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Por Asenath Mason,
A terrível senhora da noite e da bruxaria, com serpentes nos cabelos e uma tocha nas mãos, cercada por cães uivantes – esta é a representação de Hécate nas artes visuais, nos mitos antigos e nas lendas populares. O culto dessa antiga deusa era popular na Trácia, ela tinha muitos seguidores entre os cários da Anatólia e seu culto era amplamente difundido por toda a Grécia. Foi através dos mitos e lendas gregas que ela encontrou seu caminho para a cultura do Ocidente. Em suas representações antigas, Hécate era retratada como uma mulher sentada em um trono, três mulheres unidas nas costas (da mesma idade, ou uma donzela, ninfa e anciã), ou uma personagem com três cabeças. Havia estátuas que a representavam como uma mulher com três cabeças, das quais uma era de uma mulher e as outras duas eram cabeças de égua e cadela, ou de leoa e vaca. Em algumas representações ela também aparece com a cabeça de uma serpente.
Hécate possuía muitos aspectos e muitos poderes. Frequentemente seus cultos se referiam ao conceito de vida e morte, a transformação mística através da morte e renascimento. Ela era benevolente e generosa com a natureza e com os humanos, além de implacável e responsável por todas as atrocidades noturnas e bruxaria destrutiva. Ela governava a terra, o céu e o mar e também decidiu governar sobre o destino humano. Seus adoradores oravam a ela por felicidade, riqueza e prosperidade. Em Atenas, as casas tinham um pequeno altar em homenagem à Hécate e ela era muito respeitada entre as pessoas comuns. De acordo com a Teogonia de Hesíodo, ela era filha dos titãs Perses e Astéria, e uma divindade benevolente que cuidava dos filhos de Zeus. A Hécate de Hesíodo era a favorita dos deuses e humanos, a deusa que sempre ouvia e respondia às orações das pessoas. Ela poderia dotar o homem de riqueza, poder e fama, proteger soldados em batalhas e marinheiros no mar. Ela zelava pela justiça nos tribunais e garantia a vitória em competições. E, finalmente, ela também era associada à lua e adorada como padroeira da agricultura.
Por outro lado, Hécate era vista como uma deusa da escuridão e da morte. Acreditava-se que ela aparecia à noite na encruzilhada, acompanhada de cachorros, vampiros e fantasmas. Ela podia assumir uma forma aterrorizante, vagar por cemitérios e anunciar infortúnio a todos que a viam. Portanto, um de seus nomes era Antaia (“aquela que atende”). Ela também era chamada de Trivia, pois aparecia em três estradas que se cruzavam. Em muitas culturas, acredita-se que as encruzilhadas representem o ponto terreno onde os mundos e as dimensões se encontram e se cruzam: o reino dos espíritos e o mundo da matéria, o lugar dos deuses e a realidade mundana dos humanos, o terreno e o divino. Durante suas andanças noturnas, Hécate era extremamente perigosa e as pessoas ficavam longe dos lugares onde ela poderia aparecer, pois acreditava-se que ela trazia a morte para aqueles que encontrava. Mas aqueles que ousavam procurá-la, ela sempre apontava o caminho certo – aquele que deveria ser escolhido entre as três encruzilhadas, o caminho da iniciação em seus mistérios obscuros.
Hécate era frequentemente vista em lugares desolados: no topo das montanhas, nas profundezas das florestas e em bosques esquecidos. Seu reino era o dos animais selvagens: cães, lobos, cervos e serpentes. Sua bruxaria muitas vezes incluía mistérios de transformação em uma besta, uma prática semelhante à tradição xamânica da mudança de forma. Como a deusa, que assumia formas de animais, um seguidor de seu caminho poderia se transformar em criaturas bestiais associadas ao seu conhecimento. Em seu séquito pode-se encontrar Empusa, a temível vampira que se alimenta de carne humana e assombra sua presa sob o disfarce de uma bela mulher. Hécate também era uma deusa do submundo e uma psicopompa – ela conduzia as almas dos falecidos aos portais do Hades, guardadas pelo cão infernal Cérbero. Essa conexão entre ela e o cão do submundo é examinada em um dos ensaios incluídos neste livro. Acreditava-se também que ela governava a vingança e a expiação. Nas encruzilhadas, seus adoradores deixavam bolos e mel como oferendas, e às vezes também eram sacrificados animais, principalmente cachorros pretos. Seu culto era diferente da adoração de outras divindades celebradas por festivais públicos abertos. As oferendas à Hécate eram deixadas secretamente à noite para ela e seus servos e companheiros: os animais selvagens e as criaturas da noite. Além disso, acreditava-se que os celebrantes não deveriam voltar ou olhar quando ela viesse buscá-los, porque essa visão era tão aterrorizante que poderia assustá-los até a morte.
