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(achegas selecionadas por Rômulo Angélico)
Segue uma síntese das informações que foram veiculadas no seminário O Catimbó-Jurema e o Rei Salomão, realizado no mês de setembro de 2023, via Google Meet. A pesquisa sobre tal assunto permanece, como será percebido, em aberto, devido à abrangência e universalidades comportadas pelo mesmo. Pesquisadores mais abalizados poderão ampliar esses estudos com uma infinidade de dados disponíveis em diversas fontes – elementos capazes de nos esclarecer sobre as origens e a permanência da “Ciência de Salomão” (e, talvez, sobre a presença do próprio Rei Salomão, filho de Davi, entre nossos ancestrais indígenas e caboclos nordestinos, seja tal presença meramente simbólica ou de fato concreta) no universo catimbó-juremeiro.
O Rei Salomão viveu entre os séculos XI e X a.C. As pesquisas historiográficas realizadas sobre os hebreus desse período nos trazem informações relacionadas ao início da construção do Templo de Salomão (966 a.C.) e sobre a possível data do falecimento do Rei (930 a.C.).
Filho de Davi e Betsabéia, Salomão foi o terceiro e último monarca do Reino de Israel – tendo sido seus antecessores, em ordem cronológica, Saul (1.046 a 1.006 a.C.) e Davi (1.006 a 966 a.C.).
Conforme a Tradição Judaica, Salomão é considerado o pai da Sabedoria e da literatura sapiencial – superando, em inteligência, os povos do Oriente e do Antigo Egito. Sobre a história da Sabedoria de Salomão, podemos consultar, na Bíblia judaico-cristã: I Reis, capítulo 3; e II Crônicas, capítulo 1. Porém, para além do judaísmo, há quem o considere o homem mais sábio da História. Por sinal, uma das possíveis traduções para seu nome seria “figura de um homem sábio”.
Encontramos informações sobre sua vida na Bíblia Sagrada, no Alcorão, em A História dos Hebreus e no livro Kebra Negast (Glória dos Reis). Outros dados nos são fornecidos por fontes esotéricas supostamente oriundas da Grande Fraternidade Branca; além de dados presentes na Maçonaria, em escolas rosacrucianas e em organizações de caráter templário.
A Tradição Esotérica atribui a Salomão uma série de conhecimentos mágicos (inclusive a autoria de livros e sistemas mágicos – além de informar que o Rei foi recipiendário de Iniciações nos círculos mais secretos da Sabedoria Egípcia), sendo esta atribuição confirmada, parcialmente, por determinadas fontes (Flávio Josefo, por exemplo, afirma que Salomão escreveu 3.000 livros com encantamentos e exorcismos contra doenças causadas por demônios). Ademais em determinadas suras do Alcorão e em trechos do Zohar, encontramos Salomão como alguém capaz de conversas com Gênios e pássaros, assim como a ordenar demônios.
Os livros atribuídos ao Rei Salomão, conforme os ocultistas, são os seguintes:
- Testamento de Salomão: reúne elementos provenientes do primeiro milênio a.C. à Idade Média. Descreve como Salomão foi capaz de construir o Templo, comandando demônios por meio de um anel que lhe foi confiado pelo Arcanjo Miguel.
- Clavícula da Salomão (ou Chave de Salomão): em que estão reunidos 36 pantáculos para aplicações mágicas diversas. É considerada uma coleção de manuscritos com antigos feitiços hebraicos – trabalhos inspirados em escritos cabalísticos e talmúdicos. É possível que a Clavícula tenha surgido em meados de 1310, ou seja, durante a Baixa Idade Média.
- A Chave Menor de Salomão (ou Lemegeton): Grimório do século XVII (Idade Moderna), com descrições de Principados, Potestades, Hostes da Maldade e Anjos, com os quais Salomão compreendeu como se comunicar (as entidades seriam evocadas e obrigadas a obedecer ao magista). As cinco partes do Lemegeton, são as seguintes:
- Ars Goetia: que trata de 72 demônios aprisionados em um vaso de bronze (sendo, alguns desses entes, maus, outros, bons; e outros ainda entidades indiferentes);
- Ars Theurgia Goetia: que versa sobre os espíritos dos pontos cardeais e seus inferiores (alguns bons e outros maus);
- Ars Paulina: de origem medieval, aborda os anjos das diversas horas do dia e os entes angélicos ligados aos signos do zodíaco;
- Ars Almadel: com informações sobre como construir um tablete de cera voltado à proteção; e invocações angélicas;
- Ars Nova (Notoria): grimório medieval revelado por Deus a Salomão, por meio de um anjo – texto que possui orações, palavras cabalísticas e mágicas em diversas línguas.
