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A agressividade, violência e maledicência e suas consequências na formação de “Pessoas-Peão”- segundo a Quimbanda Brasileira.
“Tó ba tó bàjé nípa té èmi ni.”- Importunos; escondem, provocam, estragam e desgraçam a vida de alguém. Trecho do Orin fún òtá (cantiga para o inimigo).
A ‘Corrente 49’ compreende a agressividade como parte da ordem libidinal humana, uma reação natural/cotidiana e – por vezes – incisiva decorrente de uma disputa mental. Uma pessoa agressiva reage a todos os acontecimentos como se necessitasse provar a si mesmo e aos demais que sua leitura mental acerca de algo deve prevalecer. Quando alguém invade o ‘espaço vital’ dessas pessoas, as mesmas reagem com o enfrentamento abrindo uma contenda e até uma disputa.
Esse ensaio visa citar associações entre a expressão religiosa Quimbanda e a agressividade. Como de costume, lembramos a todos que essa visão é baseada em estudos de psicologia, psiquiatria e principalmente da vivência dentro do Culto de Exu por nós praticada. Podemos estar equivocados no uso de certas expressões técnicas, mas por segurança fomos amparados pela adepta Patrícia Medeiros que trabalha como psicóloga.
A agressividade é parte de nossos cotidianos, pois sem esse impulso seríamos meros instrumentos de ‘mentais’ mais poderosos. A agressividade é o remédio para que não aceitemos verdades que nos subjuguem. Debater calorosamente assuntos ‘transcendentais’, se rebelar contra a inércia e aflorar impulsos desumanos é parte da natureza da própria Quimbanda. Podemos constatar esse fato através de alguns comportamentos maliciosos, vorazes, perversos, altivos e violentos dos Mestres Exus. Se o adepto não compreende essa natureza e se entregar à agressividade descompassada, adentra no labirinto das emoções superficiais e torna-se um ‘peão’ ingénuo e preso ao mundo de condutas e códigos subliminares. “Pessoas-Peão” (nome que adotamos para classificar as pessoas sem autocontrole da agressividade) em sua grande parte são vítimas de neurose, ou seja, possuem instintos agressivos intencionais, mas por diversos motivos, paradoxalmente, se esforçam para impedir o sentido.
Não podemos confundir a agressividade com a violência. O psicanalista Jacques Alain-Miller alega que estamos em um mundo de guerras permanentes, ou seja, a violência não pode ser mapeada, cercada ou até mesmo completamente isolada. Certo é afirmarmos que a violência pode ser incitada através de um simples encontro entre linguagens não condizentes.
Não aceitamos os elementos que classificam a violência como meio de preservação de espécie e concordamos com Freud quando alega que a violência, como intervenção agressiva do ‘Eu’, está vinculada à hostilidade e ao ódio. Atos de violência e crueldade estão intrinsicamente conectados às ações diretas contra outras pessoas ou contra si próprio. A agressividade que gera violência é uma faceta obscura no humanismo, entretanto, a agressividade não significa violência ou crueldade, principalmente quando essa agressividade é gerada pelo medo da não aceitação social (rejeição) ou pela necessidade de autoafirmação. Pessoas-Peão, apesar de serem agressivas, procuram incessantemente e desesperadamente pessoas que o aceitem e fortaleçam seus atos, palavras e ações peculiares, isso porque essa agressividade pode ter sido gerada por uma sequência de amarguras e inseguranças. Outra característica dessas pessoas é que são dependentes de outras pessoas e o ódio (supostamente) é uma busca pela aceitação social. Os “PP” são como crianças em busca de atenção, repletas de medo e paranoias, ora sendo vítima, ora perseguidor.
