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Se a Serena Luz primária não for reconhecida, ainda há a possibilidade de manter a Serena Luz secundária. Se ela é perdida, então vem o Chonyid Bardo, o período das ilusões cármicas ou intensas misturas alucinatórias do jogo realidade. É muito importante que as instruções sejam lembradas – elas podem Ter grande efeito e influência.
Durante este período, o fluxo de consciência, microscopicamente nítido e intenso, é interrompido por tentativas fugazes de interpretar e racionalizar. Mas o ego-jogador normal não está funcionando efetivamente. Existem, portanto, possibilidades ilimitadas para, por um lado, novidades intelectuais e emocionais agradáveis se deixar-se flutuar com a corrente; e, por outro lado, temíveis emboscadas de confusão e terror se tentar-se impor a sua vontade à experiência.
A proposta desta parte do manual é preparar a pessoa para os pontos de escolha que surgem durante este estágio. Estranhos sons, visões sobrenaturais e perturbadoras podem ocorrer. Eles podem impressionar, assustar e atemorizar a não ser que se esteja preparado.
A pessoa experiente será capaz de manter a percepção de que todas as percepções vêm de dentro e será capaz de sentar-se calmamente, controlando sua consciência expandida como um aparelho de televisão multidimensional fantasmagórico: as alucinações mais agudas e sensíveis – visuais, audíveis, táteis, olfativas, físicas e corporais; as reações mais requintadas, o discernimento compassivo do eu, do mundo. A chave é a inação: a integração passiva com tudo o que ocorre à sua volta. Se você tentar impor sua vontade, usar sua mente, racionalizar, buscar explicações, você será pego em rodamoinhos alucinatórios. O lema: paz, aceitação. É um panorama que muda continuamente. Você é temporariamente apartado(a) do mundo de jogo. Aproveite isso.
Os inexperientes e aqueles para os quais o ego-controle é importante podem considerar a passividade impossível. Se você não puder se manter inativo(a) e subjugar sua vontade, então a única atividade que pode certamente reduzir o pânico e puxá-lo(a) de volta dos jogos mentais alucinatórios é o contato físico com outra pessoa. Vá até o guia ou até outro participante e ponha sua cabeça no ombro dele(a) ou no seu colo; ponha seu rosto próximo ao dele(a) e se concentre no movimento e no som da respiração dele(a). Respire profundamente e sinta o ar correr para dentro e a expiração. Esta é a forma mais antiga de comunicação viva; a irmandade da respiração. A mão do guia sobre sua testa pode ajudar no relaxamento.
O contato com outro participante pode ser mal-entendido e provocar alucinações sexuais. Por esta razão, esse tipo de ajuda deve ser combinada previa e explicitamente. Participantes despreparados podem impor medos ou fantasias sexuais no contato. Desligue-os; eles são produções ilusórias cármicas.
O aconchegar terno, gentil e apoiador dos participantes é do desenvolvimento natural da Segunda fase. Não tente racionalizar este contato. Seres humanos e, analogamente, quase todas as criaturas terrestres móveis têm se aconchegado por muito tempo, em noites escuras e confusas por muitas centenas de milhares de anos.
Inspire e expire com seus companheiros. Nós somos todos um! Isso é o que a respiração está lhe dizendo.
Explicação do Segundo Bardo
O problema essencial do Segundo Bardo é que toda e qualquer imagem – humana, divina, diabólica, heróica, má, animal, coisa – que o cérebro humano invoca ou as lembranças de vidas passadas, podem apresentar-se à consciência: imagens e formas e sons girando interminavelmente.
A solução essencial – repetida de novo e de novo – é reconhecer que seu cérebro está produzindo as visões. Elas não existem. Nada existe exceto da forma como sua consciência dá vida às coisas.
Não há, é claro, modo de classificar as infinitas trocas e combinações de elementos visionários. O córtex contém registros de bilhões de imagens da história da pessoa, da raça e das formas vivas. Qualquer delas, à taxa de cem milhões por segundo (de acordo com neurofisiologistas), pode inundar a consciência. Balouçando neste brilhante e sinfônico mar de imaginário está o que resta da mente conceitual. Num turbulento e infindável aguaceiro do Oceano Pacífico balouça uma pequena boca aberta a gritar (entre bocados de água salgada) “Ordem! Sistema! Explique tudo isso!”
