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Exclusivamente produto da criação do homem, esta classe, a mais numerosa das entidades astrais, tem uma excepcional importância, visto a sua ação sobre o homem se manifestar direta e incessantemente graças aos estreitos laços kármicos que o acorrentam a ela. É uma massa enorme, mal definida, de entidades semi-inteligentes, tão diferentes umas das outras como os pensamentos, e praticamente insusceptíveis de qualquer combinação ou arranjo metódico. A única divisão que se pode fazer é pondo de um lado os elementais artificiais criados inconscientemente pela maioria da humanidade, e do outro, os criados com qualquer intenção pelos feiticeiros ou magos, e ainda do outro o pequeno número de entidades criadas artificialmente e que não entram na categoria de elementais.
1.° Elementais criados inconscientemente.
Já se disse que a essência elemental que nos rodeia por todos os lados é, nas suas inúmeras variedades, singularmente susceptível à influência do pensamento humano. Já nos referimos mesmo ao fato de qualquer pensamento, por mais vago, impreciso e ocasional, obrigar essa essência a tomar formas nebulosas e efêmeras que se agitam como nuvens em constante movimento. Resta-nos agora considerar a forma como essa essência é afetada quando o espírito humano faz incidir sobre ela um pensamento, ou um desejo preciso e intencional. O efeito produzido é flagrante. — O pensamento apodera-se da matéria plástica e molda-a instantaneamente num ser vivo de forma apropriada — ser que uma vez criado, não fica de modo nenhum sob a influência do seu criador, mas vive uma vida sua, cuja duração é proporcional à intensidade do pensamento, ou desejo, que o gerou. De fato, dura enquanto a força-pensamento que o criou lhe mantém a coesão. Assim, os pensamentos da humanidade são em sua maioria tão imprecisos – e fugitivos que os dementais por eles criados vivem apenas minutos ou horas; mas um pensamento repetido ou um desejo convictamente formulado, geram um elemental cuja existência pode durar dias. Como a maior parte dos pensamentos do homem dizem, em geral, respeito ao próprio homem, os dementais que formam ficam em suspensão em volta dele, e tendem a provocar a repetição da idéia que representam, visto essas repetições em vez de criar novos dementais, concorrerem para fortificar os antigos e outorgar-lhes, por assim dizer, mais tempo de vida. Um homem que, por exemplo, acalente demoradamente um desejo, forma para si mesmo uma espécie de companheiro astral que, alimentado constantemente pelo pensamento predominante, pode acompanhá-lo durante anos, ganhando progressivamente força e influência sobre o seu criador. Quando o desejo é um desejo de mau caráter, a influência sobre a natureza moral do homem pode vir a ser de desastrosas conseqüências. Mais fecundos ainda em resultados bons ou maus são os pensamentos do homem acerca do seu semelhante, porque neste caso não é em torno dele que flutuam, mas em torno do objeto do pensamento.
Qualquer desejo ou pensamento de felicidade projetado sobre um indivíduo, criará para ele um elemental artificial amigável. Se o desejo for perfeitamente definido, por exemplo, o desejo de melhoras de uma doença, o elemental pairará sobre o doente, para lhe promover o restabelecimento ou para afugentar qualquer influência tendente a impedi-lo. Neste trabalho desenvolverá o que pode parecer à primeira vista uma grande porção de inteligência e adaptabilidade, mas realmente não é mais do que uma força que atua segundo a linha de menor resistência — sempre na mesma direção, aproveitando qualquer canal que possa achar, precisamente como a água num tanque se precipitará por um tubo aberto, existente entre uma dúzia de fechados, e o esvaziará através dele. Se o desejo for simplesmente um desejo vago de seu bem geral, a essência elemental, na sua maravilhosa plasticidade, responderá também a essa idéia menos distintae a entidade criada desenvolverá a sua força na direção de que surja logo uma ação para vantagem do homem. Em qualquer dos casos a quantidade de energia a despender e a duração do tempo de vida que a entidade tem para despender, dependem da intensidade do pensamento ou desejo original, embora, não é demais lembrá-lo, a entidade possa ser nutrida e fortificada, e prolongada a duração de vida por outros bons desejos ou pensamentos amigos projetados na mesma direção. Além disso, parece que a entidade assim formada é atuada por um desejo instintivo de prolongar a vida, reagindo sobre o seu criador como força tendente constantemente a provocar a renovação do pensamento que a originou. E de uma forma análoga vai influenciar outras com quem entre em contato, embora a sua relação com estas não seja naturalmente tão perfeita.