‘Pessoas-Peão’ expressam a agressividade através da maledicência. A maledicência é a arte de propagar concepções próprias sobre uma pessoa (oponente) ou sobre algo que contrarie a linha de lógica. Como os ‘PP’ costumam ter medo das consequências e se escondem nas artimanhas da modernidade alastrando notícias (verdadeiras ou falsas) para desqualificar todos que possuem domínio pragmático superior. Essa característica é descrita em um interessante artigo do psicólogo Antônio C. Alves Araújo onde alega:
“A observação clínica mostra que o agressivo possui uma admiração e curiosidade por pessoas formais e pragmáticas. Isto se deve ao fato de que estas últimas têm um anteparo eficiente contra a rejeição ou agressividade do meio. ”
Sobre a maledicência encontramos a pérola de Richard Simonetti:
“Ninguém está livre dela, nem mesmo os que se destacam na vida social pela sua capacidade de realização, no setor de suas atividades. Estes, ao contrário, são os mais visados. Nada mais gratificante para o maledicente do que mostrar que ‘fulano não é tão bom como se pensa’. ”
Mas a citação que cria uma linha de raciocínio mais apropriada para continuarmos nosso ensaio se no site psiconlinews:
“A fofoca surge por motivos diversos: porque queremos ser aceitos em um grupo, porque queremos chamar atenção dos outros, por vingança, ciúme, ou simplesmente porque queremos “passar o tempo”. No entanto, o motivo principal é o de não termos objetivos definidos, ou seja, além de estarmos nos espelhando nos outros, estamos desocupados.
Então, quando estamos desocupados e insatisfeitos, sem objetivos e propósitos de vida, nossa autoestima baixa e percebemos a vida do outro como mais interessante, dando espaço a sentimentos como a inveja e o ressentimento. ”
Dessa forma, definimos as “Pessoas-Peão” como portadores de dependência, repletos de angustias e amarguras, dotados de inveja, cuja agressividade jamais se torna violência. Geralmente estão infiltrados em muitas comunidades em busca de atenção e “holofotes”. Suas ações cruéis se limitam a implementar –superficialmente- a dúvida. Gostam de ostentar valentia, bravura e ódio, mas são apenas crianças com mentes invertidas.
Mais uma vez citaremos as palavras de Antônio C. Alves Araújo com relação aos agressivos:
“Aqui acrescento uma certa inveja contra alguém que apesar de talvez exceder no trato social, alimenta uma certeza perante seu posicionamento. O final da era das revoluções se aplica também na pessoalidade humana; a lei atual é o medo e ansiedade quando se escuta a palavra mudar. ”
Até agora nos limitamos a mostrar a diferença entre a agressividade e a violência e a ação da maledicência. Adentraremos no campo religioso usando tais informações como bases para que possamos criar uma engrenagem acerca de tais assuntos.
Em primeiro lugar, o praticante de Quimbanda Brasileira deve conhecer elementos formadores da natureza do nome/título Exu para conseguir traçar linhas de entendimento. Para isso, novamente recorreremos à origem histórica para posteriormente aplicarmos às nossas concepções.
Históricamente, a agressividade/cólera de Èsú é descrita claramente pela Tradição Yorubá. Citaremos alguns trechos de Òrikís que sustentam essa prerrogativa. No Òrikí Èsú encontramos a seguinte citação: “ Orí mi kó ni jé èmí ri ìbinú re. ” – Minha cabeça não irá permitir eu deparar com a sua cólera! No Òrikí Èsú Odára: “Ìjà ni Òtá-ru badè n`ìfé. – Conflito com o inimigo o estimula a armar uma emboscada de boa vontade. No Orin Èsú constatamos o seguinte trecho: “Odára lò soro. Odára lò soro lóòna. ” – Odára vale-se da agressão, Odára vale-se da brutalidade no caminho.
