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10 – K
MALKUTHH – PRINCIPIUM – PHALLUS
Todas as religiões conservaram a lembrança de um livro primitivo escrito em figuras pelos sábios dos primeiros séculos do mundo, e cujos símbolos, simplificados e vulgarizados mais tarde, forneceram à Escritura suas letras, ao Verbo seus caracteres, à Filosofia oculta seus signos misteriosos e seus pantáculos.
Este livro, atribuído a Enoque, o sétimo senhor do mundo depois de Adão, pelos hebreus; a Hermes Trismegisto pelos egípcios; a Cadmo, o misterioso fundador da Cidade Santa, pelos gregos, – este livro era o resumo simbólico da tradição primitiva, chamada, depois de Cabala, uma palavra hebraica que é equivalente a tradição.
Esta tradição repousa inteiramente sobre o dogma único da magia: o visível é para nós a medida proporcional do invisível. Ora, os antigos, tendo observado que o equilíbrio é, em física, a lei universal, e que resulta da oposição aparente de duas forças, concluíram que em Deus, isto é, na primeira causa vivente e ativa, se deviam reconhecer duas propriedades necessárias uma à outra: a estabilidade e o movimento, a necessidade e a liberdade, a ordem racional e a autonomia volitiva, a justiça e o amor, e, por conseguinte, também a severidade e a misericórdia; e são estes dois atributos que os cabalistas judeus personificam de algum modo sob os nomes de Geburah e Chesed.
Acima de Geburah e Chesed reside a coroa suprema, o poder equilibrante, princípio do mundo ou do reino equilibrado, que vemos designado sob o nome de Malkuth no versículo oculto e cabalístico do Pater de que já falamos.
Mas Geburah e Chesed, mantidos em equilíbrio, em cima pela coroa e embaixo pelo reino, são dois princípios que podem ser considerados, quer na sua abstração, quer na sua realização. Abstratos ou idealizados, tomam os nomes superiores de Hocmah , a sabedoria, e de Binah , a inteligência.
Realizados, chamam – se à estabilidade e o progresso, isto é, a eternidade e a vitória: Hod e Netsah .
Tal é, conforme a Cabala, o fundamento de todas as religiões e de todas as ciências, a idéia prima e imutável das coisas: um tríplice triângulo e um círculo, a idéia do ternário explicada pela balança multiplicada por si mesma nos domínios do ideal, depois a realização desta idéia nas formas. Ora, os antigos uniram as noções primárias desta simples e grandiosa teologia à própria idéia dos números, e qualificaram, assim, todos os algarismos da década primitiva.
1. Kether – A Coroa, o poder equilibrante.
2. Hocmah – A Sabedoria, equilibrada na sua ordem imutável pela iniciativa da Inteligência.
3. Binah – A Inteligência ativa, equilibrada pela Sabedoria.
4. Chesed – A Misericórdia, segunda concepção da Sabedoria, sempre benévola, porque é forte.
5. Geburah – O Rigor necessitado pela própria Sabedoria e pela Bondade. Sofrer o mal e é impedir o bem. 6. Tiphereth – A Beleza, concepção luminosa do equilíbrio nas formas, o intermediário entre a coroa e o reino, o princípio mediador entre o criador e a criação. (Que sublime idéia não achamos aqui da poesia e do seu soberano sacerdócio!)
7. Netsah – A Vitória, isto é, o triunfo eterno da inteligência e da justiça.
8. Hod – A Eternidade das vitórias do espírito sobre a matéria, do ativo sobre o passivo, da vida sobre a morte. 9. Yesod – O Fundamento, isto é, a base de toda crença e de toda verdade, é o que chamamos em filosofia o Absoluto . 10. Malkuth – O Reino, é o universo, é a criação inteira, a obra e o espelho de Deus, a prova da razão suprema, a conseqüência formal que nos força a remontar às premissas virtuais, o enigma cuja palavra é Deus, isto é: razão suprema e absoluta.
Estas dez noções primárias, unidas aos dez primeiros caracteres do alfabeto primitivo, significando, ao mesmo tempo, princípios e números, são os que os mestres da Cabala chamam as dez Sephiroth.