Tudo o que acaba de se dizer dos pensamentos bons, portadores de felicidade, é igualmente verdadeiro no caso de pensamentos portadores de desgraças e de desejos de mal aos nossos semelhantes. Basta atentar para o que existe no mundo de inveja, de maldade, de ódio e outros sentimentos igualmente condenáveis para se compreender que entre os dementais existe um verdadeiro mundo de entidades perigosamente maléficas. O homem cujos pensamentos sejam cheios de despeito, de sensualidade, de avareza, numa palavra, grosseiros, arrasta consigo através do mundo uma atmosfera pestilenta, que lhes é própria, povoada com os seres repelentes que a sua brutal imaginação criou. E não é só ele que se encontra nessa triste situação, pois todos aqueles que têm a infelicidade de se aproximar dele estão sujeitos ao grande perigo do contágio moral, pela influência das abominações que ele se compraz em lançar ao redor de si. Qualquer sentimento de ódio, inveja ou ciúme, dirigido a outra pessoa, enviará um elemental para atormentá- la, e este procurará qualquer ponto fraco por onde possa concretizar a sua ação maléfica. Se esse sentimento é persistente, o elemental continuará a ser alimentado e poderá prolongar por muito tempo a sua existência, e portanto, a sua perniciosa atividade. Pode, contudo, não produzir qualquer efeito sobre a pessoa para quem é dirigido, se esta não tem nenhuma tendência que p nutra, se não tem, por assim dizer, nenhum fulcro para a sua alavanca. Assim, todas essas influências, portadoras do mal, recuam e são rechaçadas ante a aura de um homem de pensamentos puros, de existência honrada, visto não acharem onde fixar-se. Neste caso, obedecendo a uma lei bem curiosa, elas reagem com toda a força sobre o seu criador original. E é nele que a própria entidade que ele criou vai consumir o karma de seu mau desejo, na hipótese de nele encontrar uma esfera congênita. Acontece também, por vezes, que um elemental artificial desta espécie não consegue, por várias razões, descarregar a sua energia nem sobre o seu criador nem sobre o objeto dos maus sentimentos deste. Então, transforma-se numa espécie de demônio errante, fácil e prontamente atraído por qualquer indivíduo que acalente em si sentimentos semelhantes àqueles que lhe deram origem, e está igualmente preparado para estimular esses sentimentos nesse indivíduo, graças à força nutritiva que neste acham, ou para exercer sobre ele qualquer má influência tão logo para isso se lhe proporcione uma ocasião. Se tem a força e o poder suficiente para se alojar em qualquer invólucro transeunte, é certo que o faz, visto que essa moradia temporária lhe permite economizar os seus terríveis recursos com mais cuidado. Sob esta forma pode manifestar-se através de um médium, e sob o disfarce de um dos seus amigos íntimos pode, às vezes, vir a exercer influência sobre criaturas que, a não ser assim, nunca poderia exercer o menor poder. O que acaba de se dizer vem confirmar ainda mais a importância que tem para nós e para os outros a rigorosa observação dos nossos pensamentos. Há centenas de criaturas bem intencionadas que nunca, quer por palavras quer por obras, deixaram de ser escrupulosamente observadoras dos seus deveres para com os seus semelhantes, e que, considerando que o pensamento é livre e ninguém tem nada a ver com o que pensam no seu foro íntimo, deixam à revelia os seus pensamentos, sem terem a consciência dos enxames de criações funestas que desencadeiam por esse mundo a fora.