Os trechos citados apenas concedem um vislumbre acerca da ação do Orixá Exu. Sabemos que na Quimbanda Brasileira, os espíritos que usam esse nome/título/máscara herdaram algumas características, porém, não são um espelho reflexivo do Orixá. Os Exus que se manifestam na Quimbanda fizeram parte do mundo físico, ou seja, estiveram na matéria como nós. Suas histórias retratam diversos períodos – geralmente repletos de agressividade, violência e a maledicência. Exu de Quimbanda não absorveu as fendas do arquétipo usurpado. Exu não é folclore e sua força não está nas lendas, pois suas passagens materiais foram elementos primordiais para a construção de sua forma de ação.
Um detalhe interessante dentro da Quimbanda Brasileira é que a agressividade não é incitada pela incapacidade de gerenciar sentimentos. A agressividade do adepto é fruto da simbiose espiritual. Os Exus ensinam que o ódio não pode ser uma reação de desespero e que jamais deve ser exteriorizado em contendas para modificar a opinião alheia. O quimbandeiro convicto não sabe que a Terra já é um ambiente hostil para sua natureza e existe uma forte ditadura do julgamento alheio. O “PP” deseja fazer parte da mesa de jurados, afinal, necessita de subterfúgios que acalentem sua vida esquecida e frustrada. É sinônimo de recalque.
Assim, conseguimos ter uma rasa compreensão que a agressividade é um impulso que existe na essência de Exu e pode beneficiar ou criar desequilíbrios nas pessoas. Os desiquilibrados desejam se impor ruidosamente, enquanto os que vivenciam o Culto de Exu não se agridem (autoagressão) e não gastam energias em demandas fúteis. Se o adepto verdadeiro incitar os impulsos de agressividade certamente estará aflorando a violência e tem por obrigação exterioriza-la, assim como seus antepassados o fizeram. Por tal motivo, uma das principais premissas da nossa leitura de Quimbanda é: “Quimbanda não é lugar de ovelha! ”.
Dentre as valorosas lições que recebemos dos Mestres Quimbandeiros, ressaltamos um valoroso entendimento sobre a agressividade:
“Quando uma criança se torna agressiva por desejar coisas dos outros tem dois caminhos: Tomá-las ou chorar! ” (Exu Pantera Negra)
O choro é o sentimento de auto piedade encontrado na essência dos “PP”, tais pessoas são ícones que gritam (silenciosamente) incessantemente em busca da diluição de seus impulsos bélicos, mas enquanto não são ouvidos usam máscaras com dentes e olhos vermelhos. Essas mesmas pessoas agem da forma que Exu mais repudia: Maledicência.
Diversos são os “Pontos Cantados” que exaltam a repudia do Povo de Exu pela fofoca. Destacamos um bem popular que possui inúmeras variantes e é usado por grande parte dos seguidores das bandas de Exu:
“ Diabo Velho, vou cortar seu chifre, vou cortar seu rabo e dar pra Exu Comer!
Da sua língua vou fazer um chicote, que é pra bater nas costas de quem fala mal de mim!
Fala mal de mim, mas não fala por de trás, fala mal de mim, mas não fala por de trás
Pega ele Diabo, pega ele Satanás! ”
Esotericamente o ponto reflete a morte, a ruptura da sabedoria, o desiquilíbrio emocional e a cobrança pela malevolência (fofoca). A agressividade toma corpo através do emprego da violência. Essa é a real natureza de Exu.
Na Tradição Yorubá temos um ditado que diz: “Língua Maldita, o meu nome é dente. Fala de mim, fala!”. Só como informação complementar:
“Tudo indica que a origem de fofoca é africana. O Houaiss cita como sustentação dessa tese a pesquisa da etnolinguista baiana Yeda Pessoa de Castro, publicada inicialmente no livro acadêmico De l’integration des apports africains dans les parleurs de Bahia, au Brésil , editado em 1976 pela Universidade Nacional do Zaire, onde ela se doutorou. A professora Yeda lançou posteriormente no Brasil o livro “Falares africanos na Bahia” (Academia Brasileira de Letras/editora Top Books).
