos como ópio, arsênico, mercúrio, chumbo e antimônio. Em resposta aos críticos que o acusavam de estar envenenando as pessoas, ele cunhou a versão original de sua famosa frase:
“Todas as coisas são venenosas e nada existe sem veneno; só a dose permite que algo não seja venenoso.”
Ele foi a primeira pessoa da história a estabelecer uma relação entre dose e resposta e a sugerir que substâncias tidas como inofensivas podem ser perigosas e substâncias perigosas podem ser inofensivas, e assim deu origem à ciência conhecida como toxicologia.
A determinação da letalidade de uma substância é algo complexo e variável, dependendo tanto da natureza da substância quanto da constituição única de quem a consome. Uma dose grande para uma criança pode ser uma dose pequena para um adulto, ou, como disse Hipócrates séculos antes de Paracelso:
“O que é veneno para um homem é remédio para outro.”
Foi apenas em 1927 que o farmacologista J.W. Trevan propôs uma solução inteligente para este problema ao introduzir o conceito de LD50: a quantidade de uma substância capaz de causar a morte em 50% de uma população testada, geralmente expressa em miligramas por quilo.
No meu livro Psicotropicon: Quimiognose Alquímica para Psiconautas Responsáveis falo brevemente sobre o LD50 especificamente no capítulo sobre Redução de Danos. No entanto, considero que este é um assunto interessante e importante o suficiente para merecer um aprofundamento.
Tomemos, por exemplo, a cicuta, que possui um LD50 de 5,9 mg/kg. Se imaginarmos Sócrates, com um peso de 70 kg, teríamos que ele precisaria ingerir pelo menos 413 mg de cicuta para validar sua argumentação.
Em resumo, quanto menor o valor de LD50, mais letal é a substância. A tabela apresentada revela essa escala, destacando o potencial tóxico de diversas substâncias, desde açúcar até nicotina.
Substância | LD50 (mg/kg) |
Açúcar | 29.700 |
Vitamina C | 11.900 |
Aspartame | 10.000 |
Álcool (Etanol) | 7060 |
Sal (Cloreto de Sódio) | 3000 |
Paracetamol | 1.944 |
THC (Maconha) | 1.270 |
CDB (Maconha) | 980 |
Psilocibina (Cogumelo Mágico) | 280 |
Aspirina | 200 |
Cafeina | 192 |
Cocaina | 96 |
Vitamina D | 37 |
Gasolina | 14.1 |
Nicotina | 0,8 |
Polônio-210 | 10 (ng/kg) |
Botox | 1(ng/kg) |
Valores inferiores a 1 são considerados extremamente tóxicos, com substâncias como polônio-210 e botox medidos em nanogramas. Por outro lado, valores acima de 5000 são considerados não-tóxicos, embora ainda possam ser letais em doses elevadíssimas. Por exemplo, a água tem um LD50 de 90.000 mg/kg; portanto, 6,5 litros de água para alguém de 70 kg podem levar a uma intoxicação chamada hiponatremia, diminuindo o sódio no sangue a níveis perigosamente baixos. Vale notar que esses números não abordam efeitos crônicos, nem consideram a dose média ou a frequência de uso, fatores cruciais no caso de drogas recreativas.
Este conhecimento sobre o LD50 pode fornecer insights valiosos, especialmente em contextos de overdose. Por exemplo, se alguém pesa 60 quilos e deseja se expor a riscos letais comendo doces, seria necessário consumir duas vezes a quantidade contida em dois pacotes de açúcar União ou o equivalente a um dia inteiro assistindo novelas das nove.
É interessante também notar que a aspirina, com um LD50 de 200, é aparentemente mais letal do que a maconha, cujos componentes THC e CBD têm LD50 de 1270 e 980, respectivamente. Isso desafia o senso comum, assim como a constatação de que o cigarro é mais mortal do que a cocaína.
O LD50 revela, por exemplo, que uma dose letal de psilocibina, encontrada em cogumelos mágicos, seria alcançada apenas com a ingestão de aproximadamente 17 quilos desses fungos, considerando que a psilocibina representa apenas 1% do peso total do cogumelo fresco.
Importante destacar que o LD50 é apenas um fator a ser considerado, entre outros, como os efeitos cumulativos e os fatores biológicos e psicológicos que tornam uma substância mais ou menos viciante. Mas tudo, desde sal, pimenta e noz-moscada, até substâncias como refrigerantes e insulina, possui seu LD50. A dose, portanto, não só determina o veneno, mas também a delícia e, em alguns casos, o remédio. No entanto, é sempre prudente manter a vigilância, especialmente em relação a a certas delícias cujas estatísticas todos os anos mostram que levam a milhares de mortes, com a de um certo pó branco usado em excesso… o sal, é claro.
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