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Kenneth Grant, 1972
Kenneth Grant é o resultado vivo da mudança trazida ao mundo por Austin Osman Spare. Quando Spare começou a desenvolver seu trabalho mágico, tinha em mente, ou não, criar um sistema prático livre do teatro e do barroquismo inútil que a magia cerimonial clássica e contemporânea traziam para uma arte que deveria, antes de mais nada, ser direta e buscar apenas um objetivo: resultados. Muitos magos viram a trilha seguida por Spare e a transformaram em uma via mágica pavimenta com trabalho, rituais e registros. A Magia do Caos se tornou uma escola sólida com suas próprias celebridades e mestres. Mas Spare fez algo que não imaginava ser possível, ou talvez tenha sido este seu objetivo desde o início: influenciar e contaminar com o vírus dinâmico do Caos as escolas existentes de Magia, e uma das primeiras vítimas desta moléstia foi Grant.
Kenneth Grant é um dos expoentes da magia atual, nascido em 1924 e ainda atuante (2009), foi pupilo e secretário de Crowley por longa data e reconhecido pelo próprio Spare como um dos mais sérios ocultistas de sua geração. Após a exposição à filosofia do Caos Grant começou a mesclar os princípios da Magia do Caos com as bases da Thêlema de Crowley, saindo da ritualística hermética e adicionando à panela ingredientes modernos e uma boa dose de cultura pop.
O Renascer da Magia é seu primeiro livro e possivelmente um de seus trabalhos mais lúcidos e completos. Trata-se da porta de entrada para o que posteriormente ficou conhecido como a Trilogia Tifoniana. Assim a presença deste tomo nesta lista é um convite e uma obrigação para que o estudante empenhado conheça as outras duas obras: Aleister Crowley and the Hidden God e Cults of the Shadow, ainda sem tradução para o português
Esta definitivamente não é uma obra para iniciantes. O autor vai muito além do que se espera para uma obra com a palavra “Bases” no título. Ao invés de simplesmente compilar o conhecimento e as práticas mágicas de sua geração ele nos oferece a sua visão das verdades místicas e teosóficas do ponto de vista do caminho da mão esquerda, e por isso mesmo sua obra não tem ainda hoje nenhum paralelo com o qual comparar.
Além disso, nenhum compêndio de magia que queira se passar por sério pode deixar de fora um de seus mais controversos, se não prazerosos, aspectos: o sexual. Muitos autores tratam o sexo como parte de rituais, desde a masturbação até rituais para se conseguir sexo, mas a magia sexual vai muito além disso, transformando o próprio corpo do praticante em um circuito mágico, movido à energia sexual e do orgasmo. Como ele mesmo deixa claro nesta obra:
” A exaltação mental gerada por um orgasmo magicamente controlado forma um portal de passagem reluzente semelhante a uma lente por onde flui o vívido imaginário astral da mente subconsciente. Imagens específicas são evocadas e “fixadas”; elas se tornam instantânea e vivamente vivas. Como a presença luminosa delas é obsessiva, salvaguardas mágicas são essenciais para compensar uma real obsessão. Esta imagens são elos dinâmicos com os centros mais profundos da consciência e atuam como chaves para experiência ou revelações que formam o objetivo da Operação. Encarnar tais experiências é o objetivo da magia sexual.”
No quesito Magia Cerimonial Grant é igualmente interessante, senão indispensável.
O livro é herdeiro da tradição Thêlema e claro estandarte do Aeon Horusiano. A filosofia de Aleister Crowley e da OTO é discutida nos dois primeiros capítulos de maneira muito mais esclarecedora do que em muitos livros de outros autores. O prato principal da obra é no entanto a abordagem de Kenneth a alguns segmentos não muito explorados do pensamento de Crowley e da Thêlema em si, em especial sobre a relação de entidades sobre-humanas com a A .’. A.’. e sobre as afinidades do Livro da Lei com a concepção da OTO de magia sexual e tantrismo. Além disso a maneira com que traça paralelos entre a literatura Lovecraftiana e aspectos da magia clássica deixa claro que o mago não deve se concentrar apenas na mitologia tradicional e aceita, imortalizada pela religião, mas que a criatividade de algumas pessoas, como o próprio Lovecraft, são portais para um mundo que é vislumbrado em sua totalidade apenas por poucos iniciados, criando assim uma ponte prática entre a pessoa comum e aquelas que dedicaram anos e anos a estudos e práticas.
Mais do que apontar as várias abordagens, Grant consegue integrar todos estes sistemas. Então mais do que as diferenças entre o método da OTO e a tradição hindu, aqui é apresentada uma lógica comum a ambas e com isso um novo diálogo é aberto. Kenneth Grant consegue realizar esta proeza em uma variedade de sub-tópicos diferentes, o que torna o livro especialmente valioso e interessante, a maior prova disso sendo a reação que causa nos diversos praticantes e pesquisadores do ocultismo e da arte mágica, enquanto alguns acusam o livro de se tratar de uma criativa reconstrução da história, outros afirmam que este é um dos melhores trabalhos de teorias ocultas e práticas mágicas da era moderna.
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