Fofoca teria nascido numa das línguas do grupo banto, que inclui o angolano e o congolês, entre outras, embora não fique claro em qual delas. O fato de a palavra existir com o mesmo sentido no português falado em Angola e em Moçambique reforça a tese. ” (fonte: Veja.com)
Certo é que qualquer criatura que compreende acima da média terá inimigos (Èdá o l`àiyé láilái ni òtá). Mas Exu sempre nos fornece palavras repletas de ensinamento para que essas forças contrárias não nos abalem:
“Inimigos de língua são como as vassouras; só servem para varrer o chão! ” (Exu Tranca Rua das Almas).
“ Tem medo do que? A natureza do homem não o presenteou com veneno na língua! Todas podem ser cortadas! ” (Exu Sete Garras).
“ Hahaha, a língua dela não é maligna…É mais macia que o veludo da minha capa! ” (Exu Veludo).
A cólera do Exu de Quimbanda tem como motivação o embate ao Sistema estagnado, aos princípios regentes e os entraves que são colocados diante seus tutelados. Exu de Quimbanda são Almas Humanas, cuja força emanada pela Primeira Encruzilhada de Fogo transformou em guerreiros dotados de duas expressões: individual e coletiva (legião).
Postura do Quimbandeiro diante a maledicência:
O adepto da Quimbanda Brasileira pode se posicionar de duas maneiras: Acionando a agressividade e a violência – constituindo um ato cruel ou simplesmente silenciando-se. O silencio não simboliza medo, ao contrário, simboliza desprezo. Como entendemos a natureza das ‘línguas agressivas’ e somos sabedores que os ‘PP’ estão em busca de apoio emocional, compreendemos que demandar com tais pessoas nos colocaria no mesmo patamar. Esse estado de equilíbrio entre um ‘PP’ e um adepto consciente equalizaria as frequências e geraria agressões mais infundadas. Novamente nos valeremos das célebres colocações do psicólogo Antonio C. de Araújo:
“O fator psicológico central de uma pessoa agressiva é que a mesma possui a plena consciência de uma vida que lhe seria satisfatória, agindo com um tom constante de revolta pela não obtenção de seu projeto pessoal; sabe também que a cada dia está mais distante dessa meta. Esta tese se transforma no núcleo do círculo vicioso. O não atingir o desejo pessoal ativa uma reação descontrolada e intempestiva perante uma simples frustração, e tal hábito afasta a pessoa da solução definitiva de seu problema comportamental. Reagir perante os mais insignificantes fatos novamente é o indício da atuação marcante do complexo de inferioridade no ser humano. ”
Muitas vezes os maledicentes, através da cólera superficial e do desejo de equalização, usam fragmentos da vida das pessoas para desmerecer sua ascensão pessoal, pois em sua mente esmagada pela baixa-estima, entende que atacar com informações fará com que as pessoas se afastem, repudiem ou até mesmo escarneçam. Grande erro, afinal, muitas informações mostram a natureza oculta das pessoas. A Quimbanda sempre foi a ‘Toca da Cobra Venenosa’ e a Corrente 49 nasceu de um veneno ainda maior… Mas isso abordaremos em outros textos.
Finalizamos a primeira parte desse ensaio dedicando-o a todos os adeptos da Quimbanda Brasileira, em todas as Bandas. Lembramos que os maledicentes são apenas ‘larvas’ incapazes de impingir algo real, pois se escondem nas ‘sombras de suas línguas’ e não na capacidade de seus intelectos. Como ‘Pessoas-Também não devemos temer em absoluto suas ações, pois são contaminados pela mesma covardia que Exu repudia.
De forma positiva e repleta de amor perfeito dedico aos irmãos que galgam as calçadas e moradas de Pedro Bi.
Danilo Coppini – L.T.J 49, condenado, odiado, amante da morte e dos inimigos! Caixão de madeira e o prego é de ferro, não tenho medo de vestir meu terno!
Alimente sua alma com mais:

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