Para um indivíduo nestas condições, deve ser terrível a revelação de que os seus pensamentos e desejos podem produzir elementais artificiais; e por outro lado, deve ser altamente consoladora para aqueles que, sendo bons, dotados de uma alma grata e aperfeiçoada, tenham a impressão dolorosa de que são impotentes para de qualquer modo retribuir as bondades dos seus benfeitores. E realmente, pensamentos amigose desejos sinceros de felicidade podem ser formulados tanto pelos mais ricos, como pelos mais pobres, pois nada há de mais fácil, seja para quem for, do que manter um anjo da guarda junto do irmão ou irmã, do amigo ou do filho, de quem mais se ame, seja qual for o ponto da terra onde se encontre o ente querido. Quantas vezes as preces, os pensamentos de amor e de carinho de uma mãe extremosa se têm transformado num anjo da guarda para um filho, e a não ser no caso quase impossível em que o filho não encerre cm si um instinto que possa responder a uma influência boa, quantas vezes esses pensamentos lhe têm proporcionado auxílio e proteção! Não são utopias esses anjos da guarda, pois muitos clarividentes os têm visto. Têm mesmo havido casos em que alguns desses anjos têm a força suficiente para se materializar, tornando-se visíveis momentaneamente à simples vista física. É digno de nota o fato curioso de, mesmo depois da passagem da mãe para o mundo-céu, o amor que ela derrama sobre os filhos que julga estarem em volta de si, ir ainda reagir sobre eles apesar de estarem ainda na terra, alimentando o elemental protetor por ela criado, quando na terra, até seus filhos queridos abandonarem, por sua vez, a vida física. Como muito bem observa Madame Blavatsky, “o amor de mãe será sempre sentido pelos filhos encarnados; manifesta-se-lhes nos sonhose por vezes em vários casos da vida, fornecendo uma proteção e meios de salvação providenciais; porque o amor é um escudo forte, e não é limitado pelo espaço nem pelo tempo” (5). Contudo, não se julgue que todas as histórias de intervenção dos anjos da guarda, devam ser atribuídas à ação de dementais artificiais, porque em muitos casos esses “anjos” são apenas as almas ou de criaturas ainda vivas ou mortas recentemente, e ainda, em alguns casos, embora muito raros, o papel é representado pelos devas (6). É este poder que tem um desejo cheio de convicção, principalmente se for muito repetido, de criar um elemental ativo, que constantemente trabalha pela realização desse desejo, o que constitui a explicação científica daquilo a que as criaturas, cheias de devoção mas alheias à filosofia, julgam ser as respostas favoráveis às preces atendidas. Há ocasiões, embora presentemente raras, cm que o Karma da suplicante é tal que permite a proteção implorada lhe seja fornecida diretamente por um Adepto, ou discípulo deste, e ainda há o caso, bastante mais raro, da intervenção provir de um deva ou de qualquer espírito natural. Mas, em todos estes casos, o meio mais fácil e mais evidente de proporcionar esse auxílio, seria sempre o fortalecimento e direção inteligente do elemental já formado pelo desejo. Um exemplo curioso e instrutivo da extrema persistência destes elementais artificiais, dadas as circunstâncias favoráveis, foi recentemente observado por um dos nossos investigadores.