O tetragrama sagrado, traçado deste modo:
Indica o número, a origem e as relações dos nomes divinos. É ao nome de Iodchavad, escrito com estes vinte e quatro sinais coroados de um tríplice florão de luz, que devem ser referidos os vinte e quatro anciãos coroados do Apocalipse. Na Cabala, o princípio oculto é chamado de ancião, e este princípio, multiplicado e como que refletido nas causas segundas, cria suas imagens, isto é, tantos anciãos quantas concepções diversas há da sua única essência. Estas imagens menos perfeitas, ao se afastarem da sua fonte, lançam nas trevas um último reflexo ou um último clarão que representa um velho horrível e desfigurado: é o que vulgarmente é chamado o diabo. Por isso, um iniciado ousou dizer: “O diabo é Deus compreendido pelos malvados ”; e um outro, em termos mais estranhos, mas não menos enérgicos, acrescentou: “O diabo é formado dos fragmentos de Deus ”. Podemos resumir e explicar estas asserções tão novas, fazendo notar que, até no simbolismo, o demônio é um anjo caído do céu por ter querido usurpar a divindade. Isso pertence à linguagem alegórica dos profetas e lendários. Filosoficamente falando, o diabo é uma idéia humana da divindade sobrepujada e despojada do céu pelo progresso da ciência e da razão. Moloch, Adramelek, Baal, foram, entre os orientais primitivos, as personificações do deus único, desonradas por atributos bárbaros. O deus dos jansenistas, criando para o inferno a maioria dos homens e comprazendo – se com as torturas eternas dos que não quis salvar, é uma concepção ainda mais bárbara do que a de Moloch; por isso, o deus dos jansenistas já é para os cristãos sábios e esclarecidos um verdadeiro Satã caído do céu.
Os cabalistas, multiplicando os nomes divinos, uniram todos, quer à unidade do tetragrama, quer à figura do ternário, quer à escada sefírica da década: traçam assim a escada dos nomes e dos números divinos.
triângulo que se pode traduzir assim, em letras romanas:
I
IA
SDI
JEHV
ELOIM
SABAOT
ARARITA
ELVEDAAT
ELIM GIBOR
ELIM SABAOT
O conjunto de todos estes nomes divinos, formado do único tetragrama, mas fora do próprio tetragrama, é uma das bases do Ritual hebreu, e compõe a força oculta que os rabinos cabalistas invocam sob o nome de Semhamphorash.
Temos de falar agora dos Taros, sob o ponto de vista cabalístico. Já indicamos a fonte oculta de seu nome. Este livro hieroglífico se compõe de um alfabeto cabalístico e de uma roda ou círculo de quatro décadas, especificadas por quatro figuras simbólicas e típicas, tendo cada uma, para raio, uma escada de quatro figuras progressivas representando a Humanidade: homem, mulher, moço e criança; senhor, senhora, combatente e criado. As vinte e duas figuras do alfabeto representam primeiramente os treze dogmas, depois as nove crenças autorizadas pela religião hebraica, religião forte e fundada sobre a mais alta razão.
Eis a chave religiosa e cabalística dos Taros, expressa em versos técnicos à maneira dos antigos legisladores:
E sobre os querubins faz pairar sua glória.
Com o auxílio desta explicação, puramente dogmática, já se pode entender as figuras do alfabeto cabalístico do Tarô. Assim a figura nº 1, chamada o Pelotiqueiro, representa o princípio ativo na unidade de autotelia divina e humana; o nº 2, chamado vulgarmente a Papisa, figura a unidade dogmática dos números, é a Cabala ou a Gnose personificada; o nº 3 representa a Espiritualidade divina sob o emblema de uma mulher alada, que tem numa das mãos a águia apocalíptica, e, na outra, o mundo suspenso na ponta do seu cetro. As outras figuras são tão claras e tão facilmente explicáveis como estas primeiras.
Voltemos, agora, aos quatro signos, isto é, aos Paus, às Copas, às Espadas e aos Círculos ou Pantáculos,, vulgarmente chamados Ouros. Estas figuras são hieróglifos do tetragrama; assim, o Pau é o phallus dos egípcios ou iod dos hebreus; a Copa é o octeis ou o hê primitivo; a Espada é a conjunção de ambos ou o lingham figurado no hebreu anterior ao cativeiro pelo vô , e o Círculo ou Pantáculo, imagem do mundo, é o hê final do nome divino.
