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por T.Q.M.B.E.P.N.
“A Mente humana é limitada demais para compreender certas coisas!”.
(Mestre Boolight- dez.2002)
Parte Um: Definições
Todo ser humano vive sob o embate de duas forças: A força linear e limitada conceituadamente e a força não-linear, dinâmica e não previsível. Essas forças são esotericamente conhecidas como Cósmicas e Caóticas ou Causais e Acausais. A partir desse embate vamos elucidar a ação dos Exus e Pombagiras em meio a esse turbilhão. A mente humana é programada para captar todos os elementos em estado de constância invariavelmente construindo um sentido (mesmo que frágil), pois se não fosse dessa maneira, pelas inúmeras limitações, tornar-se-ia confusa e doente.
O Cosmo, cuja origem da palavra encontra alicerces na palavra grega κόσμος, define-se como os aspectos de disciplina, harmonia e organização projetados no próprio Universo físico em sua plenitude; o macrocosmo e microcosmo. Teoriza-se:
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Pressupõe-se que atue de forma infinita, haja vista que age de forma cíclica e contínua no ordenamento vibracional das partículas subatômicas.
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É uma estrutura causal, ou seja, regida pelas “Leis da Física”.
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É Vibracional, afinal, a construção das diferentes formas materiais depende da intensidade aplicada nas partículas.
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Temporal pelo fato de estar limitado à linha de tempo (passado, presente e futuro).
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Material, pois é composto tanto de matéria densa quanto de gases detectáveis.
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Não admite o conceito do “Nada Absoluto” e sim do espaço vazio que será preenchido.
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Tridimensional, pois se encontra limitado à altura, largura e profundidade.
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É tudo que tem forma.
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É disciplinado, pois possui formas e rumos previsiveis.
O Caos (do grego χάος, Abismo), erroneamente confundido como “confusão” e “desordem”, na verdade é o antigo nome do “Espaço Vazio Disforme” ou “Estado Primordial” ou ainda “Nada Absoluto” (Não Ser). Esse conceito vem de uma definição mais antiga ainda: A separação. Existem muitas gnoses esotéricas que retratam a gênese do Cosmo e a separação de uma fagulha desse Estado Inicial, que se dividiu formando dois sistemas energético-elétricos que embatem em tempo constante. Criação e “Não Criação”.
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Sua natureza inenarrável age em vários pontos da Criação (Macro e Microcosmo) e em diversos mundos paralelos.
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Sua ação desordena o estático e linear através de acontecimentos não previsíveis e de natureza anárquica. Todavia, sob um olhar mais profundo, é generativo e auto criativo.
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Todo ordenamento do Cosmo é frágil diante a ação do Caos.
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É o Amorfo.
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É anárquico.
Parte Dois: Caos X Cosmo
Partindo dessas definições, a ciência nos explica que todo ordenamento é provindo do Caos (Ordo ab Chaos) e todo sistema linear tende ao desordenamento e à falência, a não ser que encontre entradas de energias sustentadoras. Em um sentido amplo, quando a emissão de energia (e a falta de atenção) do sistema linear está comprometida, é atacada violentamente pela desordem e destruição para que uma nova estrutura possa imperar, ou seja, o Caos retoma a energia para gerar uma nova ordem (Chaos ab Ordo).
Alguns cientistas alegam que a ação incisiva do Caos nos ambientes Causais é uma espécie de “desordem ordenada” ou melhor, algo que está por trás da estagnação dos véus causais. Essa ação está inserida dentro de todas as vertentes (medicina, economia, climatologia, biologia, religiões, dentre outras). Alegam que as mudanças produzidas pelas forças Causais não possuem uma descarga energética forte o suficiente para causar grandes mudanças, já a ação do Caos é violenta ao ponto de modificar o fluxo inicial de qualquer sistema, mesmo sendo através de adventos simples. Exemplificando:
Um rapaz que estuda em determinada escola, em razão de inúmeros problemas, se sente desvalorizado e desmotivado. Humilhado, acaba perdendo sua evolução e adoece psiquicamente. Após um determinado período, através do apoio de certos amigos e familiares, procura outra instituição para se matricular. Lá, descobre seu poder, floresce e ganha status. Depois de certo tempo passa ser admirado pelas mesmas pessoas que o humilharam.