Todos os que se interessam por leituras acerca destes assuntos sabem que em muitas famílias antigas há a crença da existência de avisos fúnebres tradicionais, isto é, de qualquer fato que prediz, geralmente com antecedência de poucos dias, a aproximação do falecimento do chefe da família. Temos um exemplo bem frisante no pássaro branco dos Oxenham que, desde o reinado da Rainha Isabel, pressagia com a sua aparição a morte de qualquer membro da família; e ainda outro no célebre carro espectral que, diz-se, pára à porta de certo castelo do norte da Inglaterra, quando está iminente uma calamidade semelhante. É um fato desta ordem, embora menos flagrante e mais vulgar, que se produz na família de um dos nossos consócios: três dias antes da morte ouve-se no ar uma ária solene de música fúnebre. O nosso colega, tendo ouvido duas vezes esses místicos acordes, e tendo reconhecido a exatidão do aviso, o que, aliás, ele sabia ser tradição secular da sua família, tratou de ver se descobria pelos métodos ocultos qual a verdadeira causa de tão estranho fenômeno. O resultado das suas investigações teve tanto de imprevisto quanto de interessante. Aconteceu que pelos meados do século XII, o chefe da família foi, como tantos outros bravos cavaleiros, para as cruzadas, e levou consigo, para que ganhasse cm tão sagrada causa as suas esporas de ouro, o filho mais novo, que era o seu favorito e um mancebo promissor, cuja felicidadee sucesso na vida era o mais ardente desejo do coração paterno. Infelizmente, porém, o cavaleiro moço morreu em combate e o pai ficou mergulhado no mais profundo desespero, lamentando não só a perda do filho querido, mas, principalmente, o fato de ele ter sido subitamente arrancado à vida, numa idade em que as paixões dominam e em que não se está espiritualmente preparado para ingressar no outro mundo. E tão profunda e pungente foi a sua dor que, pondo de lado a armadurae o gládio, professou numa ordem religiosa, jurando votar o resto da vida à oração, pedindo pela alma do filho. E além disso, para que, de futuro, a nenhum dos seus descendentes viesse a acontecer o que ele, na sua simples e piedosa imaginação de crente, considerava um perigo terrível, isto é, ser arrebatado pela morte antes de estar para ela devidamente preparado. E dia após dia canalizou, em preces fervorosas, toda a energia da sua alma no sentido do seu desejo, crendo firmemente que, fosse como fosse, o resultado das suas preces haveria de ser o que ardentemente desejava. Qualquer estudante de ocultismo terá a maior facilidade em adivinhar qual foi o efeito dessa corrente de pensamento tão firme e persistente. O nosso monge cavaleiro criou assim um elemental artificial de imenso poder e recursos inesgotáveis, e acumulou dentro deste uma reserva de força que permitiu a este a realização dos desejos do seu criador por largo espaço de tempo. Um elemental é uma perfeita bateria de acumuladores — em que praticamente não há esgotamento de energia. Se atendermos ao valor da sua potência original e à raridade das ocasiões para a despender, não nos admiraremos de a vermos manifestando uma vitalidade, absolutamente intacta, avisando os descendentes do cruzado do fim próximo, por meio da estranha melodia que foi outrora, há setecentos anos, na Palestina, o canto fúnebre que levou à sepultura o jovem e heróico guerreiro.
2.º Elementais criados conscientemente.
Vimos, no exemplo citado, como um indivíduo, mesmo sem saber o que faz, pode orientar a força do seu pensamento. Imagine-se agora o que pode fazer qualquer Adepto da magia que, conhecendo perfeitamente o assunto, sabe claramente o efeito que pode produzir com o pensamento. É fato assente que tanto os ocultistas da seita branca como os da negra se servem frequentemente de elementais artificiais nos seus trabalhos, e poucas tarefas há que não possam ser levadas a cabo por essas criaturas, quando cientificamente preparadas e habilmente dirigidas. Os industriados no assunto podem estabelecer uma relação com o seu elemental e guiá-lo, independentemente da distância em que se manifesta, de forma que o elemental agirá como se estivesse dotado com toda a plenitude da inteligência do seu criador. Têm-se visto anjos da guarda extremamente ativos e nitidamente definidos, criados