Não se pode prever que visões ocorrerão, nem sua seqüência. Pode-se apenas incitar os participantes a fechar a boca, respirar pelo nariz, e desligar a irrequieta mente racionalizante. Mas só uma pessoa experiente de inclinações místicas consegue fazer isso (e assim permanecer no sereno esclarecimento). A pessoa despreparada ficará confusa ou, pior, entrará em pânico: a luta intelectual para controlar o oceano.
Com o objetivo de guiar a pessoa, ajudá-la a organizar suas visões em unidades explicáveis, o Chonyid Bardo foi escrito. Há duas seções: (1) Sete Deidades pacíficas com suas simetricamente opostas ego-armadilhas; (2) Oito Deidades Coléricas que podemos alegremente aceitar como produções visionárias, ou fugir de medo.
Cada uma das Sete Deidades Pacíficas (representações Pai-Mãe bissexuadas) é acompanhada por consortes, criados, deidades menores, santos, anjos, heróis. Cada uma das Deidades Coléricas é similarmente acompanhada. Luzes, objetos simbólicos, belos, horríveis, assustadores, ferventes, também são vistos.
Se lido literalmente, o Livro Tibetano dos Mortos o(a) faria esperar o “Mestre de Todas as Imagens Visíveis” (ou seu oposto, a absurdidade da estupidez) no primeiro dia; a “Deidade Imóvel da felicidade” e seus consorte, criados e seu oposto no segundo, etc. O manual não deve, é claro, ser usado rigidamente, exotericamente, mas deve ser tomado em sua forma esotérica, alegórica.
Lido desta perspectiva, vemos que os lamas ouviram ou nomearam milhares de imagens que podem ferver no mosaico ajoalhado em constante mudança da retina (aquele atoleiro de multi-camadas de bilhões de raios e cores, infiltrado, como um tapete persa ou uma escultura maia, com incontáveis capilares multicoloridos). Através da leitura preparatória do manual e por sua repetição durante a experiência, o novato é levado via sugestão a reconhecer seu fantástico caleidoscópio retinal.
O mais importante, a pessoa aprende que as visões vêem de dentro. Todas as deidades e demônios, todos os paraísos e infernos são internos.
O estudante com interesse particular pelo budismo tântrico ou tibetano deve mergulhar no Chonyid Bardo. Deve arranjar placas coloridas das catorze chamas do Bardo, e arranjar para que o guia o leve segundo a seqüência prevista durante a sessão. Isto providenciará inesquecíveis séries de libertação e permitirá ao devoto emergir “reencarnado” da experiência na tradição lamaísta.
A intenção deste manual é tornar disponível o esboço geral do Livro Tibetano e traduzi-lo num inglês psicodélico. Por esta razão, não apresentaremos a seqüência detalhada de alucinações lamaísta, mas, em vez disso, vamos listar algumas aparições comumente relatadas pelos ocidentais.
Seguindo o Thodol Tibetano, classificamos as visões do Segundo Bardo em sete tipos:
- A Fonte ou Visão do Criador; 2. O Fluxo Interior de Processos Arquetípicos; 3. O Fluxo Flamejante de unidade Interior; 4. A Estrutura de Vibrações Ondulares de Formas Exteriores; 5. As Ondas Vibratórias de Unidade Exterior; 6. “O Circo Retinal”; 7. “O Teatro Mágico” [Devemos a frase “circo retinal” a Henri Michaux (Miserável Milagre) e o termo “teatro mágico” a Hermann Hesse (O Lobo da Estepe)].
As visões 2 e 3 envolvem o fechar dos olhos e nenhum contato com estímulos externos. Na visão 2 o imaginário interior é primariamente conceitual. A experiência pode se estender das revelações e do insight à confusão e ao caos, mas o significado intelectual, cognitivo, é primordial. Na visão 3 o imaginário interior é primariamente emocional. A experiência pode se estender do amor e da unidade extática ao medo, desconfiança e isolamento.
As visões 4 e 5 envolvem olhos abertos e atenção para os estímulos exteriores, tais como sons, luzes, toque etc. Na visão 4 o imaginário exterior é primariamente conceitual e na visão 5 os fatores emocionais predominam.
A lista sétupla acima descrita tem alguma semelhança com o esquema mandálico das Deidades Pacíficas listadas para o Segundo Bardo no Livro Tibetano dos Mortos.
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