No entanto, Hécate era, acima de tudo, a padroeira das bruxas e a deusa da magia negra. Ela as dotava de poder sobre as forças da natureza, revelava os segredos das ervas e ensinava como preparar poções mágicas. No mito do Velocino de Ouro, Medeia, a bruxa e a sacerdotisa de Hécate, colhe ervas narcóticas, com as quais adormece o dragão insone que guarda o velo, para que Jasão mate a fera e complete sua missão. Hécate também era a mestra da necromancia e da magia funerária. Para seus seguidores, ela aparecia com tochas nas mãos ou na forma de um animal – uma égua, uma cadela ou uma loba. Ela conduzia seus adeptos pelo caminho das camadas mais escuras e profundas do irracional. Seu culto foi perseguido pelas religiões patriarcais porque envolvia práticas que pareciam tortuosas e perigosas, especialmente aquelas ligadas aos poderes da sexualidade feminina. As mulheres que adoravam Hécate usavam a bruxaria para aumentar sua atratividade sexual e conseguir tudo o que desejavam. Podemos ver isso também no mito de Medeia. Para conseguir o que quer, ela não hesita em realizar atos que podem parecer atrozes, mesmo em seus momentos, como matar seu irmão apenas para distrair seu pai de persegui-la e Jasão depois de roubar o Velocino de Ouro. Ela mata o garoto, corta seu corpo em pedaços e os espalha na estrada, para que seu pai se atrasasse ao reunir os membros de seu filho. Sua história é cheia de manipulação, violência e bruxaria usadas para atingir seus objetivos e se vingar daqueles que a prejudicaram. O culto de Hécate foi, portanto, associado ao culto do poder feminino e, portanto, uma ameaça às estruturas patriarcais da comunidade. Nesse sentido, Hécate era uma das deusas “mais sombrias” do panteão ocidental. Seu culto é a via sinistra, a exploração do lado obscuro da natureza humana, o elemento selvagem, o instinto obscuro das tradições primordiais do Caminho da Mão Esquerda.
Na Grécia antiga, Hécate também era associada à lua e, portanto, considerada uma deusa do luar. Por isso, ela se chamava Mene, nome derivado de Selene, a deusa da lua e do submundo. Seus mistérios podem, portanto, ser associados ao ciclo feminino, que está ligado às fases da lua desde a mais remota antiguidade. Hécate, no entanto, era uma deusa ctônica. Um de seus principais atributos é uma chave que abre o portal do Hades, enquanto sua tocha ilumina os corredores escuros e túneis do submundo. Ela é a guia que conduz os adeptos pelo reino dos mortos, a psicopompa das almas e aqueles que viajam além do véu da vida e da morte, a deusa da iluminação, às vezes até retratada como uma chama viva, iluminando a escuridão da obscuridade e do esquecimento.
Na literatura, as bruxas costumam invocar o nome dela em seus feitiços e ritos. Em Macbeth de Shakespeare, Hécate é a Rainha das Bruxas invocada pelas “irmãs estranhas” em suas sombrias profecias. Shakespeare frequentemente menciona essa deusa misteriosa em suas peças com temas mágicos, como Macbeth ou em Sonho de uma Noite de Verão. No drama contemporâneo, ela é comumente associada à bruxaria e à noite. Também A Bruxa (The Witch) do título da peça do dramaturgo inglês Thomas Middleton se chama Hécate. Essa deusa obscura é frequentemente descrita como uma personificação da magia negra. Esta imagem está enraizada na tradição medieval, quando Hécate era a deusa da morte e do luar, a senhora dos mortos, da caçada selvagem, dos guerreiros e presidia a reunião noturna de bruxas e seus feitiços malévolos.