desta forma, mas é raro que o Karma permita intervenção tão direta na vida ide um homem. Todavia, acontece que alguns discípulos dos Adeptos que, no decurso da realização da missão que por eles lhes foi confiada, têm de afrontar perigos provenientes do ataque de forças muito superiores às suas, têm a seu lado um destes protetores, cujo poder formidável e incansável vigilância têm tido plena confirmação. Por meio dos processos mais adiantados, os cultores da magia negra conseguem também a criação de elementais artificiais, e não têm sido pequeno o mal que tais entidades têm espalhado por este mundo. Mas também estes esbarram com a resistência daqueles cuja pureza de vida e de caráter os torna opacos à sua influência, e, por curiosa inversão, vão reagir com tremenda força sobre o seu criador. A velha história do feiticeiro medieval esfacelado pelos demônios por ele invocados, não é de todo uma fábula inventada; pode mesmo encerrar um triste fundo de verdade. Semelhante ao que acontece com as entidades artificiais estudadas no parágrafo anterior, também estas podem, por várias razões, escapar ao domínio daqueles que tentam utilizá- las, convertendo-se em demônios errantes. Mas os elementais formados conscientemente são dotados de inteligência e de poder muito maiores; têm mesmo duração de vida muito superior aos outros, e por isso são muito mais perigosos. Buscam constantemente meios para prolongar a existência, quer alimentando-se, como vampiros, da vitalidade de seres humanos, quer influenciando-os a que façam oferendas, tendo conseguido mesmo em tribos semi-selvagens que a ignorância dos negros os leve a reconhecê-las como deuses de uma povoação ou de uma família. Toda divindade que exige sacrifícios que importem a efusão de sangue, pode ser considerada como pertencente às classes mais inferiores e mais repugnantes desta categoria. Outros tipos menos condenáveis contentam-se com oferendas de arroze de alimentos cozinhados, de várias espécies. Na índia ainda hoje se encontra em algumas regiões qualquer das duas variedades, mas é natural que na África sejam relativamente muito mais numerosas. Graças ao alimento que colhem das oferendas e sobretudo à vitalidade que subtraem aos seus fiéis, podem continuar a prolongar a existência por muitos anos, ou mesmo séculos, conservando em si a força suficiente para de vez em quando produzir certos fenômenos insignificantes, com que vão estimulando a fé e o zelo dos seus adoradores, ou para os molestar e contrariar sempre que se descuidam na realização dos sacrifícios do costume. Por exemplo, reconheceu-se recentemente que numa povoação da índia, sempre que por qualquer motivo à divindade local não era ofertado o alimento de costume, rebentavam entre as cabanas incêndios espontâneos, algumas vezes três ou quatro simultaneamente, em circunstâncias em que era impossível suspeitar se de qualquer intervenção humana. A qualquer leitor que conheça alguma coisa dos recônditos cantos dessa admirável região da índia, a mais maravilhosa e estranha de todas as regiões do Universo, decerto ocorrem outras histórias deste gênero. A arte de fabricar elementais artificiais de extremo poder e grande virulência parece ter sido uma das especialidades dos feiticeiros da Atlântida — “os Senhores da face negra”. — Um exemplo das suas faculdades encontra-se na Doutrina Secreta (vol. II, pág. 427), em que se lê dos estranhos animais que falavam e que tiveram de se apaziguar com uma oferenda de sangue para que não fossem acordar os donos e preveni-los da sua próxima destruição. Mas além destes estranhos animais criavam também outras entidades artificiais cuja energia e cujo poder eram tamanhos que se pretende ainda existam alguns deles, apesar de se terem passado mais de onze mil anos desde que o terrível cataclismo destruiu os seus criadores originais. Ã terrível divindade hindu cujos fiéis eram impelidos a cometer em seu nome os horrorosos crimes de Thuggee — a espectral e hedionda Káli, ainda hoje adorada com ritos cujo horror de pormenores não temos coragem de descrever — é talvez uma relíquia de um sistema que teve de ser aniquilado mesmo à custa da submersão de um continente inteiro que arrastou consigo sessenta e cinco milhões de vidas humanas.
3.° Artificiais humanos.