Agora, tomemos um Tarô e reunamos, quatro por quatro, todas as páginas que formam a Roda ou ROTA de Guilherme Postello; ponhamos juntos os quatro ases, os quatro dois, etc., e teremos dez montes de cartas que dão a explicação hieroglífica do triângulo dos nomes divinos, de acordo com a escada do denário que demos precedentemente. Poderemos, pois, lê – los assim, referindo cada número à Sephirot correspondente:
Quatro letras do nome que contém todos os nomes.
1. – KETHER.
Os quatro ases:
A coroa de Deus tem quatro florões.
2. – CHOCMAH
Os quatro dois:
A sua sabedoria se espalha e forma quatro rios.
3. – BINAH
Os quatro três:
Da sua inteligência dá quatro provas.
4. – CHESED
Os quatro quatro:
Da sua misericórdia há quarto benefícios.
5. – GEBURAH
Os quatro cinco:
O seu rigor quatro vezes pune quatro erros.
6. – TIPHERET
Os quatro seis:
Por quatro raios puros a sua beleza se revela.
7. – NETSAH
Os quatro sete:
Celebremos quatro vezes a sua vitória eterna.
8. – HOD
Os quatro oito:
Quatro vezes triunfa na sua eternidade.
9. – YESOD
Os quatro nove:
Por quatro fundamentos seu trono é suportado.
10. – MALCHUT
Seu único reino é quatro vezes o mesmo:
E conforme os florões do divino diadema.
Vê – se, por este arranjo tão simples, o sentido cabalístico de cada lâmina. Assim, por exemplo, o cinco de paus significa rigorosamente Geburah de Jod , isto é, justiça do Criador ou cólera do homem; o sete de copas significa vitória da misericórdia ou vitória da mulher; o oito de espada significa conflito ou equilíbrio eterno; e assim outras. Assim podemos compreender como faziam os antigos pontífices para fazer este oráculo; as lâminas lançadas à sorte davam sempre um sentido cabalístico novo, mais rigorosamente verdadeiro na sua combinação, unicamente a qual era fortuita; e, como a fé dos antigos nada dava ao acaso, eles liam as respostas da Providência nos oráculos do Tarô, que eram chamados Theraph ou Theraphims entre os hebreus, como o pressentiu primeiramente o sábio cabalista Gaffarel, um dos magos habituais do cardeal Richelieu.
Quanto às figuras, eis um último dístico para explicá – las:
REI, DAMA, CAVALEIRO, VALETE
Esposo, moço, criança, toda a humanidade,
Sobem por estes quatro degraus à unidade.
Daremos, no fim do Ritual, outros detalhes, e documentos completos sobre o maravilhoso livro do Tarô, e demonstraremos que é o livro primitivo, a chave de todas as profecias e de todos os dogmas; numa palavra, o livro inspirador dos livros inspirados, o que não pressentiram nem Court de Gebelin, na sua ciência, nem Alliette ou Eteilla, nas suas singulares intuições.
As dez Sephiroth e as vinte e duas lâminas do tarô formam o que os cabalistas chamam os trinta e dois caminhos da ciência absoluta. Quanto às ciências particulares, dividem -nas em cinqüenta capítulos, que chamam as cinqüenta portas. (Sabemos que porta significa governo ou autoridade entre os orientais). Os rabinos dividem a Cabala também em Bereschit ou Gênese universal, e Mercavah, ou carro de Ezequiel; depois, das duas maneiras de interpretar os alfabetos cabalísticos, formam duas ciências, chamadas Gematria e a Temurah, e compõem delas a arte notória, que fundamentalmente nada mais é que a ciência completa dos signos do Tarô e a sua aplicação complexa e variada à adivinhação de todos os segredos, quer da filosofia, quer da natureza, quer do futuro. Falaremos disso no vigésimo primeiro capítulo desta obra.
Eliphas Levi – Dogma e Ritual da Alta Magia
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