A constância/estagnação está evidente na sua primeira escola. As humilhações e desvalorização e a vida sem sentido (insuportável) abriram uma “porta” para a ação caótica. Veio a perca e a doença. Nesse momento a vida linear recebe um duro golpe do niilismo e a jornada simétrica desse rapaz é literalmente agitada, colocada a prova até que se despedace o concreto que norteava a vida e se inicie uma busca individual. Literalmente o rapaz adentrou em seu abismo pessoal. O Caos é isento de sentimento, frio e quente ao mesmo tempo, como uma ferramenta de demolição agindo nos conceitos e estrutura psíquica-social. Esses valores destruídos construirão um espaço/vácuo que devem ser preenchidos novamente. O Caos não preencherá essas lacunas e nesse estágio entra novamente a ação organizadora do Cosmo e sua reestruturação. A ação Caótica faz com que essa reestruturação não recaía em mesmo erro e os conceitos de autoestima e valorização modifiquem a trajetória vindoura do rapaz. Essa Nova Ordem trouxe uma nova perspectiva acerca do mesmo ser. Esse exemplo mostra claramente a ação do Caos para destruir e dar um novo ordenamento a desenvolvimento linear.
O Caos pode agir em diversos níveis da vida de um ser humano e a absorção e transmutação dessas ações é individual.
A Quimbanda não seria uma expressão de amplo progresso se seus pilares estruturais não fossem a evolução e a liberdade. Dessa maneira, entendemos que devemos percorrer certas “trilhas” para a real compreensão acerca da dimensão da palavra Exu (em ambas polaridades) e sua ação comunal e individual diante ao Cósmico e ao Caótico. Para isso procuramos as respostas em todas as vias e esmiuçamos o que já é consolidado nos ricos campos da Tradição para após dissertarmos sobre a formação e ação do Exu de Quimbanda.
Parte Três: Èsú – O Nome Perfeito Para a Reaparição dos Poderosos Mortos
Os contextos histórico, político e religioso que estiveram presentes na formação da Quimbanda Brasileira já estão bem dissertados em outros textos nossos. Por tal motivo, optamos em seguir pelas sendas dantes não exploradas, principalmente as que dão vazão ao confronto ordenado entre o Caos e o Ordenamento.
A Sabedoria dos Antigos Yorubás nos deixou heranças nos “Itan” e ‘Òríkís’. Os “Itan” são a narrativa de mitos e lendas, histórias e algumas canções passadas oralmente geração pós-geração pelos Yorubás. Os Orikis são compactos discursos poéticos, ritualísticos, comemorativos e podemos dizer sem medo que também são certas adaptações dos “Itan”. Ambas são formas narrativas. Ao estudarmos essas duas fontes, percebemos que em alguns trechos ou mesmo frases, a figura de Èsú é extremamente condizente com a ação Caos X Cosmos que descrevemos anteriormente. Assim, transcreveremos certas passagens e usaremos como ponto inicial para descrevermos a real natureza do Exu de Quimbanda.
Sob hipótese alguma estamos dizendo que a Quimbanda Brasileira faz uso dessa prática, entretanto, podemos recorrer as mesmas para traçarmos uma rota que fortificará a explicação sobre a adoção do nome Yorubá ‘Èsú’ para os Poderosos Mortos que compõe o corpo dos Sete Reinos da Quimbanda. As passagens escolhidas para corroborar em nosso entendimento se alinham perfeitamente com a proposta inicial do texto, porém, não seguem nenhuma ordem específica. Usaremos aquelas que evidenciam as tendências que desejamos ressaltar, frases que demonstram a natureza caótica implícita e por vezes explicitas nessa Deidade Yorubá.
A forma que conectamos os dizeres contidos nos “Itan” e nos “Orikis” não é parte da Antiga Tradição Afro. Lembramos que a Quimbanda Brasileira é eclética e absortiva e isso acarreta uma grande liberdade de conectarmos pontos tradicionalmente separados.