Resta-nos considerar uma classe de entidades que, apesar de ser pouco numerosa, adquiriu, pela sua íntima conexão com um dos grandes movimentos dos tempos modernos, uma importância absolutamente desproporcionada para o número dos seus membros. Poderão suscitar-se dúvidas se as deveríamos incluir na primeira ou na terceira das nossas divisões principais. Mas, apesar de humanas, estão distanciadas do caminho regular da nossa evolução, e são tão acentuadamente produtos de uma vontade estranha à própria vontade, que nos pareceu não errar incluindo-as entre os seres artificiais. A melhor maneira de as estudar é começarmos pela sua história, que nos faz voltar atrás, à grande raça atlântica. Ao pensarmos nos Adeptos e nas escolas ocultistas desse notável povo, os nossos espíritos vão instintivamente para as práticas condenáveis dos seus últimos dias. Mas não esqueçamos que antes dessa época de egoísmo e degradação, a poderosa civilização da Atlântida produziu muita coisa nobre e digna de admiração, e que entre os seus chefes alguns houve que hoje ocupam os pináculos mais elevados até agora atingidos pelo homem. Entre as Lojas de estudo oculto, preliminar para a iniciação, formadas pelos Adeptos da boa Lei, existia uma que era então tributária de um dos grandes monarcas atlânticos — “O Divino Senhor da Porta de Ouro”. E apesar das muitas e estranhas vicissitudes por que tem passado, apesar de se ter visto forçada a mudar a sua sede de país para país, visto que todos estes iam sendo, por sua vez, invadidos pelos elementos discordantes de uma civilização mais recente, essa Loja existe ainda hoje, observando ainda o mesmo ritual primitivo desse mundo desaparecido — ensinando mesmo, como linguagem secreta e sagrada, a mesma língua da Atlântida, que se falava quando da sua fundação há muitos milhares de anos. É ainda hoje o que foi no princípio: uma Loja de ocultistas de intenções puras e filantrópicas, que pode levar os estudantes que acha dignos ao caminho do verdadeiro conhecimento e, depois de váriase rigorosas provas das aptidões e qualidades do candidato, conferir-lhe certo número de poderes psíquicos ao seu alcance.
Os Mestres dessa Loja não estão no mesmo nível que os Adeptos, mas centenas dos seus discípulos têm aprendido lá a direção do Caminho que leva ao Adeptado em vidas subsequentes. E embora não faça parte da Irmandade dos Himalayas, há entre estes alguns irmãos que, em encarnações passadas, tiveram ligações com ela, e por isso se interessam com invulgar simpatia por suas atividades. Os Dirigentes dessa Loja, embora se tenham mantido, eles e a sua sociedade, sempre em plano secundário, tem feito o que lhes tem sido possível em prol do progresso da verdade no mundo. Há pouco mais ou menos meio século, para contrabalançar a onda rastejante de materialismo que ameaça afogar toda a espiritualidade na Europa e na América, resolveram combatê-lo por métodos um tanto ou quanto inéditos — de modo que oferecessem a qualquer indivíduo dotado de raciocínio oportunidade para a obtenção da prova absoluta da existência de uma vida independente da do corpo, existência que a Ciência se comprazia em negar. Os fenômenos exibidos não eram em si absolutamente novos, visto que a história aqui e acolá, desta ou daquela maneira, nos fala deles; mas a sua organização definida e o fato de poderem ser provocados, por assim dizer, à ordem, deram-lhes um caráter completamente inédito para o mundo moderno. O movimento assim iniciado foi-se estendendo gradualmente até dar esse vasto edifício do espiritismo moderno. Se é certo que não seria justo atribuir aos iniciadores do plano a responsabilidade direta de muitos dos resultados que se seguiram, certo é que realizaram o seu objetivo sob o ponto de vista da conversão de grandes massas de gente, desviando-as da descrença absoluta para a fé sólida em qualquer espécie de vida nova futura. E isto é, só por si, um resultado maravilhoso, apesar da opinião daqueles que sustentam que foi obtido por um custo demasiado alto. O processo usado constituiu em tomar uma criatura vulgar depois da morte, torná-la plenamente consciente, no plano astral, mostrar-lhe, dentro de certos limites, os poderes e as forças desse plano, e em seguida confiar-lhe a direção de um círculo espiritista. Essa criatura, por sua vez, “desenvolvia” da mesma forma outras personalidades falecidas, e todas reunidas atuavam sobre as pessoas que assistiam às sessões e as “desenvolviam” como médiuns.