O próprio nome “Hécate” é de origem desconhecida. Sugeriu-se que talvez signifique “aquela de longo alcance”. Há também uma semelhança entre a palavra “Hécate” e o termo egípcio “hekau”, que significa “magia”, que é explorado em outro ensaio aqui incluído, ou também pode ser um derivado do nome de Heqet, a deusa egípcia do parto com cabeça de sapo. De acordo com Robert Graves, seu nome significa “cem” e se refere ao Grande Ano de cem meses lunares, quando uma vez governava o Rei Sagrado. Em seu livro Mitos Gregos, ele observa que seu sangue era o símbolo do renascimento da terra. Hécate também tem muitos outros títulos. Além do mencionado acima, ela também era chamada de Aphrattos (“A Sem nome”), Pandeina (“A Aterrorizante”), Phosophoros (“A Portadora da Luz”, um título frequentemente associado a Lúcifer), Apotropaia (“Aquela que se Afasta”), ou Soteira (“A Salvadora”).
Entre outras deusas, ela foi identificada com Ártemis, Selene, Deméter ou Perséfone. Foi ela quem contou a Deméter sobre o sequestro de Perséfone por Hades no submundo. Por meio de seu casamento com Hades, Perséfone tornou-se a dona das mudanças cíclicas da natureza – no final do outono ela desce ao submundo, que marca o início do inverno e a morte sazonal da natureza. Na primavera ela retorna, trazendo uma nova vida ao mundo. Quando ela emerge da terra dos mortos, Hécate sai para saudá-la e, assim, torna-se sua companheira no processo simbólico de morte e renascimento da natureza. Como a deusa da magia e dos ritos obscuros, ela também pode ser conectada à deusa celta Cerridwen, a mestra da bruxaria, cujo principal atributo é o caldeirão da sabedoria. A imagem iconográfica de uma bruxa como uma mulher preparando uma poção mágica em um caldeirão é a reconstituição desse antigo mito. A poção da bruxa era a fonte de um grande conhecimento, desconhecido dos não iniciados. Em Celtic Myth and Magick (Mitos Celtas e Magia), Edain McCoy descreve uma lenda em que quando o servo de Cerridwen provou algumas gotas de seu elixir, ele obteve acesso a um conhecimento profundo, descobriu talentos poéticos em si mesmo e desenvolveu a habilidade de ver o passado e os eventos futuros.
A iniciação nos mistérios de Hécate é a descida ao submundo pessoal, onde o conhecimento de nossa origem, herança ancestral e talentos esquecidos está escondido, esperando para ser redescoberto. Hécate nos conduz por caminhos sombrios até os portais do inferno, onde o terrível Cérbero guarda os segredos há muito esquecidos do poder e da imortalidade. A chave do portal está na mão da deusa e sua tocha é a chama da iluminação, brilhando nas profundezas da alma da pessoa Iniciada. Na Tradição Draconiana, ela é a guardiã do ponto místico de travessia, onde todos os mundos, planos e dimensões se encontram e se tornam um só. Ela é a primeira iniciadora, a psicopompa e a sentinela que encontra a pessoa aspirante à Iniciada na Encruzilhada dos Mundos, conduzindo-nos ao Ventre do Dragão através dos portais do Lado Noturno.
Esta antologia contém todas as representações de Hécate e muito mais, apresentando à pessoa leitora a magia e a mitologia desta misteriosa deusa. Aqui você encontrará descrições de gnose pessoal reveladas por meio do trabalho dos autores apresentados neste livro, bem como referências à sua aparição no conhecimento antigo e na magia dos tempos antigos. Como as outras antologias do Templo da Chama Ascendente, tudo isso é escrito da perspectiva da pessoa Iniciada Draconiana, envolvendo uma abordagem moderna adequada para a pessoa praticante do Caminho da Mão Esquerda.
Vamos então começar a jornada para o submundo, onde o conhecimento de nós mesmos e de nosso universo está oculto, esperando para ser reivindicado, absorvido e transformado em nosso poder pessoal.
Texto enviado por Ícaro Aron Soares.
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