Iniciamos essa trajetória com o seguinte trecho:
“Bara anda senhorilmente balançando-se para a direita e para a esquerda” (Bara nyan gbégi gbégi).
Bara (um dos nomes de Èsú) anda com segurança, cheio de domínio, ora para a direita (que representa o Cosmo e a causualidade), ora para a esquerda (que representa o Caos e acausualidade). O mesmo ser tem livre acesso e domínio (Senhoril) de ambas as polaridades. É importante entendermos esse conceito, pois não se trata de bem X mal e sim de masculino/positivo/dinâmico e feminino/negativo/receptivo.
”Ele matou um pássaro ontem, com uma pedra que somente hoje atirou!”
Mesmo sem ter a plena compreensão sobre a dimensão do Caos e do Cosmo, os Antigos sacerdotes e sacerdotisas sabiam que Exu era uma deidade que caminhava aleatoriamente na linha temporal do Macro e Microcosmo. Entendemos que nos sistemas causais, o tempo possui três marcações básicas: Passado, presente e futuro. Essa marcação é linear, ou seja, obedece a linha dos acontecimentos. Somente a natureza caótica e acausal não está submetida a tais limitações. A expressão demonstra que Exu tem uma natureza caótica e conhece todos os meios de provocar acontecimentos atrelado ou não ao sistema linear. Essa expressão também demonstra que Exu pode buscar no passado, presente e futuro de todas as pessoas, energias capazes de provocar situações reversíveis ou não. Ajuda fortalecer essa compreensão parte de um outro “Oriki”: “Èsú, apressado, inesperado, quebra em fragmentos que não se poderão juntar novamente!”
“Exu faz o erro virar acerto e o acerto virar erro.”
Dentro de um sistema linear, um erro pode comprometer tudo que já está traçado energeticamente a uma pessoa. Entretanto, muitas vezes Exu (conhecedor das entradas temporais) nos impele a cometer certos atos que, inicialmente, acreditamos ser aquilo que nos derrubará. Mais a frente, vemos que tais atos foram necessários para uma mudança evolutiva. Exu também não tem um conceito de certo e errado tão atrelado como nosso sistema vigente embasado, dessa forma age de acordo com a necessidade. Isso também se reflete nessa frase retirada de outro “Oriki”: “Exu, que faz uma pessoa falar coisas que não deseja!”. Seus impulsos são tão fortes que destroem pensamentos pré-ordenados e recriam raciocínios. Essa qualidade é exaltada em outras passagens, tal como: “Èsú, não me manipule, manipule outra pessoa.” (Èsù máse mí, omo elòmíràn ni o se). Exu também é considerado o Divino mensageiro da palavra e dessa forma sua palavra se ecoa em todo Universo; (“Exu Oro ma ni ko. Exu Oro ma ja ko. Exu Oro Tohun tire site. Exu Oro Ohun Otohun niima wa kiri.”). Mais uma vez, os Antigos nos deixaram rastros da natureza de Èsú, que mesmo possuindo uma natureza caótica, a extensão de suas ações está atrelada ao Cosmo.
“Aborrecido, ele senta-se na pele de uma formiga.”
Como portador dos mistérios de Tempo/Espaço, para Exu a dimensão das coisas pode ser modificada de acordo com sua necessidade ou desejo.
“Se ele se zanga, pisa nessa pedra e ela põe-se a sangrar.”
Ao contrário de nós que temos nossos sentidos limitados, Exu consegue enxergar energia (vida) até naquilo que consideramos inanimado. Por isso consegue extrair energia de todas as coisas. Outro aspecto é a própria destruição. Segundo uma antiga lenda “Itan”, em uma determinada situação Exu se transformou em pedra para escapar de soldados que o perseguiam. Isso demonstra que ele mesmo sabe destruir-se e reconstruir-se sempre que sente necessidade.
“Você quem provocou o Rei para sair do trono!”
Sua natureza caótica também age como incitador. Provoca guerras (externas e internas), pois conhece os meios de alcançar onde nossos sistemas estão comprometidos e a partir desse ponto causar as mudanças. Exu é capaz de destruir e matar se necessário para obter um poder transmutador, em algumas lendas ele age de forma completamente contrária ao senso comum de justiça, ética e moral. Arquiteta, planeja, age silenciosamente para alcançar seus objetivos e gosta de ver a desgraça. Esse caráter, tido como irreverente, demonstra-nos uma aversão à Ordem e às Leis.