Assim cresceu e progrediu o espiritismo. Sem dúvida, alguns membros vivos da Loja original manifestaram-se por vezes na forma astral, em alguns desses círculos — talvez ainda o façam hoje; mas na maior parte dos casos limitaram-se a dirigir e a guiar aqueles a quem tinham confiado a direção. Não há dúvida que o movimento se propagou muito mais rapidamente e tomou incremento muito maior do que esperava, e tanto assim que em breve se subtraiu à sua direção. Por isso afirmamos que não se lhes devem atribuir responsabilidades diretas em muitos dos resultados desse movimento. Evidentemente, a intensidade anormal da vida astral suscitada nesses “guias”, retardava-lhes consideravelmente o progresso natural. E, embora a idéia de que o karma bom gerado com o auxílio que eles davam aos investigadores da verdade devia, em parte, compensar esse atraso, veio, contudo, a reconhecer-se que não se podia empregar o mesmo “espíritoguia” por muito tempo sem que isso lhe fosse altamente prejudicial. Recorreu-se às substituições; mas, por vezes, quando qualquer motivo não permitia a troca, recorreu-se a um expediente notável, e foi dele que nasceu a classe a que chamamos “artificiais humanos”. Permitiu-se que os princípios superiores do “guia” original prosseguissem na sua evolução retardada e passassem para o mundo-céu, mas lançou-se mão da sua sombra abandonada, vivificando-a de maneira a que “o guia” aparecesse no círculo dos seus admiradores aparentemente como antes. Parece que isto a princípio foi desempenhado pelos próprios membros da Loja, mas chegou-se à conclusão, tanto quanto nos é lícito afirmar a esse respeito, que tal disposição era, não sabemos se muito penosa e contraproducente, ou se dava lugar a grande desperdício de força e mesmo se objetava contra a criação de um elemental artificial. De modo que se decidiu que a pessoa designada para suceder ao guia precedente se desempenharia do seu trabalho, mas apoderando-se da sombra, ou do invólucro, do antecessor tendo, portanto, deste, apenas a aparência. Diz-se que alguns membros da Loja se opuseram a isto, porque, apesar da pureza da intenção, a execução envolvia qualquer coisa de fraude. Mas a opinião geral parece ter sido a de que, visto a sombra permanecer a mesma e continuar a conter uma parte da mente inferior, não havia afinal uma verdadeira fraude. Foi esta a gênese das entidades humanas artificiais. Parece que na maioria dos casos estas substituições não levantaram a menor suspeita. Mas houve casos em que alguns investigadores do espiritismo notaram, passado bastante tempo, certas diferenças, que subitamente se revelaram, na maneira e disposição do “espírito”. É inútil dizer que nenhum dos membros da Irmandade dos Adeptos contribuiu em qualquer ocasião para a criação de entidades artificiais desta espécie, mas não podiam evitar que alguém, com condições para isso, se lembrasse de o fazer. O ponto fraco deste processo consiste na facilidade com que outros o podem adotar e na dificuldade em se evitar que os magos negros criem “espíritos” de comunicação à sua vontade, e nunca é com boas intenções que o fazem. E sabe-se que já o têm feito. Termina aqui o estudo dos habitantes do plano astral. Com as reservas já mencionadas algumas páginas atrás, pode considerar-se bastante completo o catálogo apresentado. Mas não é demais insistir no fato de que este manual não passa de um esboço, a traços largos, de um assunto de grande vastidão, que exigiria uma vida inteira de estudo e de árduo trabalho para dele se fazer um tratado completo e sem omissões.
Notas das seções “Habitantes”:
(1) São sete os princípios constitutivos da natureza humana. Para elucidação do leitor, damos a seguir uma relação dos mesmos, segundo os compêndios teosóficos mais fidedignos: Tríada Superior, a espiritual: Atma., ou Espírito; Buddhi, ou Intuição o principio crístico; Afanas, ou o Pensador, a Inteligência. Quaternária Inferior, a Personalidade Mortal: Kama, ou natureza passional e emocional; Prana, ou Vitalidade, energia vital; Duplo Etérico, ou Veículo de Prâna; e o Corpo Etérico. (2) “Barretes vermelhos”.
(3) “Barretes amarelos”.
(4) Os grandes Mestres das esferas nirvânicas, que guiam a evolução da humanidade. (N. do T.)
(5) A Chave da Teosofia
(6) Ver Auxiliares Invisíveis de C.W. Leadbeater
C. W. Leadbeater
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