A Magia Salomônica pode ter alcançado o nordeste brasileiro ainda no início do século XVI. Vestígios apontam para a presença de livros como A Chave de Salomão, entre os nossos ancestrais indígenas, trazidos por piratas franceses. Além disso, a incidência de bruxas, feiticeiros e judeus sefarditas cabalistas, no território nordestino, praticantes de “ciências” atribuídas a Salomão, durante o período colonial, permitiu que os caboclos juremeiros mantivessem contatos com tal linha de conhecimentos. À margem da sociedade colonial, pajés juremeiros, mestres cabalistas e bruxas, trocando ideias e conhecimentos ocultos, redesenharam parcialmente o Catimbó-Jurema – ampliando sua herança e deixando-lhe enorme legado.
Entretanto, há indícios (citados por historiadores sérios, porém, pouco valorizados) de que, muito antes do descobrimento oficial do território brasileiro ter ocorrido (e da subsequente colonização deste mesmo território), estiveram, nestas terras, navegantes vikings, egípcios e fenícios – tendo esses últimos aqui estado durante o período em que Salomão esteve vivo e envolvido em acordos políticos e econômicos com os citados povos, fato que, para membros de religiões como União do Vegetal e do próprio Catimbó-Jurema, contribui com as visões e análises que apresentam Salomão como tendo estado em território brasileiro.
A transcendência da Ciência de Salomão entre os cultos e caboclos juremeiros foi tão grande que surgiram não apenas famílias que fazem referência ao Rei – mas Caboclos e Mestres Espirituais (entidades, seres encantados) que citam, em seus pontos cantados e em seus trabalhos, Sua Presença Espiritual e a existência de um local sagrado chamado Cova de Salomão (um dos sete mais importantes Reinos ou Cidade da Jurema) – o próprio Rei Salomão, em algumas casas de Jurema, manifesta-se mediunicamente através de seus discípulos, sacerdotes catimbozeiros.
Justamente por isso não deixa de caber, entre as reflexões suscitadas neste brevíssimo estudo, o levantamento das seguintes questões: teria, o próprio Rei Salomão, estado, de fato, entre os juremeiros nordestinos? Teria o Sábio Rei desenvolvido, entre nossos ancestrais autóctones, uma Ciência e uma Escola de Jurema (como desenvolveu uma Ciência e uma Escola de trabalho com a Sagrada Hoaska, no Norte do Brasil)? Essa é uma questão que, como todo este trabalho, permanece em aberto.
Reflitamos: parece ter sido comum, entre os Iniciados em Alta Magia (cabalística) dos séculos passados, a recepção ou a atribuição a si mesmos de nomes iniciáticos que, geralmente, provinham da Tradição Judaica. Não é por menos, por exemplo, que o autor de O Livro da Magia Sagrada de Abramelin, o Mago, é chamado Abraão – o Judeu.
Particularmente, não descarto a possibilidade do próprio Salomão ter aqui estado; assim como a possibilidade de terem visitado o território brasileiro, em épocas pré-coloniais, emissários e trabalhadores que agiram em nome do Rei.
Entretanto, estou mais propenso a acreditar que, com o passar das décadas coloniais, a crescente presença de bruxas, feiticeiros e cabalistas, no nordeste do Brasil, assim como a vinda de livros como A Chave de Salomão e o Livro de São Cipriano a este território (além da perseguição sofrida por esses elementos por parte da Igreja que, indiretamente, ao persegui-los, potencializava a importância de conhecimentos mágicos estrangeiros entre os antigos juremeiros, fossem indígenas ou caboclos), conceberam o desenvolvimento de um pensar e um praticar relacionados a Salomão e às Ciências Ocultas circulantes na Europa Medieval e Moderna, assimiladas pelos caboclos juremeiros.
Considero, ainda, a possibilidade de ter estado presente, entre os juremeiros do passado, um Mestre Cabalista cujo mote era “Salomão” (não necessariamente o Salomão filho de Davi) que deu origem a uma Rama de Jurema entre nossos caboclos (ouvi esta teoria de um de meus primeiros professores pajés juremeiros) – família que, devido as perseguições do passado, fragmentou-se e se espalhou pelo Nordeste.
Independente de qual dessas teorias possa estar mais alinhada com a realidade dos fatos (que ainda estão longe de serem cientificamente comprovados), o que se torna evidente, entre nossos caboclos e mestres juremeiros, é o grau da importância de Salomão à Jurema Santa e Sagrada: ele é considerado um dos Grandes Reis da Jurema, estando ao lado de Kanindé e Malunguinho; ele é o Patrono de um Reino (e/ou Cidade) da Jurema, a Cova de Salomão; ele é enaltecido e louvado em diversos pontos de Mestres e Caboclos; ele, o próprio Hierofante, manifesta-se em sessões de Catimbó através de alguns de seus (poucos) discípulos.
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