“Eu quero prosperidade de você, Exu, você que é o dono de saúde, proteção, promoção, bondade e prosperidade, por favor, me dê tudo isto.”
Esse trecho de um “Oriki” mostra que a natureza caótica de Exu pode interferir beneficiando seus adeptos. Sua ação combate a estagnação que causa a contraparte de todos esses pedidos. Mais do que nunca compreendemos que a natureza caótica age de acordo com a vontade de Exu. Muitos não compreendem que a ação que rompe a estrutura estagnada, linear e temporal da pobreza pode ser considerada caótica, afinal, uma trajetória escrita sem as interferências de Exu poderiam retratar uma vida de miséria, onde as relações pessoais estariam vinculadas a esse meio. Falando em relações pessoais, Exu também recebe em outro “Oriki” o título de Senhor das Relações pessoais (fartura). ”Exú wara na wa ko mi o”.
“Salve-nos, busque a nossa salvação!”
Esse trecho de um “Oriki” nos demonstra que Exu tem a capacidade de Salvação, ou seja, de Iluminação. A relação que iremos construir a partir dessa frase talvez não seja bem aceita por certos grupos religiosos, entretanto, se faz necessária para a compreensão da profundidade da gnose da Quimbanda Brasileira. A expressão: Àgiri Esú ma na! Significa: “Exu está presente no nascer da aurora!”. Isso demonstra que existe uma relação entre a natureza de Exu e o despertar da Luz. Esotericamente, temos a palavra latina “Lucifer” cujo significado e o uso interpretativo são muito similares. Um ser que trás a Salvação e está na Aurora, justo (Odara), cuja essência caótica é usada para corroborar a escalada evolutiva espiritual e material daqueles que o buscam, bonito (Elégbára Rewá), Senhor da Comunicação, cuja fúria pode matar e libertar a humanidade de tudo que é ruim foi uma deidade perfeita para ocorrer o sincretismo.
Todos esses trechos de “Orikis” e interpretações de “Itan” nos mostram como o nome Èsú foi um arquétipo perfeito para nomear os espíritos que formavam as Colunas de V.S. Maioral. Usamos apenas alguns exemplos, pois existem inúmeros outros que poderíamos estudar. As relações de Èsú com os Deuses Cósmicos (Òrisás) não nos compete, pois não faz parte da nossa busca, porém, que fique explícito a todos que se analisarmos de forma comparativa encontraremos similaridades desse Deus com muitas outras Tradições.
O que realmente nos importa é a força do nome que ao longo da criação e desvencilhamento de outras expressões religiosas fez com que determinados espíritos fossem qualificados e tipificados segundo certas características. O nome Èsú corrompeu-se para Exu e passou exercer a qualidade de título. Todo espírito que carrega o nome Exu tem determinadas similaridades, entretanto, a banda (Caminho evolutivo) em que exercem suas funções diferencia-os. O Exu de Quimbanda, ao contrário dos espíritos nomeados como Exu pela Umbanda, tem natureza caótica, mas dominam as polaridades e não agem de forma concomitante com espíritos de natureza cósmica. Espíritos de natureza caótica são senhoris tanto da direita quanto da esquerda (Bara nyan gbégi gbégi).
Pelo que estudamos e compreendemos, Exu é um nome que deixa evidente certas qualidades:
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Natureza Caótica;
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Domínio dimensional;
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Ação restrita ao Plano Cósmico (físico e astral);
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Domínio da temporalidade;
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Domínio elementar;
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Personalidade sem traços morais;
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Ação sem julgamento de ‘Bem x Mal’;
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Aniquilação do Ego;
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Ação de protetor;
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Portador da Libertação.
Essas são as principais características contidas nos espíritos da Quimbanda. O título Exu, além de conter todo processo de demonização e repudio imposto pelo Estado Cristão, esotericamente demonstra a Real Natureza dos Espíritos da Quimbanda. A essência luciférica já residia silenciosamente dantes mesmo das transformações.
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